Ressurgente

Capítulo 47


POV Tobias

— Tobias Eaton! Eu repito: Tobias Eaton! — a voz soou por megafones pela décima vez naquele dia — Se souberam onde ele está, por favor, o denunciem. Qualquer um que o estiver ajudando será morto ou feito de refém.
Tobias estava ouvindo aquilo há dois dias e isso o incomodava cada vez mais. Parecia que o Doutor tinha dado uma desistida na procura por Beatrice e decidido anunciar a procura de Tobias para todos os cidadãos. No começo, Tobias tinha ficado exasperado, entretanto acreditava que os outros não o entregariam de bandeja. A situação apenas mudou quando o adorável médico anunciou um massacre se Tobias não aparecesse para ele em uma semana.
Os poucos fugitivos no ex - complexo da Audácia não pareciam ansiosos em entregá-lo, alguns pareciam até nem se importar. Mas, Tobias sabia que alguns deles tinham parentes e amigos lá em cima, que agora tinham as possibilidades de vida reduzida por causa dele.
Claro que ele não iria se entregar desse jeito, não poderia se entregar nas mãos de alguém como aquele homem. Sem contar que, Jacob estava lá e era muito provável que este não quisesse ver Tobias nem pintado de ouro. Tinha que apostar que o Doutor estava blefando e que não iria matar ninguém, provavelmente, era o que todos faziam.
Tobias decidiu voltar a Audácia sem paciência para ficar ouvindo aquelas besteiras. Ele estava perto, muito perto, pois não conseguiria se afastar do local sem esbarrar em um soldado e isso não seria problema se eles estivessem sozinhos.
Ele voltou em passos lentos e ao chegar foi abordado por Zeke.
— Cara, não saia assim sem avisar. — disse — Todos estavam achando que você tinha ido se entregar.
— Eu não vou. — disse convicto.
— Eu sei, mas quase achei se fosse.
— Não acho que ele simplesmente irá embora e deixará todos os outros em paz só por ter me capturado.
— Esse nem é o problema. Ele vai começar a matar se você não for. — Zeke respondeu seriamente. Claro que Tobias sabia disso, muito bem na verdade.
Aquela situação o fazia lembrar quando Tris entregou-se a Erudição de forma extremamente imprudente. Ele se lembrava como se sentiu quando achou que ela fosse morrer. Tobias não faria isso consigo, não se entregaria tão facilmente e esperava que ninguém o denunciasse.
— Se eu for, ele pode me usar contra Beatrice, não? Isso não será bom.
— Esquece isso. Talvez ela nem vai saber porque não vai vir.
— Zeke...
— E talvez todos nós vamos morrer. — murmurou. Tobias abriu a boca para falar, mas o amigo apenas balançou a mão para ele deixar para lá.
Tobias deu de ombros, seguindo o seu caminho, para mostrar aos outros que ainda estava ali.
...
Quem tinha feito aquilo? Era a pergunta que se passava na cabeça de Tobias e provavelmente na de Zeke também. Pois lá estavam os dois, armados e prontos para combate.
Aparentemente, algum dos refugiados tinha o denunciado, dois dias depois, para os soldados que rodeavam o local. Claro que eles não demoraram muito para aparecer na porta da Audácia preparados para entrar de qualquer jeito.
Tobias não conseguia entender porque estavam atrás dele, especificamente. Na conversa que ele tivera com Zeke há dias, discutiram a possibilidade do Doutor querê-los mortos por saberem de tudo. Entretanto, se aquele fosse o caso, não iriam estar procurando apenas Tobias daquela forma e sim, também, Zeke, Shauna e Cara. Tobias sabia que tinha algo a ver com Beatrice, apenas não achava que merecia esse alarde todo. Por que o Doutor o queria tanto?
Pelo menos não havia tido uma matança lá em cima, até onde sabia, pois o último prazo que o Doutor dera terminava em dois dias. As pessoas ficavam nervosas e ele também. Talvez alguém tenha parado para pensar "Por que estou arriscando a vida dos meus amigos por esse cara mesmo? Foda-se esse tal de Tobias." E pronto, ali estava ele com uma arma, receoso sobre como estava sua mira, após tanto tempo sem manejar uma arma, e com Zeke ao seu lado, parecendo muito mais confiante.
— Eles vão entrar. — resmungou, ganhando a atenção de Zeke.
— Eu sei, eu sei. — passou a mão no rosto suado — Shauna está com alguns ex-membros auxiliando os civis, eles tem que sair.
— Esse é o plano, então?
— Isso. Segurar eles para os outros fugirem daqui. Simples.
— Lá fora não está muito melhor. — Tobias trincou os dentes pensando até mesmo em certos colegas de trabalho que poderiam nem ao menos estar vivos.
— Mas lá eles vão ter uma chance. Aqui não, não mais.
