Não Chore Esta Noite

Mais Uma Vez


Segurou-o a tempo, dessa vez com ambos. Seus braços doíam, não aguentariam por muito tempo. Dinho tentou segurar o braço da roqueira, que foi arrastada para a beira pelo peso do aventureiro. Desistiu. Seu braço ainda resistia à dor, mas temia pela garota. Lia não era tão forte fisicamente quanto tentava ser emocionalmente. Cairiam os dois. Talvez fosse um castigo por ter falado daquele jeito com a garota que amava. E talvez em outro momento negasse, mas, ali, sem futuro, sem amanhã no qual pudesse acreditar, só os olhos de Lia e o meio sorriso assustado que tentava encorajá-lo lhe importavam. Poderia soltar-se das mãos da garota e morreria tranquilo. Ou não. Não podia, não se deixaria levar sem antes beijá-la novamente, sem antes assumir o que sentia. Olhou à sua volta. Um pedaço de raiz se revelava enterrado no barranco. Poderia não aguentar seu peso e derrubá-lo de vez, ou levá-lo de volta para Lia. Uma única chance. Olhou fundo nos olhos apavorados da roqueira. Não podia deixá-la ir, não sem antes tê-la em seus braços como sonhara desde o primeiro dia, desde o primeiro beijo. Precisava viver tudo o que sentia, pelo menos uma vez, pelo menos uma última e única vez. Arremessou-se em direção à raiz.

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Por um segundo sentiu seu coração parar. Dinho havia soltado a sua mão. Era agora. Perdê-lo-ia para sempre. Sua negação constante para nada mais lhe servia. Tanto tempo tentando salvar sua amizade com Juliana, e agora o perderia de vez, sem chances de recomeços ou de reconciliações. Não podia deixá-lo ir. Era sua culpa, havia deixado que sua mão escapasse, havia deixado que Dinho escapasse, desde o primeiro dia, desde a primeira implicância do garoto que só queria vê-la feliz. Se não tivesse insistido em seu orgulho a ponto de se perderem, a ponto de levá-lo ao precipício que agora o arrastava para longe... Daria tudo por salvá-lo, por tê-lo por mais aquela noite, que fosse. Por viver, pelo menos uma vez, pelo menos naquele instante. Por se entregar ao que sentia, por livrar seu peito da clausura em que o deixara, protegido do objeto de tudo o que sentia e que a afligia. Precisava se libertar. Só mais uma noite, só mais um instante, e jamais pediria por nada novamente.

Em meio a seu delírio, chutou uma pedra que não se moveu. Olhou rapidamente para trás, segundos, e voltou a olhar para Dinho. Apoiou-se com toda sua força contra a pedra, puxando-o para si enquanto Dinho se apoiava com um pé sobre a raiz, suas mãos de volta aos braços de Lia. Doía-lhes cada músculo. A raiz começava a ceder e Adriano a empurrou com o pé uma última vez por impulso. A roqueira entendeu, e rapidamente o puxou com toda força que ainda tinha. As mãos de Dinho encontraram a borda novamente. Só mais um pouco. Apoiou-se com toda força contra o solo, cambaleando em terra firme sobre a loira, que o abraçou aliviada. Rolaram para longe da borda do alto barranco, até que as árvores os freassem. Beijaram-se apaixonadamente, desesperados, seus lábios ainda trêmulos pelo risco recente. Lágrimas eram camufladas pela forte chuva que ainda os banhava. Afogavam-se em beijos angustiados, com a fúria de quem havia lutado contra a morte e vencido. Os pingos gélidos e incessantes eram esquecidos a cada toque de suas línguas, e seus arrepios não mais eram de frio, mas de tudo que sentiam e guardavam por tanto tempo, desejo os afogando tanto quanto a água.

Conforme a chuva diminuía, os beijos se acalmavam. Desespero, angústia e medo partiam com os pingos que cessavam. Como seus beijos, a água parou aos poucos. A chuva teimava mais que Lia, Dinho riu.

– Que foi? – A roqueira cobrou ao perceber a reação do garoto.

– Nada. – Beijou-a carinhosamente. – Valeu. – Ao olhar confuso de Lia, respondeu. – Por ter me salvado. Eu não teria aguentado tanto tempo se não fosse você.

– Dinho, você sempre se salva. – Zombou sem jeito. – Sempre foi assim, você sempre consegue o que quer.

– Menos você. – Confessou.

– Menos eu? – Riu. – E o que a gente tava fazendo até agora? Procurando orquídias?

– É... – Concordou inocentemente. – Não tava?

Parou para pensar no que Lia havia dito... Tria mesmo a conquistado de vez? Lia sendo Lia, provavelmente fingiria que nada acontecera tão logo chegassem ao acampamento. Preferia não se iludir. O que não o impedia de viver o momento pelo qual tanto pedira.

