Stranger

Passado.


Capítulo 16 — Passado.

Domingo, 11 de novembro de 2012.

Lucas acordou, esfregando os olhos, percebendo que eles estavam sensíveis. Ao ir para o banheiro, percebeu pelo reflexo do espelho que estavam vermelhos e inchados. Tentou ficar um pouco mais apresentável, mas estava derrotado, se arrumar não adiantou muito.

Voltou para a cama, se encolhendo em seus lençóis, queria fazer um café, mas estava sem forças, não sabia o que fazer. Sentia-se desolado, exausto mentalmente, como se alguém tivesse sugado suas forças e sabia exatamente quem era esse alguém.

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Além de tudo, não conseguia pensar em como encararia Gustave novamente. Sentia um embrulho, queria vomitar algo que nem tinha em seu estômago, seu corpo todo estava estranho.

Seu coração disparou quando ouviu batidas em sua porta, Lucas sentou-se na cama como em um pulo. Ficou paralisado, sentindo que caso se mexesse, poderiam ouvi-lo. O medo de que tivessem vindo pegar a cocaína fazia com que ficasse paralisado, só se acalmando quando ouviu a voz do namorado ecoar.

Agora conseguindo se mexer, foi até a sala, estava um pouco mais tranquilo por ser Gustave do lado da fora. Mas ao mesmo tempo, sabia que não estava tão calmo assim, ainda precisaria ter uma conversa séria com ele e talvez aquela visita fosse mais do que conveniente.

— Lucas, você tá bem?! — O namorado exclamou, assim que abriu a porta.

— Tô sim, Gus. — Mentiu, em seguida sendo abraçado fortemente por ele.

— Você me preocupou... — Falou, sem querer soltá-lo. — Aconteceu alguma coisa com seu celular?

— Ah, nada, eu só não olhei mesmo, me desculpa. — Falou, sentindo seu peito apertar ao encarar os olhos dele. — Vem, entra.

— Me desculpa ter vindo, mas eu fiquei preocupado mesmo, a gente só se falou ontem cedo e antes daquilo você já estava meio sumido.

— Não precisa se desculpar, Gus. A culpa foi toda minha. — Lucas falou, encostando a porta. — Eu sei que a minha cabeça tá nas nuvens.

— O que tá acontecendo, Lu? — Falou, interrompendo-o enquanto ele andava, para encará-lo. — Você não tá nada bem. Aconteceu alguma coisa, não é? Me fala...

— Aconteceu sim. — Desviou o olhar do dele, voltando a andar. — Você quer um café?

— Não, pelo menos não enquanto a gente não conversar.

— Tá. — Lucas concordou firmemente. — A gente precisa mesmo.

Gustave foi ao sofá com ele, vendo-o sentar ao seu lado, cruzando as pernas.

— É ruim demais te ver assim pra baixo. — O namorado acariciou sua bochecha. — Fala pra mim o que aconteceu.

— É difícil... — Engoliu em seco. — Eu sou uma péssima pessoa, Gus.

— Por que está dizendo isso? — Gustave puxou-o para perto, para deitar a cabeça dele em seu ombro. — Você é meu amor, meu anjinho, é uma pessoa maravilhosa.

— Não, não sou. — Chacoalhou a cabeça, levantando do ombro dele.

— Então por que você é uma pessoa tão ruim assim? Me fala. O que houve?

— A gente tem que terminar, eu não mereço mais ser o seu namorado. — O loiro choramingou.

— Você quer terminar comigo? — Gustave indagou, sentindo seu coração ser partido ao meio.

— Querer na verdade eu não quero, mas eu não posso mais ficar com você. — Lucas sentiu suas mãos ficarem suadas. — Eu fiz a única coisa que eu não admito. Eu fiquei com outra pessoa, Gus.

— Você me traiu? — Indagou, vendo-o balançar a cabeça positivamente. — Mas como? Foi só um beijo ou...

— Foi mais que um beijo, sim. — Revelou, arrependido.

— E como isso aconteceu? — Quis saber mais, sentindo-se destruído por dentro.

— Sinceramente, eu não acredito que tenha uma justificativa, esse tipo de coisa nunca tem, mas... Era uma coisa não resolvida. — Esfregou os olhos. — Eu não falei com você ontem porque eu fiquei o dia todo me sentindo culpado.

— Então é verdade mesmo? Eu ainda estava com esperança de que fosse uma brincadeira sua... — Sentiu uma pontada de angústia lhe machucar. — Mas pelo o que eu entendi, era uma pessoa que você já conhecia?

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— Eu queria estar brincando. — Lucas admitiu. — Mas sim, não só conhecia, como também foi a pessoa que eu mais me envolvi nessa vida, Gus, eu era louco por ele. Só que ele só se aproveitou de mim, ele me deu falsas esperanças no passado e quando ele voltou prometendo tudo de volta, eu só caí.

— Então na realidade você ainda ama ele, não é isso?

— Atualmente estou o odiando, do fundo do meu coração. — Assumiu. — Mas sim, eu não posso negar que ele mexeu muito comigo.

— E o que você sente por mim, Lu? — Falou, tentando não demonstrar que estava prestes a chorar. — Eu nunca ouvi sequer você me falando que me amava... O que você sente mesmo por mim? Seja sincero.

