Caçada

Outras Vidas


Dentre todas as criaturas que já enfrentamos ao longo daqueles desafios de Durga, nada se comparou com o qual preenchia minha visão naquele momento. Quando finalmente conseguimos chegar na campina em que Ren e Kelsey estavam, meus olhos voltaram para a criatura enorme perto das cadeias de montanhas e minhas pernas travaram.

As adagas negras escorregavam de minhas mãos, pois eu suava frio. Qualquer ar que ainda restava em meus pulmões se esvaiu, deixando-me ofegante. Inconscientemente, dei um passo para trás e procurei pela presença de Kishan, contudo, o príncipe de olhos dourados parecia tão estarrecido quanto eu.

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Há metros de nós, Ren estava em sua forma animal e os pelos do tigre branco se eriçaram para a criatura em nossa frente. Ele se pôs em frente a Kelsey, a qual parecia uma pilha de nervos, olhando para aljava vazia como se novas flechas fossem surgir ali.

ꟷ Isso não pode ser verdade ꟷ balbuciei, sentindo os braços de Kishan me envolvendo pela cintura e percebi que o tigre estava pronto para me carregar para bem longe .

ꟷ Pelos deuses ꟷ A voz grossa do tigre negro estava bem próxima de meus ouvidos e por alguns segundos, me permiti entrar em desespero.

Kishan nunca fora uma pessoa religiosa e para o príncipe clamar para alguma entidade, era o sinal de que algo estava prestes a dar muito errado.

O som de elefante foi novamente escutado, tão alto que pude jurar que as árvores ao nosso redor tremeram com a vibração. Era como se toda uma manada estivesse vindo nossa direção, pronto para nos pisotear, mas tudo o que havia em nossa frente era um enorme hibrido de homem com elefante, muito maior que os dois ciclopes que nos perseguiram.

Era como olhar para um enorme arranha-céu de pele azul e muito musculoso. A criatura vestia algo parecido com uma roupa de combate indiana, reluzindo o dourado do ouro com bastante altivez, contudo, a armadura deixava exposto os cascos de elefante e a barriga humana cheia de dobras firmes.

O contraste do ouro com a pele azul do animal era surpreendente. A cabeça de elefante expunha um grande par de marfins bastante letais, um deles, quebrado pela metade. Um capacete circular e pontudo ornamentava a cabeça da criatura, que continuava a urrar com raiva.

Quatro braços fortes e humanos saíam do tronco do elefante, sendo que duas delas carregavam armas: um machado e uma adaga bastante curta, mas não menos mortal. Ele brandia as mãos armadas com agilidade, como se buscasse por algo para atingir.

Aquela criatura enorme não era de longe desconhecida por mim, pois imagens daquele elefante estavam espalhadas por todos os lugares na Índia, o que só fazia o pavor dentro de mim aumentar.

Afinal, ali em nossa frente, estava o deus Ganesha.

Não era uma visão muito animadora, afinal, aquela criatura teria que ser enfrentada por nós e nossa vantagem estava no negativa frente ao poder de um deus.

Senti meu corpo seu praticamente carregado, mas eu não prestava atenção em nada ao meu redor que não fosse o enorme elefante azul enfurecido, o qual ainda não tinha prestado atenção em nós quatro.

Quando finalmente percebi o que estava acontecendo, Kishan já havia me colocado no chão ao lado de Ren e Kelsey, os quais nos olhavam com expressões tão desesperadas quanto a minha. Ninguém parecia saber ao certo o que dizer ou fazer, apenas encaramos o enorme elefante vindo em nossa direção, pisoteando árvores e as derrubando com os dois braços livres.

ꟷ O que a mitologia indiana tem com número de braços exagerados? ꟷ perguntou Kelsey em um sussurro, tirando toda a tenção do momento e nos fazendo encarar a menina.

ꟷ É melhor não deixar o senhor Ganhesh ouvir suas palavras, ele já não parece nada contende agora ꟷ disse Kishan, e mesmo com o tom zombeteiro, pude ver os músculos dos braços tensos e inchados.

ꟷ O que vamos fazer? ꟷ Olhei para os olhos cobalto de Ren, o único que ainda parecia manter a sensatez naquele momento e não fez nenhuma piada sobre o elefante mítico.

ꟷ Não é possível vencê-lo ꟷ Era algo bastante óbvio, contudo os pelos de meu corpo se eriçaram. Mais uma vez o som de elefante reverberou entre a floresta.

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ꟷ Nós temos o elemento surpresa, talvez não seja tão impossível ꟷ disse Kishan, com a voz séria, como se um plano de guerra estivesse sendo formado em sua mente.

