See The Light

Capítulo 7


You could be the one to set me free

Você poderia ser aquele a me libertar

And with your hand in mine we will run

E de mãos dadas nós correremos

To a place that knows no one

Para um lugar que não conhece ninguém

(The World Is Watching – Two Door Cinema Club)

~

– Não coma todos eles. São para a escola, lembra?

– Eu não sabia que massa de feijão doce junto com esse arroz grudento seria tão bom – disse Nico, observando o interior do bolinho mordido que segurava como se fosse um objeto de estudo misterioso.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

Ele já tinha comido quantos? Uns três? Droga, ele queria mais. Will Solace riu, vendo-o cobiçar os outros bolinhos à frente na bancada onde os tinham preparado. Pegou mais um e entregou a ele, depois levou a pequena bandeja para a geladeira.

– Deixa eu afastar de você essa tentação terrível – ele disse.

– Minha terapeuta disse que eu preciso aproveitar a onda de apetite pela qual estou passando – comentou Nico.

– Terapeuta?

Nico fez uma careta.

– Longa história.

– E como ela começou? – perguntou Will, sentando do outro lado.

Nico queria manda-lo esquecer, mas acabou dizendo, tentando soar indiferente:

– Quando eu esfaqueei meu professor na terceira série.

Will levantou uma sobrancelha, mas sua boca formava um “o” de compreensão.

– É – Nico continuou, no mesmo tom. – Parece que ele estava tendo um caso com a mulher do irmão ou algo assim. – Era exatamente isso. Nico se lembrava muito bem. – O irmão acabou morrendo num acidente de carro e, claro, foi atrás dele. Foi a primeira vez que eu vi um espírito vingativo... Eu tinha nove anos. Estávamos fazendo maquetes do nosso bairro... Eu peguei o estilete de isopor e o ataquei.

Nico arriscou encarar Willpor um segundo. A expressão do garoto era neutra.

– Ele ficou bem ferido, porque demorou para superar o choque e conseguir reagir, sabe. – Nico tinha largado o bolinho. De repente, se sentia enjoado, lembrando de ver suas mãos cheias de sangue quando recobrou a consciência. - Chamaram psiquiatras e tudo mais para conversar comigo. Eu sabia que não podia mencionar os fantasmas. Aprendi isso bem cedo. Então... tudo que eu disse foi que de uma hora para outra eu parecia estar fora de mim, tentando explicar que não queria ter machucado o professor... Me receitaram remédios, queriam me internar, mas minha mãe... Ela era filha de um diplomata... Tinha muitos contatos úteis. Conseguiu um psiquiatra com uma segunda opinião e um bom advogado... O depoimento do professor também ajudou. Disse que eu nunca tinha apresentado um comportamento violento. Enfim, por causa disso eu estou preso às sessões de terapia com Íris, a doutora da paz e amor...

Nico respirou fundo. Nunca tinha contado nada disso para ninguém. Bianca sabia, lógico. Ela tinha estado com ele quando tudo aconteceu, mas nem para Hazel ele tinha contado tanto. Nem sabia muito bem por que tinha feito isso.

– Você está assustado? – Nico perguntou, já que o outro permanecia calado.

– Assustado? Não exatamente... Acho que já superei essa fase...

– Eu não entendo por que você não surta com tudo isso! – Nico ainda sentia parte da irritação que sentira no início, com a calma de Will.

– Em que isso ajudaria você ou a mim? – Will perguntou com simplicidade.

– Como você consegue ficar perto de mim sabendo dessas coisas?... Você é filho de um artista famoso e mora com Jason Grace. Por que estaria preocupado em me ajudar? É só por pena?

– Ai, meu Deus, Nico di Angelo! – Will apertava a têmpora com os cotovelos apoiados na bancada. – Por que é que você é tão complicado?... Quer saber de uma coisa? No pouco tempo que eu já passei no “incrível”mundo do meu pai artista famoso, eu vi coisas tão esquisitas que deixariam você e suas assombrações no chinelo. E, se você está preocupado com isso, não, não é por pena que eu sinto vontade de ajudá-lo, apesar da sua inclinação para o drama... Só, por favor, pare de ser tão paranoico! Tenho certeza que muita gente gostaria de ser sua amiga se você simplesmente deixasse que elas se aproximassem.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

– Eu não sou paranoico! E que pessoas? Lou Ellen e aquele pessoal da escola só sentam na mesma mesa que eu porque você está lá.

Will sorriu com o canto da boca.

– Sabe o que Lou Ellen me contou? Que uma amiga dela da nona série acha você fofo.

