A ovação no anfiteatro não era como no dia do duelo em que os dois irmãos disputavam a armadura de ouro — uma ocasião rara que só acontecia quando havia mais de um predestinado a ser escolhido, pois geralmente este era nomeado pelo próprio Patriarca.

Naquele momento, no entanto, não havia disputa por qualquer armadura, mas de estágios de treinamento entre aprendizes que acontecia a cada trimestre, gerando considerável presença de público.

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A presença de cavaleiros e Amazonas já sagrados — e com suas distintas armaduras — era presença obrigatória, uma vez que estavam incumbidos desde um único aprendiz a pequenos grupos de até quatro aprendizes, independentemente de sua hierarquia — Ouro, Prata ou Bronze.

Tornar-se um aprendiz de um Cavaleiro de Ouro era raro, uma vez que esses geralmente acabavam por suceder seu mestre. O mais recente exemplo foram os dois irmãos aprendizes de Solon, antigo Cavaleiro de Gêmeos. Destes eram exigidos mais disciplina e treinamentos mais rigorosos, despertando interesse de muitos aspirantes.

No atual cenário, apenas um aprendiz tinha tamanho privilégio. No entanto, não era treinado por um Cavaleiro de Ouro, mas pelo próprio Grande Mestre.

Os treinamentos no Santuário é uma tradição que segue os costumes da Grécia Clássica quando os jovens entre 7 e 10 anos iniciavam o primeiro estágio com treinamentos que alternavam entre a teoria e a prática.

O conceito teórico aplicava-se no que diziam ser a base da técnica de luta dos cavaleiros, chamado de ‘fundamentos da destruição', consistindo em concentrar e elevar seu cosmo ao pequeno universo das quais poucos eram capazes de desenvolver.

A verdade era que, daqueles que despertavam seu cosmo acabavam por 'explodir' essa cosmo-energia de maneira inconsciente, e o primeiro estágio visava o controle desse poder através de técnicas simples que demandava maior tempo de aprendizado, sendo considerado o estágio mais longo — média de quatro anos.

Uma vez que tinham maior controle de sua cosmo-energia, partiam para o segundo estágio, quando os treinamentos se tornavam mais árduos e exigindo forte preparo e resistência física. Através desses treinamentos, as técnicas eram aprimoradas e ganhando características singulares a cada aprendiz — seja com técnicas repassadas por seus mestres ou criadas pelo próprio aprendiz. A elevação do cosmo pode levar o despertar do que chamam a 'essência do cosmo' — o Sétimo Sentido.

Ao que se refere às Amazonas, neste segundo estágio ficavam encarregadas de não somente ajudar no treinamento das mais jovens, como de ajudar no patrulhamento no Campo das Amazonas, uma vez que os soldados eram exclusivamente homens e impedidos de entrar no território destinado apenas às mulheres. Nesta fase, as aprendizes tinham permissão de treinar junto aos homens — muitas vezes sendo chamadas de 'mulher-cavaleiro', uma maneira pejorativa de referir-se às futuras amazonas por conta de suas máscaras — e momento da qual iniciavam as seleções para o terceiro estágio, quando seguiriam para as disputas pelas sagradas armaduras.

Naquela manhã o anfiteatro destinava-se para isso: alternância do segundo para o terceiro estágio, por isso a presença de Cavaleiros e Amazonas naquele momento, cada um coordenando seus grupos e avaliando seus desempenhos e enfileirando-os para a tão esperada armadura. Alguns a conquistavam consideravelmente jovens — entre os 14-16 anos — a Armadura de Bronze ou mesmo Prata.

O que diferenciava cada aprendiz em seus níveis de estágio eram suas vestimentas de treino que começavam com vestimentas simples passando para de couro e placas metálicas nas ombreiras e peitoral. Ao fim do processo seletivo recebiam os acessórios como prova de seu valor até a armadura, quando era finalmente conquistada.

Os comentários chegavam ao vilarejo de Rodório através dos soldados que comentavam empolgados do desempenho de alguns aprendizes e apostando os mais prováveis Cavaleiros — indiferente se eram homens ou mulheres, referindo-se à 'Amazona' somente em respeito e diante de uma, pois pelas costas continuavam a chamar de 'mulher-cavaleiro', com algumas raras exceções.

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Foi como Selene teve conhecimento de algumas das novidades, incluindo de Aelia, sua amiga, ser uma daquelas que, em breve, disputaria por uma armadura. O seu afastamento se devia à falta cometida no duelo dos irmãos no coliseu há 30 dias.

A chamada à Sala do Grande Mestre aconteceu na manhã seguinte. Selene abriu as pesadas portas duplas com talhes em ouro e seus passos ecoaram pelo grande corredor do salão, sentindo um forte aperto em seu peito, uma aflição que secava sua boca.

