República

Uma nova manhã.


Gina abriu os olhos e não reconheceu o ambiente em que estava. O quarto estava escuro, pois a janela ainda fechada não permitia a entrada do sol da manhã, que já havia raiado. Para piorar, sua pouca visibilidade tornava-se turva pela estrondosa enxaqueca que lhe atingia.
Sua cabeça estava péssima. Seu estômago, pior.
Ela piscou os olhos diversas vezes, resolveu tentar se levantar e verificar onde estava. Ao tentar apoiar a mão no colchão que percebeu estar, sentiu tocar o braço de alguém. Um breve, porém forte, frio lhe correu a espinha. Ela paralisou-se assustada.
“Meu Deus. O que foi que eu fiz?!” Era a única coisa que sua mente se questionava. Tinha medo de descobrir a resposta.
Retirou a mão do braço e resolveu tentar se lembrar de alguma coisa. Precisava se lembrar de alguma coisa. Deito-se rígida novamente onde estava e olhou para cima, tentando vasculhar a memória. Lembrou-se de estar na festa e logo após ter saído de lá ao ver Ferdinando beijar Maia. A lembrança lhe deu um aperto no peito e até mesmo náuseas. Ela não estava bem.
Após, isso, as demais lembranças começaram a voltar, ainda que de forma bagunçada e pouco clara, à sua mente. Ela constatou: Estava no quarto de Nando. E aquele braço, era dele.
– Nando?! – Ela chamou com a voz fraca, que transparecia seu mal estar.
No escuro do quarto, ao ouvi-la chamar, Nando acordou de imediato. Sua mente, embora ele estivesse dormindo, havia lhe deixado em alerta, por saber que Gina não estava muito bem.
– Bom dia menininha... – Ele se virou para ela, tateando no escuro seu rosto, e em seguida a acariciando. “Sua voz da manhã” Gina se derreteu ao lembrar-se de como era bela.
Ele se virou para o outro lado, e habilmente acendeu o abajur. Virou-se de volta para ela, voltando à mão para seu rosto, que mostrava a quão debilitada ela estava.
– Bom dia Nando. – Ela disse segurando a mão que lhe acariciava. Seu olhar era de apreensão. – Nando... porque eu dormi aqui? – Ele precisava mesmo saber.
– Ora essa Gina, apenas porque estava cansada demais para ir pro seu quarto. Você não se lembra do que houve ontem à noite?! – Ele estava com receio de que ela não se lembrasse, mas soou compreensivo. Afinal, já havia tomado seu primeiro “porre”, e tido sua primeira ressaca. Sabia muito bem como ela estava.
– Lembrar eu me lembro de algumas coisas... – A voz dela era tímida. – Mas não sei se de tudo.
– Você lembra que te disse o quanto lhe gosto? – Ele deu um sorriso doce.
Eles estavam deitados um de frente para o outro, com uma das mãos entrelaçadas, e vê-lo assim, se declarando sem pestanejar fez Gina se sentir feliz de certo modo... Mas a fez ter ainda mais medo do que podia ter acontecido na noite anterior.
– Dessa parte eu lembro sim Nando – Ela disse um tanto desconfortável abaixando os olhos por vergonha – Lembro também que nos beijamos... – Suas bochechas tornaram-se tomates.
“Nos beijamos” Para Nando isto soava como uma doce confissão. Ela havia aceitado seu beijo, e compartilhado aquele momento com ele, conscientemente.
– Mas é só o que eu lembro Nando... Teve algo a mais?! – Ela levantou os olhos, e ele viu o receio e medo estampados em seu olhar.
– E o que a mais poderia ter acontecido menininha?! – Ele sabia no que ela estava pensando. Mas gostava de vê-la sem graça, assim, de bochechas rubras, ficava adoravelmente bela.
– Ara Nando, o que mais pode acontecer depois de um beijo?! – Ela soltou com a voz fraca, mas acompanhada do claro desespero em saber.
