Golpe de Estado

Inútil


Poderia ter levado apenas um segundo, mas certamente durara uma eternidade. Ou, pelo menos, tempo o suficiente para que um baque longínquo a chamasse de volta a razão, afastando-a do que quer que fosse aquele lugar mental onde se encontrava. E do físico também.

– Ah… - murmurou Sakura, baixinho, dando um passo para trás e afastando-se do jovem a sua frente, olhando ao redor em busca da origem do barulho - Você ouviu isso?

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– Hum… - confirmou Sasuke, num suspiro cansado, enquanto piscava um pouco mais demorado do que o natural e voltava o corpo à posição completamente ereta, tirando as mãos da cintura da garota. Ela o sentiu observá-la e concentrou todas as forças em não o encarar de volta. Não queria que ele percebesse como ela se sentia - Deve ter sido um dos lobos da Nana. Eles estão circulando a casa desde que ela apagou ontem…

Sakura acenou em concordância, mas manteve-se observando a orla da floresta. De fato, acreditava ser um lobo, ou outro bicho qualquer, a fonte do barulho. Mas agarrava-se a esse como seu salvador, sua fonte de sanidade, razão. Ela deu mais um passo, a fim de aumentar a distância até o Uchiha, e, torcendo para que esse não percebesse seu rosto em chamas, ou o constrangimento total em sua voz, obrigou-se a sorrir, fingindo que nada acontecera.

– Vou preparar o chá da Nana… - informou, tentando manter-se sóbria - Com sorte a febre some antes do almoço.

Ela ergueu o punho cerrado num sinal de torcida pela melhora da mulher e, dando meia volta, pôs-se de volta à cabana, quase correndo. Parte dela queria que o Uchiha a segurasse pelo braço e terminasse o que começara. Desse-lhe o beijo logo de uma vez! Eles ficaram tão próximos, afinal. Sakura chegou a sentir os lábios de Sasuke tocando seus próprios, fazendo o coração da menina bater tão forte que, com certeza, dava para ouvi-lo há quilômetros de distância. Ele podia simplesmente agir por instinto, impulso, sabe-se lá o que, e puxá-la para um beijo, tomando a decisão pelos dois, tirando dela sua parte da responsabilidade.

Mas um outro lado da jovem, o racional, sóbrio, são, agradecia imensamente que ele não o fizera. Passara os últimos meses num controle sobre si quase enlouquecedor, afastando-se do Uchiha todo o tempo, não dando brechas a nenhum de seus antigos sentimentos por ele, convencendo-se, diariamente, que ele não a queria, que ele não a merecia, que ela não o queria… Que ela não poderia querê-lo. Ele a fizera de idiota por anos, tentara matá-la, agira como um babaca, um estúpido. Não a merecia. Obviamente, estava feliz que Sasuke voltara a vila. Percebia no garoto seu esforço em compensar o que fizera, em recuperar a confiança perdida. Naruto o perdoara totalmente, como se ele jamais tivesse feito coisa alguma. Kakashi o tratava como um irmão que fez besteira e voltou com o rabinho entre as pernas. Mas ela, mesmo diante do empenho do companheiro, simplesmente não podia esquecer. E se o fizesse, se o perdoasse por tudo, entregasse-se a um amor incondicional, a sua dedicação passada, o que pensariam dela? Mais que isso, o que ela pensaria dela mesma? Como ela se encararia no espelho se tivesse beijado Sasuke mesmo depois de tudo que ele fizera? E então, de repente, ela percebeu: quase beijara Sasuke!

Uma pontada de dor na mão, decorrente de uma gota de água quente, trouxe Sakura de volta à realidade e a fez levar um susto quando se pegou coando o chá já pronto num bule qualquer. Sequer lembrava-se de ter entrado na cozinha, quanto mais de ter esquentado a água, lavado as lasquinhas de salgueiro, colocado-as para ferver… Mas tudo isso tinha pouca importância diante do que acabara de notar: quase beijara Uchiha Sasuke! Mais que isso: quase fora beijada por ele! Ela olhou para trás de supetão e não viu ninguém além dela mesma no cômodo. Ele não a seguira. Um misto de alívio e decepção atingiu a jovem, mas foi rapidamente descartado. Havia coisas mais urgentes para se preocupar. Só não sabia ao certo em qual delas se concentrar primeiro…

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– Sakura? - chamou uma voz vinda, só podia ser, na opinião de Sakura, do além - Sakura?

A menina olhou para cima, para baixo, para os lados, até encontrar, no trilho da porta de correr, seu sensei a encarando confuso. Ela o observou por um segundo e, quando esse indicou a chaleira que ela segurava, a jovem voltou-se à panela, constantando que coava o nada, já que o chá, antes presente ali, havia sido totalmente transferido para o bule. Levemente constrangida, Sakura colocou a chaleira de volta à pia, disfarçando a própria falta de atenção.

