Loucamente Apaixonada

Quer Uma Dica?


—- Me desculpe por você ter descoberto tudo dessa maneira -- disse papai. -- Eu só queria ter certeza antes de te contar.

Samuel disse que tinha pedido a papai um tempo para que eu me acalmasse da briga que tive com mamãe e para me explicar tudo, mas que eu ligaria para ele assim que terminássemos a nossa conversa. E foi o que eu fiz. Minutos depois de Sammy ter me contado sobre a separação eminente de meus pais e me entregado o seu passado, passamos da fase de silêncio pacífico para a de "essa conversa aconteceu, mas vida que segue". Não completamente, mas deixamos toda a tristeza de lado e voltamos a normalidade parcial. Éramos duas almas quebradas, cada uma de seu modo, ele até mais do que eu, mas preferíamos deixar tudo para trás, mesmo que ainda estivesse tudo lá.

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—- Eu já disse, pai, não precisa se desculpar. A notícia só me pegou de surpresa. Eu tenho que admitir que ainda é um pouco difícil de acreditar, mas está tudo o.k.

—- Helen e eu sempre vivemos por aparências -- admitiu. -- Entendo porque se sente confusa.

—- Não só pelas aparências, mas porque tudo pareceu muito repentino.

—- Mas não foi -- ele parecia cansado, mental e emocionalmente falando. -- E hoje porei um ponto final nisso de uma vez por todas. Tenho que admitir que não estou minimamente ansioso para enfrentar sua mãe. Liguei para ela, tentei conversar, mas é desnecessário dizer que Helen ficou histérica. As oscilações de humor da sua mãe me dão nos nervos.

Acredite, pai, eu entendo.

—- O que me lembra: -- ele acrescentou. -- Samuel insistiu para que você ficasse na casa dos avós dele como hóspede, mas eu passo pagar um hotel para você. Seria bem mais confortável e você daria um pouco de paz ao seu pobre pai.

Não pude evitar, acabei rindo e Sammy que estava sentado ma poltrona ao lado, zapeando os canais de televisão, me olhou com um semblante curioso.

—- Paz, pai? O que anda te atormentando? -- brinquei.

—- Sinto que estou jogando minha filha para os lobos. Aliás, um lobo só.

—- Fala como se eu fosse uma freira e Samuel a encarnação de todos os pecados, a tentação em pessoa -- se bem que ele meio que é...—- Ele não vai me devorar, papai, fique tranquilo.

Depois que eu disse isso Sammy sorriu torto, arqueando uma sobrancelha para mim e papai resmungou do outro lado da linha como se soubesse o que ele fez.

—- Isso certamente não me passa confiança alguma -- ele suspirou. -- Eu realmente não sirvo para ter esse tipo de conversa com você.

—- Eu sei o que é melhor para mim, papai -- sorri. -- Agora é melhor eu deixá-lo trabalhar em paz. Tchauzinho.

—- Filha, você...

—- Boa sorte, papai. Eu não queria estar na sua pele -- falei e encerrei a ligação. -- Ele ainda não confia totalmente em você -- disse a Samuel.

Ele deu de ombros.

—- Não o culpo, ele é homem. Aliás, eu também desconfiaria de mim se estivesse no lugar dele, principalmente depois de eu ter me recusado a fazer qualquer promessa sobre... -- ele parou e franziu o cenho um pouquinho, depois sorriu. -- Ei, você quer uma dica sobre como descifrar as encriptações?

—- Você mudou de assunto de uma forma bem bizarra, Sammy -- ele só ficou me encarando. -- Primeiro, eu nem sei do que você está falando e segundo, o que você se recusou a prometer ao meu pai?

—- Com encriptações, eu quero dizer as mensagens dos cartões, Little Witch.

Quase pulei no sofá por animação. Eu finalmente ia descobrir o conteúdo daquelas mensagens!

—- E...? -- incentivei para que ele respondesse a outra pergunta.

—- Não vou te dizer de jeito nenhum sobre o que mais seu pai e eu conversamos. Não agora.

Bufei, cruzando os braços de frente ao peito, zangada. Ele apenas tinha uma leve expressão de deboche e divertimento.

—- Não importa o quanto tenhamos conversado hoje, você ainda tem muitas coisas para me explicar.

—- Sobre o quê? -- ergueu uma sobrancelha.

Me levantei e apontei um dedo para ele, estreitando os olhos.

—- Tudo. T-U-D-O. Principamente sobre nós, isso está entrando em um nível altíssimo de confusão e estranheza.

