Terceirão
A gente transou
Depois de ouvir aquela bomba, precisei ir até a pia para jogar água fria no rosto.
Camila terminou de por os rins para fora e fez o mesmo.
– Por favor, não conte para ninguém. Eu ainda não sei o que vou fazer.
– Como assim não sabe? – disse surpresa.
Pra mim era óbvio, ela teria um filho e não sabia quem era pai, portanto teria que dizer a verdade, ajudar libertar os caras que estão presos e depois fazer um teste de DNA.
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Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!– Eu ainda não sei se vou ter o filho Ana.
– Camila, você sabe que o aborto no Brasil é ilegal não é?
– Não em caso de estupro.
– Você pretende continuar com essa mentira?
– Não posso por tudo a perder... – ela disse enquanto se olhava no espelho, como quem encara a si próprio antes de tomar uma decisão importante.
– Camila, eu sei que não sou nada sua, a gente mal se falou neste tempo todo que estudamos juntas, mas deixa eu te dar um conselho: Se continuar com essas ideias você vai arruinar quatro vidas em uma cacetada só... Não vale a pena.
– Quem decide se vale ou não a pena sou eu Ana. Agradeço a sua preocupação, mas eu sei me virar sozinha. – ela disse me olhando com uma frieza que eu nunca pensei que pudesse vir dela.
– Vou voltar pra sala. – virei as costas e saí. Eu sabia que nada que eu dissesse iria mudar o que aconteceu e nem mesmo o que ainda estava para acontecer.
Durante todas as aulas fiquei com aquilo martelando na cabeça.
A partir do momento que eu sei de algo ruim, que vai prejudicar outras pessoas e não faço nada para impedir, me torno cúmplice.
E era assim que me sentia.
Cumplice da Camila.
Em palavras diretas eu estava ajudando a condenar três homens inocentes e o pior... Uma criança.
– Isso não é da minha conta – repeti pra mim mesma por várias vezes durante aquela manhã.
Finalmente o sinal da ultima aula tocou.
Estava louca para chegar em casa, comer algo e me isolar no quarto, ouvindo música alta e comendo chocolate.
É o que eu faço quando estou na bad ou de TPM.
– Ana, onde você vai? – Felipe correu atrás de mim quando viu que eu me apressei em direção a saída da escola.
– Embora. Pra onde eu iria?
– Para a reunião. Na biblioteca. Lembra? O grupo de sete.
– Mas que droga! Puta merda, não to afim disso. – quase arranquei meus cabelos.
– Conselho de amigo – Fê colocou seus braços sobre meus ombros – Se não quiser arrumar mais rolo com o diretor é melhor ir nessa bagaça.
– Vamos. – disse relutante e caminhando a passos lentos.
******
Nunca vi pessoas na biblioteca daquela escola, até porque eu não frequentava muito. Em pleno horário de almoço a situação não poderia ser diferente.
Estava parecendo um deserto. Nem as moscas estavam por lá.
A não ser...
Pelas cinco pessoas sentadas na mesa no centro do recinto, visivelmente entediadas.
Olhávamos um para a cara do outro.
Faltavam duas pessoas.
Camila, que foi embora por causa dos enjoos.
E o principal.
O queridinho... Dener.
Então Aldo quebrou o silencio.
– Fico feliz que vocês tenham vindo. Cheguei a pensar que...
– A gente não viria? – completou Molly. – Pensou certo querido, posso afirmar que não estamos aqui por causa das suas mensagens irritantes no Whats, mas sim por causa da intimação que o Dener nos fez pelos corredores.
Aldo percorreu a mesa olhando para cada um presente. Estava procurando alguém que discordasse da Molly.
Infelizmente ela estava certa.
– Pensei que iríamos discutir o nosso trabalho. – Aldo disse com certo desapontamento.
– Cara, com certeza o bostinha do Dener vai querer falar sobre a organização da festa. – Roger interrompeu.
– Quanto você quer? – Molly jogou a pergunta direta para Aldo.
– Quanto quero pra que?
– Não se faça de besta. Quando você quer pra fazer esse trabalho pra mim? Pago o que você pedir. Só não me peça favores sexuais... Não tenho paciência com virgens.
