Ninguém está pronto para a vida

Ninguém está pronto para: Morrer


Caronte vestia um elegante terno Armani, sua careca era tão lustrosa quantos seus sapatos de couro de dragão. Uma iguaria rara naqueles tempos modernos. Havia sido presente de sua namorada, a doce Sophia, uma entidade que Caronte conheceu nas férias há três anos.

Como era de se esperar, quando alguém morria, Caronte estava diante de uma banqueta de madeira com uma lista. Ele tirou os óculos de grau Ray Ban do bolso de seu chique paletó e leu a lista.

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— Veja só quem temos aqui. — Disse, com um sorriso nada cortês. — Perseu Jackson.

Percy parou ao lado de Caronte, já fazia um bom tempo que estivera ali e conseguira passar por ele para fazer uma visitinha ao senhor dos mortos. Para ver como a vida muda.

— Quanto tempo. Como vai? — Percy perguntou, sentindo-se indescritivelmente tranquilo para alguém que havia acabado de morrer por causa de um veneno estúpido. Vai ver morrer era mesmo assim. O que ele poderia fazer se já estava morto? Ao menos tinha certeza de que seus amigos chegaram no momento certo.

Claro que podia ser cinco minutos antes dele ser envenenado. Mas Percy não estava muito inclinado em discutir aquele assunto.

— A vinda de uma celebridade como você ao mundo dos mortos sempre agita um pouco as coisas aqui embaixo. — Caronte tirou do bolso da calça um saco de moedas de ouro e entregou para Percy.

— Ué. Não sou eu quem tenho que te dar uma moeda para poder entrar? — ele ficou confuso, com o saco de moedas de ouro nas mãos.

— Eu perdi a aposta.

Percy abriu a boca, perguntando do que ele estava falando.

— O mundo inferior fez uma aposta com os Deuses do Olimpo. Nós perdemos.

— Quer dizer que vocês apostaram que eu não morreria agora? — Percy deu um sorrisinho vitorioso, mas logo sacou que o Olimpo apostou que ele ia morrer. Hey!

— Apostamos que você morreria ao vinte e cinco anos. E não agora. — Caronte então dirigiu-se até a barca.

— Espera, não entendi. Como assim aos vinte e cinco anos? O que vai acontecer quando eu fizer... — Percy não terminou a frase, pois ele nunca iria completar aquela idade.

Então eles atravessaram o rio Aqueronte. Caronte contou à Percy sobre sua namorada e a indecisão sobre eles se casarem. Claro que Percy lhe deu bons conselhos. Caronte se despediu do rapaz, quando Percy viu o cachorro de três cabeças.

— Opa! Como vai você velho amigo? — ele fez um carinho em cada cabeça de Cérbero. O cachorro abanou o rabo e deu alguns saltinhos, fazendo o chão vibrar. — É, eu sei, faz muito tempo. Desculpe, eu não trouxe nenhuma bolinha comigo. Mas acho que teremos tempo para brincar depois.

Como Caronte disse, pessoas como Percy causava um certo ânimo no mundo dos mortos. Por isso, rapidamente os juízes Minos, Éaco e Radamanto, se uniram para o julgamento do jovem filho de Poseidon.

Percy não imaginava que era assim tão famoso naquele lugar, também não sabia que era possível ter um tribunal com plateia. Contra e a favor.

Como responsável pelo tribunal, Minos deu início ao julgamento.

— Eu declaro aberta a sessão. — ele bateu o martelo, então uma mulher vestindo uma toga branca e vermelha aproximou-se da mesa onde Percy estava e o fez se levantar.

— Senhor Perseu Jackson, aqui está sua vida. O senhor não poderá mentir, mesmo se tentar. Nós temos a verdade.

— Ok. — Percy acenou para a plateia que dava alguns gritinhos. — Hein, se eu quiser encontrar alguém... será que...

— Agora você somente escuta. — e ela saiu.

Percy concordou e se sentou. Uma imagem grande no centro do tribunal se ergueu, era uma imagem de Sally Jackson grávida, caminhando na praia. O coração de Percy se apertou ao ver a mãe. Ele não sentia a saudade que sabia que sentiria se estivesse vivo, mas ainda podia dizer que queria ter tido a chance de dar um beijo em sua mãe.

Então a imagem mostrou o nascimento de Percy e seus primeiros anos. Ele sendo protegido por deuses, quando ainda era um bebê. Um homem levantou-se e fez uma acusação.

