Boa Sorte, Katniss

Aquele com a chefe festeira


— Retira essa coisa de perto de mim! — grita Peeta.

Parece que estou tendo uma sessão nostalgia.

— Ei, não fale assim do Cenourinha! — falo, enquanto apanho o coelho da gaiola.

Peeta parece a beira de ter uma síncope. Ele olha para Cenourinha como se o coelho fosse um serial killer.

— Você sabe que eu odeio coelhos!

— Você não odeia coelhos, você tem medo deles — zombo, enquanto faço cafune em Cenourinha. — Ele não é uma gracinha? Estava lá no pet shop, tão solitário... Resolvi fazer uma boa ação e adotar essa fofura...

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— Retira esse bicho agora de perto de mim! Esse bicho é... Argh! — Peeta está bastante frustrado.

— Não ligue para ele, Cenourinha! Eu não vou deixar ele fazer mal a você!

Olho para Peeta que trata de se manter o mais longe possível do coelho. Até parece que Cenourinha tem uma doença contagiosa ou algo do tipo. Essa cena é muito cômica. Tenho que me conter para não dar uma boa gargalhada da cara dele. Sério, Peeta, coelhos? O que há de errado com você? Cenourinha é tão fofo e lindo.

— Tira essa coisa de perto de mim! — tenho certeza que nesse exato momento ele está verificando, mentalmente, quais são as rotas de fuga para sair da presença do coelho. — Livre-se dessa... coisa, o mais rápido possível!

Encaro Peeta. Ele não está pensando que vou expulsar Cenourinha daqui só porque ele chegou, ou está?

— Não! — falo, apertando o coelhinho em meus braços. — Eu não vou transformar Cenourinha em um coelho sem lar!

— Katniss, essa coisa não pode ficar aqui!

— Qual é o seu problema?

— Meu problema é esse coelho! — fala, apontando para Cenourinha, que ouve nossa conversa atentamente.

— Hum... você realmente quer que eu retire o Cenourinha da sua presença, não é?

— Isso não é óbvio?!

— Sabe... posso arranjar uma roupa, ligar o som — olho para Peeta. — E você poderia dançar Macarena... Que tal? Quem sabe eu possa mudar de ideia — provoco.

— Nem pense nisso!

— Ah, é mesmo! Tenho uma cópia daquele vídeo de você dançando Macarena... Se Cenourinha sair daqui... posso ficar bem entediada e começar a mandar o vídeo para todo mundo que eu conheço... Aposto que seus fãs adorariam ver aquele vídeo.

Preciso disser que Peeta está praticamente espumando de raiva?

— Ótimo, o coelho fica! — sorrio, enquanto saio da sala com Cenourinha e sua gaiola. Não vou deixa o coelho aqui. Vai saber o que se passa na mente desse louro oxigenado.

A pior parte é que eu não tenho uma cópia daquele vídeo. Sim, eu menti descaradamente para Peeta. Eu precisava salvar Cenourinha, não precisava? Certas ocasiões pedem medidas drásticas. Se ele descobrir que eu não tenho uma cópia do vídeo, Cenourinha está correndo sérios riscos de se tornar um coelho sem teto.

A chegada de Peeta foi... foi... não sei bem o que pensar sobre isso. Mas, com certeza, eu não estava preparada. Faz apenas uma semana e meia que me mudei para esse apartamento, pensei que não veria Peeta tão cedo.

Peeta e eu, voltando a conviver em um mesmo ambiente? A sorte com certeza me ama. Já fizemos isso antes e olha só no que resultou!

Começo a andar impaciente pelo meu quarto, planejando... sei lá o que estou planejando. Tropeço em algo. Quase solto uma chuva de palavrões (estou convivendo muito com a chefe!). Não há pior dor do que bater com o dedinho do pé. Como algo tão pequeno pode doer tanto? E não é só o dedo que dói, a dor se estende por todas as partes do corpo.

Eu deveria ter organizado melhor o quarto para não ter acidentes como esse. A bagunça do meu quarto, infelizmente, não é devido a mudança. Há livros espalhados por diversos lugares, em cima da cama, amontoados na escrivaninha... Hoje, antes de Ren vir me visitar, estava estudando. Ainda não conseguimos realizar todos os ajustes que Peeta pediu para o pão “Dente-de-leão”, e o vocabulário de Johanna ultimamente tem se ampliado de maneira bem notável.

Ainda resmungando de dor, me arrasto até a cama.