— Que droga! Eu quero ir atrás desse homem e dar-lhe um chutão nas bolas.
— Nem me diga. — Zeke suspirou — A cidade está de cabeça para baixo.... Tudo por causa...
— Não diga que a culpa é de Beatrice. Ela não quis isso.
Tobias ouviu Zeke murmurar algo ao seu lado, mas não fez questão de perguntar o que era, pois pressentia que não gostaria nem um pouco.
— Tudo por causa desse Doutor, então. — Zeke concluiu.
Tobias riu secamente, concordando com o amigo. Podia ter diversas sensações no momento como raiva, irritação e semelhantes, mas uma felicidade silenciosa espreitava pelo seu peito por estar em ação ao lado de Zeke e não qualquer um.
— Tobias Eaton! Sabemos que está aí, por favor, saia. — um soldado berrou por um megafone — Se entrarmos, não prometemos manter ninguém vivo.
— Cara, isso está ficando ruim. — George se aproximou deles com cautela. Amah estava logo atrás roendo as unhas de maneira ansiosa. Assim como Zeke, ambos estavam bem mais acostumados com ação do que Tobias e isso o deixava um pouco nervoso.
Amah colocou a mão no ombro de seu ex-aluno o fazendo encará-lo, sorriu de maneira reconfortante. Tobias retribuiu sentindo a confiança retornar para seu corpo. George apenas encarava a origem dos sons mordendo o lábio.
— Eu estava adorando demais essa vida pacífica depois da Tris ter acertado as coisas entre os GP's e os GD's por aqui. — comentou George suspirando — Acho que não podemos ter paz para sempre.
Amah distanciou-se de Tobias para ir para perto do rapaz o abraçando de lado com um sorriso bobo no rosto.
— Depois disso, quem sabe? Ainda temos muito pela frente...
— Vocês, por favor, concentrem-se no presente. — Zeke reclamou olhando para trás — E em não morrer, para o futuro existir.
Amah revirou os olhos.
— Eu sei, ok? Nós vamos sobreviver e, ainda por cima, não deixaremos eles colocarem as mãos no Tobias.
— Dependendo da situação. — Tobias corrigiu — Eu não os deixaria machucarem vocês por isso. Se a situação ficar ruim e eu me entregar, vocês fogem. Entendido?
Os três homens se entreolharam hesitantes. Claro que sabiam que a situação poderia chegar a um ponto que todos poderiam morrer, mas a ideia de fugir era ridícula. Era covarde. Eles foram treinados na Audácia para não se acovardar diante de nada. Tobias sabia o que passava pela cabeça dos outros, mas mesmo assim, não permitiria que eles permanecessem em uma batalha só para morrer.
— Entendido? — Tobias repetiu com mais firmeza na voz.
Após quase um minuto de mais olhares e silêncio, os três responderam em uníssono, a contragosto:
— Entendido.
— Ótimo.
Os quatro mantiveram uma conversa sussurrada dos outros ex-membros. Não discutiam nada de confidencial, mas apenas acharam mais confortável discutir assim sobre certas questões cruciais para a batalha.
Mas não demorou muito para os soldados finalmente desistirem de esperar por Tobias, provavelmente, perceberem que ele não iria se entregar, e decidiram entrar no complexo a força. Entraram gritando de entusiasmo.
E eles estavam prontos, tinham que estar.
Tobias segurou sua respiração e mordeu o lábio assim que ouviu os passos sincronizados de dezenas de soldados. Isso o preocupou, pois eles mal chegavam a vinte pessoas. Aquilo tinha grandes chances de acabar em um massacre.
O primeiro tiro fez um barulho familiar soar na orelha de Tobias, tinha sido próximo, muito próximo. Duvidava que os soldados tinham o localizado logo de cara e como se escondeu atrás de uma parede não deveriam ter tido uma boa visão. Ele esperou.
Seus dedos passaram pelo gatilho com uma imensa vontade de atirar, entretanto uma saraivada de balas vinha em direção deles. Com o canto do olho viu um tiro pegar de raspão na orelha de uma garota que apenas praguejou. Alguns de seus colegas arriscaram atirar, porém, não tinham dado sorte.
Quase lá, ele pensou.
A pessoa que atirava diretamente na direção de Tobias parou para recarregar, nesse momento ele saiu de seu esconderijo para finalmente atingir o inimigo. De quatro tiros apenas um acertou, mas foi o suficiente. Tobias sorriu satisfeito, imaginando que poderia ter sido muito pior.
— Já derrubei quatro. — Zeke gritou sobre os sons dos tiros. — Não faça essa cara.
Tobias suspirou fechando a cara novamente. Pôde ouvir uma risada nasal vinda de Zeke.
— Tobias Eaton, por favor... — um soldado recomeçou a falar no megafone, porém, foi interrompido por tiros vindo em sua direção.
