John empurrou a porta devagar, e não havia ninguém lá. A luz que tinha visto do corredor vinha da tela de um computador, em cima da cama desarrumada. Mais uma vez vencido pela curiosidade, John caminhou até o notebook e encarou a tela, e se surpreendeu com o que viu.

“Através dos seus sonhos, sonhar com pessoas desconhecidas poderão simbolizar também um outro lado de você que não conhece ou mesmo não quer assumir. Isto varia bastante conforme elementos que tiver. Se tiver pessoas desconhecidas que lhe conhecem no sonho, você terá amigos duradouros. Se for traído por um destes amigos que você não conhece no sonho, terá desilusões amorosas, porém é claro que os significados deverão ser levados em conta com outros vários fatores diferenciados.”, dizia a página.

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Fosse lá quem tivesse procurado por aquilo, estava com o mesmo problema de John. A setinha do mouse estava em cima do ícone para fechá-la, o que poderia significar que a pessoa que procurara não tinha gostado muito do que tinha lido.

Havia outra guia aberta: A Ciência da Dedução. John clicou, e viu que era um blog, escrito por Sherlock Holmes.

“Eu sou Sherlock Holmes, o único detetive consultor do mundo.

Eu não vou entrar em detalhes sobre como eu faço o que faço, porque as chances são de que você não entenda. Se você tem um problema que você quer que eu resolva, entre em contato comigo. Apenas casos interessantes, por favor.

Isto é o que eu faço:
1. Observo tudo.
2. Pelo o que eu observo, eu deduzo tudo.
3. Quando eu tiver eliminado o impossível, aquilo que permanece, não importa o quão louco que possa parecer, deve ser a verdade.

Se precisar de ajuda, entre em contato comigo e vamos discutir o seu potencial.”

John riu. Quanto mais conhecia sobre Sherlock, mais tinha certeza de que o sonho não era só um sonho.

–- Me diga que você não escreveu sobre “Análise de cinzas de tabaco”... – John disse a si mesmo, rindo, mas hesitou. As palavras tinham saído de sua boca, sem saber o significado delas, e nem ter se dado conta disso.

Confuso, resolveu sair do quarto, e descer, para se despedir de Mrs. Hudson.

–- E então, vai ficar?

–- Assim que eu pegar minhas coisas, venho pra cá. – ele sorriu, ainda atordoado.

–- Não vai esperar Sherlock chegar? Eu queria tanto que vocês se conhecessem... É tão importante...

John a fitou. Quarta pessoa que considerava de suma importância John conhecer Sherlock. Havia algo muito errado.

–- Hã, eu gostaria muito, mas... Não vai dar. Amanhã eu passo aqui, com certeza vamos nos ver.

Mrs. Hudson fez beicinho, mas assentiu com a cabeça.

–- Então até amanhã, querido! – ela deu um beijo no topo da cabeça de John, e fechou a porta.

Se perguntando onde iria achar um táxi por ali, John caminhou um pouco, até chegar à uma rua mais movimentada. Fazendo sinal para um deles, entrou e indicou o endereço do hotel, onde passaria sua última noite sozinho.

John se preparava para dormir, mas antes, resolveu postar alguma coisa no blog. Ficou encarando a tela por um bom tempo, mas não conseguia organizar todos os pensamentos que passavam por sua cabeça.

Frustrado, resolveu desligar o computador e fechar os olhos para dormir. E como se tivesse se teletransportado, acordou em uma outra versão do quarto de hotel, onde, uma mulher vestida em um vestido branco social, com os cabelos presos em um delicado penteado à moda antiga, aguardava sentada em cima do criado mudo.

–- Eu estou sonhando? – John sentou-se na cama, assustado.

A mulher se virou para encará-lo.

–- Olá, John! Sim, é um sonho. Não se preocupe, é só um aviso. Daqui a pouco poderá ver a face de seu amado...