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— Não me olhe assim, Cenourinha! Eu não estou nenhum um pouco perturbada por causa da chegada daquele louro oxigenado! — digo, encarando Cenourinha, que me observa de sua gaiola. — Nem um pouquinho, ouviu? Somos dois adultos civilizados aqui, certo? Pelo menos, eu sou uma adulta civilizada... Dois adultos com um passado... Mas, isso como a própria palavra diz é passado! Passado! E aquele louro oxigenado não vai me incomodar, ponto final!

Pego um livro.

— Vê, Cenourinha? Vou estudar!

E eu consigo estudar muito bem, exceto por algumas páginas rabiscadas, com anotações um tanto misteriosas, minutos perdidos lendo o mesmo parágrafo (porque o livro fez mágica e tornou-se dez vezes mais difícil do que o normal). Tirando esses pequenos detalhes — detalhes bem bobos — eu consigo fazer uma ótima sessão de estudo!

Um cheiro realmente maravilhoso, que me faz pensar que fui parar no paraíso da comida, chega até as minhas narinas. Olho para o relógio, constatando que está na hora do jantar. O meu maldito estômago começa a resmungar inconformado com a minha decisão de não chegar nem perto daquela cozinha. Há um delicioso pão (amanhecido e um tantinho duro) me esperando na geladeira. Um pão muito bom... um pão, que ao lado da comida que o louro oxigenado está preparando, teria vergonha de se denominar “pão”... afirma a senhora dona Realidade em minha face.

— Katniss! — a voz de Peeta me chama em meio a batalha que travo comigo mesma. — A comida está pronta!

Sério, que eu praticamente corri até a cozinha? Nessas horas o meu estômago é quem toma conta de meu corpo.

Peeta está terminando de pôr a mesa. No centro, há uma travessa com algo que cheira deliciosamente bem.

— Cozido de carneiro — explica ao notar meu interesse pela travessa. — É uma receita muito boa. O chef, que me deu essa receita, disse que eu preparava o cozido de carneiro melhor do que ele.

Olho para Peeta. Algumas coisas, como o ego de certo alguém, não têm conserto.

Puxo uma cadeira e me sento.

— Sei... — digo, pegando um prato e enchendo de cozido de carneiro. Ei, eu só estou testando se esse prato é bom mesmo ou é apenas uma mentira do louro oxigenado.

Enfio em minha boca uma colherada do cozido. E... parece que acabei de comer algo como a famosa ambrósia servida apenas para os deuses (queria muito que isso fosse um exagero meu, mas não é).

— E, então? — indaga, analisando o meu semblante.

— Você não precisa da minha opinião, afinal, você é um chef! Deve saber quando uma comida fica ou não boa.

— Minha especialidade são os doces — rebate, divertido. — Aquele chef que me ensinou a receita estava certo?

— Como eu vou saber? Eu não conhecia o chef! Para que isso seja justo tenho que experimentar também o prato feito por ele. Não quero cometer injustiças!

Peeta ri.

— Certo, certo, não queremos que você cometa injustiças aqui...

Como mais um bom bocado do cozido do carneiro. E até repito duas vezes para ter um bom material de análise, caso um dia eu experimente a comida desse tal chef que ensinou a receita para Peeta.

Nosso jantar é bem silencioso. Me ofereço para lavar as louças, quando terminamos de comer. Peeta vai para a sala, liga o notebook e começa a mexer em uma bela pilha de papéis.

Quando passo pela sala, ele está cercado por muitos papéis, espalhados pelo tapete, pelo sofá, e totalmente concentrado. Uma cena bem inusitada. Deixo-o com seus papéis e vou para meu quarto.

Um cheiro muito bom de pão fresquinho me acorda de manhã. No entanto, eu não encontro o dono do pão, apenas um pequeno bilhete:

“Preciso resolver alguns assuntos. Vou ficar o dia inteiro fora.

P.S. Aproveite o pão.”

O pão estava ótimo.

Como hoje é segunda-feira, estou com um número bastante grande de trabalho. Nem tenho tempo para almoçar, apenas engulo um sanduíche e tomo praticamente uma garrafa inteira de café.

— Que belo presente de aniversário! — reclama Annie. — A chefe nem para me dar uma folga!

— Folga? — Johanna nos olha com aquele seu olhar de que está preste a usar algumas palavras adquiridas recentemente em seu vocabulário de palavras nem um pouco limpas.

— É, chefe, ou pelo menos... uma festinha... — sugere Annie. — Hoje é meu aniversário...

— Festa? — ela olha para Annie. — Isso é... uma boa ideia!