ꟷ Mia, acho que Kishan está louco ꟷ murmurou Kelsey em meu ouvido, fazendo com que o tigre negro a olhasse feio. ꟷ Você deixou que ele batesse a cabeça com muita força?

ꟷ Se você tem algum plano, é melhor dizer logo, irmão ꟷ alertou Ren, apontando para onde Ganesha estava, muito próximo de nós.

Para nossa sorte, o deus estava muito ocupado desmatando a floresta ao nosso redor, sem notar as quatro pessoas em sua frente.

ꟷ Pense comigo, Ren ꟷ implorou Kishan, como se o que ele dizia fizesse completo sentido. ꟷ Os elefantes eram usados nas guerras.

Um olhar de compreensão foi trocado entre os dois irmãos e por um momento, comecei a achar que os dois trocavam pensamentos, pois se encaravam com intensidade.

ꟷ Meninos, sejam rápidos! ꟷ Kelsey praticamente gritou, pois a enorme pata azul de Ganesha estava há poucos metros de nós, causando um pequeno tremor na terra quando a tocavam.

ꟷ Os maiores exércitos do mundo usavam elefantes em combate ꟷ Começou a dizer Ren, pegando sua lâmina e a girando no pulso, tudo isso com um sorriso convencido no rosto.

ꟷ Contudo, esses animais têm um calcanhar de Aquiles ꟷ Kishan completou a fala do irmão, empunhando a própria arma como o tigre branco. ꟷ A área entre a pata e o tórax é fina e sensível, o melhor local para se atacar.

ꟷ Nós temos que ataca-lo nas axilas? ꟷ perguntei, com uma careta no rosto.

Olhei para Kelsey completamente desarmada e entreguei uma de minhas adagas para a menina, que sorriu em agradecimento. A nossa volta, árvores voavam longe com a fúria de Ganesha.

ꟷ Espero que ele esteja usando desodorante ꟷ resmungou Kelsey, olhando para o elefante de forma voraz, como se estivesse pronta para acabar com um horda de deuses.

ꟷ Como vamos fazer isso? ꟷ gritei exasperada, jogando meu corpo para o lado, para desviar em um tronco errante.

ꟷ Espere a oportunidade! ꟷ gritou Kishan em resposta, já correndo em direção ao elefante enorme, chamando a atenção do deus.

A criatura azul pareceu bastante contente em encontrar outra coisa que não era um tronco de árvore, pois levou as mãos em direção à Kishan, pronto para agarra-lo e jogá-lo para longe. Com sorte, o príncipe desviou com agilidade, afundando sua lâmina negra no pulso de Ganesha, deixando-o bastante irritado.

ꟷ É melhor que Durga não fique furiosa por estarmos tentando matar o filho dela ꟷ comentei para ninguém em especial, pois Kelsey e Ren já haviam corrido para a posição oposta a Kishan, em direção ao elefante.

Sentindo o ataque de Kishan, o deus urrou de raiava, jogando os braços para o ar e fazendo-me tapar os ouvidos, tamanha intensidade do som, o qual me deixou zonza por alguns segundos.

Por alguma razão, os olhos de Ganesha se focaram em mim e o animal brandiu as mãos que seguravam as armas. Vindo em minha direção, o elefante parecia bastante convencido que eu era a culpado pelo ferimento em seu pulso.

ꟷ Se vocês têm um plano, é melhor colocarem em prática agora! ꟷ gritei para Kishan e Ren, os quais se localizavam nas costas da criatura azul.

Kelsey não estava em lugar nenhum e a arma das mãos do tigre branco tinha dado lugar a minha adaga negra, que parecia bastante singela nas mãos do guerreiro.

Meu olhar voltou-se para o elefante bem no momento em que o machado duplo veio em minha direção e, instantaneamente, saltei para o lado, rolando em direção às pernas enormes da criatura. Acertei-o com minha adaga em uma das panturrilhas, fazendo com um talho enorme até que o músculo fosse exposto, o que revirou meu estômago.

Por alguns segundos, Ganesha pareceu desestabilizados, tombando para a perna intacta enquanto urrava de dor, observando-me de forma mortal. O animal brandia as mãos que seguravam as armas e eu tentava prestar atenção nelas, pronta para fugir no momento em que ele pensasse em me acertar.

Infelizmente, as mãos livres do elefante foram esquecidas por mim e quando percebi, uma delas havia me agarrado pelas pernas, levando-me para o alto com força, fazendo-me gritar.

Era a segunda que eu era erguida e meu estômago não estava nada contente com aquilo, revirando-se e criando ânsias de vômito.

ꟷ Mia! ꟷ gritou algum dos príncipe, mas não consegui distinguir qual, pois meus ouvidos zumbiam.

Ganesha não parecia muito feliz comigo, contudo não usou nenhuma das suas lâminas em suas mãos, apenas lançou meu corpo no ar, para longo, como um dos troncos de árvores ou apenas como um inseto insignificante.