– Ora Gina... Você admite a existência de tais possibilidades? –Ele a provocava com um riso de brincadeira.
– Nando, fala logo. Aconteceu alguma coisa?! – Céus. Ela precisava saber.
– Fique tranquila minha cara. Eu nunca me aproveitaria de seu estado de ontem. – Ele disse acariciando-lhe os cabelos agora. – Acha que eu faria uma coisa dessas? – Ele indagou curioso.
O olhar deles era recíproco. Aquela era uma conversa doce. Íntima. Carinhosa.
–Não... Se tem uma coisa que me lembro, é que disse que confiava em você. – Ela disse sorrindo de leve.
– E você disse sendo sincera, ou por que... Estava meio... Enfim...? – Ele queria ouvir a confirmação, daquilo que o fizera tão feliz na noite passada.
–Não Nando. –Ela pegou a mão que ele usava para acariciar-lhe o cabelo e levou de volta à própria face. – Eu confio mesmo em você.
O sorriso que ele deu poderia competir com o de um anjo. Nando venceria.
– Você não sabe como fico feliz em ouvir isso Gina. – Ele levou a mão dela aos lábios, e deu um leve beijo.
Gina estava se sentindo maravilhosamente segura ali. Sua alma estava plena e leve.
Infelizmente, seu corpo não gozava de tais sensações.
Gina abaixou novamente o olhar. Soltou a mão que estava com Ferdinando, levando-a para a cabeça, que agora sentia uma forte pontada. Nando viu a palidez tomar conta das bochechas dela outrora rubras.
– Gina, o que foi?! – Ele perguntou assustado. Apoiando-se pelos cotovelos.
– Nando eu não me sinto bem... – Ela dizia em um tom de voz que o deixava ainda mais preocupado. – Minha cabeça está latejando de dor, e tudo aqui (disse colocando a mão no estomago) está bagunçado...
Nando riu inocentemente. Na verdade, ria encantado com a pureza de Gina, só agora, descobrindo os efeitos devastadores de uma ressaca.
– Ora menininha, é isso que acontece quando se bebe do jeito que você bebeu ontem, além da conta. – Ele assumira um tom crítico. Ainda mais ao se lembrar na companhia de quem ela havia bebido.
– O que eu faço agora? – Sua voz era manhosa. “Encantadoramente manhosa” qualificava Nando.
– Bom, antes de qualquer coisa, a senhorita precisa tomar um banho de água morna. Depois tomar um belo de um café, mas nada de omelete mocinha, tome leite, coma frutas, essas coisas.
– E desde quando o senhor é médico para falar com tanta pose? Doutor ENGENHEIRO. – Ela enfatizava rindo de leve, ironicamente.
Estava mal... Mas ainda era Gina.
– Não sou médico minha cara. Sou experiente! – Ele a olhou maliciosamente ao proferir o adjetivo.
Ele piscou.
Ela sorriu.
– Bom. – Ela disse voltando a ter a voz embargada pela dor. – Acho melhor começar o tratamento.
Ela se levantou com a ajuda dele, segurando em suas mãos. Ele a observou, ainda com a roupa da festa, e não pôde deixar de fazê-la saber:
– Gina, você estava linda demais noite passada... Eu precisava lhe dizer. – Aliviou-se.
Gina ainda segurava as mãos do engenheiro. E ficou novamente corada, com o elogio. Sentiu-se na obrigação de também dizer a verdade:
– Você também Nando. – Ela sorriu.
Agora, ele havia corado.
Ambos olharam timidamente para o chão, sorrindo pelos elogios trocados. Gina, então, percebeu estar sem suas sandálias.
– Nando, você viu onde coloque minhas sandálias?! – Ela questionou curiosa.
– Não minha cara, quando a trouxe pra cá você já estava sem. – Ele riu da contínua falta de memória dela. – Logo você as encontra em algum canto da casa.
Ela consentiu com a cabeça, e seguiu para o banheiro, torcendo para que ninguém a visse sair do quarto de Nando.