— Não faz essa cara. — O interior do loiro foi golpeado com força. — Eu nunca falei que te amava, porque eu simplesmente não consegui. É isso. Eu nunca consegui dizer isso para ninguém.

— Olha, não é como se eu estivesse totalmente surpreso. — Enxugou a lágrima discreta no canto de seu olho. — Eu estou chateado sim, mas eu já sabia que o nosso namoro não estava indo pra frente, eu só não queria acreditar, achei que conforme o tempo passaria, você se soltaria mais comigo.

— Você sempre fez de tudo por mim, eu sou um ingrato. — Lucas assumiu. — Eu reconheço todo o esforço que você sempre fez pra simplesmente me fazer rir, além de nunca ter deixado de me tratar com carinho. Até mesmo agora você está me ouvindo e sendo compreensivo, eu nunca conheci uma pessoa como você, Gus.

— Do que adianta eu ser essa pessoa tão boa que você está dizendo, mas sequer conseguir fazer você me amar?

— A culpa não é sua, Gus. — Segurou a mão dele. — Tem muitas coisas que você não sabe sobre mim, coisas horríveis mesmo. Eu nunca consegui me desprender do meu passado, é por causa disso que eu posso parecer meio estranho às vezes... E isso não tem como esconder, Gus, tem coisas que me atormentam todos os dias.

— Eu estou um pouco assustado agora, admito. — Gustave arregalou os olhos, vendo-o parecer constrangido. — Mas já que estamos sendo plenamente sinceros, por favor, se você quiser, é claro. Se abra comigo.

— Não dá. Pelo menos, não agora.

— Por favor, Lu. — Pediu, com os olhos marejados. — Por favor.

— Gus...

— Me fala. — Continuou, entrelaçando seus dedos. — Eu quero te conhecer melhor, já faz tanto tempo que eu estou com a sensação de que não te conheço, nem parece que éramos melhores amigos, às vezes você me parece um completo estranho.

— É que aconteceram algumas coisas na minha vida que me fizeram ser essa pessoa mais fechada, não é sua culpa. Eu nunca vou conseguir confiar em alguém tão fácil, então eu acabo parecendo insensível. — Lucas assumiu, olhando para baixo.

— Tenta confiar em mim. — Gustave trouxe a mão dele para perto de seu rosto, beijando-a.

— Eu acabei de dizer que te traí e você está sendo todo fofo comigo?

— Não é isso, é que... Tem algo em você que me faz querer cuidar de você, Lu, eu não sei o que é. — Confessou, vendo o loiro encará-lo tristemente. — Acho que é pelo fato de você nunca se abrir, você parece estar sempre sofrendo em silêncio, eu não sei...

— É mais ou menos isso. — Lucas sacudiu a cabeça positivamente. — Eu estou sempre tendo conflitos internos, eu não sei como até hoje eu não endoidei. Ou eu já estou louco e não sei.

— Olha, Lu... Se você quiser eu posso ir embora, mas se você estiver mesmo a fim, quero muito saber o que você tem pra me dizer. — Gustave reforçou. — Mesmo que você ainda queira terminar, eu posso te ajudar, posso ser seu amigo. Você não precisa sofrer sozinho.

— Gus... — Suspirou.

— Por favor. — O namorado deu-lhe coragem. — Se você está tão pensativo, então eu sei que é uma coisa séria. E eu vou ouvir tudo o que você tiver para falar, por mais absurdo que possa ser. Eu prometo.

— Tudo bem. — Mordeu o lábio inferior com força, receoso. — Eu vou começar falando um pouco sobre esse homem, se você não se importar.

— Claro que não. Pode se abrir.

— Você já o viu uma vez. — Afirmou, vendo-o ficar curioso. — Ele interrompeu a nossa conversa uma vez na livraria. Ele me chamou e perguntou pelo Alberto, que é o supervisor de vendas de lá.

— Eu acho que me lembro disso, também lembro de ter achado estranho a encarada que ele me deu. — Recordou-se do momento. — E você disse que não o conhecia.

— Foi isso mesmo.

— E puta que pariu, aquele cara era enorme! — Exclamou. — Eu juro que fiquei com medo dele! Agora tá explicado, ele parecia mesmo estar com ciúme de você.

— Ciúme?

— É, ele me olhou tipo “fica longe dele”. — Gustave assumiu. — Vocês estavam brigados naquela época?

— É isso que é o mais complicado, Gus. — Passou a mão nos cabelos, pensando em como continuaria. — Olha, eu vou contar e aí se você por acaso não entender alguma coisa, é só me perguntar, tudo bem? Porque só assim você vai entender a confusão que isso tudo é.

— Tá certo, pode falar. Eu estou curioso.

— Bom, esse cara, o Marcus, eu conheci ele seis anos atrás, na fase mais difícil da minha vida, que foi o ano que eu fugi de casa. — Iniciou. — Só que eu só conhecia ele pelo sobrenome.

— Por que só pelo sobrenome?

— Eu nunca perguntei pra ele, mas eu jurava que era o primeiro nome dele, enfim. Nós ficamos juntos naquela época por pouco tempo, tipo uns dois meses.

