Shiver

You Can Own This Day


O jazz suave escolhido por Luka escorria pelo lugar de luz erma. Todos lá dentro pareciam ter deixado as preocupações na porta, o que incluía Miku.

Sentia-se bem, completamente a favor do casamento de sua mãe, mesmo que no momento, fosse a última coisa que passasse em sua cabeça.

Escorava seu ombro em Rin, ambas sentadas no sofá carmim. Puxou o tornozelo mais para perto, tendo cuidado com a saia do vestido. Desarmou o fecho do salto, o tirando devagar e o colocando no chão, repetindo o processo com o outro pé.

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A loura ao seu lado estava com os olhos fechados e cabeça recostada no sofá, mas estava bem acordada. Seus pés balançavam suavemente ao som da música, junto a cabeça.

Miku se levantou, carregando os sapatos para um lugar onde ninguém pudesse tropeçar neles.

Encostou-os a parede próxima a varanda, coincidentemente onde Kaito estava. Tinha tido a consideração pelos outros de se ausentar para um ambiente aberto onde pudesse aproveitar seu Marlboro sabor menta.

Sua mente mal teve o tempo necessário para processar a informação, pois seu lobo a impulsionou para frente, abrindo a porta de correr e passando para fora, fechando-a logo a seguir.

Kaito recostava os cotovelos na mureta de pedra que servia de proteção, enquanto não parecia nada preocupado com a presença dela ali. Tinha sua atenção voltada para outra coisa.

Não tinha muito o que dizer. No final das contas, era culpa da criatura com quem dividia um corpo estar ali agora, e sua vontade era de sair dali como se nada tivesse acontecido. Mas ao invés disso, decidiu levar as coisas com um pouco mais de maturidade.

– Algum problema? – Miku esperou alguns instantes antes que começasse a se aproximar devagar.

Kaito não respondeu. Na verdade, mal parecia ter notado que ela estava ali.

Ela andou mais alguns passos curtos na sua direção, tentando ver se ele só a estava ignorando. Não era o que parecia.

Deitou as mãos sobre o balaústre de um marfim fadado, espichando um pouco o pescoço para ver o que o mantinha tão distraído. As pálpebras estavam abaixadas e ele respirava devagar, como se tentasse fazer silêncio.

– É mais fácil ouvir com os outros sentidos desligados. – sua voz saiu calma e baixa, e seus olhos se abriram. Olhou na sua direção, o que fez Miku desviar o olhar instantaneamente.

– E o que queria ouvir?

Kaito abaixou o rosto para a rua, como se apontasse a resposta. Do outro lado, Miku conseguiu ver o mesmo casal fumante de mais cedo, os dois ainda parecendo bastante curiosos a respeito do que acontecia no apartamento.

– Nunca é bom deixar que cheguem perto demais, Miku. – Kaito falou, proferindo um olhar cortante como uma navalha para os dois. – Lembre-se disso.

Miku olhou para o casal mais uma vez, antes de assentir quietamente.

A calmaria reinou novamente entre os dois, e Miku inflou as bochechas com ar, incomodada. Queria parecer interessante e agradável, e provavelmente estava sendo apenas tediosa. Sentiu suas sobrancelhas se franzindo ao olhar para baixo. Porque se importava tanto de qualquer maneira?

– Tudo bem? – a voz de Kaito a acordou de seus devaneios, fazendo com que ela olhasse em sua direção. – Você está fazendo caretas há um tempo.

Sentiu seu rosto queimar em vergonha. E se tivesse dito algo em voz alta sem perceber?

Kaito riu ao ver o dilema que sua mente estava enfrentando. Passou o braço sobre seu ombro com um sorriso, a puxando e conduzindo-a para fora da sacada.

– Relaxe. – a palavra escapou de forma agradável, fazendo com que ela de fato relaxasse. – Vamos para dentro, beba um pouco, finja estar bêbada e durma um pouco.

Seu corpo se recostava numa pilastra que servia para sinalizar a entrada da cozinha, enquanto ria de Rin e Gakupo cantando alto no caraoquê portátil que Len tinha guardado em seu carro. Sabia que o exagero de Gakupo era pura fachada, mas o êxtase que Rin presenciava era mais que legítimo.

