“Incompleto. Errado. O que é isso?”

Trechos da correção da prova de Física por Alberto Curt.

Isso me define. Incompleta. Talvez errada. E, para os demais, o que é isso?

Isso sou eu. É tão difícil aceitar o diferente? Custa calar a boca e sorrir como se a minha loucura fosse algo legal? Sim, pelo visto, sim. É, definitivamente, eu não sirvo para essa merda toda. Afundo minha cabeça ainda mais nessa droga de cadeira da escola. Tão desconfortável... E lá vem uma CNTS. Ela senta do meu lado. A pior das piores. A mais “popular”, entre aspas porque ela tenta ser. Mas, ela não consegue. Não consigo não sorrir com isso.

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– Já somou sua nota, Wendy?- Alberto diz olhando para mim. Velho otário. Dei de ombros e confirmei a pergunta. Ele saiu como se já tivesse me irritado o suficiente. Tsc, só de estar aqui já me irrita.

– Wendy- poderia dizer que sua voz era insuportável. Tão irritante que meu tímpano quase se explode. Mas, eu estaria mentindo. A voz dela era legal. Já a sua presença...

Não vou perder o meu tempo escrevendo sobre a nossa “conversa”. Ela não tinha nada além de falsidade. Juro que quase pedi para ir ao banheiro vomitar. O sinal tocou e senhor, eu poderia agradecê-lo por isso... Na verdade, não faria diferença. Ele não sente. Será que as pessoas pensam assim de mim? Como se eu não sentisse nada. Afinal, ninguém nunca diz obrigada. Ninguém nunca pede desculpas. Nem pergunta se está tudo bem. Nunca. Como se eu fosse um fantasma rondando por aí. Ás vezes, essa pergunta paira sobre minha mente. Mas, não me aprofundo nisso. Nem sempre sentir é algo bom.

Pego minha mala e saio sem se despedir. Fantasmas não dizem tchau, certo? Apesar das pessoas serem várias, das suas vozes serem mutiladoras para mim e pelas longas escadas e filas, passo meu cartão e pronto! Boi Wendy fora do matadouro. Isso é um pouco ridículo. Quer dizer, não só pelo fato de que eu me nomeio de boi, eu posso até ter saído daqui. Mas, parece que esse lugar está dentro de mim. As CNTS, Anne, os otários, professores, a matéria...Tudo está dentro de mim e, eu não posso fugir de mim mesma. É inútil.

Agora, estou há umas duas ruas longe da escola. Como hoje é sexta-feira, o dia parece mais leve. Eu me sinto mais leve, porém não do jeito bonito. Tipo, tão leve que eu posso voar. É mais para tão leve que eu posso desmaiar ou desaparecer. Também me sinto tonta. Mas, mesmo assim, acabo de lembrar que aqui perto tem um parque. Meio nada a ver, não ligo de qualquer jeito. Talvez seja bom relembrar os velhos tempos...

É, o parque é uma bosta. Tão enferrujado que tem cheiro de sangue. Minha boca está com gosto de sangue. Largo minha mala na gangorra e direciono-me ao balanço. Meu brinquedo preferido. A questão é que nesse parque nada aconteceu. Não tinha passado nele para relembrar. Não tinha nada a não ser eu.

Dizem que balanços te fazem voar. Seria legal ter essa sensação. Eu poderia falar que estava tão leve a ponto de voar e seria uma mensagem bonita. Estou sorrindo. E rindo. Eu posso tentar, não é mesmo? Tentar voar. Nossa, faz tanto tempo que balançar já é algo estranho. Peguei impulso e de um modo desengonçado, ênfase nisso, eu comecei a balançar.

Acontece que as coisas não são como nos filmes. Não são tão belas quanto descritas, nem tão fortes. Eu comecei a balançar de fato e quando cheguei lá em cima, não comecei a sorrir. Nem rir. Nem nada que antes eu pensasse que daria certo. Não me senti como um pássaro. Não me senti como Peter Pan. Incontáveis vezes já me zoaram por causa disso. Era só um Peter aparecer e pronto. Eu e ele éramos o novo casal.

Na verdade, senti falta de ar. Como se a qualquer momento eu pudesse cair e morrer sufocada pelo vento. Se é que isso é possível. Parei de fazer impulso. Subir mais alto não tem mais tanto sentido. Aos poucos coloquei meus pés no chão e senti-lo também não era tão bom. Nenhum lugar fazia eu me sentir bem. Como se nem o céu e nem a terra fossem meu lugar.

Avistei minha mala e assim com a CNTS maldita me ignorou, ela parecia não se importar comigo. Ela é um objeto inanimado, Wendy. Ela não irá sentir nada. Sentir nada. Uma risada irônica vinda de mim mesma surge. Eu sinto alguma coisa? Pego minha mala e caminho com um olhar qualquer. Não sei a língua dos olhos, vocês sabem disso.

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Não olhei para trás. Não fiquei sorrindo ao se lembrar desse episódio. Não contei a ninguém como uma lembrança, na verdade.

Não é algo que fantasmas fazem, certo?