O ar era cortado por meu corpo e eu fechei os olhos, sabendo que daquela vez, Kishan não conseguiria amortecer minha queda. Minutos antes de acertar o chão, ouvi o rugido alto de um tigre.

Era como se eu fosse feita de peças de montar e no momento em que atingi a grama da campina, todas elas se soltaram. A dor que me consumiu foi lancinante, mas nem mesmo m grito saiu de meus lábios.

Minha visão era turva e tudo o que eu queria era fechar os olhos e dormir. Minha cabeça parecia úmida e com um impulso, levei uma das mãos até o couro cabelo, sentindo imensa dor ao fazer aquele movimento.

Gemi de desespero ao ver sangue em meus dedos, tentando me colocar de pé sem sucesso. Aquele ato me fez perceber que meu cotovelo estava rasgado e um pedaço do osso estava exposto.

Olhei para baixo em completo desespero, apenas para achar uma das pernas viradas em um ângulo completamente impossível.

O sangue de minha cabeça parecia banhar a grama em que minha cabeça estava apoiada. Tentei manter meus olhos abertos, mesmo que a enorme sensação de cansaço me dominasse, obrigando meu corpo a relaxar.

Daquele ângulo, vi quando os dois irmãos atacaram a criatura azul de forma assassina, chamando a atenção de Ganesha, que parecia muito feliz em ter dois novos brinquedos para torturar.

Todos os músculos do corpo de Kishan pareciam flexionados e o príncipe rugia com ferocidade, mesmo em sua forma humana. Kelsey ainda não tinha entrado em meu campo de visão, e na tentativa de encontrar a menina, movi meu corpo alguns milímetros, fazendo com que eu fosse arrebatada pela dor lasciva novamente.

Lágrimas transbordavam em meus olhos, mas nenhum grito saiu de meus lábios, ficando presos como um bolo em minha garganta. Tentei agarrar o amuleto de fogo em meu peito, mas a cada segundo, era como se a terra em baixo de mim prendesse meu corpo, deixando os membros imóveis e pesados.

A luta prosseguia, com os tigres brandindo as lâminas, cada um de um lado de Ganesha, chamando a atenção do deus e o deixando bastante confuso. A criatura parecia bastante em dúvida sobre quem atacar primeiro, mas lançava seus enormes braços na direção dos dois, tentando decapitar Ren com o machado e perfurar Kishan com a adaga.

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Os dois príncipes se esquivavam com graça, acertando os braços do elefante, abrindo enorme rasgos na pele azul, fazendo com que sangue escorresse pelos punhos da criatura. Por alguns segundos, percebi que o machucado feito por mim na panturrilha de Ganesha o havia deixado mais lento e sorri por dentro.

Lutar com algo tão grande, a ponto de se tornar inacessível, pode se tornar bastante maçante, pois após muitos minutos observando os irmãos lutando, observei que tudo o que faziam era se esquivar e atacar, apenas deixando o deus ainda mais furioso.

Contudo, percebi que os dois príncipes pareciam em um passo de dança, pois a cada vez que pulavam para longe do elefante, o levavam para a entrada da floresta. Ignorando a dor que subia de minhas pernas e braço quebrados, tentei me concentrar na luta em minha frente, vendo o exato momento em que Kishan sumiu para dentro das árvores, deixando a criatura azul enfurecida.

Ganesha voltou a arrancar os troncos com os braços livre, jogando-os para o ar como se encontrar Kishan fosse o objetivo de sua vida divina. Ren foi completamente esquecido pelo deus e sem esperar mais, o tigre branco correu em minha direção de forma exasperada.

Ignorei as palavras falhas de Ren, afinal, eu não conseguia ouvi-lo, pois o latejar em minha cabeça parecia se sobrepor a qualquer som. Continuei encarando a cena de Ganesha arrancando as árvores e uma sombra de percepção tomou conta de mim.

Naquele estado, o deus estava com as axilas completamente expostas enquanto jogava os troncos para trás, e foi em um daqueles movimento que Kelsey apareceu, segurando o cabo da lâmina de Ren como se fosse arremessa-la.

E foi o que a garota fez.

Mirando de forma precisa, a lança cortou o ar até se cravar na pele desprotegida do deus, fincando-se até encontrar o punhal.

Ren estava quase se aproximando de meu corpo, mas tudo o que pude notar foi o grito de agonia que Ganesha soltou, cambaleando para trás enquanto tentava arrancar a lâmina que o ferira com uma das três mãos livre.

Os urros do elefante azul eram ensurdecedores e percebi com espanto, quando os ouvidos de Kelsey começaram a sangrar, fazendo a menina tombar no chão no exato momento em que o deus também caiu, entre a floresta e as montanhas.

