Vingue-se Ou Morra.

Manhã infernal.


- Elisa! Acorda logo desgraça.- essa era a minha mãe batendo a exatas seis e quinze da manhã na porta do meu quarto.

E eu não sei por que, já que a porcaria da aula começa às sete e meia.

Mas tudo bem, não adianta eu tentar convencer minha mãe de que ela tem uns parafusos meio soltos mesmo.

E também, porque o diretor havia ligado aqui em casa comunicando meus pais dos atrasos constantes. Alertou também sobre a possível possibilidade de eu repetir o ano por conta das faltas e atrasos.

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Como se isso fosse alguma novidade.

- Já acordei!- respondi desligando o abajur, puxando um pouco mais a coberta e me virando para o outro lado.

Ah, meu doce e querido sono.

- Levanta logo!- dessa vez as batidas se tornaram mais fortes de encontro a porta.- Eu sei que você voltou a dormir!

- Argh!- grunhi jogando o cobertor com ódio no chão e esfregando a cara tentando- inutilmente- afastar o sono.- Pronto! Prontinho! Feliz agora?- indaguei mais alto, pulando em um salto da cama e abrindo a porta só para provar minha animação.

- Não grite comigo mocinha, agora vá se arrumar!- anunciou enquanto voltava para a cozinha para terminar o café da manhã vestindo seu roupão cor-de-rosa chiclete altamente “cegável”.

Rolei os olhos e fechei a porta novamente. Caminhei até o banheiro do meu quarto (meu único luxo) e fiz minha higiene matinal. Coloquei a camiseta horrível daquele uniforme, uma calça jeans normal, um chuck taylors amarelo e deixei o cabelo solto- pelo menos ele estava apresentável hoje. Uma jaqueta preta de couro, minha mochila e desci.

Para minha surpresa, todos madrugaram.

Ou será que eu sempre acordava no horário de uma vagabunda preguiçosa?

Bem, dane-se.

Tomei o café calmamente, enquanto mamãe informava euforicamente sobre a decisão de pintar o quarto deles (meus pais) de verde limão.

- Talvez eu também coloque alguns detalhes prateados nas janelas...- boiei totalmente nessa frase (ou no assunto inteiro), assim como todos que estavam ali.

Fala sério, foi pra isso que eu acordei cedo?

- E você Lisa? Como está indo na escola?- percebem como ela muda rápido de assunto?

- Hã?- só ai que eu percebi que estava de olhos fechados quase caindo no meu pão com manteiga.

- Escola. Como está. Elisa.

Teria o imenso prazer de informar que estou sendo chantageada e sou a delinquente anônima juvenil (meus pais chamam o dono do blog assim, e acreditem, eles não sabem que sou eu) da escola. Preciso resolver exercícios de matemática da faculdade e estou com uma puta dor de cabeça no momento.

- Tudo ótimo.- respondi desanimada.- Acho que já vou indo.

- Mas já?- papai interveio.- Ainda são seis e meia!

- Jura?- rebati com ironia.- Eu poderia muito bem estar dormindo a essa hora, mas nãão, a maluca da sua esposa estourou meus ouvidos hoje mais cedo me tirando a força da cama.

- Mocinha! Olha como fala!

- Ta, desculpe, tanto faz, já vou indo.

Não esperei uma resposta a altura e corri até a garagem. E sim, eu estava puta. Acordar cedo me deixa puta. Ir pra escola me deixa puta. Tomar suco de laranja de manhã me deixa puta. Ser acordada por roupões rosa chiclete me deixa puta. Então eu estou definitivamente puta.

Joguei minha mochila no banco passageiro totalmente desgastado, quase quebrei a porta quando a fechei e inseri a chave para começar a dar a partida com uma raiva dos capetas.

Mas algo estanho aconteceu.

A lata-velha não ligava de maneira nenhuma. Tentava uma, duas, três, quatro vezes, e nada! Claro que ela nunca foi de funcionar de primeira, mas fala sério.

Olhei para o meu relógio dourado de pulso e vi que já estava a mais de dez minutos ali.

Que droga! Mas que bela droga! Meu dia já começou estressante, e agora isso! Essa é a maldição de acordar cedo. Talvez seja melhor repetir o ano de uma vez.

