Hold On

Lembranças


Finais de semana eram desagradáveis, desnecessários e tediosos. Para Sophie, pelo menos. Eu diria que apenas para ela, aliás.

Na mansão estava apenas ela e os empregados, cada um em um canto. A garota só saiu do quarto quando uma das empregadas a chamou para almoçar, e assim que terminou voltou. Ficou deitada na cama lendo um drama qualquer.

Sophie largou o livro na cama e levantou. Saiu do quarto e ficou encarando a porta do quarto da irmã. Colocou a mão na maçaneta e devagar abriu, tomando apenas o cuidado de não fazer barulho. Ao entrar, fechou a porta sem fazer barulho e ficou observando, tudo exatamente da forma que Katy havia deixado. As empregadas apenas entravam para limpar, mas não ousavam modificar nada.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

02/07/1999 – Mansão dos Montini

"− Mamãe, Kay e eu fizemos um desenho pra você! – A pequena Sophie deu nas mãos de Sarah Montini duas folhas de papel, sorrindo de orelha a orelha e com os enormes olhos verdes cheios de expectativa.

A mulher observou os dois desenhos e devolveu uma folha para filha menor.

− Este é o seu, não é? – Ela perguntou num tom de reprovação. Ainda com um grande sorriso, Sophie assentiu.

− Você gostou? – Ela perguntou.

− Vou ficar com o da Katy– Sarah disse à filha. – Está uma gracinha.

− E o meu? – Sophie perguntou com a voz chorosa e sem o sorriso no rosto.

− Peça ajuda à sua irmã e faça um desenho melhor. Dê esse papel para empregada, não quero lixo no chão da minha casa!

A mulher virou as costas e saiu andando com o desenho de Katy na mão. Sophie não segurou as lágrimas, ela era apenas uma criança de seis anos, afinal.

Entrou no quarto da irmã aos prantos. E foi ela quem a confortou, era sempre ela que o fazia. Apenas uma outra criança de quase nove anos.

− A mamãe não gostou do meu desenho, Kay! – Ela dizia desesperada.

− Não ligue pra ela, Sophie. Mamãe não entende muito de arte, seu desenho está lindo. – A irmã mais velha consolava a outra enquanto se abraçavam.

− Mas eu só queria que ela ficasse feliz com meu desenho.

− Olha, então vamos fazer assim... Eu te ensino a fazer um desenho bem lindo pra ela e depois vamos juntas dar, tá bom? Ela vai amar!

− E se ela não gostar?

− Aí a gente dá pro papai. – Katy sugeriu.

Naquela tarde, as irmãs Montini fizeram uma grande bagunça no quarto de Katy. A garota mais velha ensinou a irmã algumas técnicas de recorte e colagem que havia aprendido na escola, e a mais nova resolveu usar. No chão do quarto ficaram revistas, papéis picados, cola, tesoura, uma total desorganização. Mas, para pequena menina de seis anos, tudo valia à pena se fosse para agradar a mulher do quarto ao lado.

− Será que a mamãe vai gostar? – Sophie perguntou para Katy, colocando na frente da irmã o resultado final do desenho.

− Ficou lindo, Sophie! – Kay respondeu enquanto sorria.

− Você gostou mesmo? – Ao fazer a pergunta, o olhar cheio de expectativa de Sophie voltou, e o grande sorriso em seus lábios voltou a ir de orelha a orelha.

− É claro, mamãe vai amar!

Sophie olhou para o desenho e para irmã, e ficou um tempo intercalando o olhar entre um e outro.

− Toma! – Ela deu a folha na mão de Katy. – Quero que você fique com ele!

Para Katy, tudo valia à pena se fosse para agradar Sophie. E aquilo, mesmo depois de anos se passarem, nunca mudou."

09/05/2009 – Mansão dos Montini

"− Parabéns, minha bebê!

Assim como em todos os anos, Katy foi a primeira a desejar feliz aniversário para irmã, que naquele dia estava completando dezesseis anos. Deu um abraço apertado e conseguiu acordá-la com os gritos altíssimos.

− Quem é que está ficando mais velha hoje? – Katy gritava animada. – Quem é que está completando dezesseis aninhos? Quem?

− Pare de me tratar como se eu fosse uma retardada, Kay. – Sophie disse com a voz arrastada, típica de uma pessoa que havia acabado de acordar.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

− Eu comprei uma coisa pra você! – A mais velha disse animada. – Vem comigo, está no meu quarto.

Sorrindo, Sophie levantou da cama e foi correndo para o quarto de Katy atrás dela.

− Fique parada com os olhos fechados, eu vou buscar!

Sophie fez o que a irmã pediu, e em poucos segundos a ouviu voltar.

− Pode abrir.

Ao abrir os olhos, a aniversariante enxergou em uma das mãos de Katy um lindo vestido, e os olhos verdes imediatamente brilharam.

− Eu não acredito! – Sophie berrou, puxando das mãos da irmã a peça. – É o Valentino que eu queria! – Ela falou sorrindo. – Obrigada Kay, você é a melhor irmã do mundo!

Sophie deu um forte abraço na irmã, e a agradeceu um pouco menos de trinta e cinco mil vezes.

− Ainda não te contei o melhor, Sophie!

− Ainda tem mais? – A mais nova perguntou sorrindo.

− O que você tem me pedido há mais de dois anos, Sophie? – Katy perguntou olhando para irmã com um meio sorriso.

− Eu não sei, conta!

Sophie estava visivelmente curiosa, olhando para irmã com uma atenção incomum. A ansiedade havia tirado dela qualquer possibilidade de pensar sobre o que Katy falava.

− Estamos de viagem marcada para mês que vem. – Ela disse, ainda fazendo mistério. Sophie franziu a testa, e Kay não conseguiu mais segurar a surpresa para si. – Para Paris! – Ela continuou, animada.

Outra vez a irmã mais nova deu um berro e abraçou a mais velha. Estavam há dois anos planejando uma viagem à Paris, onde passariam dias fazendo compras nas lojas mais maravilhosas que existiam."


Não houve a viagem. Foi no início do mês seguinte que houve o desmaio de Katy, e ela obviamente não estava em um bom estado para viajar. Sophie já não estava preocupada com a viagem, ela sequer pensava nisso. Tudo que queria era ver sua irmã bem, com saúde.

Eu preciso dizer o quanto Sophie estava chorando agora? Ela estava ali sentada na cama de Katy, lembrando-se dos momentos que já havia passado naquele quarto com ela. Apenas se perguntando o porquê dela não estar ali com ela agora, o porquê dela ter ido embora tão cedo.

Tudo havia ficado muito mais difícil para Sophie depois da morte de Katy, E a cada dia que se passou o simples ato de sorrir foi se tornando mais complicado. Não havia motivos para isso, a vida não colaborava com ela.

Acredite se quiser, mas quem havia arrancado o primeiro sorriso sincero de Sophie depois de cinco anos havia sido Thomas Löhnhoff, em uma simples troca de olhares pela janela. Havia sido espontâneo, e assim que Sophie percebeu ela fez questão de disfarçar.

O primeiro sorriso sincero, a primeira gargalhada, a primeira conversa em que ela não precisava pensar no que dizer e talvez, apenas talvez, o primeiro cara que ela estivesse gostando de verdade. E esse último não apenas em cinco anos, mas em sua vida toda.

Thomas Löhnhoff. Como ele havia ido parar em seus pensamentos outra vez mesmo?