– O quê? –Nico sentiu o rosto arder e isso o deixou zangado, o que só fez com que ficasse ainda mais vermelho.

– Parece que ela acha você parecido com um cara de uma banda de rock gótico que ela gosta... Ah, se eu tirasse uma foto sua agora, acho que poderia até vender para ela!

Will fez uma moldura com os dedos, como se o estivesse enquadrando para a foto.

– Pare com essa brincadeira estúpida.

– Juro que estou falando a verdade! – Will tentou ficar sério.

– Quer saber? Acho melhor eu ir embora – Nico se levantou. Não sabia se estava mais irritado com Will ou com Lou Ellen, se ela tivesse mesmo dito aquela baboseira, porque se tivesse, com certeza estava querendo tirar uma com a cara de Nico.

Quando ele começou a se dirigir para a porta, Will perguntou calma e casualmente, ignorando o gesto de Nico:

– Você já ouviu falar de Steve Callander?

– Calendar? – Nico não fazia idéia do motivo da pergunta, mas de certa forma ficou satisfeito por ele estar mudando de assunto.

– Callander.

– Ele é o quê? Jogador de hóquei? – perguntou Nico, voltando a se sentar lentamente na beirada do banco alto.

– Ele é o astro teen da série “O Garoto Russo”.

– Ah, faz um tempinho que parei de assistir o Disney Chanel...

– Nickelodeon, na verdade.

– Hum, Steve Calendar é russo? Você o conhece?

– Callander. O pai dele é sueco, mas ele nasceu aqui no país. Ele estudava comigo.

– No internato na Califórnia?

– Isso.

– Ano passado, no natal, eu decidi contar que gostava dele.

– Quê? – Nico quase caiu da beirada do banco. Ele tinha certeza de que tinha ouvido errado, mas precisava perguntar: – Gostava? Como assim?

– Gostava no sentido de eu estava apaixonado por Steve Callander.

– V-você está me dizendo que é...

Nico olhava para Will como se nunca o tivesse visto. Esperava que ele fosse voltar a rir e dizer que era uma piada, mas seus olhos azuis nunca estiveram tão sérios e, Nico notou, tristes. O garoto loiro sacudiu de leve os ombros e respondeu, como se essa não fosse a parte importante:

– Acho que sim. Nunca quis entrar para a aliança gay-hétero nem nada do tipo, mas depois que percebi o que sentia por Steve, percebi também que nunca fui muito como os outros garotos, sabe, no que diz respeito a garotas...Isso o surpreende?

– È claro! Eu nunca teria imaginado! Você não parece ser...

– Por quê? Como eu deveria parecer?

Nico não sabia como responder, então só perguntou:

– Mas... o que... o que Steve fez quando você contou para ele?

– Ele disse que sentia o mesmo por mim.

– Sério?

– Pois é... – Will suspirou longamente. – Eu ainda não tenho certeza se ele estava mentindo ou se só estava confuso...

– O que houve?

Will demorou um pouco para responder:

– Steve queria ser artista, mas não tinha o apoio dos pais. Ele canta e toca piano muito bem... Eu sabia que meu pai poderia ajudar, então falei com ele.

– Seu pai sabia sobre... vocês dois?

– Eu não contei para ele, mas pode ser que ele suspeitasse... Não sei. De qualquer jeito, Steve conseguiu o papel, e eu o via cada vez menos depois disso. Acabei sabendo pela internet que ele estava namorando Violet Dawson, que faz par com ele na série... Quando perguntei a ele, tudo que ele me disse foi que achava que estava apaixonado por mim até conhecer Violet... Eu sei que é horrível da minha parte, mas quando lembro de tudo, sinto que pode nunca ter sido verdade da parte dele, que ele pode ter fingido só porque era a oportunidade perfeita para ele conseguir o que queria...

Nico não sabia o que dizer. Nunca ninguém tinha lhe contado nada tão pessoal e a história de Will o deixava nervoso. Ele percebeu que apertava o lado da tampa de granito da bancada com muita força.

– Por que você está me contando isso? – Só mais tarde Nico perceberia que o jeito como perguntou isso tinha soado bem insensível diante da expressão triste de Will.

Will levantou os olhos para encara-lo e disse:

– Acho que eu precisava contar isso para alguém. Pensei que você iria entender como eu me sinto.

– P-Por que você pensou isso?

– Bom... Me desculpe por dizer isso, mas se existe alguém que sabe o que é enfrentar um problema... Sei que perto dos seus problemas, eu devo parecer um grande bobo, mas...