Acalme-se Elisa. Vamos lá, respire.

Já notou que quando alguém pede para você se acalmar ou parar de chorar, simplesmente a vontade de ficar com raiva e berrar como um bebê triplicam?

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Pois é.

- Vamos lá gracinha.- falei docemente tentando ligá-la novamente. E sim, eu acredito que carros possam nos escutar.- Funciona pra mamãe, Lola! Por favor!

Que merda, eu pretendia deixar esse fato de lado, mas eu confesso novamente, chamo minha lata-velha de Lola.

Sou interrompida de minhas maluquices íntimas (e idiotas) quando uma mão robusta e pálida bate com certa impaciência na janela de minha porta, que no momento se encontrava fechada. O que eu estava querendo? Me matar?

Abri o vidro deixando que o ar gélido envolvesse meu rosto já totalmente suado, amenizando um pouco o ódio e calor que sentia no momento. Olhei para cima e lá estava meu pai ainda com seu pijama branco de bolinhas vermelhas. Fala sério, eu não vou nem imaginar como esses dois passam a noite vestidos desse jeito.

- O que está havendo aí?- perguntou apoiando as mãos no capô.

- Parece que Lola morreu.- informei.

Uma risada rápida de sua parte envolveu o ambiente.

- Do que está rindo?- rebati com certa impaciência.

- Oh nada. Vamos saía daí, parece que vai ter que ir de ônibus.

Ai não, buzão não.

Você sabe o que tem dentro de um buzão? Se eu não estivesse com sono e zangada, estaria tudo bem, entretanto eu estava com sono e zangada.

Bebês de colo chorando incansavelmente, mães que não fazem nada para parar o choro das aberrações, caras que fumam do seu lado (mesmo que seja proibido), música alta, aquelas tias velhas que ficam cantarolando achando que são alguma Adele, garotos que não tiram o olho dos seus melões, falhas no asfalto que fazem todos dentro do automóvel pular que nem cabritos e aquele cara chato que sempre pergunta se seu pai é pedreiro.

Bufei enquanto rolava os olhos ainda dentro da Lola.

- Não vou de ônibus.- indaguei.

- Vai do que então mocinha? Voando?

- Pai, acredite, não tem nada pior que ir de buzão pra escola às seis e quarenta da manhã! Eu prefiro morrer com uma garrafa no meu...

De repente, somos interrompidos pelo som absurdamente alto e irritante da campainha.

Deveria ser crime amolar os outros de manhã.

- Eu atendo!- Nick gritou passando sobre nós com o molho de chaves da casa em mãos.

Não me pergunte, mas o garoto é viciado em recepcionar visitas.

- Vou pegar o dinheiro.- papai informou entrando novamente para dentro de casa. Claro que ele estava falando da grana do ônibus.

Ô vida lazarenta.

Bufei mais trocentas vezes enquanto pegava meu material e abria a porta para sair de minha querida Lola (ela pode ser uma lata-velha, mas é a minha Lola.)

- Elisa, tem um cara loiro e assustador querendo falar com você.- Nick surgiu atrás de mim, fazendo com que eu desse um micro pulo com o susto.

Cara loiro? Pensa Elisa, pensa.

Tio Jefferson? Mas espera aí... O tio Jefferson é ruivo, mas tipo, é um ruivo tingido porque ele era loiro, assim como a maioria da minha família, só a desgraçenta aqui é morena, não espera, o Nick e o papai também são! Mas é claro, porque se o papai fosse loiro e a mamãe também seria um pouco estranho... Eu sei que antes deles casarem ela abria a perna pra qualqu...

- Elisa!- Nick me chamou novamente e só ai eu percebi que estava discutindo minha genética com meu subconsciente.- Anda logo, desgraça.

- Já to indo.- sou um caso perdido.

Caminhei até o portão e meus olhos castanhos se arregalaram quando dei de cara com um porsche preto estacionado na frente de casa.

Caralho.

Vamos Elisa, fuja! Deve ser um sequestrador trilhonário querendo usar seu corpinho mucho sexy para fins sexuais.

Ou não.

Porque definitivamente eu não tenho um corpinho sexy.

