Lorenzo começaria o trabalho um pouco mais tarde aquela manhã, e Marcela não dava aula no primeiro período. Lia não havia dormido em casa, Gil já tinha saído para a escola, estavam só os dois. O médico parecia preocupado, não tendo falado muito desde que acordou.

-O que foi, Lorenzo?

-Eu estou preocupado com a situação daqueles dois...

-Eu normalmente perguntaria quais dois, mas acho que é meio óbvio... O Dinho é um deles, não é? Aposto um pãozinho que a Lia é a outra!

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-Eu sei que não deveria me meter, que o Dinho quer falar na hora certa, do jeito certo, mas... Eu conheço a minha filha, Marcela. Se depender dela, na pior das hipóteses eu vou chegar em casa dizendo “filha, seu ex morreu, quer chorar ou comemorar?” e ela não vai entender nada.

-Bate na madeira, Lorenzo! E você que pensa! Eu bem vi aqueles dois de chameguinho ontem no sofá.

-De que?? – Lorenzo não podia estar mais surpreso.

-É, a Lia se comoveu com o estado dele e quando o Dinho acordou não se desgrudaram um segundo, rolaram até uns beijinhos, achei tão fofo!

O médico não sabia se ficava feliz pelo paciente ou preocupado com a filha se rendendo ao garoto que a fez sofrer.

-Então eles voltaram?

-Bom, a Lia tentou deixar claro que era só um momento de trégua, mas quem entende aqueles dois? A essa hora ela pode estar tanto arrancando o pescoço dele, quanto o beijando e abraçando. Se bem que tem o Vitor, também...

-Coitado do Vitor, não tem culpa de nada... E a Lia também não ajuda, né? Isso ela puxou da Raquel!

Marcela riu do namorado querendo culpar a ex-mulher e levou seu prato à pia para não precisar responder. Quando voltou, lembrou a questão principal do assunto.

-Você acha melhor contar pra ela?

-Eu prefiro que a Lia saiba a verdade logo. Não dá pra prever se vai dar tudo certo ou não, mas é melhor preparar o terreno... E depois daquela cena ela deve estar cheia de dúvidas.

Ficaram pensativos por um momento, até a professora questionar Lorenzo quanto à cena que a atormentara tanto.

-O que aconteceu com o Dinho ontem, Lorenzo?

-Você tem certeza que quer saber? – o médico encarou o silêncio da professora como consentimento - O Dinho tentou se matar.

-ELE O QUE??? – Gil entrara naquele exato momento e perguntou em uníssono com a mãe, ambos aterrorizados pela confissão do pai de Lia.

-Gil? Filho, o que você está fazendo aqui?

-E-eu esqueci uns cadernos... Que história é essa? O Dinho tentou se matar? Por isso ele tava daquele jeito? Por isso ele precisou ser sedado? Por que ele tentou se matar? Como assim? A Lia já sabe? Tem certeza que não era blefe? E se foi só pra chamar a atenção? Aposto que foi! Aquele imbecil só se importa com ele mesmo, não faz sentido!

-Filho, olha como você fala do Dinho! Ele é meu aluno, ex da minha enteada e, apesar dos erros, ótimo garoto!

-Até você defendendo ele?

-Gil, o que você falou foi muito grave, a Marcela tem razão.

-Por que você ta defendendo tanto o Dinho? Você nunca foi com a cara dele!

-É uma história complicada, filho...

-Por que vocês não param com os segredinhos e contam de uma vez?

-Esse é um assunto meu e do Dinho que não lhe diz respeito!

Gil se sentiu ofendido pela reação do médico e até mesmo da mãe. Pegou seu material e se retirou, irritado. Marcela cogitou ir atrás do filho, mas estava chocada demais com o que ouvira de Lorenzo para levantar de sua cadeira.

-Lorenzo, isso é muito grave!

-Eu sei... O Dinho perdeu completamente o juízo! Eu não sei mais o que fazer...

