Never Let Me Go

O Início - Pietra


P.O.V Pietra

Devem ser três horas da tarde. Me despeço da tia Margô que não me deixa ir antes de um aperto nas bochechas seguidos de alguns beijos. Pego minha bicicleta rosa da Barbie que ganhei da minha tia esse ano em meu aniversário de onze anos de idade. Arrumo o vestido branco com flores e enfeites cor-de-rosa, talvez eu seja só um pouco fascinada, apaixonada, maluca pela cor.

Pedalo em direção a minha casa que fica a duas quadras da casa da minha amada tia Margô. Pedalo rápido enquanto sinto a brisa gélida tocar sutilmente minha face. A sensação é mágica de liberdade. Mal percebo quando fecho meus olhos desfrutando da sensação inebriante que parecia ter seu fim muito breve.

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— I can ride my bike with no handlebars, no handlebars, no handlebars... - cantarolo enquanto tiro minhas mãos do guidão.

Como isso era bom. Então essa era a sensação de voar? E então tudo acontece muito rápido. Sinto algo se chocar contra a minha bicicleta e então, mais rápido ainda e ao mesmo tempo tão lentamente sinto meu corpo se desprender de minha bicicleta. Uma sensação mágica me toma por completo. Bato meus braços quase em uma tentativa inútil e desesperada de manter essa preciosa sensação, mas tão breve quanto começou encontrou seu fim quando meu corpo vai de encontro a grama de um jardim.

Meu corpo inteiro reclama em resposta enquanto mantenho meus olhos fechado em uma tentativa fracassada de controlar as lágrimas que tentavam escorrer de meus olhos. Frustada por me sentir presa a realidade, fixa ao chão e com raiva por sentir tanta dor nos locais que entraram diretamente em contato com a grama no momento do choque.

— Ei, você está bem?

Uma voz desconhecida praticamente me obriga a abrir os olhos enquanto me chacoalha fazendo-me reclamar de dor.

— Desculpe.

É então que eu vejo. Um anjo. Com seus belos cabelos castanhos e seus olhos verdes que me lembravam belas esmeraldas.

— Oi.— mas que raio de resposta é essa? Um anjo está aqui para me ajudar e tudo que sou capaz de dizer é oi? Que patético.

— Te machuquei muito?

— Acho que eu mesma me machuquei quando caí.

Ele ri. Ai meu Deus, acho que nunca achei ma risada tão linda como a dele. Senhor amado, ele é tão perfeito.

— Por que raios você anda de bicicleta de olhos fechados e sem as mão no guidão? Você é retardada?— tinha humor em sua voz, o que me deixou levemente irritada, o que logo passou quando olhei em seus olhos me perdendo nas esmeraldas presas naquele precioso olhar.

— Eu... Eu... só estava tentando alguma coisa nova.

Ele me analisa e então cora. Ai meu Deus, ele tem que ter algum defeito!

— Rosa. - ele me diz e eu o fito confusa. Pronto. Achei o defeito, o menino deve ser drogado, só pode. Tão novinho, parece ter no máximo treze anos.— Sua calcinha. É rosa. - coro violentamente enquanto cubro-a com meu vestido. Maldição. Vejo-o controlar-se para não rir, o que foi em vão.

Existe amor a primeira vista? Se não é amor é doença. Talvez eu tenha o encarado por tempo demais pois percebo-o ficar desconfortável sob o meu olhar. Talvez seja o nervosismo pelo sentimento, pela ligação forte, que de repente houve entre nós. Acho que eu gosto dele, e acho que o sentimento é reciproco.

— Você mora aqui? - refiro me a casa de dois andares branca de grande janelas quadradas.

— Sim, por quê?

— Acho que seremos vizinhos. - aponto para a casa de dois andares, igualmente branca, mas essa por sua vez possuía janela quadradas e onde se encontrava meu quarto, uma cortina rosa chamava a atenção.

Percebo-o ficar nervoso. Acho que ansiedade e animação por sermos vizinhos. Ou talvez seja nervosismo por não saber como reagir com esse novo sentimento que é o amor. Será que eu estou me precipitando em dizer amor? Talvez, mas eu não ligo, mais tarde eu descubro o que realmente é.

— É... tenho que ir... - ele diz levantando-se e andando apressadamente para casa, sem se despedir apropriadamente. Antes de fechar a porta me fita por uns segundos e então fecha a porta, rompendo nosso contato visual.

Menino estranho. Entro em minha casa que fica do outro lado da rua, em frente a da dele. Analiso meu vestido que está completamente sujo graças a queda. Como se tivesse recebido uma mensagem via satélite, minha mãe surge, com uma expressão brava em seu rosto tão belo. Seus olhos azuis acinzentados eram impenetráveis e seus cabelos castanhos escuro caiam sobre seu ombro e alcançavam a cintura. Me preparo para a bronca.

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— Pietra Medina Collins, quantas vezes vou ter que te dizer para não brincar na terra, muito menos com a filha retardada da Margô! - eu odiava o modo como mamãe se referia a Diana, a minha priminha de dois aninhos, ela tem síndrome de Down e para mamãe essas coisas são contagiosas. — Desde que seu pai trocou a gente por uma qualquer parece que você não quer parar de fazer o que não presta! E como fica seu irmão? Sem nada? Menina egoísta, continue com isso e você não receberá mais nada de mim.

— Mamãe, eu...

— Para, Pietra! Se continuar assim eu vou ter que te mandar para morar com sua tia e a filha retardada dela.— me calo e ela levanta a mão apontando em direção a escada— Agora venha me dar um abraço, e suba para trocar de roupa que eu tenho que lavar logo isso.

Caminho lentamente em direção a ela para lhe dar um abraço mais ela me interrompe antes:

— Acho melhor deixar o abraço para depois que trocar de roupa, não acha? - ela franzi a testa de forma engraçada, me fazendo rir, e logo ela ri juntamente comigo.

Subo as escadas correndo e entro em meu quarto. As paredes eram um tom de rosa pouco mais escuro que as cortinas, prateleiras preenchidas com Barbies e Pollys desde as arrumadinhas até as sem braço e com cabeça raspada, minha tentativa de salão de beleza. Sento me no chão e paro para pensar um pouco.

O que será que meu anjo estaria fazendo agora? Estaria ele pensando em mim? Quem sabe. De tudo isso eu só tenho uma certeza: nós vamos voltar a nos ver.