Antes de sair correndo dali, me viro e meio que dou de cara com o... Carter?

Com uma camiseta pólo azul claro, uma calça jeans com alguns rasgos nos joelhos e um par de all star pretos ele me fitava com indiferença.

- Mas que diabos! Tá fazendo o que aqui?- sim, aquele encanto da primeira vez que o vi tinha sumido no momento que ele me levou para uma lanchonete de velhos. E pela chantagem. E também pelas questões de faculdade. E por minha inveja de seu carro ter falado mais alto.

- Entra.- foi tudo que me informou antes de dar meia volta, abrir a porta daquele tesourinho (He He) e a bater com força.

E meio que eu fiquei parada ali, na minha calçada com a cara: “O mundo resolveu brincar de lelés hoje e se esqueceu de parar.”

Então, voltei a minha consciência quando percebi que tinha mais gente no carro.

Bom, que mal ele podia me fazer com testemunhas ali?

Dei de ombros e abri a porta direita traseira.

Garotas.

Eu devia ter imaginado. Garanhões como o Carter não costumam ser garanhões sozinhos.

Enfim, o cara deu a partida e tudo ficou no mais breve silêncio.

E a ideia de elas não serem testemunhas e sim cúmplices começou a me assombrar.

- Vamos lá Elisa, preciso das questões.- sua voz grave e um tanto rouca quebrou aquele silêncio assustador enquanto o mesmo passava a dirigir com uma rapidez absurdamente impressionante.

Aimeudeuseuvoumorrer.

Acenei timidamente com a cabeça e com os olhos fechados, movendo minhas mãos lentamente para dentro de minha mochila rezando baixinho para que ele diminuísse a velocidade e poupasse minha vida medíocre com uma lasquinha de misericórdia.

Tirei as folhas com as questões resolvidas dali de dentro (valeu Nick) e em questões de segundos a garota loira e branquela sentada ao meu lado, as toma violentamente de mim, checando número por número.

E claro que minha cara de “What?” misturada com a de “Meu Deus do céu eu vou morrer” deveriam estar mais do que patéticas no momento.

- Parece que está tudo certo, Carter.- a mesma informou enquanto passava as folhas para a frente e o garoto tomava-as em sua mão esquerda.

- Ótimo.- murmurou rapidamente as jogando no banco passageiro de qualquer jeito.- De a ela as próximas instruções.

- Próximas questões?- perguntei.

- Aqui está Libe.- uma morena que sentava ao lado da loira me entregou mais um rio de folhas com alguma coisa escrito nelas.

- Elisa.- corrigi-a.- E que porra é essa?

- Preciso de uma redação sobre Martin Luther King para a próxima aula de inglês, ou seja, amanhã.- o diabo respondeu me olhando no retrovisor com uma pitada de satisfação sobre aqueles olhos azuis brilhantes e imensos.

- O que?- gritei.- Achei que estávamos quites!

O senhor musculoso riu de forma provocativa e continuou:

- Só ficaremos quites quando eu quiser, gracinha.- e graças a Deus ele começou a diminuir a velocidade do carro momentos após dizer aquilo.

Contudo algo me deixou confusa (e não foi nem o fato de ter tirado uma com a minha cara e ter me chamado de gracinha). O garoto havia estacionado em uma esquina vazia e desconhecida.

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- Agora já pode descer.- quebrou novamente o silêncio e destravou minha porta apertando algum botão do painel.

Haha, nossa que susto, achei que ele havia me mandado descer e...

- O QUE?- gritei pela segunda vez no dia.

- Desça.- rebateu com calma enquanto colocava um par de óculos escuros e voltava a segurar o volante, mordendo o lábio inferior o deixando mais vermelho ainda.

Eu poderia suspirar se não estivesse em pânico.

- Tá surda?- a loira perguntou.

Engoli um seco sentindo meus olhos se marejarem de água.

Fechei o zíper da mochila com raiva, abri a porta, pisando na calçada da rua desconhecida e batendo logo em seguida, a porta do carro com força.

Carter não esperou nem um milésimo, e dirigiu em disparada para longe dali, sumindo do meu ponto de vista em frações de segundos.

Deixando-me ali.

Completamente sozinha.

Quase se mijando de medo.