Cartas de Amor

A difícil arte de fazer escolhas


Dizem por aí que o tempo cura tudo, só não dizem quanto tempo. E eu estou começando a achar que quem inventou essa frase era um louco, ou um idiota, porque mesmo com os segundos, os minutos, as horas, os dias passando nada se resolve, nada se cura, nada melhora, pra ser sincero, fazendo uma avaliação crítica de tudo que está acontecendo, as coisas só estão mesmo é piorando, se é que isso é possível.

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Eu sei que recentemente tudo o que eu faço é reclamar da vida, parece um péssimo hábito disposto a se repetir todos os dias que eu acordo. Eu sei que eu deveria estar grato, porque Annabeth ainda está viva e isso é um milagre ou qualquer coisa desse tipo, mas é difícil lidar com tudo isso, é difícil ser otimista quando o seu mundo foi arrancado dos seus pés e você foi obrigado a prosseguir, é difícil ter esperanças, é difícil acreditar, é difícil não saber.

É difícil não reclamar da vida e aceitar tudo o que acontece como se não fosse uma injustiça.

É difícil viver, eu já deveria saber disso.

Mas é mais difícil ainda escolher.

Não sei se fico com ela ou se a deixo ir.

Não sei se esqueço minhas promessas de amá-la para todo o sempre, ou se me lembro delas a cada vez que eu penso em desistir.

Não sei se faço isso ou aquilo.

Não sei, não sei, não sei. E isso é difícil.

Eu escolhi deixá-la lá naquele apartamento com as incertezas que eu mesmo criei, pensei que estava vivendo em um castelo de certezas, disposto a enfrentar a tudo e a todos para estar com ela, porém não era isso que ela deve ter pensando quando eu passei por aquela porta às 9:30 da noite. Não foi isso que eu me imaginei fazendo, não era o que estava planejado. E agora eu não sei se foi certo ou errado, porque algo me mata por dentro insistindo que eu errei, mas ao mesmo tempo há algo que me diz que tudo bem duvidar, tudo bem querer desistir do que não é mais seu.

Eu revejo todas as minhas escolhas enquanto sigo em frente com uma nova em mente, dirigindo pela cidade às 2 da madruga. Eu escolhi voltar pra casa, para aquele apartamento que nós compramos juntos, para aquele lugar onde nós já fomos felizes.

Tudo o que se vê são luzes de postes e alguns poucos faróis de carro que se aventuram por aí. É uma noite sem estrelas. Mas pelo menos já é quarta-feira, o que é bom, porque as terças adoram complicar minha vida.

Tudo parece tão silencioso para uma mente barulhenta, gritando para ser ouvida, entretanto eu já não sei se suporto meus próprios pensamentos, eles são confusos demais, fazem barulho demais, são difíceis demais para entendê-los, então tudo o que eu fiz para tentar acalmá-los foi ligar o rádio. Péssima escolha.

Eu poderia reconhecer aquela melodia em qualquer lugar, a qualquer instante, porque, por mais clichê que isso pareça, aquela era a nossa música, tocando ali no rádio, às duas da manhã, enquanto eu voltava para casa.

A música não tinha uma letra romântica, mas ela tinha uma história, o suficiente para fazermos dela a nossa música. E isso pode parecer tortura, eu sei, no entanto eu deixei ela tocando, escutei cada letra, cada nota, porque de algum modo , eu precisava disso, eu precisava de uma coincidência estranha, isso não me encheu de certezas, não foi como um surto esclarecedor sobre o futuro, mas foi um começo, pois me explicou que voltar para casa era certo, me explicou que talvez eu tivesse que reconsiderar.

E eu iria reconsiderar, depois de uma boa noite de sono, sem estresse, sem pressão, sem medos.

Eu estive passando a noite toda andando por aí, indo a lugares sossegados que eu gostava, lugares onde eu podia ficar sozinho, porém não foi bem isso que aconteceu, porque nos últimos anos eu escolhi não estar sozinho, eu escolhi deixar ela conhecer meus lugares solitários, eu deixei Annabeth ser minha companhia na solidão, e consequentemente, tudo me lembrava ela,absolutamente tudo. Eu não sei mais como é estar só, e pretendo me lembrar disso quando estiver reconsiderando.

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Viver é difícil, como eu já disse, mas é muito mais quando você está só.

Dirigi mais um pouco até chegar em frente ao edifício no qual eu morava, porém resolvi dar a volta no quarteirão, estava tocando uma música que me lembrava de Annabeth, eu nunca tinha escutado, mas era sobre um cara que ama uma garota loira mas não tem o amor correspondido, eu sabia como era ser esse cara.

Então, quando eu finalmente desci do carro, ironicamente, começou a chover. A chuva estava atrasada algumas boas horas, para ser sincero. Se isso fosse um filme, a pessoa que escreveu o roteiro deveria estar debochando de mim, não havia outra explicação, a não ser que o canal 17 finalmente tenha acertado em suas previsões, porque se eu não me engano haveria “chuvas fortes de madrugada”. Talvez eu até mesmo escreva um elogio à emissora amanhã, tudo é possível.

Apertei o botão do elevador esperando impaciente e molhado, o sono já começava a me fazer de vítima, tinha sido um dia cansativo, eu só queria dormir um pouco.

Porém, por mais que eu estivesse com pressa para dormir logo me obriguei a ir devagar e fazer pouco barulho, esperava que Annabeth estivesse dormindo e não queria correr o risco de acordá-la e ter que conversar com ela, ou na pior das hipóteses, brigar com ela. Bom, eu esperava que ela estivesse lá.

Todavia, por mais silencioso que fossem meus passos e meus movimentos ela gritou.

De início eu pensei que ela estivesse brava comigo e quisesse retomar nossa discussão, imaginei ela vindo nervosa tirar satisfações, mas então eu percebi, não era um grito de ódio, não era um grito de raiva, era um grito de dor.

Algo a tinha machucado.

E não importa o quanto eu estivesse magoado ou indeciso, eu corri.

Corri em direção dela.

Indo ao seu encontro.

Desesperado.