– Não – Nico se apressou em dizer. - Quer dizer... Não acho que seu problema seja bobo. Esse Steve Calendar é que parece ser um grande idiota. O que você disse a ele?

– Eu não consegui dizer nada. Não queria começar a chorar na frente dele.

Will tinha o queixo apoiado na mão e os olhos abaixados.

Nico nem conseguia imaginar Will Solace desabando. Simplesmente não parecia certo. Ele queria fazer algo para que ele se sentisse melhor, mas não conseguia pensar em nada. Tinha experiência zero em consolar pessoas. Quer dizer, quando Hazel veio para a cidade e estava deprimida pela morte da mãe, ele deixou que ela chorasse em seu ombro enquanto dava batidinhas desajeitadas em sua costa. Segundo Hazel, aquilo tinha feito com que se sentisse melhor. Mas não. Claro que ele não ia sugerir que Will chorasse em seu ombro. Sacudiu a cabeça com esse pensamento e disse:

– Me desculpe.

– Pelo quê?

– Por não poder ajudar. Quer dizer, eu gostaria de poder retribuir o que você faz por mim...

Will Solace pareceu gostar de ouvir aquilo. Um sorriso fraco voltou ao seu rosto e ele disse:

– Falar sobre isso já ajuda bastante. Você não se sente melhor quando compartilha um problema?

Nico ponderou sobre a pergunta.

– É... Talvez...

Nesse momento, eles foram interrompidos por Thalia Grace, que entrou trazendo uma caixa de pizza.

– O jantar chegou – ela disse.

– Ah, que bom – disse Will. – Nico aqui tem uma onda de apetite para aproveitar.

Vendo o jeito como Will falava agora normalmente com Thalia e lhes passava latas de coca-cola, como se tudo estivesse perfeitamente bem, Nico pôde entender por que era difícil suspeitar que ele tivesse qualquer problema na vida. Era preciso prestar muita atenção para conseguir captar a tristeza bem lá no fundo de seus olhos.

– Você vai trabalhar hoje? – Will perguntava a Thalia.

Ela assentiu com a boca cheia de pizza.

– Restaurante coreano – disse, depois de engolir.

– Você está na faculdade? – Nico meio que se arrependeu da própria curiosidade imediatamente, quando os olhos naturalmente elétricos de Thalia se fixaram nele, encarando-o como se ele fosse um verme. Ele não entendia o motivo daquela expressão, mas resolveu mostrar a ela que não era a única que sabia olhar feio.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

Os dois se encararam por uns segundos, antes que ela parecesse se dar por satisfeita e respondesse, simplesmente:

– É.

Então, para tentar quebrar o olhar dela, Nico comentou com Will a primeira coisa que lhe veio a cabeça:

– Jason e Leo disseram que iam sair com uma amiga sua...

– Piper McLean. Ela estudava comigo também... Quer dizer, no mesmo internato, mas ela está na mesma série de Jason e Leo. Vai estudar na Argo II, mas ainda não foi essa primeira semana. Ela acabou de se mudar com o pai. Eles estão numa casa grande meio afastada...

– McLean, tipo o ator? – Aquele não era um sobrenome incomum, mas vindo de uma conhecida de Will, depois de tudo que Nico descobrira naquele dia, comum não era mais o padrão.

– Ah, é... Foi meio que assim que nós nos tornamos amigos...

– Espera aí! Você está me dizendo que Tristan McLean está na cidade? Que ele se mudou para cá??

– Bom, parece que ele prometeu a Piper que ia procurar trabalhar o mínimo possível esse ano. Ano que vem ela vai para a faculdade, sabe... Então, ele comprou essa casa longe de Hollywood e disse que ia fazer o possível para que eles pudessem ser o máximo possível como pai e filha normais enquanto der, o que quer dizer até que algum paparazzi descubra, claro.

Nico só conseguia olha-lo, assombrado.

– Di Angelo, que cara é essa? Não me diga que você é daqueles que gostam de filmes como ‘O Rei de Esparta’ ou aquele outro... como é mesmo o nome?...

– ‘Bellamy’ – disse Nico, sem conseguir esconder a empolgação. – A história do capitão Juan Bellamy, o justiceiro dos mares...

Nico parou diante das testas franzidas de Will e Thalia.

– Eu gosto de histórias de piratas, está bem? – perguntou, cruzando os braços.

– Tá bem – respondeu Will, apertando os lábios.

Um pouco mais tarde, quando Will se despediu de Nico na porta do elevador no fim do corredor, o único comentário que fez sobre o que tinham compartilhado naquela tarde foi:

– Olha, eu gostaria que você não falasse para ninguém...

