Lucille olhou pela centésima vez o relógio sobre a cornija da lareira. Eram onze horas da noite. Onde Gerard estava? Ele lhe dissera que voltaria no começo da noite, mas até aquele momento nenhuma notícia.

A moça sentou-se no sofá, mas segundos depois tornou a levantar-se andando pela sala. Por que seu coração batia descompassado como se sentindo uma tempestade aproximar-se. Ela embrulhou-se mais no penhoar de inverno que usava. Ele parecia um longo casaco com renda sobreposta a veludo. Por baixo dele ela usava uma camisola longa do mesmo tom de verde de seus olhos.

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Quando ela já estava quase apagando as velas para ir dormir, ouviu baterem na porta. Um sorriso acendeu seu rosto e ela ignorou o apertar de seu coração.

– Já pensava que você não viesse... – disse abrindo a porta.

Mas diferente do rosto amado de seu marido, ela deparou-se com os frios olhos azuis de Von Gorthel. Atrás dele, como um cão de guarda, estava o sargento Kroll.

– Ah, mas eu vinha... Eu vinha sim, meu rouxinolzinho.

Lucille tentou fechar a porta, mas o sargento era mais forte e praticamente arrombou a porta. Lucille correu pela sala fugindo de seu captor. Jogando objetos nele.

– Não precisa disso, meu rouxinolzinho. Quero transformar você numa princesa.

– Nem morta! Vou lutar o quanto puder contra você.

– Sim, minha linda! Lute, lute mesmo. Adoro mulheres indômitas.

Traída pela camisola longa, Lucille caiu e o sargento a imobilizou com uma corda e uma mordaça. A moça continuava lutando, mas o aperto de Kroll tirava-lhe o ar a cada mexida dela.

Von Gorthel segurou o queixo da moça deliciando-se com o brilho feroz dos olhos verdes.

– Você será o meu melhor prêmio desde que cheguei aqui. Leve-a para o carro. Nessa noite, serei o homem mais feliz do planeta.

***

Hanna ouviu o carro chegar e foi para a janela. A corrente tilintou com a movimentação, mas ela não se importou. Viu quando dois homens carregavam algo parecendo uma mulher que se debatia e Otto acompanhava a operação de perto. O grupo se encaminhou para uma cabana que havia na lateral do terreno. Algum tempo depois, somente um homem saiu de lá. Entrou no carro e foi embora. Uma luz fraca emanava de lá e Hanna fechou os olhos quando ouviu um grito de mulher. Otto estava praticando seus rituais de sadismo. Que Deus protegesse a pobre moça, Hanna desejou fechando as cortinas e voltando para cama.

Mas parecia que o grito pungente da moça ecoava em seus ouvidos a impedindo de dormir. Uma vontade imensa de chorar a invadiu e Hanna abraçou o travesseiro molhando-o com suas lágrimas e sufocando nele seus soluços.

***

A porta abriu com um estrondo e Gerard invadiu a casa.

– Lucille! Lucille!

Ele viu seus temores tomarem forma ao ver a desordem na sala. Medo e orgulho mesclaram-se em seu intimo ao ver que sua amada Lucille não se entregara sem lutar. O rapaz vasculhou o chão em busca de sinais de sangue, respirando aliviado quando não achou nenhum.

– Vermont! O que aconteceu aqui? – perguntou Julian entrando na sala.

– Lucille foi raptada e eu tenho certeza que por Von Gorthel.

– Então vamos lá na casa do canalha buscá-la.

– Mas quem nos garante que ele a levou para a casa dele? Von Gorthel frequenta alguns infernos aqui em Paris. Casas de péssima reputação. Ele pode ter levado Lucille para qualquer um desses lugares.

– Vou falar com alguns meus contatos das ruas de Paris. Talvez alguém saiba alguma coisa.

– Vou ficar por aqui. Von Gorthel tramou uma emboscada para mim. É bom que ele pense que estou morto. Será fácil resgatar Lucille com o elemento surpresa. Boa sorte, Desmonts.

– Pra você também, Vermont. – E Julian saiu em disparada pela porta.

Gerard foi até a cozinha e bebeu um copo de água, sentindo-a descer pela sua garganta ainda ressentida do aperto do soldado. Ele ouviu um ruído vindo da sala e sacou a arma.