O sangue da menina começou a pingar na terra quando os braços de Kishan a ampararam, olhando na direção em que meu corpo estava, como se não soubesse exatamente o que fazer.

Ren havia caído de joelhos ao meu lado, tentando tapar o sangramento de minha cabeça enquanto buscava o amuleto em meu peito, contudo, naquele momento, o som de sinos encheu meus ouvidos e eu quis dizer algo, mas o sangue em minha cabeça continuava a escorrem, infiltrando na terra e me deixando quase inconsciente.

O sangue na terra mostrará o que o passado esconde ꟷ O sussurro tirou-me da consciência e eu fechei os olhos, ouvindo os gritos dos dois príncipes enquanto eu me deixava levar na escuridão, e meu corpo foi transportando para onde quer que Durga me levaria.

A escuridão era acolhedora e nenhuma parte de meu corpo doía. Todos os meus pensamentos estavam silenciados, contudo, imagens desconexas se passavam em minha mente, como se estivesse sonhando.

Pela segunda vez, ouvi o som se sinos como um riso maternal e quis abrir os olhos para confrontar a deusa, mas fui tirada do inconsciente quando meu corpo começou a ser chacoalhada e meus olhos se abriram.

ꟷ Vamos, logo! Não temos o dia o todo! ꟷ Um grito masculino me assustou, fazendo-me olhar para os lados, contudo, o Sol forte cegava minhas pupilas.

Percebi que meu corpo novo não doía e consegui levantar-me com um pulo; pelo o que parecia meu braço e perna contundidos estavam em perfeitas condições.

ꟷ Se você não quer ser castigada, é melhor começar a andar! ꟷ Algo bateu contra a pele de minhas coxas, causando um dor cortante.

Finalmente consegui focar minha visão e estava pronta para me colocar de pé e enfrentar o homem que me batia, quando a realidade se fez presente. Tudo em minha volta era um misto de terra cercada por florestas tropicais, como uma estrada rudimentar.

Uma multidão se enfileirava perfeitamente, amarrados por cordas nos pulsos e nos tornozelos, o que os obrigava a andar em um ritmo lento e sincronizado. Todas as pessoas tinham o corpo maltratado, com as cabeças baixas e as roupas esfarrapadas. O grupo era formado pelas mais variadas etnias, desde africanos até orientais, com alguns árabes.

Levantei a cabaça para encarar o homem que gritava comigo, apenas para encontrar uma pele oliva, coberta por pelos negros e brilhosos; o cabelo era bem cortado e a barba, perfeitamente aparada. Ele tinha uma cicatriz nos lábios, como um sinal de batalhas passadas e as roupas pareciam um uniforme militar de um império indiano antigo.

Em desespero, tentei encontrar alguma informação de que eu ainda me encontrasse no século XXI, contudo, meus olhos foram em direção aos meus braços, longos, ossudos e com uma bela cor de ébano.

Olhei para baixo e encontrei pernas longas e ossudas, cobertas até os joelhos com um pano creme completamente imundo e já rasgado. Todo o meu novo corpo parecia magro e alto como o de uma modelo.

Em desespero, olhei para os lados até encontrar uma pequena poça de água no meio da estrada de terra e com dificuldade, engatinhei até ali e olhei meu reflexo na água lamacenta. Um ofego de surpresa saiu de meus lábios, pois eu encarava o rosto de uma mulher negra, de lábios grossos com um rosto bem desenhado e fino, os cabelos estavam cheios e encaracolados, sendo lindos se não estivessem cheios de terra e embaraçados.

Contudo, uma coisa que ainda se assemelhava comigo mesma eram os olhos azuis elétricos, que se tornavam lindos em contraste com a pele negra, diferente da forma apagada que eram com minha palidez.

ꟷ Não é hora de se embelezar, garota! Levante-se, agora! ꟷ O homem veio em minha direção com passadas decididas, agarrando o meu braço fino e colocando-me de pé de forma bruta, antes de amarrar meus pés e tornozelos no final da longa fila de pessoas, batendo em meus pés com o que parecia um chicote.

Ninguém olhou para trás ou perguntou se eu estava bem, apenas continuaram a caminhar de forma arrastada, obrigando-me a seguir o fluxo. Imaginei que todos teriam medo de sofrer a mesma retaliação que eu, caso expressassem qualquer reação.

O caminho de terra parecia nunca acabar e a paisagem tropical de florestas já se tornava a mesma ao longo das horas. O Sol estava insuportável e queimava minha pele, deixando-a ardida; o vestido maltrapilho escorregava de meus ombros ossudos, contudo, a corda em meus pulsos impedia-me de levantar as alças.

