Canção De Ninar

Capítulo 9 - Fique bem, Sasuke


Naruto estava sentado no chão do quarto, recostado na parede. Ao seu lado estava a menina de cabelos negros, em sua mesma posição enquanto olhavam Minato que chorara até dormir na cama do filho. Naruto lembrara de tudo o que bloqueara de forma inconsciente, e o conhecimento, embora antes desesperador, o deixara estranhamente sereno.

- Você tentou me salvar. – a menina falou ao cabo de instantes. – Eu estava presa com outras crianças em uma das alas. Então você chegou de repente e arrombou a porta com um machado de emergência e começou a tirar todo mundo. Eu não conseguia andar, então você me colocou nos braços. – ela tinha um rosto triste, mas sereno. A voz era doce. – Eu estava com tanto medo! Então você começou a cantar pra mim, e me senti calma e serena. O fogo tomava tudo misturado com a água que tentava apaga-lo, e tudo ruía, e você ainda cantava pra mim não chorar. E em algum momento, tudo desabou por cima de nós dois.

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- Eu sinto muito... – Naruto balbuciou.

- Não sinta. – Ela sorriu. – Você tentou me salvar, meus pulmões eram fracos demais e toda aquela fumaça foi meu fim. E ainda assim você ficou ao meu lado.

Minato se mexeu na cama, ainda durante o sono.

-Você tem um motivo para estar aqui não tem? – ela perguntou ao cabo de instantes.

-Konohamaru. Não podia deixa-lo sozinho. Ele me chamou e eu vim por ele. Mas agora ele não está mais sozinho.

Ela levantou e sorriu: - Faça o que tem que fazer.

Sentiu um beijo no topo da cabeça loira e a garota sumiu.

Naruto se ergueu devagar e foi até a cama onde o pai estava e olhou a cabeça loira tão parecida com a sua. Passou a mão de leve sem toca-lo. Podia sentir que perdia ao pouco essa capacidade, se sentia mais leve. O homem parecia estar tendo pesadelos. Naruto apelou para que ele o ouvisse em algum lugar de seu subconsciente. Que ele alcançasse sua voz durante aquele sono, pois seria sua última chance com o pai.

-Pai. – murmurou perto do rosto do homem, sentado no chão ao pé da cama.

O rosto do homem parou de se contorcer e sorriu.

-Naruto. – sussurrou durante o sono e Naruto fez uma pequena prece. Ele o ouvia.

- A culpa não foi sua. Nada foi sua culpa. Eu lamento por não ter entendido sua dor e sua solidão pela mamãe. Eu não havia amado ninguém assim, mas agora eu entendo. Mas você tem que ser forte, pelo Konohamaru. Não o deixe sozinho, não o perca, é meu pedido.

O homem sorriu de leve: -Sim...

- Eu te amo pai. Eu lamento por tudo o que eu disse antes, mas eu te amo. Fique bem, e cuide do meu irmão.

- Filho, eu amo você...

-Eu sei.

Naruto limpou as lágrimas e beijou o topo da cabeça loira. Tudo ficaria bem, ele sabia. Agora ele sabia.

Saiu do quarto e foi andando. Aquilo seria mais difícil. Entrou no quarto do irmão que ainda dormia e sentou no colchão silencioso.

-Eu tenho que ir.- Sussurrou. O menino abriu os olhos e acordou, sonolento.

-Naru? É você?

Agora isso seria bem mais complicado.

-Sim. Deite. – Ele deitou ao lado o irmão e o puxou mais para perto. – Temos que conversar.

-Você está chorando. – o menino falou assustado.

-Desculpe. Eu tenho que ir Konohamaru, você sabe não é? Sabia o tempo todo.

Viu que o menino ficara tenso: - Não! Não me deixe sozinho. Para onde você vai? Quando volta?

- Você vai ficar bem. Não vai ficar sozinho. Tem o papai, e Moegi, e também... Sasuke.

-Eu não quero eles! Você voltou, eu chamei e você voltou! Não pode me deixar sozinho. – Naruto o apertou para que ele parasse de chorar e começou a cantar a canção de Kushina. Aos poucos a criança foi se acalmando.

- Você cresceu muito. Não é mais aquela criança assustado que passou por essa porta e tinha medo do escuro. Você é forte, e inteligente e será um homem de verdade. Você não precisa mais de mim.

-Naruto...Não.

- Cuide do papai. – Naruto beijou o topo da sua cabeça e se sentou. Konohamaru aos poucos foi largando do aperto e o soltou.

-Eu vou cuidar.

O loiro sorriu e se afastou da cama. Konohamaru viu o irmão parar na porta do quarto e sorrir aberto: - Eu te amo fedelho.

-Eu também te amo. – mumurou e abaixou o olhar. Quando ergueu, o irmão mais velho havia sumido.

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Para Sasuke, tudo ruía. Estava destruído por dentro e não conseguia reagir. Depois do choque inicial, da negação, da discussão intensa procurou Sakura para que explicasse tudo. Mas quando ela contou, soube que não queria ter ouvido a verdade. Queria a mentira, a negação, não os fatos. Nada daquilo fazia o menor sentido. Ele havia beijado Naruto, o abraçado, sentido amor, carinho e desejo. Ele havia se sentido inteiro e completo, e seu quarto ainda cheirava a limões frescos. Aquilo era irreal.