– Oi Kakashi-sensei… - começou ela, forçando um sorriso enquanto servia um pouco de chá em uma caneca qualquer encontrada na escorredeira - A Nana piorou?

– Ah… ela acordou, na verdade… - respondeu Kakashi, levemente mal humorado - Você está bem?

– Uhum - confirmou Sakura, segurando a caneca e, indo em direção ao quarto da mulher, acrescentou - Vou vê-la.

Sakura entrou no quarto de Nana segundos depois, sendo seguida por Kakashi. Ela caminhou em direção à mulher, que estava sentada com as costas enconstadas na parede, e, colocando a caneca com chá ao lado, começou a examiná-la. É nisso que você deve focar, Sakura!, pensou a garota enquanto media a febre de Nana. No seu trabalho! Na missão de levar Nana de volta à Konoha! Não no Sasuke! Não naquele cretino, idiota, ridículo, canalha…

– Eu achei que minha febre tinha passado - comentou Nana, encarando Sakura preocupada.

– Ãhn? - a garota levou um susto. Estava, novamente, longe dali. E, deveria ter deixado transparecer a raiva que sentia, porque Kakashi e Nana a encaravam como se estivessem se preparando para a pior notícia já dada. Entendendo a confusão, ela logo se apressou a falar - Ah, não, tá tudo certo. Sua febre baixou mesmo, Nana-san! Tome, beba isso!

A jovem entregou a caneca com chá para Nana e a observou tomar tudo num só gole. Foco!, pensou ela novamente quando recebeu a xícara vazia de volta e forçou um sorriso. Foco!

– Então, liberada? - perguntou Nana, sorrindo à garota. Sakura estranhou: não sabia que a kunoichi era capaz de sorrir.

– Ah… ainda não. Seria bom você ficar em repouso mais algumas horas… Até o almoço pelo menos. Sua febre baixou, mas não sumiu.

– E as compressas foram úteis, Sakura? - perguntou Kakashi, com um tom meio afetado. Sakura rapidamente percebeu o porquê: certamente Nana o pegara triscando nela e fizera drama. A menina riu e confirmou com um aceno que as compressas foram úteis. Não mentira, no fim das contas.

– Humph… - resmungou Nana.

– Bem, eu estarei lá fora se vocês…

– Sakura, você pode chamar o Naruto e o Sasuke aqui, por favor? Quero conversar com vocês… - pediu Kakashi, interrompendo Sakura de sua, agora, abortada tentativa de dar o fora. A jovem, novamente, confirmou com um aceno e levantou-se para obedecer.

Sabia que Naruto dormia na sala e, por isso, foi até ele primeiro. Planejava mandar o garoto chamar Sasuke em seu lugar, evitando, assim, um precoce encontro com o Uchiha. Por isso, ao encontrar o futon do companheiro vazio, teve vontade de quebrar a casa. Virou-se controlando a raiva, e caminhou em direção ao quintal, imaginando quando que Naruto saíra e aonde teria ido. Contudo, mal deixara a cozinha, viu na agora quase totalmente iluminada orla os cabelos amarelos do amigo refletirem os raios de Sol, que eram praticamente absorvidos pelo ônix dos cabelos de Sasuke, a sua frente. Pelo menos estavam juntos. Isso poupava trabalho.

– VOCÊS DOIS! - gritou a Sakura, chamando a atenção dos companheiros a metros de distância - O KAKASHI-SENSEI QUER FALAR COM A GENTE!

Os dois trocaram um olhar rápido antes de atenderam ao chamado. Sakura girou nos calcanhares e voltou para dentro da casa, a fim de evitar qualquer segundo a mais desnecessário com Sasuke. Além disso, não tinha certeza se conseguiria encarar o garoto. Agora que parara para pensar, constatou que ficara toda tímida e constrangida com o quase-beijo. Gostaria de ter tido outra atitude. Algo mais próximo do empurrar o Uchiha e jogar na cara dele algumas verdades.

A garota entrou no quarto de Nana e encontrou a kunoichi e Kakashi sentados exatamente do jeito que os deixara. Ela se curvou levemente e sentou-se a beira do futon, à frente do sensei. Esperou menos de meio minuto antes de Sasuke e Naruto chegarem e sentarem de modo que ela ficou entre os dois. Fitou o Uchiha de canto de olho, e ficou decepcionada ao perceber que a ignorava totalmente, mantendo os olhos fixos em Kakashi e Nana. Sakura balançou a cabeça discretamente, afastando o pensamento. Afinal, dane-se se Sasuke não ligava pra ela. Ela não ligava pra ele também.

– Tudo bem, Sakura-chan? - perguntou Naruto, sorrindo maliciosamente. Sakura acenou indicando que sim, mas não entendeu a pergunta. Contudo, não teve muito tempo para se dedicar a ela. Kakashi logo chamou a atenção para si.