— E esse “ficamos juntos” é quase um namoro?

— Não era um compromisso, mas pra mim, era bem sério, eu era louco por ele. Um adolescente completamente iludido. — Assumiu. — Bom, depois ele sumiu e nunca mais tive contato com ele... Todos esses anos se passaram, então ele me encontrou, mas no primeiro momento eu não sabia quem era, ele tinha mudado completamente.

— E como foi esse reencontro? — Gustave indagou.

— Não foi dos melhores, ele se apresentou apenas pelo primeiro nome, então eu não associei ele com o cara que eu conheci anos atrás. Consegue entender?

— Consigo sim.

— Foi desconfortável, porque ele tentou se aproximar demais e aí eu me assustei. Eu jurava que ele era um desses caras loucos que perseguem os outros e matam, porque ele me seguiu até o apartamento, foi muito estranho. — Lucas detalhou, com as cenas vindo em sua mente.

— Que horror.

— Eu disse que não conhecia ele, que não queria aquela intimidade e pedi espaço, só que ele insistia em me seguir.

— Você é corajoso, eu me cagaria de medo se alguém me perseguisse. — Impressionou-se. — E você não chamou a polícia?

— Eu acabei não chamando, mas foi porque ele acabou nunca mais aparecendo quando eu dei um fora nele. — Lucas explicou. — Bom, ele já tinha se afastado quando eu e você começamos a namorar, Gus. Eu estava até achando que ele nunca mais apareceria, mas nessa semana eu tive a surpresa de ver ele.

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— Mas se você não se lembrava de quem ele era, como você descobriu isso? — Gustave perguntou.

— Pra resumir, eu só fui saber quando ele me mostrou a habilitação dele.

— Que doideira. E antes você nem desconfiou de quem ele era? Nem pela voz?

— Não sei se é impressão minha, mas a voz dele parece ter mudado também, sei lá, seis anos é muita coisa.

— É. É verdade. Mas continua.

— Bom... Nesse dia da livraria que você o viu, eu ainda não me lembrava dele, então eu não menti quando disse que não o conhecia.

— Mas você ficou super pálido. — Gustave observou. — Foi porque estava com medo dessa perseguição dele?

— É, mais ou menos isso. — Concordou.

— Não quero te interromper, continua, Lu.

— Sobre isso da identidade, foi nessa sexta-feira agora. — Lucas sentiu um calafrio ao dizer, tomando coragem para continuar. — E era o aniversário dele. Quando eu cheguei no apartamento, ele estava me esperando na frente da porta, com chocolates, dizendo que queria conversar comigo.

— Isso daí é covardia. — Gustave riu baixinho, tentando quebrar o clima tenso.

— Também acho. — Lucas suspirou. — Ele comentou que era o aniversário dele e me deu os chocolates. Eu me lembro até de brincar com isso, falando que ele estava dizendo aquilo só para eu deixá-lo entrar.

— É, realmente soa como uma desculpa esfarrapada.

— Bom, depois disso ele quis me provar que realmente era o aniversário dele, me mostrando a habilitação. — O loiro recordou-se, com o seu corpo se arrepiando.

— E foi aí que você viu o nome dele e o sobrenome?

— Foi. — Sentiu sua voz tremer ao se lembrar da cena. — Por pouco eu não desmaiei, eu gritei, chorei igual criança. Aí ele me abraçou.

— Você sentiu alguma coisa especial quando ele te abraçou?

— Tudo o que eu sentia por ele no passado parecia voltar à tona. — Lucas envergonhou-se em dizer, com a voz chorosa.

— Eu posso imaginar. — Gustave sensibilizou-se. — Foi nessa noite que vocês dormiram juntos?

— Foi, Gus. — Confessou, com os olhos marejados. — Me desculpa.

— Não, não precisa se desculpar. — Afirmou, vendo-o ainda mais constrangido. — Eu consigo entender.

— A história não acaba aí. — Lucas retomou a coragem, enxugando o canto dos olhos.

— Eu estou curioso. — Segurou em sua mão. — Vamos, continua.

— Então... — O loiro engoliu o choro, mordiscando sua boca para arrancar as películas de seus lábios nervosamente. — Pra isso, eu preciso te dizer como eu conheci ele e eu tenho medo do que você vai pensar... É uma parte da minha vida que eu não me orgulho nem um pouco.

— Eu já disse que eu estou aqui pra isso, não vou te julgar, eu prometo. — Acalmou-o, passando sinceridade com seu olhar.

— Bom... Quando eu saí de casa, eu peguei todo o dinheiro que eu tinha acumulado das minhas mesadas e comprei uma passagem escondido.

— Eu me lembro de você ser bem econômico. — Recordou-se. — Aí você veio pra cá?

— Foi. — Balançou a cabeça afirmativamente. — Eu cheguei em Manhattan totalmente assustado. Eu me lembro que eu estava desesperado de fome e já estava muito tarde quando eu cheguei. Eu passei horas andando pedindo informações para as pessoas de onde tinha um hotel barato para passar a noite, aí teve um cara que se ofereceu pra me ajudar.

— E esse cara foi o Marcus?

