A Day Like Any Other

Capítulo 1


Um Dia Como Outro Qualquer

O telefone tocava sem parar e eu podia ouvir as buzinas caóticas atravessarem a janela. Nem mesmo a água quente escorrendo pelos meus cabelos podia me levar para longe da realidade.

O vento soprava forte e a poluição pairava sobre a cidade. Nada diferente de de ontem ou de outro dia qualquer. As mesmas coisas pra fazer e os mesmos rostos para ver.

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A luz de alerta da secretaria eletrônica piscava. Cheia de novo. Há tempos eu perdera o hábito de ouvir, agora simplesmente apagava os recados sem me dar ao trabalho de checá-los. Isto enlouquecia minha mãe. Afinal, como proteger a inocente garotinha que abandonou o lar para se aventurar em outro país?

Atravessei correndo o apartamento enquanto secava os cabelos, jogando tudo o que encontrava dentro da bolsa. Precisava sair daquele lugar. Tomei coragem e fui enfrentar o frio lá fora.

Andei a passos lentos encarando as vitrines sem graça, as pessoas sem expressões, a paisagem cinza, em busca de qualquer coisa que me ajudasse a escrever. Devo ter andando sem rumo por algum tempo e quando me dei conta estava enfrente a minha cafeteria favorita. Acho que era o meu subconsciente me avisando que ali seria o único lugar onde eu conseguiria repor minha dose de cafeina e ainda terminar a crônica dessa quinzena.

Logo que entrei fui invadida pelo calor, aconchego e risos que sempre fizeram parte daquela Starbucks.

Escondida na última mesa, eu podia ver tudo. Era minha pequena fonte de inspiração. Tantas pessoas e histórias diferentes. Eu só olhava e escrevia. Era embriagante.

Presa no meu mundo de palavras, pude sentir que era observada e sorri de canto. Já sabia quem era. Foi só levantar os olhos e voilá, lá estava ele. O case encostado na cadeira, talvez de um violão. O caderno escondia parte do seu rosto, o cabelo preto, um pouco comprido, lhe caia nos olhos. Olhava fixamente pra mim. Meu motivo particular de vir ali quase toda semana. Escondeu-se atrás do caderno novamente. Era sempre assim, ele me olhando e eu olhando de volta, por horas. Como se conversássemos silenciosamente.

Ele devia ser o cara mais estranho e fofo que eu já tinha visto na vida. A combinação perfeita de serial killer com um sorriso que ficava entre infantil e debochado com um “quê” de mau-humor. Agia como se o mundo fosse uma grande piada para ele. Tinha a pele pálida, com algumas tatuagens. Estava sempre sozinho e nunca conversava com ninguém. Era meu livro de histórias secretas, aquelas que você esconde de todos. Eu apenas ficava lá, o encarando e inventando algo sobre o seu sotaque ou sobre sua bebida favorita. Um hobby doentio.

Meu café havia acabado, então me levantei e fui pedir qualquer outra coisa com cafeina. Nesse meio tempo em que me decidia se pedia algo para comer ou não, ele simplesmente sumiu. Ainda de pé e com o café na mão, me apoiei no balcão e comecei a examinar cada canto da Starbucks procurando-o.

– Sabia que é feio espiar os outros?

Pude sentir seu riso e respiração na minha nuca. Prendi o fôlego instantaneamente e no segundo seguinte havia café em toda parte, na minha calça, no chão e na camisa dele.

– Desculpe, não queria assusta-la – disse enquanto tentava inutilmente limpar a roupa.

– Não assustou – Nada mais que um sussurro. Eu pisquei aérea, ele riu de mim.

– Claro, claro. – respondeu enquanto revirava os olhos e me arrastava de volta a mesa. A MINHA mesa. Eu tinha acertado, ele era mesmo irônico.

– Preciso de outro café – ele apenas me ignorou e continuou andando. As coisas dele também estavam lá agora, junto com as minhas.