A roqueira não percebera o que estava acontecendo até então. Acampamento, Quadrante, Ju. Ju! Estava aos beijos com o namorado da melhor amiga! Não podia, não devia. Precisava correr o quanto antes, voltar como pudesse, mesmo que se perdesse outra vez. Não podia se deixar levar, Dinho estava vivo e a realidade os alcançaria novamente. Afastou-se o suficiente para não permanecer deitada sob o garoto.

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– Aaaaah!

– Dinho, o que foi? – Voltou-se para o garoto, para só então perceber a ferida em sua perna. – Ai, meu deus, você tá bem? Dinho, a gente precisa sair daqui, você precisa de um médico urgente!

– Eu... – Tentou se levantar. – Eu... – Mais um impulso. – Eu não consigo! – Admitiu desesperado.

– O que a gente faz agora? – Perguntou derrotada.

– Faz assim, - Segurou sua mão. – a gente fica aqui até amanhecer, daí você tenta achar o acampamento de novo. Vai dar tudo certo.

– Tem certeza? Dinho, eu não posso te deixar aqui.

– Pode. Ou você me deixa aqui, ou ficamos os dois de vez. Por mais que eu queira ficar sozinho com você o máximo que conseguir, a gente precisa voltar. Mas antes... Antes a gente precisa tirar a roupa.

– O QUE?? Você é um idiota, sabia? Eu aqui me preocupando de verdade com você, enquanto o bonitão só pensa naquilo! Dinho, pelo amor de deus!

– De novo, por mais que eu queira, ou a gente tira essas roupas encharcadas ou ficamos os dois com febre, o que você quer?

– Ok, vai. – Aceitou hesitante.

– Anda, Lia, eu já vi tudo na praia, mesmo, esqueceu? Ó, tô tirando também.

A roqueira o observou tirar a camiseta de canto de olho e fez o mesmo. Dinho não pôde deixar de reparar em seu corpo. Era diferente vê-lo de tão perto. Lia era perfeita, em cada centímetro. Queria tocá-la, precisava tocá-la.

– Vem, me ajuda a te arrastar até aquela árvore. Acho que a chuva não pegou tanto ali.

Puxou-o pelos ombros com cuidado, enquanto o garoto remava contra a terra. Encostou-o sentado contra o tronco e voltou para buscar as roupas. Por fim, sentou-se ao seu lado.

– Lia, vem cá. – Dinho apontou para suas coxas e afastou suas pernas. – Aqui tem encosto, vem.

– Realmente, em ser um encosto na minha vida você é profissional.

– Lia... – Repreendeu.

– Ok, vai. – Sentou-se entre as pernas de Dinho. A ausência de mais roupas complicava sua tentativa de agir normalmente.

– Ei, Lia.

– O que? – Virou o rosto para o garoto.

Dinho lhe respondeu com um rápido beijo.

– Você quer parar?

– Não. – Retrucou debochado.

– Dinho, é sério, você e a Ju...

– A Ju sabe que eu gosto de outra.

– Você gosta mesmo? Ou é só mais um capricho seu?

– Você sabe muito bem o que eu sinto. Olha, eu acabei de ver a minha vida passar inteira pelos meus olhos, você pode pelo menos respeitar o meu último pedido?

– Último pedido? – Lia riu.

– É, eu pedi por isso, por estar aqui, com você... Quer dizer, não exatamente nessa situação, mas... Enfim, você pode, por favor, deixar esse orgulho de lado e... E... E-e... – Sua voz falhou aos poucos, conforme seu corpo começou a tremer.

– Dinho? Dinho, o que você tem? Dinho, se é mais um dos seus truques, pode parar!

Levou a mão à testa do garoto, assustada. Queimava. Deitou-o sobre a terra, encostou-se contra a árvore e apoiou a cabeça de Dinho contra suas coxas.

– Lia...

– Eu tô aqui.

Segurou a mão trêmula do garoto com uma mão, e com a outra enrolou os dedos nos cachos de Dinho.

– Você só não pode dormir, ok? Vai ficar tudo bem, eu prometo. – Encorajou preocupada, acariciando os fios castanho-escuros de Adriano.

Dinho inconscientemente levou os dedos a tocar a pele de Lia, traçando pequenos círculos perto de seu umbigo.

– Por que você se esconde tanto, marrentinha? Você é perfeita. – Comentou com a voz distante, quase inaudível.

– Do que você tá falando, Dinho? Você queria o que, que eu andasse por aí de biquíni?

– Você entendeu. É a sua mãe, não é? É por causa dela que você se esconde tanto...