Minha mente funcionava com a velocidade da luz, tentando assimilar tudo o que acontecia, mas a dor de meus pés descalços, em contato com as pedras do caminho, parecia gritar mais alto.

O Sol já se escondia no horizonte quando os guardas começaram a gritar, contentes, em uma língua que parecia muito o híndi, pois me lembrava de Kishan. Os homens se cumprimentavam com alegria, como se estivessem felizes por finalmente chegar em casa.

Quando a floresta se abriu em um gramado extenso, meus olhos encontraram uma enorme construção majestosa ao fundo, sendo iluminada pelo pôr do sol alaranjado. O castelo era muito parecido com o Taj Mahal, com os telhados abobadados e os arcos em cada entrada e janela, contudo, o prédio era pintado na cor vermelho terra, com desenhos em branco e um jardim imaculado que o rodeava.

Tentei buscar em minha memória algo que me fizesse lembrar daquele lugar, mas eu estava confusa demais para me concentrar, então apenas comecei a observar as nuances do que parecia um labirinto de roseiras no canto direito do jardim do castelo.

O fila de pessoas parou abruptamente e tentei olhar por sobre os ombros em minha frente, para entender o que acontecera. Os soldados se amontoavam em volta de duas figuras masculinas, mas daquela distância, era impossível distinguir formas.

ꟷ Aqui estão todos os prisioneiros de guerra que conseguimos capturar, Vossa Majestade ꟷ disse o soldado que havia me acordado com violência, curvando-se de forma respeitosa e sendo seguido pelos outros homens de farda.

ꟷ Vocês foram bravos e valentes ao conquistarem novas terra, em nome do nosso reino ꟷ A voz do que deveria ser o rei era altiva e decidida, lembrando-me vagamente de Ren. ꟷ Sei que devem estar cansados e com saudades de suas famílias, mas, antes de libera-los, preciso conferir todos os prisioneiros.

Todos os soldados responderam em híndi, colocando-se em uma formação horizontal respeitosa ao lado do rei, que começava a transitar entre as primeiras pessoas da fila, observando e fazendo algumas perguntas.

Só faltavam cinco pessoas antes que o rei finalmente chegasse em mim, e foi quando meus olhos focaram no homem altivo, que um lapso de memória me atingiu. Parado em minha frente, com a pele oliva e os olhos castanhos mel, vestindo roupas elegantes e finas estava o rei Rajaram.

Arregalei os olhos e dei um passo para trás, percebendo todos os detalhes daquele homem na tela que estava na antiga cabana dos pais de Kishan.

ꟷ Eu não entendo porque sempre tenho que lhe acompanhar nas conferencias de prisioneiros. ꟷ Uma voz rouca e melodiosa me atingiu em cheio no peito e eu levantei os olhos para o garoto ao lado do rei, há alguns passos para trás.

Kishan estava bem ali em minha frente, usando roupas indianas reais, adornadas com pedras e linhas brilhantes, as quais destacavam a longa camisa negra e as calças folgadas na mesma cor. O príncipe tinha uma expressão de tédio no rosto, como se preferisse estar em qualquer lugar menos ali.

Em nenhum momento ele olhou para os prisioneiros que o pai conferia, abaixando a cabeça como se tivesse vergonha do que se passava em sua frente.

ꟷ Um dia você será rei, e isso é apenas uma parte dos deveres ꟷ disse o rei Rajaram, de forma dura, ao mesmo tempo em que tocava o queixo de um prisioneiro homem, baixo mas bastante musculoso. ꟷ Este homem será muito útil nos estábulos.

Com aquelas palavras, dois soldados agarraram os braços do homem, que começara a gritar em uma língua desconhecida, talvez árabe. Ele tentava resistir, mas já era arrastado pela escolta real, sendo levado para longe do palácio.

ꟷ Ren será rei, ele deveria estar aqui, não eu ꟷ comentou Kishan, ainda não levantando o olhar, encarando os pés como se eles fossem a coisa mais interessante do mundo.

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Eu quis gritar, chama-lo e correr em sua direção, tomando-o em meus braços como uma forma de alívio, mas eu sabia que aquele Kishan não me reconheceria como Mia.

ꟷ Um reino não é nada sem seus súditos ꟷ grunhiu o rei, olhando para o filho com bastante nervosismo. ꟷ Esses prisioneiros serão nossos a partir de agora, por que essa tarefa lhe desagrada tanto?

Mais duas pessoas faltavam para que o rei Rajaram finalmente chegasse em mim e naquele momento, meu coração já palpitava no peito de ansiedade, sem saber o que aconteceria ou como reagir.

ꟷ É desumano a forma como os tratamos ꟷ As palavras de Kishan foram mais do um sussurro e o príncipe finalmente levantou os olhos, encarando com agonia um dos prisioneiros que era carregado pelos soldados; o homem protestava, se debatendo e gritando, mas ninguém lhe dava atenção.