– Olá? Tem alguém aqui? – soou uma voz feminina.

Gerard encaminhou-se para a sala ainda com a arma em punho. Surpreso viu que era madame Von Gorthel.

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Madame? O que faz aqui?

– Capitão Vaan Sucher! O que o senhor faz aqui?

– Talvez pelo mesmo motivo que a senhora.

– Eu vim procurar ajuda. Minha amiga Lucille, Otto Von Gorthel a raptou e a mantém em cárcere.

– Onde? – Gerard guardou a arma e já se encaminhava para a saída.

– Em nossa casa.

– Então vamos para lá.

– Mas...

– Agora, madame! – ele pegou na mão dela e a colocou no carro.

– Agora me conte o que a senhora viu. – pediu ele enquanto dirigia pelas ruas.

– Hoje de manhã a porta do meu quarto foi aberta e aquele cão de guarda do Otto entrou com um molho de chaves na mão dizendo que meu marido queria me ver no escritório. Escoltada por ele eu desci as escadas e fui para o escritório. Otto andava de um lado para outro, fumando furiosamente, parecia nervoso.

"- Sente-se." Ele ordenou.

Sentei-me na beirada da cadeira, pronta para fugir. Meu primeiro pensamento foi que ele havia descoberto sobre a noite que Julian e eu passamos juntos. – Hanna corou – Mas não era. A mesa estava coberta de papeis e o cofre estava aberto. "Assine todos esses documentos. Use seu nome de solteira."

"- E por que eu faria isso, Otto?" – perguntei

"- Para garantir a minha fortuna. Se os ratos de Berlim acham que vão me deixar na miséria, não vão."

– Eu fiz de conta de que não sabia do que ele estava falando. Mas Otto sempre estava me dando papeis para assinar. Comecei a assinar os documentos e ele andava pela sala bebendo e fumando. Às vezes ele ficava murmurando: "- Eles não vão me pegar, não vão." "Vou para Suíça, depois para a Argentina. Roemmer me disse que é um bom lugar para se esconder." "Eu e meu rouxinolzinho... Ela cantará para mim."

– Quando eu o ouvi dizendo isso, eu parei de escrever. Então era minha pobre amiga que gritava a noite passada.

Gerard engoliu em seco quando ouviu Hanna confirmar seu mais terrivel medo.

– Desgraçado! Eu mato aquele desgraçado! – ele explodiu batendo repetidas vezes no volante.

De repente ela se deu conta que não sabia do romance entre a amiga e o secretário de seu marido. – Você a ama! Meu Deus, Como pode ser isso?

–Depois vamos conversar sobre os detalhes. E ela está na casa, madame?

Não, Capitão. Está naquele anexo que está sempre trancado. Quando Otto foi para o andar de cima, eu fugi do escritório e pedi para Nannau ficar observando o anexo do meu quarto. Disse a ela que dispensasse todas as criadas e peguei o molho de chaves no escritório antes de sair. Vim para a casa dela, pensando em encontrar Julian.

Nesse momento Gerard estacionava o carro em frente a casa dos Von Gorthel, aliviado ao contatar que não haviam guardas no portão e que o carro do comandante ainda estava na garagem.

Madame, procure a chave do anexo e liberte Lucille. E saiam as duas daqui. Se encontrarem Julian, fiquem com ele. Não deixem ele vir atrás de mim. Eu ainda tenho que procurar outros documentos.

– Para que capitão? Se Otto encontrar você, vai achar que você também vai prendê-lo.

– Não se preocupe comigo, Hanna. – respondeu Gerard chamando-a pela primeira vez pelo nome. – Tenho um trabalho a fazer.

Os dois se separaram e Gerard entrou na casa. Foi direto para o escritório de Von Gorthel. Como Hanna havia dito, o cofre estava aberto e vários documentos estavam sobre a mesa. Ele estava microfilmado alguns com o selo do Terceiro Reich, quando viu pela janela o sargento Kroll indo em direção ao anexo. As duas mulheres ainda estavam lá e nem por um segundo Gerard hesitou. Largou tudo e correu em direção a pequena construção.