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Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!O rosto de Aldo ficou vermelho.
– Como você é escrota Maria. Acha que tudo pode ser comprado. – rebati impaciente.
– Mal amada, eu estava falando com o Aldo. A-L-D-O. Pelo que eu saiba esse não é o seu nome.
A porta da biblioteca se abriu.
Era o Dener.
– Apareceu a margarida. – Felipe soltou em tom de deboche.
– Desculpem o atraso. Tive que fazer umas coisas...
– Tipo meter a língua na boca daquela gostosa do segundo ano? – Roger ironizou.
Dener pareceu desconcertado.
Logo desviou o assunto.
– Precisamos de ideias para a festa. Por isso pedi para fazermos essa reunião.
– E quanto ao trabalho? – Aldo logo protestou.
– Aff, muda o disco! – Molly virou os olhos.
– O trabalho é para o fim do semestre e a festa é para daqui dois meses. – Dener respondeu tentando ser paciente.
– Claro, e a festa é mais conveniente pra você. – Felipe exclamou.
Eu cutuquei ele para que ficasse quieto.
– Pense como quiser. Alguém tem alguma ideia?
Todos ficaram em silencio por alguns segundos.
Eu estava pouco me lixando, então nem fiz força para pensar em algo referente a essa festa. Só conseguia pensar no teria para comer quando chegasse em casa.
– Vamos fazer algo no estilo “Projeto X”. – Roger finalmente quebrou o silencio.
– “Projeto X”? – Aldo perguntou como se fosse à primeira coisa no mundo a qual ele não sabia do que se tratava.
– É beberrão. Nunca viu o filme? Uma festa fora de cotrole. É irado. Nunca tivemos algo parecido por aqui. – Roger disse com certo tom de entusiasmo.
– O Roger, acho que você está se esquecendo de um detalhe importante: essa festa vai ser realizada aqui na escola. Se bobear nem bebida alcoólica vai poderá ter, quando mais um anão de porcelana cheio de êxtase. – Felipe opinou.
– Essa festa vai ser uma droga! – joguei na roda sem rodeios.
– Tenho que concordar com a Ana – Roger me olhou diferente. – Ninguém vai pagar pra entrar em uma festa que só tem suco de laranja e bolo.
– É bonitão, acho que a reforma do seu campo não vai rolar. – Molly completou.
Dener pareceu preocupado com o que foi dito.
– Quer uma dica parça. Escuta só: A Molly entende de festas melhor do que ninguém, eu sei como deixar todo mundo doidão e os outros podem nos ajudar, você só precisa tirar uma pessoa dessa jogada... O diretor. Com ele fora esta festa bomba! O seu campo é reformado o campeonato acontece e todos nós saímos felizes nessa história. – Roger disse.
– Não é tão simples assim... O Diretor cedeu um pequeno caixa para usarmos, ele disse que era um investimento e que dinheiro faz dinheiro. – Todos arregalaram os olhos, surpresos. Dener continuou... – Só que ele vai querer todas as notas fiscais, vai inspecionar as pessoas na entrada, vai por seguranças e... Vai vir nesta festa. Além disso, esta escola é propriedade privada, não podemos transformar em uma casa noturna ou em uma zona.
– Por isso que eu disse que você precisa tirar o diretor da jogada. Neutraliza ele. É o nosso ultimo ano, ficaríamos conhecidos com a turma que badalou esta escola. – Roger completou voltando a se entusiasmar.
– Estou começando a gostar disso. O diretor queria nos castigar não é? Vamos transformar isso em algo épico. – Molly deu um sorriso malicioso.
– Opa, pera aí. Vocês estão se ouvindo? – disse incrédula com aquilo tudo.
– Deixa de ser chata Ana! – Molly disse.
– Eu chata? Vocês viram no que deu apenas o fato de ter ido para uma festa, imagina se fazermos algo pior aqui dentro. Não quero ser expulsa no ultimo ano. Eu preciso dessa bolsa.
– Eu também não concordo com isso. – Protestou Aldo.
Esperei que Felipe também protestasse, mas ele nada disse.
