Monotonia

Por Deusa Nariko

XLIII

Sakura tinha terminado de abrir a última caixa, desembrulhando as últimas louças finas e guardando-as no armário na cozinha, enquanto Sasuke ficava com Sarada na sala.

Pouco mais de uma semana depois a família Uchiha finalmente havia se mudado para sua nova residência. Era extraordinário para Sakura voltar à rotina depois de quase um ano afastada da vila. Ela não pensava ainda em voltar a trabalhar no hospital, Sarada era pequena demais e dependia muito dela, mas havia um consenso de que o cargo de chefia voltaria a ser dela assim que sentisse que fosse o momento certo.

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Ela sorriu consigo mesma quando pensou em todos os rostos amigos que reencontrou naquela última semana. Para a sua surpresa, Ino, Temari e até mesmo Karui, a kunoichi de Kumo, estavam grávidas. E a novidade que Naruto prometera no dia em que eles cruzaram os portões da vila era que ele e Hinata também seriam pais.

Pensar em Sarada crescendo e frequentando a Academia junto de todas aquelas crianças a fazia se sentir animada. Sua filha teria muitos amigos, e todas aquelas jovens folhinhas seriam o futuro da vila, todos herdariam a vontade de fogo.

Suspirou, apoiando as mãos nos quadris para olhar para tudo, e assentiu satisfeita. Era mesmo uma bela casa. Voltou à sala e encontrou Sasuke no sofá com a filha. Sarada estava deitada de barriga para cima sobre uma manta, os olhos escuros como os do pai seguindo cada movimento que ele fazia, balançando pernas e bracinhos de forma descoordenada, abrindo e fechando os dedinhos para tentar agarrar qualquer coisa.

Ela soltou uma meia risada pelo nariz quando se lembrou de como Sasuke dominara a técnica de trocar fraldas, tão típico dele. Olhou o relógio na parede e percebeu que ainda tinha um tempinho até a próxima mamada de Sarada. Mesmo assim, se acomodou ao lado da filha no sofá, recostando-se e acariciando os tufos de cabelo preto que lhe cobriam toda a cabeça.

Sasuke a olhou de soslaio e finalmente cedeu aos resmungos da filha, oferecendo seu dedo para que o agarrasse, o que ela fez prontamente. Sarada era um bebê esperto e seu período de adaptação ao novo ambiente estava sendo bastante tranquilo tanto para Sasuke quanto para Sakura.

— Está tudo finalmente em seu devido lugar — ela comentou aliviada.

O marido assentiu, lacônico, e Sakura sorriu em resposta.

— Podemos convidar Naruto e Hinata para jantar agora. — Lembrou-se de que precisava retribuir o jantar agradável que tiveram no lar dos Uzumaki na semana passada.

O olhar de Sasuke se perdeu no vazio por um tempo. Apenas os resmungos ocasionais de Sarada quebravam aquele silêncio confortável. Sakura contou mais alguns segundos antes que o marido voltasse a fitá-la.

— Andei conversando com o Kakashi.

— Sobre o quê? — perguntou, deitando a face no encosto do sofá.

— Muitas... coisas — Sasuke suspirou, parecia-lhe perdido em pensamentos. — Uma delas foi a respeito da minha situação com a vila.

— E o que vocês decidiram? — Agora ela estava um pouco mais apreensiva.

— Nada, por enquanto. Mas quando Naruto assumir o cargo, eu quero poder apoiá-lo apropriadamente e ajudá-lo no que eu puder.

Sakura assentiu, ciente de que quando o momento chegasse também deveria apoiar Sasuke como sua esposa.

Sarada soltou o dedo do pai, parecendo muito mais interessada agora em outra coisa, e Sasuke estendeu a mão para a esposa sem pensar. Ela a pegou com a sua própria, dando-lhe um aperto firme que dispensava o uso de palavras. Eles eram uma família agora, enfrentariam o que tivesse de vier como uma família. Por eles e por Sarada.

Dois dias depois, Sakura e Sasuke receberam a família Uzumaki para um jantar. Kakashi também compareceu e, assim, todos desfrutaram de algumas horas agradáveis. Mesmo que o ex-sensei tivesse sido o primeiro a ir embora, alegando que precisava retornar ao trabalho ainda que já fosse um pouco tarde.

Hinata a ajudou a cuidar de toda a louça suja. Sakura tocou sua barriga para sentir o bebê que se mexia e parecia haver um consenso entre ambas de que o menino, que se chamaria Boruto, poderia herdar muito da personalidade do pai — o que levou as duas a rirem no fim.

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Uma hora depois, eles partiram, caminhando lado a lado com Naruto colocando um braço ao redor dos ombros da esposa. Sakura se acomodou no sofá para amamentar a filha enquanto Sasuke estava no banho e logo em seguida a colocou para dormir no berço montado no quarto do casal.

Depois que Sasuke saiu, foi a sua vez. A água quente a ajudou a relaxar, mas também a deixou sonolenta. Sakura vestiu os pijamas confortáveis e suspirou quando apanhou com os olhos seu reflexo no espelho do quarto. Balançou a cabeça, pegou a escova em cima da cômoda e penteou os cabelos cujas pontas estavam úmidas devido ao banho.