ꟷ Nem sempre podemos ser bons, Sohan ꟷ A forma como o rei disse o primeiro nome de Kishan me pegou desprevenida e eu já não sabia o que fazer com as mãos, as quais suavam e tremiam.

Os olhos cor de mel do rei Rajaram finalmente pousaram em mim e eu prendi a respiração, encarando-o de volta com um misto de medo e ansiedade. Uma das mãos do rei coçaram o próprio queixo, como ele se ele estivesse em grande dúvida sobre o que fazer comigo.

ꟷ Como chama, menina? ꟷ perguntou o pai de Kishan, com a voz altiva que qualquer rei deveria ter. Aquele homem com toda certeza não estava acostumada a ter perguntas sem respostas.

Minha boca se abriu e eu estava pronta para responde meu nome, Amélia, quando um turbilhão de memórias me invadiu. Lá estava eu, a menina cor de ébano, correndo alegre nas savanas de um povoado, sendo seguida por um menino baixinho e com a cabeça raspada, que ria e parecia tentar me pegar.

Minhas pernas longas corriam com graça entre a vegetação amarelada, como se meu corpo fosse um felino. Os cabelos encaracolados estavam brilhosos e sedosos, balançando no ar enquanto eu olhava para trás, observando o pequeno menino me seguir.

Aquele era o meu irmão mais novo. Não conseguia saber como ou porque, mas aquela informação foi tão natural como dizer que o céu era azul.

Outra imagem tomou conta de mim, agora, um casal me abraçava com força, sussurrando palavras calmas, enquanto todo o povoado era atacado por soldados. Tudo pegava fogo quando o homem que me acordara veio em minha direção, ao meu lado, os corpos de meu irmão e meus pais jaziam sem vida.

ꟷ Ashanti ꟷ murmurei com a voz fraca, sabendo que todas aquelas imagens eram minhas memórias e eu era aquela menina altiva e feliz que corria pela savana e tinha uma família amorosa.

ꟷ Você é muito bonita para servir na cozinha ꟷ disse o rei Rajaram, mas para si mesmo do que para as pessoas ao seu redor. ꟷ Sua mãe precisa de uma nova dama de companhia, não é mesmo, Kishan?

ꟷ Acredito que sim, meu pai ꟷ respondeu Kishan, finalmente focando os olhos dourados em mim. Prendi a respiração mais uma vez, esperando que uma chama de reconhecimento cruzasse a face do príncipe, mas ele apenas me estudou por alguns segundos, antes de cruzar os braços e olhar para o lado.

ꟷ Leve-a para sua mãe enquanto eu converso com nossos soldados ꟷ instruiu o rei, pegando-me pelo braço e me empurrando delicadamente em direção ao filho, que parecia muito constrangido por tudo.

O rei voltou-se para onde seu exército estava, olhando-os com bastante orgulho enquanto os congratulava pela eximia atitude em guerra. Pelas minhas lembranças, tudo o que aqueles homens fizeram foram destruir vidas e famílias.

Um chama de raiva queimou em meu peito ao me lembrar o corpo do menino morto ao meu lado.

ꟷ Sinto muito pelo tratamento de meu pai ꟷ disse Kishan, tirando-me dos devaneios e me fazendo encará-lo com bastante curiosidade.

Nunca imaginei que um príncipe seria encarregado de levar uma prisioneira de guerra para qualquer lugar, contudo, o rei Rajaram parecia bastante decidido em passar alguns valores para o filho.

Não respondi nada, pois todo os meus sentidos estavam entorpecidos. Ali ao meu lado estava o homem que eu amava, com os cabelos negros bagunçados e os olhos dourados com um leve brilho de travessura. O perfume amadeirado de Kishan, o qual eu tanto amava, me envolvia.

Encolhi meu corpo em um ato impensado, e dei alguns passos para longe do príncipe como se me desculpasse pela proximidade. Sabia que aqueles não eram os atos de Mia, mas sim da minha versão daquele século, Ashanti.

De alguma forma, Kishan me conduziu em silêncio para dentro do palácio. Entramos pelos fundos, onde parecia um depósito, que logo daria espaço para uma longa cozinha, com centenas de mulheres usando sáris e correndo de um lado para o outro, enquanto amassavam a massa de um pão ou tiravam algo do forno.

ꟷ Vossa Alteza ꟷ disse uma das mulheres, a mais velha do grupo. Ela sorriu com carinho para Kishan, o qual correspondeu o sorriso, roubando uma lasca de pão da bandeja da mulher.

ꟷ É muito bom vê-la, senhora Bahula ꟷ respondeu o príncipe, acenando com a cabeça antes de prosseguir o caminho para fora da cozinha.

