Hastryn: Ascensão

Carnificina


Lothar

Lothar se tornou incapaz de adquirir qualquer sentimento de amor por outro ser humano após a morte da amada Lucy. Sua crueldade não tinha limites e o tornava capaz de cometer atrocidades e malevolências contra qualquer um, até mesmo cidadãos inocentes que outrora o veneravam e o respeitavam acima de tudo, mas cruzaram seu caminho em momentos inoportunos e indesejáveis.

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O que a população sentia ou pensava a seu respeito não era nem um pouco importante, e muito menos a vida trabalhosa e pesada que levavam diariamente. Para ele, não fazia diferença que os deuses enviassem ou não para o mundo das sombras todos aqueles vermes insuportáveis. Tudo o que restava em seu coração era a dor, a solidão, o sofrimento. A sensação de perda e o ressentimento lançado completamente sobre a filha Charlotte.

Daquela vez, não havia sido diferente.

Furioso, ordenou que trancafiassem a princesa na torre em que dormia, sem que ninguém além de Hazel pudesse sequer olhar para ela. A ama apenas levava alimentos e água para mantê-la viva e nutrida, e não era sempre que era permitida a fazer isso. Um castigo necessário para que a filha fosse educada e passasse a não só obedecer, mas valorizar o próprio pai.

Depois de executar Gregory Muirden, mandou seus homens caçarem pelos reinos suas filhas e a família de Elliot, que ele ainda não conhecia, mas estes não foram capazes de encontrá-los. Lothar também não se recordava muito dos rostos das meninas, pois as vira poucas vezes antes do ocorrido. Acreditava ser capaz de reconhecê-las caso as encontrasse novamente.

Concluiu que os Trannyth e as gêmeas tivessem fugido juntos e obrigou os capangas a irem atrás dos fugitivos pelas estradas grandes, aguardando que chegassem com pelo menos a cabeça de um fugitivo para acrescentar em sua coleção. Depois disso, voltou-se para os problemas existentes dentro de seu próprio território, tentando se esquecer por um tempo daquelas criaturas insolentes.

Certa manhã, no interior de seus aposentos, estava entupindo seu organismo com café, enquanto observava a vasta paisagem nevada que se abria pela vista da alta janela. O nascer do sol era algo que Lothar quase nunca perdia, pois era uma tradição que mantinha com Lucy, quando esta era viva. Atualmente, dormia abraçado com travesseiros, imaginando por algumas horas que o amor de sua vida nunca havia partido para a morte. Ao acordar, voltava a se decepcionar a partir do momento em que abria os olhos.

Refletia sobre a triste trajetória que sua vida tomava, mas sempre chegava à mesma conclusão: tudo aquilo fora necessário para que se tornasse um homem cheio de força e determinação, capaz de pisar em todos quando preciso fosse. Caso os deuses realmente existissem, aquela seria a vontade deles. Lothar enxergava uma imagem resistente olhando para si mesmo no espelho, orgulhando-se das cicatrizes ganhadas em sua primeira guerra e que ficavam à mostra para a população. Eram a prova de que sobrevivera a muitos desafios e superado cada um deles.

Entretanto, existia um lado que mantinha escondido. Um lado extremamente sensível e sentimental, que jamais mostraria a nenhum ser humano na face de Hastryn. Os únicos que o conheceram fortemente foram seu pai e sua mulher, portanto, era como se esse lado houvesse morrido junto com ambos.

A porta bateu, fazendo o rei despertar do transe. Impaciente, demorou a atender a pessoa que o aguardava. Descobriu alguns minutos depois que se tratava de um de seus próprios soldados, sendo impossível reconhecer qual deles por detrás das armaduras enferrujadas que costumavam utilizar.

— Posso saber oque o leva a interromper meu momento de paz durante a manhã? — Lothar cerrou os punhos, fazendo questão de mostrar ao rapaz que seria capaz de matá-lo ali mesmo caso utilizasse as palavras erradas e o ofendesse ou o humilhasse de alguma forma.

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— Majestade, há movimentos suspeitos de pessoas revoltosas que estão cada vez mais próximas à entrada do castelo. Estão diante dos portões e realizando protestos, gritando sem parar. Parecem ter exigências de melhorias para o reino, podendo causar um enorme alvoroço para consegui-las!

— Já não bastam as audiências marcadas, contra minha vontade, que me obrigam a ouvir as petições de cada um? Essa população é realmente ingrata demais! Não sabem valorizar o rei que possuem e são desprovidos da consciência de que posso piorar ainda mais a situação em que vivem. Gostam de sofrer!

— Outros guardas alegaram tê-los visto com objetos grandes nas mãos semelhantes a armas. Aparentemente, estão desejando causar um movimento revoltoso. Podem estar planejando um levante e não são poucos dispostos a isso.

