P.O.V America

Minha conversa com Maxon havia sido curta, e eu não acredito que ele havia ficado tão chocado quando disse que só queria vê-lo. E naquele encontro, eu parecia vê-lo pela primeira vez: ele estava todo desalinhado, não parecia o almofadinha de sempre, parecia quase um cara normal.
Ele estava sem o paletó e com as mangas da camisa arregaçadas. A gravata azul estava folgada em volta do pescoço, e o cabelo – quase sempre puxado para trás – agitava-se um pouco quando ele se movia. Um contraste gritante com a pessoa de uniforme que eu havia visto no dia anterior; Maxon parecia mais jovial, mais real. E ele havia ficado ainda mais fofo e lindo se preocupando nisso.
Mas agora não tenho tempo para isso. Tenho que focar no ensaio. Os dias haviam se passado e eu mal posso acreditar que amanhã será o tão esperado Show de Talentos, nunca fui de ficar ansiosa para apresentações ou concursos, mas naquele momento aquela era a única palavra que poderia descrever meu estado de espírito: ansiosa.
Tento tocar mais três vezes na sala de música do palácio. Annabeth havia dado um jeito para que todas ensaiassem em lugares diferentes e, se quisessem, até ao mesmo tempo, eram muitas garotas, apesar de algumas estarem em grupos de 3 ou 4 garotas. Eu estava sozinha. Por pouco. Annabeth havia insistido para que eu tivesse o acompanhamento de uma banda, ou ao menos de um piano, qualquer coisa, com o argumento que eu seria a única a tocar sozinha – o que ambas sabíamos que era mentira, já que Marlee havia me dito que ia tocar piano sozinha, o que na hora eu interpretei como um convite implícito para fazermos juntas, mas fingi não perceber. Gosto de trabalhar sozinha. Foi em vão. Não arredei o pé, mas quando falei que ia cantar também, ela e Percy sossegaram um pouco, o que me fez acreditar que eles só queriam saber o que eu ia cantar e quando viram que eu não ia ceder, se contentaram com a pequena informação. Ou não, né?
A música que iria tocar eu achava linda e, de um jeito ou de outro, influenciou muito na minha vida, adorava tocá-la, cantá-la ou simplesmente ouvi-la nos momentos de aflição ou de felicidade, ela era ótima. Não que fosse tão importante assim ou que eu não pudesse tocar outra, mas eu queria tocar aquela.
Ninguém sabia qual era música, de qualquer modo e eu queria que permanecesse assim, para isso, eu evitava ao máximo pensar nela fora daquele lugar onde me encontrava.
Quando uma nota minha desafina por minha cabeça estar em outro lugar, olho para trás para o espelho por alguns segundos, observando meu reflexo, depois respiro fundo, volto-me novamente para a porta e volto a tocar.

Está um corre-corre enorme no Salão das Selecionadas, todas estão muito ansiosas, Olivia havia vomitado pelo menos três vezes, sendo uma em cima de um piano e feito a menina que estava sentada nele, Natalie, sair gritando.
Ninguém quer que ninguém saiba o que está planejando. O Salão está dividido em vários grupinhos de acordo com quem vai apresentar. Eu estou sozinha. Olho para o outro lado do Salão e percebo que Marlee também está. Vou até ela.
– Oi, Marlee. – sorrio.
– Oi, America. – ela parece um pouco chateada.
– Quer que eu a deixe sozinha? – pergunto-lhe.
– Não, está tudo bem. Só estou muito ansiosa e um pouco cansada.
– Entendo. – digo e me sento ao seu lado. – Piano, não é? – tento.
– Violino? – ela sorri.
Mas, por mais que eu tente, o inconveniente e insuportável silêncio continua a voltar, até que não aguento mais, levanto-me e peço desculpas, alegando que estou me sentindo mal.