Acompanhava os passos de Kishan com certo receio, olhando para os lados quando adentramos em um largo corredor, cheio de cores e móveis extravagantes, brilhantes como ouro.

ꟷ Imagino que esteja com fome ꟷ O príncipe de olhos dourados me surpreendeu estendeu o pão que havia pego na cozinha em minha direção. Olhei-o com espanto, encarando os olhos dourados do homem com curiosidade.

Um pequeno sorriso se abriu nos lábios do príncipe e ele colocou a comida em minhas mãos, não parando por um segundo de caminhar pelos corredores amplos e iluminados do castelo, como se conhecesse aquele lugar de olhos fechados.

ꟷ Obrigada, Alteza ꟷ agradeci com a voz baixa, quase como um sussurro, mas sabia que Kishan havia ouvido, pois ele apenas balançou a cabeça.

Meu estômago roncou com o cheiro do pão fresco, e a comida foi rapidamente jogada para dentro da boca; vergonhosamente, soltei um gemido de prazer, pois aquela parecia a primeira comida que Ashanti ingeria depois de muito tempo.

Uma pequena risada escapou dos lábios de Kishan e pude sentir minhas bochechas corando. Estava pronta para me desculpar quando príncipe parou em frente à uma larga porta, batendo algumas vezes antes de se colocar ao meu lado.

ꟷ Minha mãe vai gostar muito de você ꟷ As palavras de Kishan me acertaram em cheio, pois eu já havia ouvido aquilo do príncipe antes e tive que controlar as pequenas lágrimas que se formavam em meus olhos.

A porta do quarto foi aberta e uma linda mulher com feições orientais olhou para nós, abrindo um sorriso cativante ao encarar o filho e a mim. Deschen estava parada em minha frente e tudo o que podia pensar era como a rainha lembrava tanto com Ren, mas suas feições eram travessas como Kishan.

ꟷ Imagino que seu pai tenha finalmente encontrado uma dama de companhia para mim ꟷ disse a rainha, estudando-me com bastante contentamento, antes de tomar-me pelas mãos e me puxar para dentro do quarto. ꟷ Kishan, caso você encontre seu irmão, diga que eu preciso conversar com ele.

ꟷ Sim, mãe ꟷ O príncipe curvou-se respeitosamente, voltando sua caminhada lenta pelo corredor, enquanto Deschen falava alguma coisa para mim, contudo, eu não consegui prestar atenção, pois Kishan virou-se uma última vez antes de desaparecer, e sorriu.

Eu estava pronta para devolver o sorriso de volta, quando tudo ficou escuro. Olhei em volta, mas eu já não estava mais no castelo. Passei as mãos pelos cabelos e os senti curtos e revoltos, fazendo-me perceber que eu já não era mais Ashanti, e sim, Mia.

A terra tem o poder de guardar todo o passado de uma alma ꟷ A voz calma e maternal de Durga encheu meus ouvidos, mesmo que eu não pudesse ver a deusa em lugar nenhum. ꟷ Toda a alma tem uma trajetória, e você acabou de descobrir um pouco da história da sua, Amélia.

As palavras de Durga apenas confirmaram o que eu já sabia: Ashanti não era nada mais do que eu mesma, só que a minha versão que viveu durando o reinado dos Rajaram, que sofreu com as lutas de conquista e que conheceu Kishan muito antes da maldição.

Eu estava pronta para questionar a deusa sobre as perguntas que martelavam em minha cabeça, mas, mais uma vez fui jogada para fora da escuridão e quando meus olhos se acostumaram com a imagem em minha volta, percebi que Kelsey estava ao meu lado.

A menina chorava, olhando para frente sem ao menos me perceber. Eu já não era mais Ashanti, e naquela visão, tanto Kelsey quanto eu estávamos apenas observando os acontecimentos, sem poder interferir.

Em nossa frente estava Ren, com as mãos cobrindo o rosto, enquanto o corpo tremia devido ao choro; o príncipe estava sentado em frente a uma mesa quilométrica, contudo ele era o único ocupando. Ao seu lado estava um homem usando roupas de soldados e parecia bastante desconcertado em estar ali.

ꟷ Eu sinto muito, Vossa Alteza ꟷ murmurou o soldado, fazendo uma reverência antes de deixar o príncipe de olhos cobalto sozinho com seu sofrimento.

Naquele momento eu soube, que aquela era a cena de Ren descobrindo sobre a morte de Kalika e meus peito se apertou. Olhei para o lado e encontrei Kelsey soluçando, com os olhos inchados e o nariz vermelho; tudo o que pude fazer foi tomar a garota em um abraço, pegando-a de surpresa por alguns segundos.