— Não, quem me dera se fosse. — Lucas falou, exibindo pânico com seu olhar, que preocupava Gustave. — Esse cara foi muito simpático, me ofereceu até mesmo uma carona. E eu todo bobo aceitei, nem sequer desconfiei... Ele realmente me levou pra um lugar onde eu poderia passar a noite, mas eu não imaginei que nunca mais poderia sair dali.

— Hã?!

— Calma que eu vou explicar... Quando chegamos, eu já vi que a coisa estava meio estranha, porque fomos pra um bairro bem pouco movimentado, ele estacionou de frente ao que parecia ser um clube noturno. — O loiro falou, diminuindo sua voz, estremecendo com cada lembrança. — E então esse homem, que eu não faço ideia de qual seja o nome, eu só lembro que tinha uma cicatriz enorme no braço. Ele tirou um revólver da calça, me forçando a entrar nesse clube com ele.

— Meu Deus... Então foi um sequestro?!

— Sim, mas demorei demais pra perceber... — Soltou o ar dos pulmões vagarosamente, tentando não chorar. — Ali era uma casa noturna, mas eles traficavam pessoas, elas iam para lá contra a própria vontade. E eu fui levado pra um quarto... Lembro de não conseguir enxergar direito as coisas, me trancaram em um quarto e eu passei muito mal, tive várias crises asmáticas e ninguém me ajudou.

— Vem cá. — Gustave puxou-o para seu peito. — Se não quiser continuar tudo bem.

— E-Eu quero... — Falou com voz falha, sentindo as mãos dele em seus cabelos.

— O que ele fez com você? — Gustave indagou, temendo a resposta.

— Ele não falava nada e só me revistava... Eu falava sem parar que se ele estivesse procurando por alguém, que eu era a pessoa errada. Pedia pra ele me dizer o que ele queria, ou o que estava acontecendo, qualquer coisa. — Lucas enxugou uma lágrima discreta.

— E ele não disse nada mesmo? O que ele queria? Ele te tocou indevidamente?

— Ele só me dizia que eu era perfeito, que depois eu ia entender, mas não me falou mais nada. Eu ficava com nojo do jeito que ele me olhava, mas ele não abusou de mim. — Falou soltando um suspiro. — Quando ele saiu do quarto, pensei que poderia ter sido pior, mas fiquei com muito medo do que poderia vir... Foi uma tortura, eu fiquei trancado nesse quarto escuro por horas, fiquei agarrado com a minha mochila, tive que passar por algumas crises asmáticas pesadas e achei que ia morrer, achei mesmo.

— Ainda bem que você está aqui agora... — Falou, ainda mantendo a cabeça dele em seu ombro. — Mas o que aconteceu depois?

— Bom, eu acabei conseguindo cochilar e nem faço ideia de quantas horas fiquei lá até me tirarem. Esse mesmo cara voltou com outro homem e os dois me levaram pra outro lugar... Foi nessa hora que eu reparei mais do ambiente, andamos pelo clube, que era pouco iluminado e fedia a bebida, subimos uma escada e chegamos tipo em um mezanino, que tinha um corredor enorme com muitas portas. — Lucas explicou, olhando para o nada, como se as cenas passassem na frente de seus olhos. — Aí abriram a porta e me deixaram em um quarto com mais umas três mulheres. Lembro também que um deles disse “cuidem bem dele, meninas” e eu não entendi nada, me abandonaram ali e eu só fiquei encarando todas elas, olhando pra tudo ao redor, não desgrudando por nada da minha mochila.

— E depois disso? Você conversou com elas?

— Sim, uma delas foi super gentil comigo, a Lys. Já as outras eu nem lembro o nome, uma foi super grossa e a terceira nem me encarou direito. Enfim... A moça que foi gentil comigo me levou até a cama dela e me fez sentar um pouco, ela me deu um copo de água e perguntou o que tinha acontecido comigo. Eu fiquei em silêncio um tempo e só pedi respostas, eu queria entender o que estava acontecendo e ela me respondeu tudo o que eu precisava saber... Resumindo, eu estava em um prostíbulo.

— O quê?!

— Pois é, para ajudar na situação, a outra moça que foi grossa comigo, ficou rindo da minha cara, disse que eu iria ter que dar a bunda e outras coisas horríveis.

— Como assim, Lu? Que horror...

— Bom, eu fiquei desesperado já pensando em formas de fugir dali ou até mesmo me suicidar, sério, eu juro que eu pensei em qualquer coisa que me livrasse daquilo. — Continuou. — Acontece que depois de um tempo ali com elas, de alguma forma eu me acalmei. Fui levado para o refeitório um pouco depois, eu só lembro que tinha um monte de caras com umas armas enormes na nossa direção, nem se eu fosse doido teria coragem de reagir... Eu comi o mínimo possível e assim voltei para o quarto com elas, nesse tempo todo ninguém mais falou comigo. Eu sabia que ali tinha líderes e nenhum deles veio sequer dar satisfações e eu também nem sabia mais se queria que algum deles viessem, eu preferia ficar com elas que eram vítimas como eu do que ter que me deparar com qualquer um desses caras.

— Líderes?