– Sobre Steve Calendar? – Nico o interrompeu.

– Não. Quer dizer, é, também. Mas eu estava me referindo ao meu pai e o pai de Piper.

– Ah, sim. Claro.

Nico ficou esperando que ele dissesse mais alguma coisa, mas o elevador chegou e Will só disse “Obrigado. Até amanhã”.

Em casa, Nico procurou por “O Garoto Russo” na internet. Era um show sobre um garoto russo (dã) fazendo intercâmbio na Califórnia, tendo que viver com uma host family desajustada e se apaixonando por sua host sister.

O tal Steve Callander tinha um rosto anguloso, cabelo loiro platinado e olhos castanhos. Nico abriu um vídeo em que ele tocava piano e cantava uma música lenta e melosa sem saber que sua host sister, de cabelos longos, negros e encaracolados estava escutando. Quando Steve começa a falar, é com um sotaque russo bem fake, depois de ter cantado num inglês totalmente americano.

Revirando os olhos para isso, Nico clicou numa entrevista intitulada ‘Steve Callander e Violet Dawson fazem a alegria dos fãs’. Era uma entrevista um tanto constrangedora em que os dois adolescentes falavam sobre como ia o namoro entre algumas risadinhas e bochechas coradas.

A entrevista era de uns três meses atrás. A cabeça de Nico podia estar inventando coisas, mas para ele, tudo em Steve parecia falso e calculado para a auto-promoção, desde seu sorriso até a maneira como ele colocava para trás o cabelo que encostava no alto na testa, sem razão alguma.

Ele teve certeza que as suspeitas de Will eram verdade e quando pausou o vídeo, congelando os dois atores olhando um para o outro, Nico se perguntou se os olhos azuis de Violet Dawson não faziam Steve se lembrar de Will e ao menos se sentir um pouco mal.

Era um pensamento estranho. Chega de internet.

–---------------------------------------------------------------

– Você não se inscreveu para nenhuma atividade extraclasse?

– Minha atividade extraclasse é ir para casa.

– Ha, tenho certeza que vai impressionar bastante as faculdades para as quais você se candidatar daqui a dois anos...

Nico deu de ombros e disse a Will:

– Não acredito que vai mesmo se meter nessa baboseira de clube de arco e flecha. Eu ouvi falar que eles não sabem acertar nem uma melancia a cinco metros... todos estão lá só porque são fãs de ‘Jogos Vorazes’ ou ‘O Senhor dos Anéis’...

– Bom, eu participava do clube do arco e flecha na minha outra escola, mas nunca fui o melhor, nem nada. Só quero continuar a praticar.

– Você acertou o Japão no mapa-múndi de olhos vendados, eu arriscaria dizer que é bom de mira.

– Acho que tenho boa concentração... Devo ser capaz de acertar uma melancia a cinco metros.

– Divirta-se, então – concluiu Nico, quando os dois se separaram no corredor.

Ele viu Will se afastar e sumir entre a multidão. Ao invés de dar meia volta e se dirigir para a saída, ele foi pelo mesmo caminho que Will tinha ido, só que do lado de fora, seguiu para o grande ginásio de natação.

Muitos gostavam de assistir aos treinos da equipe de natação. Até gente de fora se infiltrava na escola só para dar um olhada e tentar tirar fotos com os membros. Percy Jackson era o grande campeão, com medalhas internacionais e um rosto que já tinha aparecido bastante na televisão, mas toda a equipe era muito boa. Todos com boas classificações em competições estaduais e nacionais.

Nico se sentou no lugar mais tranquilo da arquibancada, encostado na parede, e começou a fingir que lia um livro que levava na bolsa. Ele lançava olhares para a grande piscina olímpica à sua frente de vez em quando. O lugar não era dos mais silenciosos com o som de pessoas conversando e o barulho constante de gente caindo na água. Seria um lugar péssimo para tentar ler um livro de verdade, Nico reconhecia isso.

– Ei – de repente, ele ouviu aquela voz bem perto e se sentiu paralisado. Olhos verdes luminosos o encavam dois degraus abaixo e agora estavam ao seu lado, onde Percy Jackson se sentou. Seu treinamento devia ter começado mais cedo e já acabado. Os cabelos ainda estavam molhados e ele usava uma bermuda e regata. – Você sempre vem aqui, não é? Gosta de esportes aquáticos?

– Eh... sim. E também é... um bom lugar para ler...

– Sério? Você acha? Com toda essa agitação?