Acho que ficamos nos encarando por alguns minutos, tenho a vaga lembrança dele falando sem parar, sobre me pagar outro café talvez e quase certeza de que respondi algo, mas eu estava desligada demais pra prestar atenção em alguma coisa.

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– Você tem sérios problemas – consegui dizer depois que voltei à realidade – e desculpe pela camisa.

– Você fica aqui por horas observando os outros e murmurando coisas sem nexo sobre os efeitos da cafeina em você e eu é que tenho problemas? – Ruborizei e fingi estar distraida com a recente mancha na minha calça. Então foi isso o que eu havia respondido.

– Eu não sou a unica que fica olhando por cima do caderno – arqueei a sobrancelha.

Ele tinha cheiro de marlboro e vodka. Era bom.

– Touché – sorriu de lado – e o nome da senhorita é?

– Te falo o meu se me falar o seu – ele não me parecia ser o tipo confiável. Talvez o misterioso.

– Sasuke – encarou como se estivesse me desvendando.

Sakura...

– Faz jus ao nome – riu indicando meu cabelo e me fazendo corar pela segunda vez – então posso saber por que fica ai bancando a espiã? Vigiando e escrevendo?

– E eu posso saber por que fica me encarando a cada 5 minutos? – ele era mais bonito ainda de perto, e a sua voz era envolvente, assim como o seu cheiro e tudo mais. A sua presença era envolvente. E sedutora.

– É justo, mas como eu perguntei primeiro acho que deveria...

– ...responder primeiro – eu o interrompi rindo.

– Então você é a esperta? Tentando passar a perna nos outros? –Sasuke acusou fazendo bico. Ele era inglês. E tinha o sotaque carregado.

– Faz parte do charme – dei de ombros. E sem ao menos perceber eu já estava flertando. O que geralmente não era normal, pelo menos não tão rápido assim.

– Então ele funciona – piscou. Eu ruborizei. Terceira vez.

– Você poderia parar com isso – falei sem pensar.

– Não gosta de elogios? – Provocou.

– Não quando me fazem corar – Sasuke riu.

– Pois devia gostar Sakura, fica mais bonita ainda quando cora – Meu nome saiu cantado da sua boca. Ele riu mais ainda, como se me achasse a piada mais cômica do momento. E o pior é que eu era.

– Eu sou escritora– atirei depressa, ele assustou com a mudança rápida de assunto – é por isso que venho aqui e tudo o mais. É como se eu pudesse participar da vida de todos que eu vejo. Como viver milhares de vidas diferentes.

– Você respondeu primeiro – e ele não parava de se divertir as minhas custas. Nesse momento eu percebi que Sasuke adorava sorrir, na verdade fazia isso o tempo todo. E tinha um sorriso lindo. Olhava-me como uma criança que tinha acabado de ganhar o melhor doce da loja.

– Sua vez – eu disse emburrada. E adivinhem: ele riu!

– Você me intriga – minha vez de me assustar. Ele mantinha os olhos fixos em um ponto qualquer da mesa – não sei por que, mas desde que te vi você meio que me fascinou. Sempre sozinha e atenta até as partículas de poeira do lugar. Sei que é besteira, mas eu meio que gosto de te observar, é interessante.

– Está me fazendo sentir como se eu fosse um projeto de ciências – eu ri nervosa – acho que fico te encarando pelos mesmos motivos.

– Considere-se meu projeto de ciências favorito então.

– Isso foi outro elogio? – sorri de canto.

– Foi, e dessa vez você nem corou – tirou sarro de mim – é uma pena.

– É músico? – mudei de assunto de novo.

– Só nas horas vagas. Guitarrista, para ser mais exato – seus olhos meio que brilharam quando olhou pro instrumento – é isso que eu fico fazendo – levantou o caderno – compondo.

– Nice! – eu já estava envolvida por ele. Sasuke era o tipo fácil de gostar. Alto, forte, bonito e simpático. Perigoso. – E o que você faz nas horas não vagas Sasuke?

