Capitulo Sete

Hicc

Hook

Passado

Pelos três próximos dias que passei ali, eu e o velho Viking não nos falamos. Na verdade, uma porta trancada me impediu de ter contato físico e formal com qualquer outro humano.

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Existia apenas uma pessoa que entrava em contato comigo. Somente um garoto com uma idade aproximada da minha, um ou talvez dois anos mais novo. De compleição franzina e cristalina, com a pele branca e os cabelos castanhos- escuros e despenteados, como se uma brisa muito forte houvesse o tocado para sempre e o moldado com cuidado, o pequeno menino não abria os lábios para me dirigir uma única palavra. Tudo que conseguia arrancar dele, era um olhar de desespero de sua íris verde-musgo e uma incompreensão e submissão tão evidentes como as poucas sardas de seu rosto.

E por três dias um ciclo monótono se repetiu.

Pela manhã, assim que a aurora nascia e o sono me abandonava, ouvia o ranger de uma chave gritando na cova da fechadura. Seus gritos iam da esquerda, para a direita e voltavam para a posição inicial, quando eram brutalmente interrompidos e silenciados pelo entoar da porta se abrindo.

Carregando uma tigela de madeira com pão e cereais frescos, o menino deixava o alimento a poucos passos da porta, no chão duro e saia. Apenas saia em passos largos, ás vezes olhando-me de soslaio, mas ainda assim, deixando-me sozinho.

Foi apenas no terceiro dia, no momento em que ele despejava novamente aquele alimento seco e sem sabor ou gosto identificável no chão que tentei me dirigir a ele:

–Qual é o seu nome?- A garganta estava arranhada, ferida, marcada. Era dolorido dizer qualquer coisa, como se houvesse um peso morto em meu corpo.

O garotinho olhou de um lado para outro, como se temesse que alguém pudesse ouvi-lo.

– Meu nome é Hicc. – Respondeu o menininho, seus cabelos escuros por um único centímetro não caindo em seu rosto sujo.

–O meu é Killian- Falei, piscando algumas vezes. Estava cansado e com sono... Não sei se poderia dizer muito mais que aquilo para ele.

–Sua amiga está bem- Ele mencionou antes mesmo que pudesse ou pensasse me manifestar sobre ela.

–Onde?- A frase saiu única e sem sentido. Uma abreviação simples de “onde ela está?”

–Eu não posso dizer- Cochichou, ainda mais baixo do que seu mínimo tom de voz- Mas ela está bem. Eu mesma fui vê-la. - Confessou, seus olhos verdes incertos e oscilantes, caminhando por uma dimensão, por entre algo que não via.

Suspirei... Um suspiro longo que fez meu peito chiar.

–Por que ele me quer aqui?- Indaguei, olhando com cautela para o menino.

–Ele quer crianças, Killian- Respondeu, olhando para as próprias mãos machucadas. Sim, podia ver os ferimentos na palma úmida e pegajosa, ver a dor desenhada por cada marca e estigma– Ele precisa delas.

–Para que? Para que ele precisa delas?-Tossi duas vezes seguidas, o peito produzindo um som rouco. A gripe certamente havia se apoderado de mim nesse curto espaço de tempo, seus efeitos me deixando num estado intenso de letargia.

O garoto deu um passo para trás, distando-se mais de mim e se aproximando com cautela da porta de madeira. Pensei que seu espanto seria tudo que conseguiria arrancar dele. Seu silêncio o único presente que me daria. O vazio a única marca que deixaria para trás.

Mas ele me deixou algo mais...

Uma palavra... Uma única palavra de despedida.

–Sangue- Cochichou o garoto antes de me deixar afogado na solidão novamente.

E mesmo cansado e tremendo, mesmo sozinho e muito doente, sem receber uma única frase clara e inteligível, sem receber uma carta formal escrita a pena ou um relato detalhado, mesmo sem tudo isso... Eu ainda pude entender o que ele quis dizer...

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Meu salvador e carcereiro... Ele... ele queria sangue...

E sangue sempre queria dizer morte.