– É que... eu sou o tipo de pessoa que tem facilidade de ler e entender as coisas com barulho, sabe. È como estudar ouvindo música alta. – Que diabos ele estava dizendo?

– Hum... – Percy franziu a testa, como se estivesse tentando entender aquilo. Depois perguntou, cauteloso: - E você... err... está bem?

– Sim. – Nico quis mudar de assunto: - Eu... soube que você vai participar de uma competição em Miami no fim de semana.

– É. É o fim da temporada. Graças! Na verdade, eu vou anunciar que não vou participar das competições ano que vem. É provável que não participe mais.

– O quê? Por quê? Todos estão esperando ver você nas olimpíadas ano que vem – Nico se mostrou mais chocado do que pretendia.

Percy assumiu um tom paciente, como se tivesse se preparado bem para todas as vezes que lhe perguntariam aquilo.

– Acho que isso tudo já foi longe demais. Isso era só pra ser uma atividade extraclasse qualquer. Eu era bom nadador, entrei para equipe de natação e só. Quem inventou que eu queria ser o novo Michael Phelps? Que droga... – Nico chegou a esboçar um sorriso, sabendo que era assim que os jornais costumavam se referir a Percy. - Pode parecer estranho, mas gosto de ser Percy Jackson.

– Não é estranho. Quer dizer... acho que entendo seu ponto de vista.

Percy sorriu para ele.

– Sabe, um patrocinador se ofereceu para pagar minha faculdade... Era um contrato muito bom, na verdade... agora você acha que eu estou sendo burro ou antipatriota?

Nico pensou por uns segundos. Apesar do tom brincalhão, parecia que Percy esperava uma resposta sincera.

– Não – Nico respondeu. – A não ser que você não tenha certeza se é isso que quer.

– Bom, eu tenho certeza. Quando recebi a proposta, só conseguia pensar que não ia agüentar mais quatro anos disso. Quero meus verões de volta. Talvez eu comece a praticar Vela... Definitivamente está na hora de aprender a surfar. Piscinas são ok, mas nada se compara a sentir a brisa do mar... Seria legal, não é? Aprender a velejar e um dia poder sair por aí, tipo meio sem rumo oceano afora...

Nico achava a ideia bem empolgante. Ele ia comentar isso, quando alguém chamou:

– Jackson, venha aqui! – era o treinador.

Percy se levantou e começou a descer até o homem, mas parou e virou para fazer mais uma pergunta a Nico:

– É verdade que você aceitou participar do experimento teatral do Valdez?

– Sim – Nico não precisava ter sido lembrado disso.

– Cara - Percy riu, - eu tinha certeza que era brincadeira dele. Estamos todos numa roubada! Então... até logo.

Ele se afastou e Nico sentiu que recebia olhares curiosos das outras pessoas na arquibancada. Pegou suas coisas e saiu dali.

Enquanto contornava a Academia Argo II pelo gramado, Nico, ainda pensando na conversa que tinha tido com Percy Jackson, viu o Sr. Brunner em sua cadeira de rodas acompanhado por um visitante. Um homem comum de meia-idade, de óculos quadrados, camisa e calça sociais, que não teria feito Nico olhar duas vezes se não fosse pelo garotinho que segurava sua mão como se os dois estivessem dando um passeio. Uma visão perfeitamente explicável, não fosse o fato de o garoto estar morto.

Nico parou por um momento. Aquele não era um espírito que lhe passava qualquer energia muito negativa, como o de Amanda logo depois de sua morte. Só o que Nico conseguia sentir era uma certa tristeza e anseio vindo do menininho. Então, ele só teve que respirar fundo uma ou duas vezes para se acalmar e seguir adiante, como se nada estivesse errado.

O Sr. Brunner falava e apontava para o campo de futebol logo ali a alguns metros. Mais um pouco e Nico teria passado por eles. Infelizmente, como as coisas não podiam ser simples na sua vida, justo quando Nico estava no melhor ângulo da visão do homem, este virou o rosto e o enxergou.

Nico desviou o olhar e continuou a andar. Depois, sentindo que ainda era observado e achando que estava imaginando coisas, resolveu olhar para trás para verificar. Encontrou novamente o olhar do homem, com a cabeça virada para acompanhá-lo. Parecia ter visto algo interessante nele. O garotinho, pálido e translucido, fazia o mesmo, ainda segurando a mão do homem. Nico engoliu em seco e voltou a olhar em frente. Não é nada demais, ele dizia a si mesmo, mas apressou o passo, até começar a correr.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!