Espio lindas mulheres em cafeterias e trabalho em um escritório de advocacia. – Sempre galanteador. Foi impossível conter o suspiro e minhas bochechas se aqueceram. De novo.Se quiser me ouvir algum dia, é só falar – disse enquanto afundava a mão esquerda nos cabelos. – Inclusive, adorei a forma como disse meu nome Sakura. Você é francesa?

Senti meus olhos se arregalando levemente. Tudo nele vinha assim. Súbito e espontâneo. E me deixava desconcertada.

– Japonesa. Porém cresci em Paris, minha mãe é de lá. – me inclinei sobre a mesa. – E sobre te ouvir tocar... Isso é um convite?

– Vai ter que descobrir – ele se inclinou também. Eu podia sentir sua respiração contra meu rosto. Os olhos cor de ônix eram sufocantes.

Eu estava pronta pra aceitar o convite e quem sabe algo mais quando meu celular tocou. Um lembrete que eu havia colocado mais cedo. Algo para não me esquecer de mandar o texto ainda hoje à revista. Eu quis jogar meu celular pela janela, mas agora não faria muita diferença.

– Desculpe, tenho que ir – mordi o canto da boca, visivelmente chateada. Afundei-me na cadeira.

– Posso te ver de novo? – ele se afastou decepcionado.

Sorri, e sem que ele ao menos entendesse, eu peguei seu caderno e anotei meu número.

– Agora sabe como me encontrar – levantei, coloquei o dinheiro em cima da mesa e me dirigi a saída lentamente, ainda querendo me chutar por ter colocado aquele alarme estúpido.

Já tinha atravessado a rua quando ouvi alguém me gritar. Olhei para trás e lá estava ele, correndo na minha direção com um copo de café.

– Eu ainda te devo um – colocou o copo na minha mão e me deu um beijo no rosto. Senti minha pele formigar.

Agradeci, me virei e voltei a andar. Quando olhei para minha mão, vi que havia algo escrito no copo: “Para a garota mais bonita que eu vi na vida”

Estaquei onde eu estava, apenas encarando aquele pequeno recado. E antes que eu pudesse mudar de ideia, me virei e corri na direção de Sasuke, que ainda estava parado no mesmo lugar. Simplesmente me atirei nele e o beijei.

Para minha surpresa, ao invés de me afastar, ele me puxou para si e passou os braços em volta de mim. Aninhei-me contra ele e fiquei no seu aperto forte o quanto pude. Seus lábios eram duros e macios ao mesmo tempo. Exigindo tudo o que minha boca podia lhe dar. Sasuke me abraçava ainda mais apertado e sua respiração invadia minha boca. Meu celular tocou mais uma vez.

– Eu realmente preciso ir. – sussurrei em seu ouvido enquanto me afastava sem folego – Me liga.

– Ahanm... – respondeu automaticamente, como quem não sabe o que está acontecendo.

Dei-lhe as costas e fui embora, deixando para trás um moreno totalmente confuso e surpreso. Já eu carregava um sorriso ofuscante e um olhar diferente.

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As vitrines não eram mais sem graça e a paisagem tinha cores lindas agora. A cidade tinha vida. Não apenas por causa de um cara, mas pelo fato de eu ter feito algo espontâneo e por vontade própria, coisa que não fazia já havia tempo.

Enrolei um pouco para chegar em casa, mas assim que entrei a secretaria já piscava anunciando uma nova mensagem. E para a minha própria surpresa em vez de apagar, coloquei para ouvir.

Hey, é o Sasuke, o cara do café – ri como uma boba – não sei se ainda quer me ver, mas eu ainda quero te ver de novo – ele parecia deslocado, sem saber o que dizer – bom, eu vou estar na Starbucks amanhã, as 15hrs, te esperando... É, é isso. A gente se vê, eu acho.

Joguei minha bolsa no sofá, tirei as botas, caminhei em direção ao computador. Ainda tinha trabalho para fazer.

E enquanto meus pés tocavam o chão frio, eu tive certeza de que nunca mais viveria um dia como outro qualquer.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.