—- Acredite, se você não fosse tão complicada, isso já teria sido resolvido faz tempo -- afirmou com cuidado.

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Sentei no sofá novamente, sabendo muito bem que ele tinha um ponto ali.

—- Ei, porque você não me diz logo o que aquelas mensagens significam? -- indaguei.

—- E perder todo o próposito inicial? Nem pensar. O espetáculo tem que continuar até o final.

—- Sabe, eu posso ser complicada, mas você é irritantemente impossível. E então? Qual é a dica?

—- Você só vai ganhá-la quando chegar mais tarde. Enquanto estiver fazendo compras com a Rebecca eu vou dar uma passada lá na empresa para finalizar um projeto de publicidade no qual estou trabalhando, então antes disso vou deixar a dica no seu quarto. Você vai precisar de um tempo para pensar sobre, quando descobrir o que encriptações significam.

—- Sobre o quê? -- sinceramente, eu ainda tinha esperanças de que ele revelasse um pouquinho que fosse daquele mistério.

—- Você verá.

Com um mau humor dos infernos, fui pegando cada almofada que via pela frente e atirando nele, que apenas ria, zombando da minha péssima pontaria.

***

—- Eu adoro o seu cabelo. E as suas roupas. E adorei seus sapatos. Eu...

—- A síndrome da fã empolgada que não sabe calar a boca -- disse Mike e Rebecca que tinha parado de falar o fuzilou com os olhos, depois olhou preocupada para mim, como se estivesse com medo de ter me assustado por estar falando sem parar desde o segundo que me viu, a mais ou menos uns cinco minutos.

—- Mike, deixe a sua irmã -- defendi a garota. -- Eu gosto de elogios, o.k? Principalmente hoje, o meu dia não começou bem.

—- Você não gostou quando eu te chamei de gracinha -- me contradisse ele.

—- Isso porque você só estava tirando uma com a minha cara -- voltei minha atenção para Rebecca, tentando parecer totalmente educada. -- E então, empolgada para o shopping?

Ela assentiu com a cabeça, rápido, mas não disse nada.

—- É um pouco incrível e assustador o modo como essa garota parece uma versão mais nova da Ariela que se veste como você -- comentou Samuel.

Rebecca não se parecia em quase nada com Mike, por ser loira e de pele mais clara que a dele, mas dava para ver uma pequena semelhança aqui e ali. Mas o que Sammy falou era uma grande verdade, ela realmente parecia um pouco com a Ariela.

—- Você não precisa falar como se isso fosse algo ruim, Sammy, a Ari não é uma cobra como pensávamos -- argumentei.

Ele me olhou assustado de uma forma teatral.

—- Agora você a chama de "Ari"? O que fizeram com você enquanto estava em Londres?

—- Apagaram parte das minhas lembranças e as substituíram por novas, acho. Brincadeirinha, depois eu te conto tudo que aconteceu enquanto estávamos separados pelo Atlântico, mas agora o shopping nos espera -- gesticulei entre mim e a irmã de Mike.

—- Infelizmente é o Mike que vai nos levar -- Rebecca disse desanimada. -- Minha mãe insistiu. Disse que eu preciso ser controlada.

—- Se ele nos irritar, nós acabamos com ele -- pisquei para ela sorrindo. -- Tchau, Sammy.

Fiquei na ponta dos pés e beijei o rosto dele, então fui até Rebecca e enlaçei nossos braços.

—- Que se dê início a tarde das garotas! -- declarei.

***

Uma hora e meia depois, percebi que não era apenas Rebecca que precisava de controle, mas eu também, embora o irmão dela não parecesse ter o mínimo talento em mantê-lo. Já estávamos cheias de sacolas, e mais atrás, um Mike muito mal-humorado nos seguia segurando várias outras.

—- Melhor dia da história! -- ela disse animada, erguendo as sacolas para o alto.

—- Preciso lembrar nossa mãe de pôr um limite no seu cartão -- ele disse a ela.

—- Não ouse -- ela replicou.

Então eu tive uma ideia.

—- Mike, você poderia tirar uma foto nossa? -- perguntei.

—- Outra?

—- Com o meu celular. Quero mandar para minha prima Gabriely.

Ela está tão irritada comigo por não ter falado com ela ainda, que vai ficar mais furiosa do que já está. Até o pensamento me fez rir.

Mike revirou os olhos e pegou meu celular. Eu e Rebecca nos juntamos de frente a alguns manequins e ele tirou a foto.

Pouco depois de eu tê-la mandado, Gabriely ligou. Dessa vez eu atendi, esperando os gritos.