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Luka, na cozinha, ria para si, enquanto servia-se um pouco de vinho. Len estirava-se no sofá, tentando se manter acordado para quando sua vez chegasse. Ao seu lado, Kaito escorava seu braço esquerdo sobre o recosto do sofá, enquanto eventualmente sua mão direita transportava o whisky de seu copo para sua boca.

Mantinha os olhos anis em Miku, e os lábios mantinham-se espichados num sorriso esbanjando relaxamento. Não sabia se era um motivo de desconforto ao um bom sinal, mas ela evitava deixar evidente que tinha o tinha notado observando-a.

Seus olhos avulsos quase não interpretaram a imagem que captavam. Rin, numa dança exasperada em meio a música, pisou para trás em falso, tropeçando na mesa de madeira que servia de apoio para taças e garrafas de vidro.

O objeto se virou para trás, e tudo que sustentava veio junto. O som de vários itens de vidro se quebrando simultaneamente fez que ela estremecesse, acordando para a realidade.

Rin pendeu o corpo para frente imediatamente, com uma mão sobre a boca e outra sobre a barriga, como se segurando algo de sair.

– Não me sinto bem. – sua voz saiu embargada e tremida, quase assustada. Gakupo lançou um olhar discreto e rápido para Luka, como se esperasse por instruções do que fazer. A mulher deu uma acenada com a cabeça, se aproximando com expressão preocupada.

– Acho que já vi dias melhores. – Gakupo apoiou-se nos joelhos, enquanto seu rosto adotava uma expressão enjoada.

– Olha essa bagunça – Rin ergueu o corpo novamente, olhando para os cacos de vidro espalhados pelo chão. – desculpe, Miku, vou arrumar isso...

– Não se preocupe – Miku avançou com um sorriso – vou dar um jeito nisso num instante. Mas você não parece muito bem.

– Talvez você devesse ir à um hospital tomar um pouco de glicose, Rin – Kaito aproximou-se do grupo, parecendo preocupado. – Não pode ficar forçando seu corpo com tanto álcool. Luka, leve ela e Gakupo para uma dose, e deixe o Len em casa, eu ajudo Miku a arrumar tudo.

Luka assentiu, pegando seu casaco e sendo acompanhada pelo resto do pessoal para fora. Quando a porta se fechou, Miku foi até a cozinha pegar uma sacola onde colocaria todos os maiores pedaços de vidro.

Ambos se abaixaram e começaram a recolher com cuidado os cacos, colocando todos dentro da sacola. Por sorte, o vidro não havia se quebrado em pedaços muito pequenos, então a maioria deles foi facilmente recolhida.

Miku se levantou para jogar fora os restos de vidro, quando um raio cortou o céu com ferocidade, absurdamente perto de seu apartamento. As luzes farfalharam um pouco, nada sério.

Seguiu seu caminho até a lixeira, vendo pelas janelas que os raios se tornavam cada vez mais frequentes.

Enquanto voltava para a sala planejando mentalmente algum agradecimento educado para dar a Kaito, um barulho seco e oco preencheu todo o prédio, e as luzes piscaram antes de se apagarem de vez.

Era claro que um raio havia atingido seu prédio, e o gerador provavelmente se sobrecarregou.

– Miku? – a voz de Kaito saiu do breu, e ela parou de andar. Não estava nada acostumada com o novo ambiente, e estava com medo de se esbarrar num pilar ou móvel.

– Sim?

– Onde você está? – pelo barulho de tecido sendo esfregado em tecido, Miku deduziu que Kaito havia levantado do chão.

– Hã... – ela tentou se lembrar de onde estava antes que as luzes se desligassem, mas a memória de devaneios não era uma grande ajuda. Estendeu os braços em várias direções, tentando achar algo para se agarrar. Suas mãos encontraram uma parede sólida e sem beiras, o que foi até confortante. – Acho que estou entrando na sala. Ou na cozinha. Não tenho certeza.

– Fale de novo. – a voz de Kaito agora estava mais a sua esquerda – Vou tentar te achar.

– Deveria procurar velas.