– E você Felipe? Concorda com isso? – perguntei impaciente.
– Eu... É... Ana, eu gosto do fato de entrar pra história.
Só pode ser o apocalipse.
– Felipe. É só uma festa idiota, não tem nada de histórico nisso. O máximo que pode acontecer é você ser expulso ou coisa pior.
– Calma! Parou! Estamos em uma democracia então acho justo fazer uma votação. – Roger sugeriu certo de qual seria o resultado.
– Que palhaçada... – suspirei.
– Quem é a favor de uma festa épica que nenhuma escola jamais realizou antes?
Fiquei apenas observando um por um levantar a mão. Primeiro o Roger, defensor das idiotices, depois Molly, o traidor do Felipe e por ultimo o Dener...
– Que?! Pensei que você usaria o bom senso. – disse diretamente para ele.
– Eu preciso que esse campeonato aconteça. E também será algo que vamos manter sob controle. Só precisamos de planejamento.
– Então é isso. Com apenas dois votos contra a maioria vence. Mesmo que a Camila votasse contra ainda assim venceríamos. – Roger disse se sentido vitorioso.
– Aldo e eu não vamos fazer parte disso. Vem Aldo, vamos para a sala do diretor ter uma conversa com ele. – Antes que eu pudesse me levantar Dener segurou meu braço com um aperto forte.
– Você não vai. – Ele olhou fixo em meus olhos, tentando me intimidar.
– Eu não tenho medo de você. – rebati.
– Digo que você mandou todo mundo se foder e disse que não quer fazer porra nenhuma de trabalho e o que o diretor dessa escola é um merda.
– Quanta maturidade – debochei. Ele ainda segurava em meu braço.
– Em quem você acha que ele vai acreditar? No atleta de ouro dessa escola, aluno exemplar, com um futuro brilhante ou em você. Pera ai, quem é você mesmo?
– Me solta seu otário.
Saí correndo da biblioteca.
Só queria encontrar a saída e voltar pra minha casa.
******
Estava encapsulada em meu edredom quando ouvi a campainha tocar no andar de baixo.
– Ana é o Felipe. Vou mandar ele subir. – minha mãe gritou.
Continuei na mesma posição fetal assistindo “American Horror History”.
Não demorou muito e ele abriu a porta do meu quarto.
– Fico impressionado com a modernidade da sua mãe, ela sempre me deixa subir aqui e ficar sozinho com você no seu quarto. – Ele foi logo dizendo e sentando na minha cama.
– Claro, ela pensa que você é gay.
– O que?! – ele se espantou.
– Nada não. O que você quer?
– Vim ver se você está bem. Mas pelo jeito... Cara, essa série é muito louca, curti apenas a primeira e segunda temporada.
– Eu to bem Felipe – ignorei o comentário sobre a série, pois era a minha favorita e já tínhamos discutido sobre isso outro dia.
– Quer saber Ana, você ainda tem coragem de dizer que eu tenho inveja daquele otário. O cara é um mala. Uma hora está lá, pagando de bom moço, educado, cheio de sorrisos, depois de repente vem com patadas.
– Esse é o preço de reprimir alguns sentimentos, a pessoa acaba perdendo o equilíbrio uma hora ou outra.
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Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!– Como assim?
– Ah esquece.
O assunto morreu e ficamos apenas olhando para a TV.
Percebi que ele começou a ficar impaciente.
Ele ficava assim quando queria dizer alguma coisa. Felipe não era do tipo que saia falando sobre sua vida, ele esperava alguém perguntar.
E esse alguém quase sempre era eu.
– Você quer falar alguma coisa? – eu finalmente disse.
Ele se levantou e foi até a janela.
– Lembra que na festa a Camila me agarrou e a gente se beijou...
– Lembro e daí?
– E daí que você sumiu, eu fiquei te procurando... E...
Ele começou a enrolar.
– Pode falar Felipe.
– Então... Eu acabei trombando com ela de novo enquanto te procurava. Ela me arrostou para o banheiro, trancou a porta... E... A gente transou.
“A gente transou... A gente transou...”
Sabe aquele eco no fundo da mente?
Essas palavras ficaram ecoando.
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