— É, tipo cafetões mesmo. — Lucas desencostou-se dele para encará-lo. — Pelo o que a Lys me disse, era uma máfia terrível, ninguém que entrava dali saía com vida, eu soube que eles até realocavam pessoas para outras casas noturnas, mas elas nunca ouviram que alguém conseguiu fugir dali com vida.

— Poxa... Agora estou curioso para saber como você conseguiu fugir. — Gustave falou, ansioso por mais. — Continua.

— A Lys logo me deu um sinal de esperança, lembro que ela esperou as outras duas meninas dormirem para vir falar comigo. — O loiro contou, lembrando até mesmo do cheiro de mofo que aquele quarto tinha. — Eu estava em um colchão ao pé da cama dela e ela se deitou do meu lado, perguntou se eu ainda estava acordado e aí começamos a conversar. Ela sussurrava, não queria que as outras meninas soubessem do plano dela, porque faria de tudo para que desse certo e tinha medo de que a dedurassem. A Lys disse que confiava em mim, então me contou.

— Apesar de tudo, deve ter sido bom ter alguém como ela... Eu só consigo pensar no que eu faria em uma situação assim e nada me vem em mente.

— Não tem nada que prepare a gente pra isso... mas eu também sei que poderia ter sido muito pior. — Lucas sacudiu a cabeça afirmativamente. — Eu só sei que eu estava desesperado, principalmente quando ela me explicou o que acontecia por lá... Basicamente as noites de "festa" eram três vezes na semana: quinta, sexta e sábado. As festas eram como de qualquer boate de strip, mas os frequentadores eram apenas homens e as meninas de lá eram obrigadas a se exibir. Caso algum cara quisesse ter uma noite com uma garota, eles podiam. Apenas faziam o pagamento com antecedência para esses cafetões e aí levavam a menina para o quarto, que ficava naquele corredor do mezanino que eu falei, sabe?

— Aquelas portas que você comentou eram os quartos?

— Sim. E tinham muitos quartos, do mais simples até o de luxo, elas eram obrigadas a se prostituir e não podiam sequer falar da sua situação para os "clientes", porque caso tivessem alguma denúncia por conta de alguém ter dado com a língua nos dentes, nem queira saber o que aconteceria com essa pessoa. E pra garantir que ninguém abriria a boca, eles ameaçavam as meninas e sempre colocavam “clientes” infiltrados para saber como elas andavam reagindo com eles e se estavam abrindo a boca. — O loiro explicou.

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— Caralho, até isso?!

— Eu não te falei nem metade das coisas horríveis que aconteciam lá, Gus, teve uma época que colocaram até câmera nos quartos pra gravarem o sexo e verem se realmente estava rolando algo... Mas enfim, voltando pra um pouco antes disso. Sobre o plano da Lys, ela me contou que tinha um cara, um tal de Bob que estava a ajudando não fazer os programas. — Falou. — Ele pagava as horas com ela, mas não faziam nada, apenas conversavam com ela e arquitetavam pra fugir. Eu ouvi tudo atentamente jurando que aquela poderia ser a minha salvação. Só que ao mesmo tempo que ela me contava, ela não podia me dar esperança de que ele também me ajudaria porque por eu ser homem, ela não sabia se eu iria permanecer ali ou se eu seria levado para outra casa noturna.

— Cacete, Lucas, você é azarado demais. — Gustave falou, indignado com a história. — Continua, tô curioso.

— Ela estava certa, eu seria um dos que seriam realocados, mas pelo o que entendi, ainda tinham que me mostrar para alguém. Um velhote que eu nunca vou esquecer a cara. Chamavam ele de Conrad, nem sei se esse é o nome verdadeiro desse filho da puta nojento. — Lucas contou, enraivecido. — Nesse dia que ela me contou sobre o plano dela, era uma quarta-feira à noite e eu mal consegui dormir. No dia seguinte já abririam o clube e eu estava preocupado com o que ia acontecer.

— Eu também não sei se conseguiria dormir em um ambiente assim...

— Eu consegui dormir por causa do cansaço, mas eu tive muitos pesadelos, por vários dias seguidos. — Declarou. — Bom, tudo o que você imaginar se passava pela minha cabeça, principalmente se eu seria obrigado a transar com estranhos. Fiquei mais preocupado ainda, quando no almoço, uns caras armados entraram no quarto e levaram a gente para o refeitório de novo. Dessa vez vi mais meninas, que pareciam já habituadas ou conformadas com a situação, não sei direito. Eu só fiquei na minha, comi e voltei para o quarto.

— E essas outras meninas também eram de lá?

— Eram, mas eu não encontrei com elas no dia anterior, porque elas ficavam em outros quartos. A realidade é que lá tinha muita mulher mesmo, todas muito jovens, em sua grande maioria menor de idade.

— Eu não imaginava que existia esse tipo de coisa, achava que era só coisa de filme.

— E eu queria que fosse...

— Continua, Lu.

— Bom, nesse mesmo dia, eu me desesperei quando um dos caras, quase de noite, pediu para eu tomar um banho “especial” e me arrumar para esse tal de Conrad, que até então eu nunca tinha visto. Eu me caguei todo de medo e tô falando literalmente, acho que eu nunca fui tantas vezes ao banheiro de tanta dor de barriga que tive! Eu jurava que tudo de ruim ia acontecer comigo. — Murmurou, envergonhado. — Mas eu não podia fazer muita coisa, então eu tomei meu primeiro banho lá e me troquei, acho que nunca fiquei tão fedido na vida como naqueles primeiros dias que passei lá.