Quando Kelsey finalmente percebeu minha presença, a menina agarrou minhas roupas com força, deixando que as lágrimas escorressem de forma livre.

ꟷ Eu vi tudo, Mia ꟷ disse a menina, entre soluços. ꟷ Vi quando nos conhecemos, vi quando ele jurou amores por mim e vi quando Lokesh me fez pular do penhasco.

ꟷ Eu sinto muito, Kells ꟷ murmurou, afagando os cabelos chocolate da menina, enquanto Ren continuava chorando, completamente desconhecido de nossa presença.

Fechei os olhos e apoiei minha cabeça contra a de Kelsey, querendo acabar com todo o sofrimento da garota com um simples abraço.

Felizmente, com um piscar de olhos, toda a imagem se desfez e quando abri os olhos, percebi que estávamos de volta ao templo da Terra, em Goa. Toda a gruta parecia muito claustrofóbica, e eu olhei para meu corpo, ainda abraçada em Kelsey, apenas para perceber que meus membros estavam intactos, sem nenhum resquício da batalha com Ganesha.

No momento em que Kells e eu nos soltamos, meu corpo foi envolvido por braços fortes e meu rosto se afundou no peito quente e reconfortante do príncipe de olhos dourados. Um sorriso se formou em meus lábios e eu agarrei a camisa preta de Kishan, aspirando todo o seu perfume de corpo.

ꟷ Eu achei que tinha perdido você, bilauta ꟷ murmurou o tigre negro, segurando-me com força como se a qualquer momento em fosse me despedaçar.

ꟷ Você nunca vai me perder, tigre ꟷ respondi com convicção, antes de me soltar do aperto de Kishan, olhando para onde Kelsey e Ren estavam, tão envolvidos no próprio abraço, enquanto o tigre branco murmurava algumas palavras baixas e a menina apenas continuava a chorar.

Com toda aquela comoção, não percebemos quando a estátua de pedra de Durga deu lugar à deusa e seu tigre. O som de sinos chamou minha atenção e quando meus olhos focaram na divindade em minha frente, percebi que a mulher parecia usar um vestido de lodo e a pele tinha um brilho cinzento, como se fosse uma rocha.

Contudo, os olhos vermelhos de Durga permaneciam ali, nos encarando com muito orgulho enquanto acariciava o tigre em seus pés. Damon rugia em contentamento, apreciando a atenção da deusa.

ꟷ Vocês conseguiram mais uma vez ꟷ A voz musical da deusa fez com que todos nós voltássemos para ela, parando uns do lado dos outros. ꟷ Libertaram mais um elemento da magia negra que o prendia e como recompensa, os tigres proveem de mais seis horas como humanos.

Dezoito horas. Aquele era o número de horas que os dois irmãos agora tinham como humanos. Por alguns minutos, quis gritar de alegria e sair dançando, mas apenas mantive minha postura séria quando a deusa me lançou um olhar cúmplice, antes de se voltar para Kelsey, que já havia controlado o choro.

ꟷ Toda alma tem um ciclo para cumprir, contudo a sua, Kelsey, foi interrompida por uma força não natural. Sua vida foi tirada antes da hora, por Lokesh ꟷ A voz de Durga parecia tocar em todos os cantos do templo, reverberando como sinos badalando. ꟷ Nenhuma força tem o direito de interromper um ciclo e por causa disso, você está aqui em nossa frente hoje.

ꟷ Por que eu sou idêntica a Kalika? ꟷ perguntou Kelsey, limpando o nariz com a barra do moletom, tentando manter a voz firme.

ꟷ Porque uma parte da menina, que um dia foi você, ainda permanece viva até que o seu ciclo de vida seja finalmente completo ꟷ explicou Durga, mas naquele momento minha cabeça rodava e milhares de perguntas se formavam em minha mente.

ꟷ Vocês completaram mais um desafio, contudo, estão longe do fim da batalha ꟷ Enquanto a deusa falava, o tigre aos seus pés começava a retornar em sua forma de pedra. ꟷ Levem minha benção com vocês.

Terminadas aquelas palavras, a deusa deu lugar a sua estátua em pedra, completamente inanimada. Tudo estava em silêncio e só o crepita das tochas era ouvido. Kishan e Ren pareciam bastante confusos com as palavras da deusa, e pude jurar que um interrogatório seria feito para mim e Kelsey quando estivéssemos fora do templo.

Contudo, naquele momento, tudo o que consegui fazer foi me voltar para o príncipe de olhos dourados, o qual me encarava; entrelaçando nossos dedos, fiz com que Kishan me encarasse e selei nossos lábios brevemente antes de confidenciar as palavras que Ashanti não teve coragem de falar.

ꟷ Você seria um rei maravilhoso, Kishan.

Continua...

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