The Surviver 2

Capítulo 4 — Esfriando


Esfriando

SENTEI-ME À MESA COSTUMEIRA E ESPEREI. Eram cinco horas da manhã, e eu não tinha dormido um minuto sequer a noite inteira.

O primeiro ser vivo que se aproximou de mim foi Lola. Passava pouco das sete horas quando vi a sombra de seu rabo longo e fino como uma baqueta nas paredes do túnel. Ela seguiu meu cheiro e pulou no banco, sentando ao meu lado.

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Alisei o pelo da minha labradora dourada e afaguei suas orelhas.

—Acho que somos apenas você e eu novamente, Lola.

Ela balançou o rabo e fechou os olhos quando acariciei seu focinho.

Quando eram oito horas, os primeiros vestígios de humanos começaram a surgir.

Minha mãe Jane foi uma das primeiras, acostumada a acordar cedo, e seu sorriso se fechou quando ela examinou meu rosto.

—O que aconteceu, Ash? Nem vi você voltar ontem da incursão. Ocorreu tudo bem? Onde está Jamie?

Qualquer pessoa normal teria desabado em lágrimas e deitado no colo da mãe para se consolar.

Eu faria isso dois dias atrás.

Mas dessa vez, senti algo pesado se formando no centro do meu peito. Eu conhecia bem, apenas não estava habituada. Era frio e sólido.

Raiva.

Intensa e gelada. Apenas raiva, em qualquer centímetro do meu corpo. O sangue correu mais rápido nas minhas veias.

—Ele foi capturado.

Fiquei surpresa com meu autocontrole.

Minha mãe ficou preocupada.

—Ah, meu amor.

Ela me abraçou, mas fiquei rígida. Não queria abraços, nem consolos.

—Eu sinto tanto.

—Mas eu não sinto nada.

Jane se afastou e me encarou com sobrancelhas franzidas.

—Como não sente nada?

Baixei os olhos.

—Algo aconteceu comigo quando vocês foram capturados, mãe. Eu fiquei impulsiva, descontrolada e muito, muito furiosa. Bruma me mantinha sensata. O problema... —Ergui meus olhos. —É que Jamie foi capturado, e Bruma não está mais aqui.

Antes que ela dissesse algo, fiquei de pé e caminhei em direção ao grupo de pessoas que estava se aproximando.

Sem parar de caminhar, segurei o braço de Ian e o reboquei para longe.

—Não quero saber de sermões sobre sensatez ou qualquer outra porcaria, então escute: preciso ir atrás de Jamie, e vou com ou sem ajuda.

Ele assentiu.

—Se você soltar meu braço, ficaria agradecido.

Eu o fiz, e cruzei os braços.

—Então?

—Ashley, eu sei que está preocupada com Jamie. —Ergui uma sobrancelha. —E que quer correr atrás dele imediatamente, mas você tem que entender que precisamos de um plano, ou simplesmente podemos esperar.

—Esperar? Você quer esperar?

—Alguns meses. —Ele disse como se fosse a coisa mais fácil do mundo. —Melanie voltou, talvez Jamie volte também.

Talvez! —Expirei com raiva. —Qual seu problema, Ian? Quer esperar até o levem para o outro lado do mundo, onde eu nunca mais possa vê-lo? Precisamos ir atrás dele agora! Eu sou a única que compreende isso?

—Espere algumas semanas, então.

Apontei um dedo acusatório para ele.

—Como você agiria se Peg fosse capturada? Eu sei que ela é uma Alma – aliás, uma porcaria de Alma, que não está fazendo seu trabalho em proteger os humanos da sua espécie. Mas se ela fosse humana, Ian, e a levassem, o que você faria? —Eu praticamente cuspi as palavras. —Você esperaria?

Ele não soube o que dizer. Ian estava pensando em me repreender pelo xingamento a Peg, ou brigar sobre a doidice na minha cabeça, ou sei lá o que.

—Você a culpa? —Eram as palavras dele. —Você culpa Peg por Jamie ter sido capturado?

Neguei devagar com a cabeça.

—Eu sei que não é culpa de ninguém. A não ser, claro, minha.

—Sua?

Olhei para o chão.

—Se eu não tivesse pedido a Jamie que tirasse as lentes...

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Mordi o lábio. Ian ficou em silêncio.

—Não é culpa sua. Você nunca adivinharia.

Franzi as sobrancelhas. Se aquilo era para ser um consolo, falhou.

—O que está acontecendo aqui? —Peg se aproximava. —Está tudo certo?

Olhei para ela de modo significativo.

—O que você acha?

Meu comentário sarcástico a desarmou, e Peg se encolheu um pouco. Ela não tinha aparência de alguém corajoso, e sua personalidade pura e gentil não contribuíam para isso. Ela sempre era protegida, pelo fato de ser tão pequenina e indefesa. Eu odiava isso nela, a dependência dela para com Ian.

—Ashley estava dizendo que talvez devêssemos ir atrás de Jamie imediatamente.

Peg curvou as sobrancelhas, com uma expressão tristonha, ao olhar para mim.

—Não deve ser fácil, principalmente para você, porém nós precisamos esperar. Nem que sejam alguns dias... Teremos um plano e iremos atrás dele. Eu sei que sente falta dele, Ashley. Acredite, eu também sinto. Eu amo Jamie tanto quanto você.

Franzi o cenho diante daquele comentário.

—Como você se atreve a dizer algo assim?

Ela mordeu o lábio.

—Eu... Não quis ofender...

—Eu não quero saber de esperar. Quantos já se foram e vocês simplesmente esperaram? Que merda.

—Ashley... —Peg se assustou com o palavrão. Molenga. —Vai ficar tudo bem...

Puxei o ar com força e cerrei os dentes de raiva. Antes que eu pudesse pensar, virei meu braço num movimento rápido e acertei um tapa seco e estalado na lateral do rosto dela.

—Cale a boca! —Gritei. —Pare de dizer que tudo vai ficar bem. Por que nada está bem. Sua inocência me enoja, Peregrina.

Ela estava encolhida, choramingando, e havia uma marca vermelha com cinco dedos em sua face.

—Ashley! —berrou Ian, e me empurrou brutamente para longe de Peg. —Qual seu problema?

—Não sei. Qual é o seu? Como consegue se apaixonar pelo inimigo? Por um monstro cruel e sem coração que veste nossos corpos? Eles tiraram tudo de nós. Está na hora de revidar.

Com essas palavras, sumi túnel adentro.

Não sabia para onde estava indo até dar de cara com o pequeno depósito.

Virei uma curva abrupta para a esquerda, para outro corredor escuro, até a rampa que levava a saída.

Caminhei pela areia do deserto.

Subi nas montanhas, andando no lado de fora do teto abobadado do pátio principal.

Devagar, tombei sobre meus joelhos e fechei os olhos.

Queria sentir o cheiro da chuva novamente.

Ansiava sentir a explosão arrasadora, e refazer uma promessa.

Desejava dizer que seríamos eternos.

Cobri os olhos com as mãos, molhando-as com lágrimas.

Engoli o nó na minha garganta e limpei as lagrimas. Queria ser forte como sempre fui, e usar apenas meu lado racional.

—Que diabos... Pare de chorar, Mayfleet. Pare de chorar.

Acalmei-me aos poucos, sentindo os últimos espasmos sacudirem meu corpo.

Contei até três e olhei a paisagem a minha frente, o deserto sem fim, a autoestrada.

Prometi a Jamie que ficaríamos sempre juntos.

Era hora de fazer outra promessa.

—Eu vou te encontrar. —Gritei ao vento. —Eu vou. Só não sei como.