— E como foi isso? Você estava com suas roupas? Suas coisas?

— Sim, eles não tiraram minha mochila de mim, pelo menos, só revistaram para saber se eu não tinha nenhum aparelho celular ou armas sei lá, mas como eu não tinha, não pegaram nada. — Lucas continuou. — Nossa, me lembro que eu tive outra crise asmática quando estava me trocando depois do banho. Eu fiquei com muito medo, acho que nunca tive tanto medo na vida, eu não queria fazer sexo por obrigação e sabia que se eu negasse, também seria forçado de qualquer maneira. Eu estava apavorado.

— Qualquer um, Lu... — Gustave acariciou sua bochecha, vendo a expressão dolorosa que ele carregava. — Agora imagina passar por tudo isso com apenas dezessete anos. Eu não consigo imaginar o quão desesperador é...

— Foi difícil, parecia um filme de terror que não acabava.

— Quer continuar falando? — Segurou a mão dele com força.

— Quero sim... Naquela noite, a Lys estava se arrumando para a festa também. — Voltou a dizer. — Ela estava dizendo que assim que achasse o Bob naquela noite, que falaria de mim para ele e ele veria o que poderia fazer para me ajudar também. Mas eu mal tive tempo de agradecer, porque logo vieram me buscar.

— E foi aí você foi levado para aquele tal de Conrad?

— Foi. — Contou, com seu coração disparado pelas lembranças cada vez mais vívidas. — E foi horrível, porque esse velho desgraçado me colocou contra uma parede e passou a mão pelo meu corpo todo, tocou o meu rosto, tentou me beijar. Os caras estavam armados do nosso lado, então apesar do medo que tive de negar, neguei o máximo que consegui, porque eu não queria que ele me tocasse de jeito nenhum. E para piorar, eu lembro do mal hálito que ele tinha, que só me dava ainda mais enjoo.

— E o que aconteceu depois disso? — Perguntou, com medo do que ouviria.

— Eu continuava a negar e ele reclamava, quase gritava que eu gostava "da coisa" e que se eu não gostasse, ele ia me dar algo para me fazer gostar. — Revelou, exibindo uma feição que expressava toda a repulsa que sentia apenas ao lembrar-se. — Eu me desesperei quando ele falou isso, eu não sabia o que ele seria capaz de fazer comigo e até hoje não sei o que ele faria, porque ainda bem que nessa hora ele foi interrompido.

— Ufa. — Gustave suspirou, já estava com o coração na mão.

— Só que o meu alívio não foi tanto assim, porque quem interrompeu ele era um cara enorme, que conversava com ele, parecendo que já o conhecia. Esse cara olhou diretamente pra mim e depois pro Conrad, perguntando o quanto eu "custava". Eu me senti um lixo nessa hora, quis morrer, já não estava aguentando mais. — Continuou a contar. — Bom, o Conrad falou que eu era “carne fresca” e eu quase vomitei ali mesmo. Felizmente ou não, esse homem tinha a quantia que ele queria e até lhe deu a mais do que pediu, entregando em um envelope que parecia bem recheado de dinheiro ou sei lá... Depois de pagar o Conrad, esse homem segurou firme no meu braço, mas não me apertou a ponto de me machucar, só foi comigo para onde dois caras nos acompanharam, eu descobri que eles eram guardas, porque eles também estavam com revólveres escondidos.

— Então literalmente tinham homens armados por todas as partes? Credo.

— Sim, só que na festa as armas eram mais discretas. — Revelou. — Enquanto eu andava, tentava pensar em alguma coisa que me fizesse poder sair dali, olhei procurando pela porta de entrada, ou pela Lys, não sei, eu estava desesperado, mas fui andando. Conforme eu caminhava parecia uma tortura, quando chegamos ao quarto então, eu senti um calafrio horroroso, principalmente quando entramos e ele trancou a porta. — O loiro fechou os olhos, sofrendo com as recordações. — Eu jurei que eu ia ser estuprado até a morte ou sei lá, foi péssima a sensação.

— Eu não sei se eu peço pra você continuar ou se é melhor parar por aí.

— Não, não é tão ruim assim. — Lucas explicou. — Esse homem que pagou uma quantia alta pra ficar comigo e me levou para o quarto, era o Marcus. E ao contrário do pânico que eu estava, ele foi super gentil comigo, ficou distante de mim para demonstrar que não queria intimidade, disse que eu poderia me acalmar... Pelo o que eu entendi, ele já sabia mais ou menos o que acontecia por ali.

— Ah! Eu estava mesmo curioso para saber quando ele entrava na história...

— Ele percebeu que eu tremia muito e me deu o casaco dele, falou para eu me sentar um pouco, perguntou se eu queria comer alguma coisa, porque aí ele pediria para trazerem para nós. Lá eles tinham tipo um serviço de quarto, sabe? Tudo para melhorar a experiência do “cliente”.