Annie acertou uma flecha bem no alvo, festas é um dos pontos fracos de nossa chefe. Todos aqui conhecem a fama de Johanna.

— Katniss! — ela me chama, me deixando tensa. — Você se mudou para um apartamento novo perto daqui, não?

— É... — respondo vagamente, temendo pelo que as engrenagens do cérebro da chefe está tramando.

Johanna sorri. O sorriso dela é mais aterrorizante que sua lista de palavrões.

— Pronto, Annie. Temos um lugar para sua festa! Assim que acabarmos aqui, vamos para o apartamento novo da Katniss.

— O quê? — grito, fazendo todos me olharem.

— Finnick, você ouviu, festinha no apartamento da Katniss depois do expediente — Johanna ignora totalmente meus protestos. — Relaxa, garota, só vamos emprestar seu apartamento, pode deixar que cuidamos do resto — pisca para mim, muito animada. E isso é simplesmente assustador. — Além disso, eu sou sua chefe! Portanto, vai ter festa sim!

— Eu estou dentro dessa festa! — afirma Finnick, sorrindo. — As bebidas ficam por minha conta!

— Viu isso, Katniss? Menos reclamação, siga o exemplo de Finnick!

Em menos de um minuto, a “festinha” está combinada. Só tem um problema, ninguém sabe que o meu novo apartamento pertence a Peeta e que, nesse momento, estamos vivendo juntos.

Tento contatar Peeta, porém, não consigo. O celular dele está desligado. Bela hora para aquele louro oxigenado desligar o celular.

— Katniss, o expediente terminou! — anuncia Johanna, enquanto eu tento desesperadamente ligar para Peeta e saber seu paradeiro. — Vamos, garota! Hoje, eu quero festejar!

A animação de Johanna me faz querer ter o poder de voar até a lua e ficar lá por um bom tempo.

— Não me olhe assim, Katniss! — fala Annie. — Ideia da chefe!

— Vamos, Katniss, vai ser divertido! — diz um Finnick bem animadinho. Muito animadinho, diga-se.

Quando alguém afirma que vai ser divertido, isso não significa que necessariamente você está incluído na diversão.

Estou quase à beira de um colapso nervoso, quando chego ao apartamento rodeada por dez pessoas. Infelizmente, meu plano de fingir um desmaio não funcionou corretamente. Mas, ninguém pode me acusar de não ter tentado parar isso.

O que vou falar para esse povo, se ao abrir essa porta, nos depararmos com um cara alto e louro sentado no sofá? Será que se eu afirmar que estamos sofrendo de ilusão de ótica coletiva, vai funcionar?

Se descobrirem que eu estou vivendo com Peeta as coisas vão ficar muito estranhas na empresa.

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Contudo, quando abro a porta, não me deparo com nenhum Peeta Mellark sentado no sofá da sala. O apartamento está vazio. Isso me dá mais alguns minutos para tentar descobrir o paradeiro de Peeta e evitar certas mortes.

Enquanto, as pessoas se espalham por meu apartamento, eu tento ligar para Peeta. Nenhum um ninja seria tão rápido quanto eu agora. Finalmente, depois de quase meio século de desespero, Peeta atende o celular.

— Katniss, por que há um monte de ligações perdidas suas? E que barulho é esse aí?

— O pessoal do meu setor está dando uma festa no apartamento — despejo tudo de um só folego.

— O quê?

— Será que você poderia não aparecer por aqui? Eles logo vão embora... — minto.

— Katniss, por que você está me pedindo isso?

— Porque se você aparecer por aqui, vão descobrir de nós... e isso... vai ser bastante complicado...

Peeta suspira.

— Ok, ok... Estou resolvendo alguns assuntos importantes por aqui e realmente vou chegar um pouco tarde...

— Ótimo, demore o tempo que for necessário aí!

— Quem deveria demorar? — pergunta alguém para mim.

Me viro.

— Ren!

Espera, Ren está aqui? Como? Quando? O que foi exatamente o que eu perdi?

Desligo o celular quase automaticamente.

— Ninguém — sorrio. — E como você soube da festa?

— Finnick me avisou — aponta para Finnick que está agora cuidando do som. — Resolvi vir... ver se você estava precisando de ajuda.

Olho para ele.

— Chegou em uma ótima hora! Quem obriga uma pessoa a emprestar seu apartamento para uma festa? — falo, indicando Johanna com a cabeça.

Ren ri da minha cara de frustação.

— Então, fiz bem em aparecer?!