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— Aqui vemos que o réu sempre teve colaboração divina. Não é certo que os semideuses devem seguir seu próprio caminho?

— Mas você está sendo calunioso. Nós sempre ajudamos os mortais em suas dificuldades. — Outra mulher levantou-se e o respondeu. Percy estava confuso. Eles estavam mesmo julgando sua vida ali?

A imagem mostrou uma bela mulher empurrando o balanço em que Percy estava brincando e afastando uma serpente venenosa de perto dele. Percy não sabia como, mas ele tinha certeza de que era Afrodite. Em outra ocasião, um carro fora parado abruptamente quando Percy atravessava a rua carregando uma sacola de compras para sua mãe, que trabalhava até tarde. Ali estava Apolo o protegendo. E, logo depois, Percy adormecido, e uma nevoa suspeita entrando pela janela, sendo dissipada por Hermes.

— As atitudes dos deuses não podem ser levadas em conta. Pois seus atos não estão em julgamento. — Minos bateu o martelo e prosseguiu.

As imagens de sua vida passando diante dos seus olhos, dava a Percy um real significado para aquele velho ditado. Ele viu o encontro com Grover no colégio, então Annabeth e o Acampamento. Alguns momentos Percy ouvi um “Awnnn” da plateia, ou um “Uhhuuu”. Viu Luke, e imaginou se ele havia passado por tudo aquilo também.

— Aqui, vejam todos. — O mesmo homem que o acusava apontou. — Percy Jackson está deliberadamente agindo contra as nossas crenças e violando regras importantes.

— Mas todos nós fizemos isso na juventude. — Alguém gritou lá do fundo. Então continuou a passar as imagens, até o dia em que Percy e Nico se beijaram pela primeira vez.

A imagem remeteu Percy aquela noite, ele sorriu serenamente, com o coração aos pulos. Seria isso possível mesmo morto? Ou era uma lembrança humana de ter coração batendo?

E então a cena da sua morte chegou. Ver seu corpo no chão, sem vida, causava uma estranha sensação. De medo e abandono, mas Percy também via amor. Ele via seus amigos ao seu redor, lutando bravamente. Annabeth gritava e apertava seu peito, fazendo respiração boca a boca, mas sem sucesso. Leo e Jason trabalhavam juntos, fogo e raio contra Charlote e seu exército de harpias. Moros havia sido abatido e estava sendo amarrado por Luke. Enquanto Dante trazia Drew para perto de seu corpo no chão.

Aquele momento causou uma certa euforia em Percy. Ele não viu Drew por ali no mundo inferior, o que queria dizer que ela ainda estava viva.

— Percy Jackson, por sua vida dada em prol a proteção dos mais fracos, e por seus atos terem sido justos e gentis, você será recebido no Campos Elísios para toda a eternidade.

Percy estava de pé, ouvindo as pessoas ao seu redor comemorar. Algumas até gritavam que ele merecia uma segunda chance. Mas ele sabia que isso era impossível. Não era?

— Será que agora posso ver uma pessoa? Eu só queria dar um oi antes de ir para os Campos Elísios. — ele perguntou, mas foi ignorado. O tribunal foi se esvaziando, e Percy sendo levado e aclamado para fora. — Ok! Acho que vocês não estão me ouvindo.

No caminho, Percy pensava nas pessoas que poderia encontrar nos Campos Elísios. Era tanta gente boa que estava ali, que chegava dar uma certa ansiedade. Ele já podia ver as mansões vitorianas e os castelos medievais, o cheiro de churrasco era delicioso e abriu seu apetite. Lá dentro, em Elísios, as coisas pareciam ir muito bem, obrigada. E então, o que ele estava esperando?

Percy parou diante dos portões dos Campos Elísios e suspirou. Os portões se abriram, então ele caminhou naquela rua que mais parecia uma avenida famosa. Era tudo bonito, elegante, fino, divertido, animado, cativante. Uma variedade incrível.

— Onde será que eu vou ficar? — Ele parou em frente à uma banca de frutas, as maçãs pareciam apetitosas.

— Tome, meu jovem. Coma quantas quiser.

— Obrigado, senhora. — Percy pegou duas maçãs, colocando uma delas no bolso do casaco. Ele continuou caminhando e encontrou uma banca de uvas, peras e uma de sorvete de chocolate. — Eu vou virar uma bola nesse lugar. — disse, ao se deparar com uma barraquinha de cachorro-quente tipicamente Nova-iorquina.