– Vocês três são os ninjas que eu mais confio em Konoha, - começou o sensei, serio - por isso, acho justo compartilhar qualquer coisa que eu descubra com vocês primeiro.

Sakura preocupou-se. Sabia, obviamente, que algo errado estava acontecendo. Desde que Sasuke chegara com Nana no colo, Kakashi ficara estranhamente sério e pensativo. Algumas vezes, a jovem chegara a cogitar a hipótese do sensei estar recuperando antigos sentimentos por Nana, mas não dera muita atenção à própria teoria. Sentia que havia algo muito mais sério acontecendo.

– Alguém está preparando algo contra Konoha. Nana e eu achamos que pode ser um golpe de Estado…

Kakashi prosseguiu explicando cada detalhe do que ele achava estar acontecendo. Começou contando como a emboscada contra Nana o fizera pensar sobre uma possível conspiração, indicando que o fato de saberem da identidade da kunoichi era um evidência muito forte, que existiam muitos motivos para os conselheiros e a Raiz quererem Kakashi longe do poder e que a atual situação da vila era muito convidativa a um golpe. Sakura ouviu tudo calada e, ela não poderia negar, surpresa. Passara as últimas horas cuidando de Nana e não dedicara muito empenho a meditar sobre o que de fato poderia estar acontecendo. Claro, como discípula de Tsunade, tinha conhecimento sobre a real condição da vila. Sabia, por exemplo, que as fronteiras estavam praticamente abertas, e por isso a insegurança aumentara tanto. Mas não se preocupara com um ataque vindo de dentro de Konoha. Se concentrara nos que poderiam vir de fora.

– E o que nós faremos, Kakashi-sensei? Quero dizer, temos que começar avisando Tsunade-sama, claro… Mas como vamos descobrir o que está acontecendo realmente? - perguntou Sakura, nervosa, quando o ninja calou-se por um instante. Estranhamente, só ela o fez. Naruto e Sasuke permaneceram quietos, sem demonstrar surpresa alguma com as revelações, o que fez Sakura pensar que talvez tudo aquilo não fosse a eles tão novo quanto era para ela.

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– Eu acabei de enviar Ihai a Konoha - começou Nana, levantando-se com certa dificuldade e alongando-se brevemente - Ela contará a Tsunade o que sabemos. Quanto ao que vocês farão, bem… Não é mais comigo, né?

Dito isso, Nana simplesmente passou reto por Sakura e pelos garotos e saiu do quarto, deixando o time sete a sós. A jovem a acompanhou com o olhar por um instante e a viu entrar no quarto da filha, cuja porta dava para o da própria Nana. Quando a mulher sumiu de vista, a Haruno voltou-se ao próprio time, que já começara a discutir o possível golpe.

– ...nós temos a vantagem de que eles não sabem que sabemos - argumentou Naruto, surpreendendo Sakura pela análise correta que fizera. Certamente, Naruto era forte. Mas inteligência não era, definitivamente, seu ponto de destaque.

– Mas não temos certeza do que sabemos, Naruto - contrapôs Sasuke, racional - Talvez, Nana simplesmente tenha deixado a identidade dela vazar de alguma forma…

– Ela não deixou, Sasuke - cortou Kakashi - Você sabe.

– E por que a Nana não vai voltar com a gente? - perguntou Naruto, agitado - Ela não é nossa missão, no fim das contas?

Kakashi suspirou e Sakura notou o cansaço atrás dos olhos do sensei. Quando ele voltou a falar, sua voz acabou por demonstrar ainda mais a exaustão do ninja:

– Bem, deixaremos a missão para trás, Naruto… Há coisas mais urgentes. Nana não é uma delas…

A resposta pareceu convencer Naruto, já que ele rapidamente voltou ao assunto do possível golpe. Sakura, por sua vez, nada falava. A cada segundo que passava, tinha mais e mais certeza de que todos já sabiam da conspiração e não dividiram com ela. Isso, associado ao cansaço por cuidar de Nana e ao recém acontecimento do quase-beijo com Sasuke a fez atingir seu limite. Sendo assim, só viu a garota duas opções: explodir com todos ali, ou levantar-se e deixá-los sozinhos, uma vez que não fazia muita diferença mesmo. Ela optou pela última.

– Sakura-chan? - espantou-se Naruto quando viu a companheira levantar-se de repente e caminhar em direção à porta - Onde tá indo?

– Arrumar as coisas pra voltarmos para Konoha - respondeu Sakura, seca - Se a Nana não vai voltar, suponho que partiremos hoje ainda, certo?

– Mas… - começou Naruto, confuso - Mas nós estamos discutindo algo sério aqui!

– Vocês discutiram até agora sem mim, tenho certeza de que podem continuar. Minha opinião não fará muita diferença, né?

E então Sakura saiu do quarto, levando consigo o sentimento mais constante que tinha fazendo parte do time sete: o de inutilidade.