— Chame os homens e preparem-se para evitar o ataque. Quando o sinal for dado, abram as portas e as fecham no instante em que todos estiverem do lado de dentro. Cerquem-nos e removam as armas de suas mãos. Terão o que merecem por se acharem no direito de confrontar alguém como o soberano de Arroway!

“Um verdadeiro rei não é aquele que recebe o amor de seu povo, mas sim o que causa medo neste. O medo é uma ferramenta poderosa no mundo hastryniano, devendo ser usado com maestria por aqueles que o possuem em suas mãos. A arte da manipulação, quando dominada, é um trunfo nas mãos do ser humano.”

Os portões fechados impediram que os revoltosos tivessem a chance de escapar do destino que lhes tinha sido preparado. Descendo sem pressa os degraus da escadaria de mármore, Lothar ouviu um grito e sons de lâminas se chocando, vindos do conflito que ocorria nas áreas próximas aos pátios. Chegando ao lado de fora, encontrou soldados com suas respectivas lâminas apontadas para os rebeldes, que estavam ajoelhados e com seus objetos deixados sobre o chão de pedra.

Lothar olhou os objetos com atenção e ficou surpreso ao descobrir do que realmente se tratavam. Aparentemente, estava redondamente enganado sobre o movimento.

— Não são armas o que carregavam, mas imagens dos deuses e símbolos religiosos. — disse o mesmo guarda que o havia notificado anteriormente, envergonhado por ter dito uma mentira acidental. — É uma caminhada de fé, em nome de nossas divindades.

— Como se isso fizesse alguma diferença, afinal... Estão praticando algo sem antes ter pedido minha autorização ou sequer me consultar a respeito. Deveriam ter feito um pedido oficial!

“Não vou ceder a essa palhaçada e deixá-los pensando que estou me tornando bondoso e tendo piedade das pessoas. Dessa maneira, poderão pensar que podem passar por cima de mim e tomar o que é meu. Aqueles que cometem atos desrespeitosos com as autoridades merecem sofrer tanto quanto os traidores e conspiradores.”

— Acorrentem todos e os levem para a praça, sem nenhuma exceção!

Lothar viu terror nos olhos daqueles indivíduos.

Era prazerosa a sensação de poder controlar a vida daqueles que julgavam dignos de tal sofrimento. Sorriu ao ver os cidadãos sendo acorrentados e levados impacientemente até seu local favorito do castelo: A Praça da Execução. Fechou os olhos e sentiu o forte e delicioso vento vir em sua direção, maravilhando-se com sua impotência diante do povo.

— Por favor, poupe minha vida! — implorava um garoto jovem, que deveria ter cerca de dezesseis ou dezessete anos de idade. Era um dos últimos da fila na qual os guardas obrigavam a formarem. Seus cabelos eram negros e os olhos de tonicidade cinzenta lacrimejavam sem parar. — Nós não queríamos causar nenhum mal contra nosso rei! Somos seus leais seguidores... Tenha piedade!

Anos atrás, havia sido uma criança medrosa, e detestava aqueles que se comportavam como tal. Lothar o empurrou de forma rude, fazendo o garoto bater com o maxilar no chão de pedra. Após a queda, chutou sua barriga com violência, sorrindo diante de sua expressão de dor. Gritou para que todos ouvissem:

— Este aqui será o primeiro, como principal exemplo a todos os que ousarem desafiar minha paciência novamente! — Lothar fez o rapaz se levantar e caminhar até o início da fileira, tomando a frente dos capturados. — Preparem o fogo!

Grandes fogueiras não tardaram a ser construídas, nas quais pelo menos seis pessoas forma queimadas juntas. Eram cinco fogueiras ao todo e, quando acesas, as chamas faziam os olhos de Lothar brilharem como nunca. Traziam um imenso sentimento de adrenalina e felicidade diante daquela vista. As agoniadas súplicas daqueles que estavam sendo carbonizados se tornavam motivo para gargalhadas guturais e monstruosas, pois eram como uma música doce para seus ouvidos.

“O fogo possui uma beleza maravilhosa! Não há nada tão perfeito e maravilhoso quanto ele!”

Quando se deu conta de que todos já estavam mortos, caminhou pela tempestade de fumaça e fogo que ocupou toda a praça, analisando o que restou de cada corpo na pilha que foi montada. Aqueles foram sacrifícios necessários para colocar em prova toda sua coragem adquirida com o passar dos anos.

Pensou no banquete que seria generosamente servido aos corvos, sentindo orgulho de si mesmo. Eram animais muito eficientes na entrega de cartas e bilhetes, assim como outros pássaros também com a mesma função, sem haver nenhuma falha, dignos de seu respeito. Tinha mais apreço pelas aves do que pelos próprios seres humanos. Os corvos seriam muito bem recompensados com toda aquela quantidade de comida.

— Minhas belas aves, desfrutem desses presentes. São todos seus!