— Isso é repulsivo, mas vá frente. — Gustave entristeceu-se.

— Eu fiquei quieto e ele insistiu. Marcus perguntou meu nome e em seguida se apresentou como “Wayne”, que é o sobrenome dele. — Fez uma pausa para retomar o fôlego. — Ele viu que eu estava morrendo de medo, então ele disse que não relaria em mim, que apenas queria minha companhia... Era como se eu não escutasse nada do que ele dizia, porque eu não acreditava que ele não me faria mal, eu estava em choque.

— Eu também ficaria e não é pra menos.

— Bom, eu só acreditei quando ele se sentou do meu lado na cama, olhando pra mim de um jeito diferente, não sei, ele parecia muito sincero. — Lucas contou. — Ele me perguntou quantos anos eu tinha, porque eu parecia jovem demais. Eu falei minha idade e ele se assustou. Foi quando me abri com ele, indo contra a tudo o que me disseram que era errado fazer.

— Ele era um dos amigos do tal de Bob que estava ajudando a Lys?

— Olha, sendo bem sincero, eu nunca pensei nisso, mas eu acho que não. A Lys provavelmente nem tinha conversado com o Bob ainda e o Marcus nem sequer mencionou ter vindo com um grupo de amigos. Muito menos falou de um plano de fuga, pelo menos, não assim que me conheceu.

— Bom, continua, o que aconteceu nessa noite?

— Nós conversamos pelo restante da noite e eu fui confiando nele pra me abrir cada vez mais. Tudo andou bem até ter um momento que eu fiquei preocupado. — Lucas continuou, respirando fundo. — Bateram na nossa porta e eu me lembrei da fiscalização que a Lys tinha me dito, Marcus entendeu na mesma hora do que se tratava e tirou a camisa, bagunçou os cabelos, também me pedindo fazer a mesma coisa e eu obedeci.

— Vocês fizeram isso pra despistar qualquer suspeita?

— Isso mesmo. — Afirmou. — Quando ele abriu a porta, perguntaram se precisávamos de algo. Eu lembro dos olhos desse guarda correrem o quarto todo, eu gelei de medo, mas Marcus agia naturalmente, como se realmente estivesse rolando algo entre nós. Até mesmo pediu um champanhe.

— É genial, se parar para pensar.

— Sim. E isso me salvou por várias noites. — Lucas voltou a deitar ao ombro de Gustave.

— Ele voltou outros dias para ficar com você? — Tornou a fazer um cafuné tranquilo em seus cabelos.

— Sim, ele voltou todos os dias que o clube abria. — O loiro respondeu. — Eu nunca perguntei o que ele fazia da vida, ele só dizia que ganhava bem e que queria gastar com o que valesse a pena. Mas ainda assim eu ficava desconfiado e não perguntava nada. Só que pensando bem, deveria ter muito dinheiro em jogo, porque foi suficiente para os filhos da puta me deixarem em paz.

— Então devia ser uma boa quantia mesmo.

— Com certeza, porque os guardas não me levaram para outra casa noturna como haviam dito antes que fariam. E mesmo ali só tendo mulheres, me mantiveram por lá por causa do Marcus. — Lucas salientou. — Também não me faziam ser mais rentável, então não me forçavam a ficar com outro “cliente”, nem nada disso. Eles diziam sempre para eu descansar bem e que ficasse disposto... Me chamavam de cachorrinho porque eu tinha “dono”, ou perguntavam o que eu tinha de tão mágico na minha bunda pra deixar aquele cara doido por mim. Era cada coisa que eu era obrigado a ouvir que você não faz ideia.

— No fundo só você sabia o que acontecia de verdade. — Gustave observou. — Não te dava raiva?

— Até dava, mas ainda bem que não sabiam, porque foi isso que me salvou, nunca precisei dormir com outras pessoas senão ele.

— Então vocês dormiram juntos naquela época? — Surpreendeu-se. — Eu estava achando que não.

— Sim, dormimos. Mas demorou um tempo pra isso acontecer e foi por vontade própria... Eu me envolvi muito com o Marcus, ou melhor, com o Wayne. — Lucas explicou. — Ficar tanto tempo encarcerado, tendo poucas pessoas de confiança para conversar era de enlouquecer, então eu acho que isso também me ajudou a ficar muito obcecado por ele. Porque chegou uma época em que eu contava os dias e comemorava quando estava chegando o fim de semana, porque sabia que ia ver ele. Sendo que na realidade eu não deveria ter me acostumado com aquela realidade, porque não era o certo.

— Seu psicológico com certeza estava muito abalado. — Gustave imaginou.

— De qualquer forma, nós passamos dois meses juntos, nisso a gente planejava como faria pra eu fugir dali. Ele contava histórias bonitas e tentava me convencer de que queria ficar comigo pra sempre... Eu caí como um patinho quando ele me prometeu que me tiraria dali. — Lucas entristeceu-se. — Só que quando chegava cada vez mais perto do momento em que a gente estava combinando de fugir, ele sumiu, simples assim. Ele desapareceu. Eu fiquei sem proteção e sem saber o que tinha acontecido com ele.

— Sério? Que filho da puta.