Depois de comer dois cachorros-quentes, beber um refrigerante e comer um espeto de peixe frito, Percy continuou sua peregrinação pela cidade.

— Pelos deuses, eu não acredito no que estou vendo.

Aquela voz era bem familiar, Percy se virou e deparou-se com Silena Beauregard. Seus cabelos cor de chocolate ainda eram longos e macios, os olhos azuis como o céu sem nuvens e uma voz que transmitia carinho.

— Silena. Que bom ver você aqui. — Percy falou, notando que era meio natural falar daquele jeito, sem se sentir mal por estar, digamos, morto.

— Quando eu soube do seu julgamento, fiquei louca para vê-lo, mas eu tinha certeza de que você viria para cá. — Ela o abraçou e então se virou. — Venha, Charlie. Veja, o Percy.

Beckendorf aproximou-se dos dois, com uma aparência muito boa, na opinião de Percy.

— Como vai, amigo? — Charlie Beckendorf esticou a mão para Percy.

— Um pouco morto, mas feliz em vê-los. — eles sorriram. — Então, vocês moram aqui? Em que lugar?

— Oh! Você vai adorar nossa casa, digo, se quiser pode jantar com a gente essa noite. Vou preparar minha especialidade. Lasanha. — Silena falou animada.

— É muito boa mesmo. Você precisa experimentar. — Charlie confirmou.

— Lasanha? Pode colocar mais um prato na mesa. — ele deu uma piscadinha. — E onde, ou como eu descubro que lugar vou morar?

— Você vai descobrir. — Silena respondeu, como se a resposta fizesse sentido.

— Apenas siga seu instinto. — Charlie completou.

Percy agradeceu a ajuda, embora estivesse mais confuso do que antes. O casal apaixonado saiu caminhando, cobrando a visita dele para a lasanha.

Depois de uma hora passeando pelo Elísios, e encontrado várias pessoas que haviam morrido, Percy finalmente ficou cansado. Ele não estava triste ou abatido, só estava um pouco farto de tanta coisa boa.

Era uma sensação esquisita, pois foi a primeira vez, desde que pisou os pés no mundo inferior, que se sentiu como se tudo aquilo não fosse bom para ele. Ele não merecia. Havia algo errado em se sentir mal por viver num lugar tão bom? Afinal, ali era o paraíso.

Percy jogou a cabeça para trás e bufou, lançando o corpo na direção de um banco de praça. Havia uma fonte ao seu lado, onde uma estátua de querubim fazia xixi. Era a coisa mais bizarra que vira ali.

Ele decidiu continuar andando por aquela rua, até que ela ficou menor, eram ruas estreitas com pequenos prédios, parecia o bairro em que Percy vivia com sua mãe em Nova Iorque.

Percy podia jurar que havia ouvido umas buzinas de carro e o barulho do trânsito da cidade. Ele olhou para os lados e tinha certeza de que aquela cena era tipicamente uma manhã normal em...

— Senhor Jackson, que prazer em vê-lo.

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— Senhor Norman? — Percy podia ficar chocado agora. Seu porteiro que havia falecido um ano atrás estava ali. — O que o senhor... — ele olhou de um lado para o outro. — O senhor está aqui, que bom.

— Sim, eu estava o aguardando. — O porteiro abriu a porta do prédio.

— O senhor trabalha de porteiro, no Elísios? — Percy coçou a cabeça.

— É um prazer servir as boas pessoas, senhor Jackson. — o velho disse, caminhando pelo saguão do prédio. Era um prédio estilo neoclássico. Percy poderia dizer que já o vira antes na cidade de Nova Iorque. Parecia com o mesmo prédio que havia visitado uma exposição de artes com Nico. É, e eles havia feito planos sobre aquele lugar ser perfeito para eles.

— Obrigado por tudo, senhor Norman. — Percy tocou o ombro do velho, e entrou no elevador.

Vinte andares depois, o que Percy julgava ser tranquilo para viver, o elevador parou e abriu a porta. Percy saiu direto para uma entrada com piso de mármore.

— Uau. Vida boa é assim? — Ele perguntou para ninguém em especial e começou a andar. — Se tiver uma máquina de pinball do Homem Aranha, eu piro.

A máquina estava lá. Mas não foi isso que chamou a atenção de Percy, quando ele entrou na sala.