Adriano a conhecia tão bem que a assustava. Perfeita... Era um galanteador. Por sorte, também o conhecia o suficiente para não acreditar, por mais sincero que fosse. Se nem sua mãe gostava da própria filha, o que dizer do garoto que poderia ter quem quisesse, a hora que quisesse...

– A gente pode não falar nela?

– Você que sabe... Mas uma hora você vai ter que enfrentar.

– Vou... E não vai ser com você.

– Por que não? – Perguntou genuinamente curioso.

– Dinho... – Riu. – Porque você é você.

– Isso eu sei, eu só não sei por que você foge tanto de mim.

– Eu já falei, é a Ju.

– Não é a Ju.

– Agora você decide os meus motivos também? Aliás, não era você que tinha nojo de mim? Pra quem me odeia tanto, você presta bastante atenção.

– Eu não tenho nojo de você, Lia. – Assegurou como se fosse óbvio. – Eu me decepcionei com você, só isso. O único motivo que eu tenho pra te odiar é você não sair da minha cabeça.

A garota corou de leve.

– Sem essa, Dinho.

– Ah, Lia, cansei. Olha a situação em que a gente tá! Pior: olha o que a gente acabou de passar. Você realmente vai continuar fazendo a difícil? Eu gosto de você, ok? Eu tinha uma namorada linda, que gostava de mim de verdade, por que eu arriscaria a minha relação com ela se não gostasse de você? A gente já ficou, mais de uma vez, e eu continuei insistindo. Você acha o que? Que eu leio a sua mente? Que eu adivinhei que você ia me odiar no futuro quando a gente ficou de novo? Você sabe que figurinha repetida não completa álbum pra mim e me viu ir de novo atrás de você. Ou você é cega, ou você é muito mais insegura do que eu pensava!

A garota o observou por um momento. As palavras de Dinho faziam sentido... Por que não conseguia se deixar levar? Sabia que ele falava a verdade, e o temia.

– Tá, você gosta de mim, eu sei disso. Desde o começo, infelizmente. Mas e daí o que? A gente passa a perna na Ju como se nada tivesse acontecido? Ela desconfia da gente, mas encarar como uma realidade é muito pior.

– Como você desconfiava do que eu sinto e até tendo admitido pra Ju segue temendo?

– Não transforma em outra pergunta. Eu me recuso a fazer a Ju sofrer, Dinho. A gente...

Tomado por um impulso, Adriano ergueu o tronco até que sua boca a calasse. Confusa, a roqueira demorou a reagir, deixando-se perder nos lábios de Dinho por uma fração de minuto.

– Você quer, eu quero, por que fugir tanto? – Questionou entre beijos.

– Dinho... Não é assim... Você não pode... – Tentou raciocinar, entregando-se aos beijos do garoto.

– Eu posso... – Continuou, sem fôlego. – Eu sei o que eu quero, eu consigo o que eu quero, e sinceramente, Lia, eu não pretendo desperdiçar o nosso tempo depois do que eu acabei de passar. E quem nos garante que a gente vá conseguir voltar? Eu prefiro viver essa febre inconsequente e inconsciente a voltar são sem lembrança alguma.

– É injusto comigo, é injusto com a Ju... Eu devia te deixar aqui.

– Mas você não vai, porque você também gosta de mim.

– Infelizmente.

– Então você admite?

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– Admito o que?

– Que também gosta de mim?

– Como se você já não soubesse... – Odiava-se por admitir.

– Então vamos viver isso, por favor. Só até a gente conseguir sair daqui, e então o que aconteceu no barranco fica no barranco. A chuva leva. – Propôs.

– Eu tenho escolha?

– Não. – Respondeu-lhe com outro beijo.

– Dinho, vocês estão juntos... – Tentou retrucar, já sem fôlego novamente.

– Nem sei mais. – Respondeu levando a mão à nuca da loira para aprofundar o beijo seguinte.

– Hmm! Hmm... – Tentou lutar contra a língua do garoto que a invadia, prazer e angústia mesclando-se em mais uma tentativa frustrada em que acabou se entregando.

As mãos de Dinho percorreram o corpo seminu de Lia, sentindo cada toque em detalhes, tentando memorizar cada curva de seu corpo. A roqueira involuntariamente levou os braços aos ombros de Dinho, aproximando-o de si. Ao perceber o que fazia, tentou se afastar novamente.

– Ela é a minha melhor amiga...

– E só quer te ver feliz. Você tá feliz.

– Eu não...

– Lia... Só por uma noite. A gente pode esquecer quando voltar. Se você quiser, eu posso até prometer que não vou te procurar mais. Por favor?

Indefesa, a roqueira se deixou levar novamente, lembrando-se dos momentos sob a chuva. Não podia deixá-lo escapar sem antes viver o que sentia. Mais uma vez.