—- EU NÃO ACREDITO! -- ela começou. -- EU ESTAVA PREOCUPADA COM VOCÊ, SABIA?! E VOCÊ ESTÁ APENAS SE DIVERTINDO NO SHOPPING! INACREDITÁVEL!

—- Gabe -- cantarolei. -- eu comprei um monte de presentes para você.

Ela ficou em silêncio por uns dois segundos, então pigarreou.

—- Acho bom mesmo. Você está em dívida comigo, mocinha -- ela disse mais calma. -- E então, o que aconteceu para você nem se dignar a responder minhas mensagens?

—- Coisas boas -- comecei. -- Coisas confusas. Coisas ruins. Coisas tristes. Francamente? Estou ficando maluca desde o instante que pus meus pés em Nova Iorque.

—- E esse seria um ótimo motivo para você voltar -- falou preocupada.

—- Não posso, há coisas a serem resolvidas por aqui ainda. E o mais importante: o Sammy está aqui.

—- Decidiu admitir a si mesma que está louquinha por ele?

—- Quem sou eu para negar algo óbvio? -- afastei o celular quando ela começou a gritar um "eu sabia!" repetidamente, a plenos pulmões. Rebecca cutucou meu braço e apontou para uma vitrine a nossa esquerda. Olhei para ela falando um "Ai, meu Deus!" sem som e fiz um sinal com a mão pedindo para ela esperar um pouco. -- Agora que o seu humor está melhor, eu vou desligar, Gabe. Rebecca acabou de me apresentar um pedaço do paraíso em forma de sapatos.

—- Rebecca? -- perguntou.

—- A garota da foto, minha nova melhor amiga de compras em Nova Iorque. Agora, se não se importa, aquela vitrine está me chamando.

—- Você está me trocando!

—- Garanto que vai adorar os presentes que eu vou mandar, priminha. Além disso, mais tarde eu tenho que conversar com você, não se preocupe, vou te atualizar de tudo. Prometo.

—- Certo, mas se você não cumprir essa promessa eu vou te enfernizar pelo resto da vida. Até mais tarde.

Ela desligou e eu empurrei mais algumas das minhas sacolas para Mike. Antes de entrar com Rebecca como dois furacões categoria cinco na loja, o ouvi resmungar um "eu mereço".

***

—- Acho que eu exagerei um pouco -- falei envergonhada para Amélia, enquanto ela me guiava para o quarto de hóspedes que havia mandado prepararem para mim. Ela e um dos empregados da casa, Roby, me ajudavam a levar tudo que eu tinha comprado para o andar de cima.

Eu sempre compro coisas demais baseada no nível do meu estresse, e por acaso, hoje ele estava em nível máster.

Ela sorriu com gentileza para mim.

—- Não tem problema, querida. Você deveria ver a mim e a Charlote em um shopping. Oliver e Olavo ficam enlouquecidos! Aparentemente minha nora e eu temos o problema de querer presentear a família inteira a cada vez que vamos fazer compras.

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—- Deve ser divertido sair com vocês -- falei.

—- Nós poderíamos fazer isso da próxima vez quando estivermos todas juntas -- ela disse.

Quando chegamos ao quarto, ela e Roby deixaram as sacolas lá e me deixaram sozinha para descansar. Mas não era bem isso que eu estava planejando fazer.

Com o olhar atento, girei no centro do quarto, alerta a qualquer coisa. Samuel disse que deixaria a dica para mim. Por falar nisso, ele não tinha chagado ainda. Com certeza estava levando a sério a parte de me dar um tempo para pensar.

Quando achei o que procurava, quase não pude acreditar. Sobre o criado-mudo ele tinha deixado um bilhete escrito a mão e um livro. Fortaleza Digital. Ele só podia estar brincando comigo.

O bilhete era direto e confuso:

Eu já te entreguei parte da minha alma, não custa arriscar agora.

Pronta para o fim do espetáculo?

Você encontrará suas respostas nos últimos parágrafos do capítulo três.

Mas, não siga, tudo a risca, Little Witch. Seja do contra ao menos nesse momento.

E por favor, pense com cuidado.

Sammy.

Sentando na cama abri o livro. A página correta estava marcada por replícas dos cartões que ele tinha me dado antes e que, por acaso eu carregava na bolsa. Dois de cor creme, um vermelho. A possibilidade de descobrir o que aquelas letras douradas significavam estava me deixando nervosa.

Mas, ainda assim, e exatamente por isso, começei a ler.