Mesmo não tendo citado nomes, John sabia exatamente de quem a mulher estava falando.

–- Ele não é meu am... – John suspirou. – Quem é você?

A mulher riu.

–- Um dia você saberá, e vai me odiar. – ela sorriu, com arrogância. – Pode me chamar de Dominatrix... Agora vamos ao que interessa. – ela se levantou e começou a caminhar pelo quarto. – Acredito que já tenha ouvido falar em “teoria do caos”?

John tentou pensar em alguma coisa útil sobre o assunto, mas nada lhe vinha à cabeça.

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–- Basicamente, a ideia central da tese é que pequenas alterações numa situação trazem efeitos incomensuráveis.

–- E o que eu tenho a ver com isso?

A mulher riu novamente.

–- Oh, você não faz a mínima ideia?

John deu de ombros.

–- Certos acontecimentos são um ponto fixo no tempo. Se, por qualquer circunstância, isso não ocorrer, pode mudar todo o rumo do espaço-tempo. E foi o que aconteceu com você, John.

–- Algo fixo no tempo que deixou de acontecer por minha culpa?

–- Não. Por culpa de Mike Stamford. – vendo que John queria protestar, Dominatrix levantou um dedo para calá-lo. – Obviamente, não no sentido carregado de paixões... O que eu digo é que, se Mike não tivesse sofrido aquele acidente, nada disso estaria acontecendo.

–- Nada disso o que? E como pode dizer algo assim? Foi uma fatalidade!

–- Fatalidade essa que pode alterar todo o curso do Universo.

John passou as mãos pelo rosto, completamente atônito.

–- Mas o que de tão importante ia acontecer se Mike não tivesse sofrido o acidente?

Dominatrix suspirou.

–- Vocês se falaram quando chegou em Londres. Ele ia lhe indicar uma espécie de “pensão”. Ia lhe apresentar seu flatmate.

–- Flatmate?

–- Mike iria levá-lo ao laboratório de St. Barts, e lá você conheceria Sherlock Holmes.

A respiração de John falhou por um segundo.

–- C-como disse?

–- Mas no meio caminho – a mulher prosseguiu, ignorando John. –, ele sofreu o acidente. Não falou com você depois disso, como deveria ter feito. Não levou-lhe à lugar algum, e muito menos, lhe apresentou alguém. O ponto fixo não ocorreu.

–- Mas se é fixo, como pode simplesmente não ter ocorrido?

Dominatrix ajeitou-se no criado mudo novamente.

–- Uma pergunta pertinente... Sabe, John... Quando algo na natureza ocorre fora de seu curso natural, estipulado desde a grande explosão, ela vai tentar consertar isso.

John ouvia com atenção.

–- O Universo vai restaurar seu equilíbrio. No seu caso, está usando a ferramenta do sonho. Faz todos os que seriam envolvidos com tudo isso depois que se conhecessem, sonhem com o que deveria acontecer. E está acontecendo, sim, mas em um universo paralelo. O que você vê, você já viveu. São ecos do seu passado, que constituem e revelam seu futuro.

John coçou a cabeça, claramente confuso e surpreso com toda a situação.

–- Meu futuro é com Sherlock Holmes?

Dominatrix passou um dos dedos sobre a boca, simulando um zíper.

–- Mas espere. Por ser um ponto fixo, as circunstâncias também já estão estipuladas, não?

–- Não... Entenda, John – Dominatrix sorriu. –, os métodos realmente não importam. O que importa é o final. É normal ficar confuso com isso, relaxe. Os fins justificarão os meios.

John arqueou as sobrancelhas.

–- Dominatrix?

–- Hm?

–- Por que eu iria odiar você?

Dominatrix sorriu amarelo.

–- Detesto spoilers. Descubra e verá.

–- Mas eu vou me lembrar disso?

O sonho já estava se desfazendo, e John acordou de volta em sua cama real, sem a resposta para sua pergunta.