Passo o resto do dia no quarto, ensaiando baixinho a música para não atrapalhar ninguém e para que ninguém escute, mas parece ser em vão, consigo ouvir gritos agudos e femininos do andar de baixo, se me sinto mal com isso, nem imagino como Maxon não está se sentindo.
Mary e eu estamos sozinhas no quarto. Nesta noite eu encararei Maxon, todos os habitantes da mansão, Zeus e todos os deuses. Sem falar nas outras meninas, que estariam presentes o tempo todo, analisando o desempenho umas das outras e tecendo suas críticas mentais. Dizer que eu estou nervosa seria um eufemismo grosseiro.
– Senhorita? – ouço a voz suave de Anne me chamando.
Viro-me para pela e sorrio.
– Oi, Anne. Já disse que pode me chamar de America.
– Sim, senhorita America.
Reviro os olhos e faço um gesto com as mãos para ela prosseguir. Mas antes que ela o fizesse, notei algo nas mãos de Lucy, que vinha logo atrás dela.
– O que é isso?
– Terminamos seu vestido para o Show de Talentos, senhorita – ela responde.
Franzo a testa, confusa.
– Outro vestido? Por que não posso usar o azul que está no armário? Vocês acabaram de fazer. E eu simplesmente o adorei.
As três trocam olhares.
– O que foi? O que vocês fizeram? – pergunto apontando para o cabide que Anne havia pendurado no gancho próximo do espelho.
– Conversamos com as outras criadas, senhorita. E ouvimos muitas coisas – começa Anne. – Sabemos que Janelle e a senhorita foram as únicas a terem mais de um encontro com o príncipe. E, pelo que pudemos perceber, talvez haja uma ligação entre vocês.
Ligação? Como assim ligação? A única ligação que tínhamos era que ela também era do CHB, mas nem ruiva ela era, tampouco éramos filhas do mesmo pai.
– Como assim?
– Pelo que ouvimos – continua Anne –, ela foi mandada embora por ter feito comentários desrespeitosos sobre a senhorita. O príncipe não concordou e a dispensou no ato.
– O quê? – exclamo, levando a mão à boca na tentativa de esconder meu espanto.
– Temos certeza de que é a favorita do príncipe. Quase todo mundo diz isso. – Lucy diz, suspirando de alegria.
– Acho que vocês estão mal informadas – replico. Anne dá de ombros com um sorriso no rosto, como se minha opinião não importasse.
Foi então que me lembrei de como a conversa havia começado.
– O que tudo isso tem a ver com meu vestido?
Mary se aproxima de Anne e abre o zíper daquela enorme capa. Dentro estava um vestido dourado com alguns pequenos brilhinhos cor de ouro longo que devia arrastar no chão e me lembrava o vestido da Rainha das Fadas de Tinker Bell, filme que eu havia assistido graças a May. Ele era simplesmente maravilhoso e cintilava à luz fraca do pôr do sol.
– Nossa, Anne... – eu digo, completamente embasbacada. – Você se superou!
Ela recebe o elogio inclinando levemente a cabeça.
– Obrigada, senhorita, mas todas trabalhamos nele.
– É lindo. Só que ainda não entendi o que tem a ver com nossa conversa.
Mary tira o vestido da capa para deixá-lo arejar um pouco. Anne continua as explicações:
– Como eu disse, muita gente no palácio pensa que a senhorita é a favorita do príncipe. Ele lhe faz elogios e prefere sua companhia à das outras. E parece que as outras garotas também notaram.
– O que você quer dizer?
– Vamos à oficina quase sempre que precisamos costurar algum dos seus vestidos. Lá temos um armário de materiais e um lugar para fazer sapatos. A maioria das outras criadas também vai lá. Todas as garotas pediram um vestido azul para esta noite, e as criadas acham que é porque você usa essa cor quase sempre. As outras meninas estão tentando imitá-la.
– É verdade – palpita Lucy. – Tuesday e Natalie não vão usar nenhuma joia hoje. Como a senhorita.
– E a maioria das moças começou a pedir vestidos mais simples, como os que a senhorita prefere. – continua Mary.
– Isso ainda não explica por que me fizeram um vestido dourado.
– Para que se destaque, claro – responde Mary. – Se ele gosta mesmo da senhorita, temos que mantê-la no primeiro plano. Tem sido tão generosa conosco, especialmente com Lucy.
A essas palavras, todas olhamos para Lucy, que confirma com a cabeça. Mary prossegue:
– A senhorita daria... daria uma boa deusa. Seria espetacular.
Eu, boa deusa, quase rio. Começo a procurar um jeito de escapar. Odeio ser o centro das atenções.
– Mas e se as outras tiverem razão? E se Maxon gosta de mim justamente porque não gosto de aparecer, aí vocês me vestem com uma roupa assim e botam tudo a perder?
– Toda garota precisa brilhar de vez em quando. Além do mais, conhecemos o príncipe desde criança. Ele vai adorar. – Anne afirma com tanta segurança que não tenho escolha, só não entendi o “desde criança.”
Não quero explicar que todos os bilhetes que ele me enviou e todo o tempo que passou ao meu lado não passaram de amizade. Não posso contar a elas. Ia deixá-las tristes, e eu preciso manter as aparências se quiser ficar. E eu quero. Preciso ficar.
– Tudo bem, vamos tentar. – cedo, com um suspiro e as assisto pular de alegria.

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