— Vou precisar de todo a ajuda possível... se alguma coisa quebrar nesse apartamento... aquele cara vai me matar...

— Que cara? — indaga Ren.

Droga, acabei deixando escapar algo que não devia.

— O dono do apartamento! — eu não estou mentido, apenas omitindo o pequeno detalhe que o dono do apartamento se chama Peeta Mellark.

— Hum... ele deve ser bem chato...

— Você nem imagina o quanto!

— Vocês dois aí! — Johanna praticamente pula no meio de nós. — Isso aqui é uma festa ou um enterro? Vamos, quero ver todo mundo se divertindo! — entrega dois copos de bebidas para nós. — Animem-se! Pessoal, hora do brinde! — todos voltam sua atenção para nossa chefe. — A nossa aniversariante! — levanta o copo.

Todo mundo levanta também o copo. Discordar de Johanna não é a melhor das ideias.

— À Annie! — falamos em coro.

— Obrigada, chefe! — Annie toma sua bebida de um só trago.

— Gostei disso, garota! Sigam o exemplo de Annie! — instrui uma Johanna bem animada. Esse não deve ser o primeiro copo de bebida dela.

Todo mundo elimina sua bebida em um instante. Não sabia que o poder dos meus colegas era fazer um copo de bebida desaparecer dentro de segundos.

Olho para meu copo de bebida e para Johanna. Decido tomar rapidinho a bebida.

— Agora, todo mundo dançando!

Eu e Ren somos literalmente empurrados para a pista de dança.

— Ren... você sabe que eu não sou uma dançarina lá muito boa.

Ele ri.

— E você sabe que eu sou pior que você...

Ren começa a realizar alguns passos desengonçados (até cômicos). Sigo seus passos. Começamos a gargalhar de nossos nadas ortodoxos passos de danças. Às vezes, a melhor dança é quando você não se importa com seus passos, com o fato de seus membros se esforçarem para competirem entre si para saber quem é pior em seguir o ritmo da música, apenas dança, não se importando com mais nada.

A festa segue, com Johanna nos obrigando a fazer brindes (até o apartamento ganhou um brinde), até que alguém — uma pessoa realmente sensata ou muito corajosa ou ainda sem medo da morte — lembra a nossa chefe que amanhã é terça-feira e não seria nenhum um pouco legal chegarmos todos de ressaca na Sinsajo. Embora Johanna não goste nenhum um pouco disso, resolve que está hora de todos irem para suas casas.

Ren acaba ficando para me ajudar com a limpeza do apartamento.

— Por que essas coisas só acontecem comigo? Quem tem uma chefe que organiza uma festa e obriga você a emprestar o apartamento? — reclamo, recolhendo uma latinha de cerveja. — E ainda tenho que limpar a bagunça!

— Sua sorte não é das melhores, Katniss! — brinca Ren, colocando algumas coisas de volta ao lugar.

O som ainda está ligado, I hear the bells de Mike Doughty toca baixinho.

— Adoro essa música! — cantarolo um trecho da música.

— Vamos dançar! — Ren pega em minha mão e me traz para ele.

Rio de um modo um tanto incomum, quando meu corpo encontra o seu. Acredito que esteja um pouco embriagada.

O corpo de Ren é quente. Ele envolve minha cintura com um dos braços, enquanto o outro, envolve meus ombros. Encosto minha cabeça em seu peito.

Não seguimos, claramente, o ritmo da música, seguimos um ritmo próprio nosso. Estamos em nosso próprio mundinho.

Nossa dança desengonçada acaba provocando uma pequena queda. Caímos no tapete na sala. Rimos alto. Rimos até nossas barrigas começarem a doer. Rimos até rirmos de nossas próprias gargalhadas.

Olho para Ren. Ele retribui meu olhar. Não sei quando ou como ficamos tão perto. Nossos corpos, nossas cabeças estão perigosamente pertos. Tão pertos...

Não sei quem fez o primeiro movimento, talvez eu, talvez Ren, talvez os dois ao mesmo tempo. Só sei que nossos lábios se encontram. Sua boca tem gosto de álcool e seus lábios estão um tanto secos. Mas o beijo é bom. Muito bom.

— Katniss! — a voz de Peeta chega até a mim.

Perfeito, agora também estou ouvindo a voz dele quando beijo outro cara. Minha mente gosta de uma brincadeirinha.

Porém, quando eu e Ren separamos nossos lábios, constato que isso não foi uma brincadeira de minha mente. Peeta está em nossa frente, olhando para nós, com os braços cruzados.