Sarada já ressonava no berço quando se juntou a Sasuke, na cama. Aconchegou-se ao calor do corpo dele e ele envolveu sua cintura com o braço. Mesmo que não pudesse tocá-lo da forma como ansiava — pois seu corpo ainda se recuperava do parto —, contentava-se em abraçá-lo e em senti-lo por perto.

Então afundou o rosto na junção do pescoço e do ombro, exposto pela gola da blusa que ele vestia, e sentiu seu cheiro, relaxando todo o corpo e fechando os olhos.

Sonolenta, lembrou-se da conversa que tiveram no dia em que se mudaram para aquela casa. Sakura o tinha surpreendido de pé na varanda, com a porta de vidro escancarada e o olhar perdido na vista do quintal ou talvez no céu azul e tranquilo.

— Anata? — ela o tinha chamado, mas ele mal havia se mexido.

Quando o circundou para fitar seu rosto descobriu que seu semblante estava sereno e os olhos, enevoados. Uma brisa gentil soprava a grama que ainda precisava ser aparada no quintal. Sakura colocou a caixa pesada que trazia nos braços no chão e se juntou a ele. Sarada estava dormindo no colo da avó no outro cômodo, avó esta que não se cansava de mimá-la.

Ela estendeu a mão para afagar o braço dele e acabou por arrancá-lo daquele estranho — e calmo — estado de transe.

— Aconteceu alguma coisa?

Sasuke ergueu os olhos para a vista agradável outra vez. Sua boca se ergueu um pouquinho numa sugestão de sorriso. A brisa suave afastava o cabelo escuros dos seus olhos.

— Eu só... gosto daqui. — Foram as únicas palavras que ele disse, mas ela entendeu tudo o que ele pretendia dizer com aquilo.

Sakura também gostava. A casa era espaçosa, sim, e ela ainda tinha uma sensação estranha porém agradável a cada vez que via o símbolo do clã Uchiha estampado em algum objeto de decoração ou bordados nas próprias roupas e nas roupas de Sarada.

Mas aquilo tinha muito mais a ver com a noção de um lar. Um refúgio, um lugar de tranquilidade, aconchego e descanso. Sasuke tinha sido privado disso por anos e mesmo depois do seu retorno sentiu necessidade de estender aquela ausência para pagar sua penitência e vagar pelo mundo.

Quando voltou, mesmo que por um curto tempo, para levá-la consigo, ele ainda não tinha se permitido construir algo tão sólido quanto um novo lar. Isso só havia mudado recentemente e, talvez, o peso dessa constatação tivesse finalmente atingido o Uchiha.

Os olhos negros de Sasuke procuraram pelo rosto de Sakura, sondando-a.

— Sakura, mesmo que eu tenha que continuar essa minha busca...

As palavras não foram ditas, mas ela compreendeu: ele agora sempre teria um lugar para voltar, um lar que o esperaria e que o receberia de braços abertos não importava o quão longe seus pés o levassem ou o tempo em que precisasse se manter longe. Sakura e Sarada estariam ali por ele, sempre. Ela se certificaria de fazer a filha entender, prometeu por ele e por ela.

No fim, deitou a cabeça no ombro dele enquanto as nuvens resvalavam pelo céu azul e aquela brisa gentil jamais cessava de soprar.

Sakura voltou ao presente e sorriu contra o ombro de Sasuke. A mão dele descansou na sua cintura, os dedos apertaram-na de leve.

— O que foi? — ele perguntou com a voz rouca, meio sonolento.

Sakura apertou os braços ao redor do corpo quente do marido. A expressão sonhadora no seu rosto era inabalável.

— Nada. Só gosto daqui também. — Foi o que murmurou e ele entendeu, acariciando a pele da sua cintura.

Algumas pessoas, especialmente os casais, tendiam a temer a rotina que passava a ditar a vida depois de um tempo e depois que a novidade se esvaía. Sasuke e Sakura eram uma exceção a essa regra: depois do que passaram e sofreram, finalmente conseguiram vencer tudo o que os havia tentado separar em todos aqueles anos, sendo o último e persistente obstáculo a distância.

Ele que sofreu tanto, e ela que sofreu pela dor e pela escuridão que o consumia, entendiam que havia uma grandeza postergada na monotonia, uma tranquilidade que era ansiada mesmo nos pequenos gestos e nas pequenas tarefas que regiam seus dia a dia.

Como não amariam aquela paz (mesmo que fosse efêmera) quando já haviam lutado por tempo demais e quando ela era tudo o que desejavam nos seus âmagos? Era por esse motivo que lutariam com unhas e dentes para preservá-la, para que a filha preciosa que agora dormia pacificamente no berço naquele mesmo quarto jamais conhecesse a dor e as trevas do mundo como eles já conheceram.

Não tinham dúvida de que, algum dia, teriam de voltar ao campo de batalha. Mas enquanto durasse, aproveitariam aquela paz e tranquilidade. Não importavam os próximos obstáculos, os percalços futuros, permaneceriam unidos como uma família.

O amor os conectaria, aqueles sentimentos os conectariam. Eles eram Sasuke e Sakura, afinal, e já haviam triunfado sobre coisas piores.

Fim.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.