Passei o resto da noite pensando sobre como escreveria. Fazia quase três anos que tinha largado o jornalismo, desde então passei por vários empregos, sem ficar muito tempo em nenhum. Não era o que eu queria, mas nem eu mesma sei o que queria fazer. Na escola os professores sempre perguntavam e eu sempre mudava minha resposta. Nenhuma nunca foi verdadeira.

Achei que gostaria do jornalismo, afinal, eu gostava de escrever. Não sempre, mas as vezes. A maioria dos meus textos continham mistérios e suspense, nunca fui do romance, e agora, veja só, estou num romance policial.

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Não li muitos livros na minha vida, achava besteira, bobagens, coisas que as pessoas faziam para se sentir mais intelectual, mas acho que sempre estive errada. Algum tempo atrás lembro-me de conhecer uma menina um pouco mais velha que eu, com ideias diferentes das minhas - malucas, diria eu - e que gostava de ler mangás. Não lembro do seu nome, nunca lembro dos nomes, lembro do jeito, da personalidade. Se me agradar, permanece na minha memória. Caso não, talvez eu lembre.

Durante o meu pouco tempo de vida conheci muita gente, tanto na escola, quanto trabalho, ou até mesmo no cinema. Essas pessoas agora, apareciam em textos que criava, mas sem escrever nada.

Acho que esse sempre foi o problema, sem escrever nada. Tinha ideias, ideias que ficavam e iam da memória, como as pessoas. Mas dessa vez não, dessa vez eu ia em frente. Tinha isso em mente, e ela não sairia da memória até que fosse finalizada.

Amanhece, o frio permanece e me levanto, sem dormir. Era uma manhã de sábado, bem agradável, daquelas que você fica em casa, assiste filmes tomando café. Seria o que eu faria se não fosse a loja novamente, dessa vez para comprar comida. Não que eu seja consumista, mas cá entre nós, quem não tem um lado consumista, mesmo que escondido?

Para a minha surpresa Jul ainda estava lá e seu turno acabava às 6:00 sendo que já eram quase 7:30. Com uma cara nada boa, entro e pego alguns pacotes de macarrão instantâneo. Jul quebra o silêncio:

–Soube que Estevan está escrevendo um livro - diz ela olhando uma revista.

–Conhece ele?

–É meu vizinho, bons vizinhos.

–Brilhante.

–Acho que eu deveria escrever também. Ajudar vocês.

Paro tão repentinamente que percebo que não peguei macarrão instantâneo, e sim sopa.

–Ele lhe chamou para escrever os casos? Não foi?

–Na verdade não, eu que me convidei - ela faz uma pausa e começa a dar risadinhas - acho que seria legal.

–E será, pode acreditar, será!

–Pensei que você não ia aceitar, não é do tipo que me parece aceitar isso.

–Acho que não deveria achar tanto.

–Tanto faz. Que bom que aceitou -ela tira duas cervejas do freezer e me dá uma - já tem ideia de começar alguma coisa?

–Ah, não - dou um belo gole na cerveja me animando um pouco - você teria?

–Não, mas meu turno acaba logo, acho que podíamos sair por aí e ver se achamos algo.

E o que tenho a perder. Pelo pouquíssimo que conheço Jul sei que ela é daquelas pessoas ótimas para sair mas péssimas para se falar. Se não tivesse ideias pelo menos o divertimento teríamos.