-Vocês não têm acompanhamento de psicóloga no hospital? Se bem que, pelo que eu vi aqui em casa, acho que a Lia já se encarregou de animá-lo.

Lorenzo engasgou seu sanduíche, vermelho, com os olhos arregalados.

-Calma, ela não o deixou tão feliz quanto você imagina. Foram só uns beijinhos...

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-Eu sei muito bem aonde esses “beijinhos” levam! Aliás, às vezes eles não precisam nem disso, né?

Marcela riu da preocupação do médico, sabendo que ele tinha razão. Lia e Dinho juntos eram sempre um perigo para um pai conservador como seu namorado. A sua preocupação com o garoto, no entanto, logo desmanchou seu sorriso. Conversaria com ele após a aula.

-x-

-Lia! Lia, espera!

No intervalo, Dinho tentava chamar a atenção da garota que o ignorava. Correu até ela, mas a roqueira apenas mudou de direção, saindo da quadra em direção à frente do portão do colégio, acompanhada de seus fieis escudeiros: Ju, Gil e Vitor. Dinho a seguiu e alguns alunos começaram a prestar atenção na cena, curiosos quanto à nova “performance” do ex-casal. Cansado de tentar se comunicar civilizadamente com a ex, Adriano a alcançou e segurou-a pelo braço.

-Me larga! Não enche, garoto! Me deixa em paz!

-Agora você vai me ouvir!

-Ei! Larga a minha namorada!

Vitor tentou empurrar Dinho, mas o garoto estava com a mão firmemente envolta no cotovelo de Lia. Parecia estar usando as forças que lhe restavam para manter-se imóvel, em pé. Aproximou Lia de si e suas respirações se mesclaram. Vitor havia visto o suficiente. Separou o rival de sua namorada à força, aproveitando a distração de Dinho, que já não a segurava com tanta firmeza, perdido no olhar da garota. Lia pareceu acordar de um transe ao ser puxada por Vitor e, mais uma vez, atacou Dinho.

-Eu te odeio! – Lia saiu bufando e Ju e Vitor a seguiram.

-Você não vem, Gil? – perguntou a it-girl.

-Eu quero falar com o Dinho, pode ser? Ele precisa ouvir umas verdades.

-Vê lá o que você vai falar... – Ju olhou para Adriano uma última vez antes de voltar para a sala de aula com a amiga. O garoto estava sentado no chão, atirado contra o portão da escola. Dinho sempre foi cheio de vida e Juliana estranhava o novo comportamento agressivo e sombrio do aventureiro, que parecia tão mais sério do que ela lembrava. No entanto, não era a seriedade resultante da maturidade que o garoto poderia ter adquirido viajando o mundo sozinho, era simplesmente a ausência de sorrisos.

Dinho estranhou a presença de Gil e se levantou para encarar o pichador.

-O que você quer? Veio rir da minha cara, exigir que eu me afaste da Lia?

-Eu sabia que você não prestava, mas nunca imaginei que fosse capaz de algo tão baixo.

-Eu perdi o controle, eu sei. Mas eu nem segurei tão forte, o Vitor que é fraco...

-Eu não estou falando disso. Como você pôde fingir suicídio pra chamar a atenção da Lia?? Você não tem noção? Preocupar o Lorenzo e a minha mãe daquele jeito por conta de um teatrinho??

-Não fala o que não sabe! Aliás, nem deveria saber!

-Eu ouvi o Lorenzo contando pra minha mãe.

-A Marcela sabe? Olha só, não conta pra Lia! Eu preciso-

-Você fica! E vai me ouvir!

-Eu não fingi nada, Gil, e isso não é da sua conta, agora me deixa ir!

Antes que o filho da professora pudesse impedir, Dinho correu para a quadra poliesportiva, mas o sinal para o retorno às aulas mudou sua trajetória. Para sua sorte, Gil não pareceu tocar no assunto com a melhor amiga.