– Não preciso de velas.

– Elas estão na cômoda perto da varanda.

Não preciso de velas! quase como se para contrariar, Miku ouviu o barulho de algo se chocando com madeira, e a voz de Kaito praguejando.

– Acho que precisa de velas agora. – ela riu imaginando a cena, e pela voz, ele ria também.

– Calada! Estou chegando perto. Eu acho. – bem, sua voz estava próxima, mas Miku não disse mais nada. Queria ver se ele se perderia no escuro se sua voz não se manifestasse mais. – Miku? Miku? Miku, responda! Eu sei o que está fazendo, e não vai funcionar!

Ela teve que morder o lábio para segurar o riso. Sentia como uma criança brincando de esconde-esconde, e a sensação era boa.

Como uma surpresa, Miku sentiu seu corpo ser empurrado por um peso maior para baixo, mesmo não tendo sentido quase nada ao se chocar contra o chão. Seus olhos se fecharam na hora, e ela manteve os braços juntos ao corpo como se andasse em uma montanha-russa.

– É, te achei. – a voz de Kaito soou acima de seu corpo, fazendo que seus olhos se abrissem, mesmo que não pudesse ver nada. A simples ideia de que Kaito estivesse sobre seu corpo no escuro a deu arrepios, e não no jeito ruim.

– O que está fazendo? – falou mais baixo do que deveria, encolhendo-se um pouco.

Conseguiu ouvir uma risada escapando.

– Algo que quero fazer há muito tempo. – assim que a frase foi finalizada Miku sentiu um contato macio e quente em seu pescoço, e foi quando percebeu que Kaito havia posto seu rosto lá.

Realmente não tinha ideia de como responder a isso, mesmo que sentisse que seu corpo pertencesse apenas a seus instintos naquele momento.

O toque era leve e responsável por deixá-la num estado de pré-êxtase. Sentia que ele subia o rosto na direção de seu próprio, com uma velocidade que dizia “você ainda pode me dizer se quiser que eu pare”. Mas ela não queria que parasse.

O momento em que ele finalmente a beijou foi o mesmo em que as correntes da timidez e vergonha se romperam e ela finalmente pudesse relaxar. Era como se esperasse por aquilo a mais tempo do que gostaria de admitir.

Os dedos escorriam entre os cabelos curtos de sua nuca, enquanto as grandes mãos passeavam por seu corpo como se tivessem há muito a permissão para tal.

Estava entregue. Mesmo que se perguntassem sua resposta seria uma negação, sabia que a partir daquele instante, pertencia a ele e a mais ninguém.

O modo em que Kaito a pressionava contra o chão apenas fazia com que ela quisesse mais. Sabia que era intenso demais para um primeiro contato daquele tipo, mas ela queria que ele a tomasse. E algo a dizia que não era um desejo apenas do momento.

As luzes voltaram com ardência e quase a queimaram. Afastaram-se imediatamente, como se os olhos do mundo tivessem se voltado para eles.

Kaito a olhava nos olhos, e ela conseguia ver nas íris azuis que ele estava se controlando.

– Eu poderia te devorar. – a voz saiu rouca e quase pesarosa.

Ela engoliu em seco, apoiando-se nos cotovelos para se sentar.

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– Está indo muito rápido. – ela disse, mesmo que quisesse que tudo fosse muito rápido, e demorasse uma eternidade para acabar.

– Funciona assim onde eu venho. – voltou a enterrar o rosto em seu pescoço, sem economizar beijos ou sussurros ali.

– Me leve para jantar. – falou, querendo afastá-lo mas sem forças para tal. Kaito afastou-se por si só, a encarando com um sorriso no rosto.

– Te levar para jantar?

– Isso. – ela concordou, colocando a mão sobre seu rosto e olhando para baixo, sorrindo. – Seja engraçado e critique a comida. Depois me leve para sua casa, me mostre seus desenhos e seus livros favoritos de Hemingway. Olhe nos meus olhos por um tempo sem dizer nada, e então sim, serei sua para fazer o que quiser.

Kaito suspirou, olhando bem para ela antes de responder.

– Sábado. Oito horas. Nada de atrasos.