— Oi, amor. — Nico diAngelo cumprimentou.

Percy idealizou aquele momento tantas vezes em sua cabeça, que não podia dizer que foi igual ou não. Ele, na verdade, não conseguia pensar em outra coisa naquele momento. Mas estava se fazendo de desentendido todo o instante para conseguir dar o próximo passo.

Ele nada disse, apenas avançou na direção de Nico e o pegou pelos braços. Suas mãos passaram pelas costas do rapaz, erguendo-o do chão em um caloroso abraço apertado.

Percy afundou o rosto no pescoço de Nico, cheirando-o, sentindo-o. Guardando todos os segundos em sua memória. Ele sentiu o coração dar umas cinco cambalhotas antes de ter certeza de que não estava dormindo, e que não acordaria, vivo (hein?), sem Nico ao seu lado.

— Meu amor. — Percy finalmente o beijou, segurando o rosto de Nico com as duas mãos. Beijou-o por todo o rosto. Apertando os lábios, sentindo seu gosto natural, a textura macia dos lábios. As línguas enfim se encontraram e trabalharam como nunca. — Eu estava com tantas saudades de você.

— Eu também, eu também. — Nico o abraçou e fez um carinho no rosto de Percy. — O que está fazendo?

Percy o pegou no colo novamente.

— Onde é o quarto?

— O que? — Nico bateu no ombro de Percy, mandando-o parar. Percy estava brincando e o colocou no chão.

— Você tá diferente, tá bonito. Mais do que antes, digo, sempre foi bonito, mas está mais bonito. Sabe. — ele desistiu de tentar consertar a frase, mas elogios não se consertam. Era verdade, Nico estava diferente. Talvez mais alto, e com uma expressão mais madura no rosto. Os cabelos eram maiores e mais negros, se é que isso era possível, e a pele pálida, com certeza era possível ficar mais. — Tá mais gostoso.

— Percy.

— Tô falando sério. Morrer me deixou com tesão. — Percy falou avançando em um beijo. — Já estou liberado em te levar para o quarto, ou a gente precisa de mais um pouco de conversa?

Nico sorriu.

— Você teve uma morte honrosa, Perseu. — ele falou, passando os dedos nos lábios de Percy. — É um homem valente e mostrou-se corajoso. Nada mais justo que você ter um descanso merecido.

— Esse papo de descanso... a gente pode deixar para depois. — Percy segurou-o pela cintura. — Estou sabendo que você tá comandando o Mundo Inferior, isso faz de mim o namorado do manda chuva?

— Faz de você meu. Por toda a eternidade.

— Gostei disso. Não parece tão ruim agora... — Percy se inclinou para beijá-lo novamente. — Hmm vossa majestade Nico diAngelo.

— Ok, chega, você não precisa me chamar assim.

— Você está cheiroso.

— É?

— Sim. Eu gosto. — Percy lambeu o pescoço de Nico. — Estava com saudades do seu cheiro. — Percy apertou as mãos em volta da cintura dele. — E com saudades do seu corpo.

Apesar de estar ali pela primeira vez, Percy sabia muito bem como se locomover naquele ambiente, era como se já morasse ali a vida toda. Ele Beijou Nico e foram caminhando abraçados pela sala, passaram pelo corredor com algumas fotografias – isso porque Percy abriu os olhos enquanto beijava, só para dar uma espiadinha –, e caminharam em direção aos outros cômodos.

— Tem uma vista ótima do escritório. — Nico comentou.

— Que maravilha. — Percy mordeu-o nos lábios. — Podemos transar em cima da mesa depois, se quiser, seu pervertido.

— Eu não disse isso.

— Mas agora pensou.

Não houve resposta.

O quarto que chegaram era mesmo um lugar que Percy Jackson moraria. Amplo, espaçoso e bagunçado. Havia caixas espalhadas em alguns lugares, livros, roupas. Mas, no geral, os móveis combinavam bem. A cama era grande e confortável. Bem, eles iriam descobrir isso logo.

Percy soltou-se de Nico e segurou a mão dele.

— Da última vez, eu havia pedido você em casamento. Ainda está de pé? Ou aqui não pode casamento do mesmo sexo?

— Eu sou o supremo senhor do mundo inferior, posso casar-me com quem eu quiser. — Nico fez uma reverência.

— Ok, senhor supremo. Vamos resolver isso agora. — Percy o puxou pelas mãos, e ambos caíram na cama.