Crônicas do deus busão

O Pastor de Boivelhas


Somos um rebanho de ovelhas perdidas nos caminhos do senhor deus busão. Uns de um lado pro outro, outros na contramão de um caminho que tem volta (mas só daqui a uma hora, dependendo do trânsito). O rebanho, diferente dos rebanhos de outros bichos, é o mais diversificado possível. Todos os tamanhos, pesos, cores e espécies possíveis. Da raça gospel à raça vidaloka, da qual provém uma subespécie regional chamada môfi. Da raça incômoda, que gosta de cutucar a ovelha vizinha, à nãometoques, que tem sempre uma postura perfeita para não ser incomodada (que funciona com todas as outras, menos as incômodas e suas respectivas hibridagens).

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Falando em postura, curioso é notar a postura das raças hipster, urbanconceitual, ryca e pão-com-ovo, além da metidabesta, que tem em comum a cabeça quase sempre empinada, o que se constitui numa tentativa de se impor como superior, mesmo dentro do mesmo rebanho e dos mesmos caminhos do deus busão que raças com posturas menos imponente (mas de força muito maior) como a trabalhadora. Mas não há fronteiras que resistam à primeira freada brusca do motorista, vulgo conhecido por motô. Motô é, na verdade, uma espécie de sacerdote que acredita saber das vontades do deus busão e dos fiéis, e como e para onde deve conduzi-los. Pura especulação, pois na verdade o motô acaba conduzindo seu rebanho de formas complicadas, pouco ortodoxas e não sei se realmente aprovadas pelo seu senhor. Há toda uma polêmica em relação ao motô e seu assistente, o cobrador. O cobrador, por sinal, talvez seja ainda mais complicado: é o que retira de todos um dízimo diário (várias vezes por dia), e o que recebe todas as reclamações que o motô deveria ouvir mas ignora. Um motô ruim será sempre um motô ruim. E o que se diz ao motô, pode ser aplicado ao cobrador: incitação ao caos!

Em resumo, a maioria acaba não lidando muito bem com as curvas e buracos do caminho, e é sempre acusado de estar carregando boi. Não sei em relação aos bois (que não são merecedores disso, claro), mas o rebanho de boivelhas do deus busão talvez receba tal tratamento como uma espécie de castigo divino indireto para purgar os pecados e as faltas de todo dia. Há um ou outro não merecedor dessa pena injusta, sabemos. Existem as crianças e os bebês, que acabam pagando injustamente pelos malfeitos de seus pais, mas no geral, o que une o rebanho de boivelhas é o purgatório, que nada mais é que uma viagem num busão lotado em estranha estrada ruim com um motorista pior ainda que somos obrigados a pegar todos os dias.