Mas o baque do concreto o tomou quando viu a loja de instrumentos. Onde antes havia a simpática loja onde tudo começara, agora havia um prédio velho que aparentava estar fechado há muito tempo. Pegou a chave que Sakura lhe dera e rodou e ouviu o barulho forçando a porta há muito não utilizada. Estava tudo coberto por lençóis brancos e poeira, e das janelas vinha um sol jogando as partículas no ar, como se tudo fosse outra dimensão. Não podia acreditar naquilo.

Ouviu o barulho do piano, fraco, a canção de ninar ecoava e ultrapassou a cortina em frangalhos. Naruto estava sentado no piano, o lençol que outra cobria o objeto no chão. Não precisou se anunciar, o loiro parou de tocar e falou sem se virar:

-Eu sabia que você viria até aqui. Você já sabe?

-Sim, Sakura me contou. – A voz de ambos era baixa, e estranhamente serena, como se temessem explodir a qualquer elevação. Sasuke trancava os sentimentos, mas suas mãos tremiam. Naruto só tinha um olhar cheio de tristeza e se virou para fita-lo.

- Ele morreu um ano depois da mamãe. Ataque cardíaco. Eu fui no enterro, e coloquei o violão de brinquedo que ele havia me dado no caixão. Não lembrava disso.

-Quem? – Sasuke se aproximou devagar e sentou no banco ao seu lado. Ficaram ambos olhando para o teclado.

-Bee.

Não soube o que responder. Lembrou do velho e das suas rimas cafonas. Aquilo tudo era... louco. Mas ali estava a prova, ao seu redor. Lembrou de todas as tardes ali, mas imaginou que se começasse a tentar entender enlouqueceria.

- O que aconteceu? – Sasuke murmurou sentindo a voz falhar. O cheiro de Naruto... Não podia ser verdade.

- Eu havia brigado com meu pai e estava no parque do hospital quando a ala explodiu. Eu pensei que ele estivesse lá e entrei. Havia tanto desespero, e gritos... Então eu passei por uma porta impedida e ouvi os gritos das crianças presas. Peguei o machado de incêndio e abri a porta. – Naruto falava rápido. Sasuke via que as mãos dele apertavam os joelhos. – Todos saíram correndo, era caos, mas uma menina não conseguia levantar e levei ela comigo. O fogo estava tentando ser contido, mas a estrutura era frágil e desabou na gente. Acordei aqui nessa sala com Bee, tocando com ele. Depois fui pra casa e fiz chocolate quente pra Konohamaru. O incêndio se apagou na minha cabeça. – Ele olhou para Sasuke e ele pode ver as lágrimas. – Eu sinto muito Sasuke, eu não lembrava, eu não sabia, eu não queria fazer isso com você...

Em resposta foi abraçado. Não conseguia saber se Sasuke chorava, mas o abraço dele o aliviava e machucava ao mesmo tempo. Sua sensibilidade estava diminuindo.

Por sua vez Sasuke via que Naruto parecia mais... etéreo. Era como se ele pudesse sumir de uma hora pra outra e o agarrou mais.

- Eu só lamento não ter te conhecido antes Sasuke. Mas mesmo assim eu te amei muito.

-Você conheceu. – Sasuke murmurou em seu ouvido e largou seu abraço. Apenas segurou o rosto de Naruto com as mãos e ficaram se fitando, cheio de sentimentos nos olhos, principalmente tristeza. – Quando eu perdi meus pais eu encontrei um garotinho loiro no parque no hospital e ele me cantou uma canção de ninar que sempre levei comigo. Eu não sabia, mas o amava já ali.

Naruto arregalou os olhos: - Eu...

Sasuke o beijou de forma urgente, depois beijou seus rosto inteiro e o puxou forte para si.

- Não é justo! – gritou.

- Tudo bem. – Naruto o consolou e se afastou segurando o rosto do jovem Uchiha entre as mãos e sorrindo de leve. – Valeu a pena cada instante. As coisas vão seguir seu rumo, continue tocando, é meu presente para você. - Naruto se inclinou e sussurrou em seu ouvido com a voz suave de ninar. - "Feliz sou porque amo e sou amado/Sem ter que alterar nem ser alterado./Sou o que sou, e quem me apontar/Os excessos medirá os que são seus;/A prumo talvez eu esteja, e eles vergados;/Os seus pensamentos não denunciam os meus atos." Disse Oscar Wilde. Eu te amo, Sasuke Uchiha. – e então ele o olhou e Sasuke viu os grandes olhos azuis repletos de carinho. O sol batia nele, como a primeira vez que o viu naquela sala, mas dessa vez parecia passar por ele, estava tão bonito...

-Naruto... – entendeu a mão para tocá-lo e não conseguiu.

- Fique bem, Sasuke. – Falou, igual quando eles eram crianças.

Sasuke tremeu: - Eu te amo Naruto.

Mas era tarde. Ele já não estava mais lá.

Só restava no ar um grito e o cheiro de limões frescos.