Entretanto, assim que saiu, viu um belo par de olhos azuis a fitando, com duas sandálias penduradas nos dedos.

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[...]
– Juliana, eu já te disse que não houve nada! Eu dormi lá por praticidade, nada além. – Gina não era nada convincente.
– Ah sim, e você e o Ferdinando nem conversaram durante a noite toda, depois que ele subiu as escadas lhe levando no colo? – Juliana queria saber.
– Ele fez isso?! - Gina levou às mãos a boca e riu com a atitude fofa do rapaz.
– Fez sim... Ora Gina, sou eu sua amiga, pare de cerimônia e me conte logo! – Juliana precisava saber.
Gina se sentia culpada por mentir. E também, queria uma posição amiga sobre o que faria agora, que Ferdinando havia lhe confessado sua paixão. Era tudo muito novo para ela.
– Ara Juliana! Está certo... – Ela contou a amiga tudo que acontecera a noite passada. Ao menos o que se lembrava. – [...] e então, eu fui tomar banho, e agora estou com aqui com você no meu quarto. Satisfeita professora?!
– Aiii Gina, ele foi um cavalheiro. – Juliana ria boba para a amiga – E agora vocês vão namorar?!
– Ah Juliana, é isso que eu não sei. Eu não sei se gosto do Ferdinando tanto assim...
– Tanto assim?! Ora essa Gina... Você está me confessando, então, que gosta dele?! – Juliana sorriu ao terminar a constatação.
– Gostando eu to sim Juliana, aqueles três beijos me fizeram começar a gostar de coisas nele... Até do jeito dele ás vezes. – Ela confessava penteando lentamente o cabelo.
– TRÊS beijos?! – Juliana se levantou da cama – Ora essa Gina, eu só sei de dois! Quando foi o segundo?!
“Ops”.
– Ah... então Juliana...Sabe o dia em que a panela pego fogo?! – Gina dizia torcendo os dedos pela confissão de culpa. – Nós não estávamos prestando muita atenção não. – Gina deu um leve riso de deboche.
– Ora essa! Vocês dois estão me saindo melhor que a encomenda, hem?! – Juliana repreendia a amiga brincando, levando as mãos à cintura.
As duas riram como cúmplices. Ao final dos risos, Juliana contemplou a amiga já com pensamentos distantes.
– Mas e agora Gina... Você já sabe o que fazer?
– Pior que não Juliana, nem sei como vou tratar ele agora no café. Minha cabeça roda cheia de dúvidas. Eu nunca planejei algo assim.
– As melhores coisas da vida Gina, às vezes não são planejadas. – Juliana a aconselhou, sentando novamente ao seu lado na cama, tomando-lhe as mãos. – Minha amiga, se você gosta do Ferdinando, deveria se permitir conhecê-lo melhor.
– Como assim Juliana? – Gina queria entender o conselho da amiga.
– Ora, você gosta dele e ele, pelo que você me disse, está apaixonado por você. Não disse que lhe ama. Então, se vocês se permitirem sei lá... “ficar” alguns dias, poderiam descobrir se vale a pena tentar algo mais sério ou não. Ninguém vai sair ferido, já que nenhum dos dois está de fato amando.
Gina a olhava, estagnada. Não havia pensado que o apaixonado era diferente do amando. Por um momento, bem no fundo, até sentiu-se um pouco triste com a constatação da amiga quanto aos sentimentos do engenheiro. Mas resolveu guardar para si a sensação.
– Será que ele vai querer isso Juliana?!
– Ora Gina, isso só ele pode te dizer. – A amiga era sincera. – Chame-o para uma conversa adulta, depois do café, e vocês resolverão isso de uma vez. – O sorriso de Juliana era inspirador.
– Tá certo. Obrigada amiga. – Gina abraçou Juliana, que se surpreendeu com o adjetivo e com a atitude da amiga.
“Vejo que o Ferdinando já está ensinando para ela o quanto carinho é bom!“ Juliana pensou sorrindo, durante o terno abraço que recebia da amiga.

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