— Eu não pensava assim na época, eu só achava que algo grave tinha acontecido e que eu tinha que me virar. Então eu pedi para a Lys me tirar dali junto com esse amigo Bob dela. — Lucas acrescentou. — Ela conversou com ele, que pediu para um dos rapazes dele se passarem por cliente comigo. Assim nós planejamos tudo de última hora e conseguimos fugir. Foi algo que eu devia ter feito muito antes de ter acreditado que o Marcus me tiraria dali... Até hoje eu me arrependo de ter acreditado tanto nele, foi só depois de anos que eu reparei que ele estava me enganando.

— Não fique se culpando pelo o que aconteceu no passado, Lu. Olha só o que você já enfrentou! Você conseguiu escapar!

— Eu sei disso, mas eu não resisti quando Marcus voltou... Quando eu vi que era ele mesmo e depois se declarou, dizendo que teve problemas no passado e que não conseguiu me encontrar, eu juro que eu fiquei cego. — Lucas explicou, choramingando. — Eu me senti uma criança de novo.

— Eu entendo isso completamente, Lucas, você foi muito apaixonado por ele no passado e se separou abruptamente dele, sem se resolverem. Acho completamente compreensível. — Gustave afirmou, abraçando-o. — Vem cá.

— E-Eu queria ter sido firme, Gus... Assim eu não estaria precisando te contar tudo isso agora, eu só ia seguir a minha vida com você, sem ter te traído.

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— Lu, como você ia seguir a sua vida com tudo isso guardado dentro de você por tanto tempo? Uma hora ou outra isso iria explodir, você precisava desabafar... Presumo que todos esses anos você não falou com mais ninguém sobre isso, falou?

— Não, ninguém. — Respondeu, com voz trêmula. — Mas se eu contasse, eu sei que todos iriam se afastar, assim como eu sei que você também vai.

— Por que está dizendo isso? Eu estou aqui, não estou?

— Mas é agora que a coisa fica séria. — Lucas mordeu o lábio inferior, tomando coragem para continuar. — Se eu comecei a contar, eu vou terminar.

— Então fala. — Esfregou o ombro dele devagar, percebendo que ele novamente levantava a cabeça de seu ombro.

— Olha, Gus... Eu espero mesmo que você possa entender, mas eu também vou compreender se depois disso você nunca mais quiser olhar na minha cara. — O loiro encarou-o, com os olhos avermelhados.

— Você tá me assustando. — Gustave exibiu preocupação. — Pode se abrir.

— Bom, sabe esse Bob? Ele aparentemente era uma pessoa legal, que tirou eu e a Lys daquele lugar horroroso. Mas a fantasia do conto de fadas também não durou muito tempo, ele nos tirou de lá com um propósito. — Explicou. — O Bob precisava de uma cobaia.

— Cobaia? Como assim, Lu?

— Bom... É difícil dizer assim logo de cara, mas o Bob é traficante, ele precisava de uma pessoa onde pudesse deixar a droga, porque caso fosse pego, nunca achariam a droga com ele. — Lucas exemplificou. — Então quem você acha que foi a primeira pessoa que ele encontrou pra isso?

— Você?

— Sim. Eu mesmo, Gus. — Assumiu. — E desde aquela época é isso que eu faço... Eu me envergonho demais em te contar isso assim, mas é a verdade. É um segredo que eu guardo de todos.

— Mas você nunca denunciou ele? Daria pra armar algo para pegar ele no flagra, sei lá.

— Como eu vou fazer isso? Ele me dá proteção, diz que é isso ou ir de volta ao prostíbulo. E vai saber Deus o que fariam comigo caso me achassem de novo. Além do mais, eu poderia ser preso por conivência!

— Isso é muito triste, Lu, é basicamente uma escravidão. Ele te chantageia psicologicamente.

— Eu sei, mas tenho certeza que a Lys, por exemplo, está na pior, não faço ideia do que aconteceu com ela. Não consigo notícias, mas ela provavelmente também deve ter sofrido muito na mão dele... — Suspirou. — Enfim, quando o Bob vem aqui eu sou obrigado a esconder cocaína pra ele. Ou seja, eu acabo sendo um traficante também.

— Não, não diga isso, você não é um traficante. — Gustave afirmou, fazendo o coração de Lucas acelerar com aquelas palavras, que de certo modo lhe reconfortaram. — Você é inocente.

— Você acha mesmo? — Lucas indagou, esperançoso.

— Tenho certeza... Você é só vítima de tudo isso. — Tocou ambos os lados do rosto do loiro. — Olha pra mim, não fica se rotulando de algo que você não é... Você é uma vítima! Vítima! Entendeu? Você não é culpado pelas coisas ruins que fizeram a você.

— É muito bom ouvir isso... — Murmurou, com os lábios trêmulos. — Porque eu estava mesmo começando a pensar que era tudo a minha culpa, principalmente por eu não conseguir me livrar de tudo isso. Ele me persegue, se eu sequer falar que não quero mais fazer isso, ele vai me levar de volta ou falar onde estou para aquelas pessoas... E eu não quero isso, eu não quero voltar pra lá.

— Ele não vai fazer isso. — Gustave falou, firmemente. — Você vai ficar comigo, eu vou te proteger.