Tobias não conseguia observar bem os companheiros, mas apostava que não havia mortos, pois não havia ouvido alguém lamentar ou praguejar de raiva. Por enquanto, os dois lados estavam protegidos pela distância, entretanto, a batalha não poderia manter-se assim. Uma hora um dos lados iria se aproximar.
Como sempre, Tobias estava certo. Os soldados do Doutor decidiram se aproximar aos poucos, conseguindo assim ótimos ângulos para mira. Eles não comemoraram como os ex-membros, porém, dava para ver que estavam satisfeitos. Um, dois e três foram atingidos em locais não vitais e logo saíram do local correndo para um canto escuro do complexo.
— Recuem um pouco! — Amah gritou para ser ouvido por todos — Procurem uma barreira.
— Vamos, gente. — George apoiou, seguido por um grito conjunto de entusiasmo pelos ex-membros, inclusive Tobias e Zeke.
Mas isso começava a dar errado, terrivelmente errado. Tobias percebia o quanto eles estavam perdendo naquele combate, mesmo conseguindo abater alguns soldados, eles estavam claramente perdendo.
Tobias recuou para recuperar o fôlego e enxugar a testa pingando de suor. Ele ouviu Zeke resmungar de dor não muito longe. Virou o rosto alarmado, com o coração batendo forte por causa do medo dele ter se machucado gravemente. Felizmente, Zeke estava com a mão na bochecha onde um filete de sangue escorria.
Perguntou sem emitir som se ele estava bem. Zeke apenas assentiu.
Os ex-membros continuaram lutando e tentando, mas estava cada vez mais difícil porque parecia que eles estavam multiplicando-se. Tobias não havia tido nenhum ferimento grave até o momento, apenas dois tiros de raspão no braço e um na perna esquerda, entretanto, havia alguns em estado muito pior. Isso o fazia sentir-se culpado.
— Droga!Droga! Droga! — Tobias resmungou quase no limite de sua própria raiva e indignação.
Esses sentimentos apenas se manifestaram no momento em que Zeke levou um tiro bem no joelho, e fraquejou caindo no chão. Engolia a seco e mordia o lábio com força. Zeke tentou se arrastar para longe da área perigosa onde estava, porém não conseguia. Tobias foi assisti-lo.
—Você está bem? — perguntou, ao colocá-lo apoiado no ombro.
— Mais ou menos. — gemeu de dor — Faz tempo que não sinto esse tipo de dor, cara. Isso dói.
Tobias encostou-o em um lugar longe de toda a ação, perto de alguns outros feridos. Despediu-se com um aceno breve com a cabeça.
Com tudo formando-se lentamente na cabeça de Tobias, ele se aproximou de Amah com cautela.
— Tire todos daqui, tudo bem?
— Tobias...
— Sem discussões, Amah. — Tobias suspirou — Nós vamos perder, admita.
— Nós somos da Audácia. A gente não vai perder. — resmungou mais para si mesmo do que para Tobias.
Tobias balançou a cabeça ao se afastar sentindo o coração bater no peito com tanta força que parecia rasgar seu peito. Espreitou por outros ex-membros que o olhavam com raiva no olhar e observavam seus movimentos. Claro que eles pensavam que a culpa de tudo era dele.
Conseguiu ficar seguro e o mais perto possível, sem ter o risco de levar um tiro. Ele imaginava se queriam-no necessariamente vivo, pois não podiam diferenciá-lo dos outros e podiam já ter o matado momentos antes. Talvez o Doutor não se importasse em deixá-lo morrer baleado, afinal, Tris havia morrido assim, e mesmo assim agora ela está viva de novo.
Puxou o colarinho da blusa e umedeceu os lábios. Era agora ou nunca.
— Eu sou Tobias Eaton! Podem me levar. — gritou alto o suficiente para os soldados o ouvirem — Podem parar de atirar neles agora?
Os tiros cessaram aos poucos, ambos os lados pararam para observar Tobias com certa curiosidade. Ele suspirou andando em direção aos soldados, alguns sorriam satisfeitos. Não houve reclamações dos ex-membros.
...
Tobias foi levado para fora do complexo com uma força desnecessária, seus pulsos amarrados em um nó apertado.
Resmungava, enquanto a mão de um soldado de olhos claros apertava onde uma bala tinha passado de raspão. Entretanto, sua expressão era passiva e tentava não demonstrar nenhuma dor.
Quando foi afastado dos outros começou a ouvir uma discussão alta e desordenada, o que fazia boas lembranças voltarem à mente. Tobias sabia que eles discutiam se estavam felizes ou nervosos com essa ação. Mas não havia nada que poderiam fazer.
— Tobias — alguém se aproximou passando por entre os soldados — Achei que não o veria mais. Sentiu minha falta?
Ele sorriu de canto, de modo sarcástico.
— Tinha que ser você, Jacob.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!