Viu Shion, o Grande Mestre dos 88 cavaleiros de Athena, e Patriarca do Santuário, sentado ao trono em mármore com suas vestes brancas — a casula branca de gola alta e mangas longas adornos dourados e detalhes em vermelhos que cobria seu corpo, o amito redondo dourado com em volta do pescoço caindo sobre os ombros. Os cabelos há muito perderam sua cor, mas mantinham-se belos. Ao seu lado estava o Mestre Arles, com casulo azul e adornos destacáveis em vermelho com apenas um colar de contas envolto do pescoço, sem o amito — característico aos patriarcas tanto quanto o elmo.

Enquanto cruzava o salão até próximo aos dois mestres, Selene parecia assimilar o que havia feito, e não era somente ferir o orgulho de Kanon, desaparecido naquele fim de tarde e considerado desertor como ouviu pelo Santuário à caminho da Sala do Grande Mestre, infringindo o código de honra dos cavaleiros.

A cada passo, sentia o peso daquilo em sua consciência e pior: não comentara o seu feito a Saga. Isso a fez engolir a seco quando se curvou, encostando o joelho direito ao chão e apoiando as mãos sobre a outra perna em sinal de respeito sob a presença do Grande Mestre. Shion não hesitou em falar.

Durante o duelo de ontem no Anfiteatro, da qual definiria o herdeiro de Gêmeos. Todos estavam demasiadamente entretidos com o embate e com aquele choque de poder que não perceberam o que de fato aconteceu... ao contrário de mim e de Arles.

Apenas a voz de Shion ecoava no grande salão. Era forte e imponente, não havia sinais de cansaço pela idade. Selene sabia que ele havia sido o Cavaleiro de Áries na última Guerra Santa, ocorrida há mais de dois séculos. Mesmo diante do mestre Selene usava sua máscara de Amazona, ocultando a apreensão dos olhos trêmulos, mas deixando-a expressa somente nas mãos que se fechavam sobre a joelheira.

O mestre não usava necessariamente uma máscara, mas o elmo projetava uma sombra sua face que impedia de ver com precisão sua face nublada.

— As leis do Santuário são rígidas quanto ao envolvimento no duelo de cavaleiros, ferindo o seu código de honra, passível de exílio ao banimento do Santuário. Compreende a razão da qual a chamei aqui, Selene? Quero que me diga o porquê não devo expulsá-la pela sua falta cometida ontem da qual anularia a herança de Gêmeos ao seu cavaleiro.

Houve breves instantes de silêncio e hesitação por parte de Selene que mordiscava os lábios por baixo de sua máscara. Arles observava como ela fechava os punhos, a respiração notada na contração de seus músculos, mas mantinha-se apenas calado e observador. Viu então sua aprendiz erguer a cabeça e fazer menção de se levantar, concedido por Shion com leve aceno, colocando-se de pé.

— Mestre Shion, mestre Arles... Não há nada que justifique o que fiz, nem mesmo negarei minha ação na tarde de ontem. — Arles agora arqueara o semblante, mas ainda se mantendo calado. — A minha intromissão pode... pode ter influenciado no embate, mas... mas não houve qualquer intenção de favorecer qualquer uma das partes. Apenas que...

Selene interrompeu suas palavras e controlando seu estado emocional naquele momento. Sentiu os olhos queimarem ao lembrar das palavras e da expressão de Kanon para ela, imaginando a reação de Saga em perder a armadura por conta de sua atitude impensada refletindo a feição de seu irmão sobre ele.

A máscara mostrava-se vantajosa naquele momento por não permitir ver como estava se sentindo, mas ainda assim era capaz de jurar que Shion e Arles percebiam isso e precisava se controlar. Ouviu um "Continue!" por parte do próprio Grande Mestre que a fez voltar àquela realidade e que ela 'explicasse melhor o que queria dizer'.

— Apenas que fiz aquilo que acho que deveria ter feito. — continuou ela buscando manter a voz firme. — Aprendi ao longo desses anos que lutamos para defender a Terra de toda e qualquer ameaça em nome do amor e da justiça defendido pela deusa Athena... Mas também aprendi que de nada disso adiante se não pudermos defender aqueles próximos a nós, defender nossos companheiros de batalha do perigo que os cercam e foi o que fiz.

As palavras de Selene que começaram inseguras e perdida em tropeços, ganharam firmeza naquele discurso, surpreendendo Shion e Arles que continuaram a fitá-la confusos, buscando compreender aquele seu discurso. Nesse momento, Arles deu um passo à frente e quebrando sua postura e silêncio, voltando-se para sua jovem aprendiz.

— Perigo? Peço que seja pouco mais clara, Selene. Shion e eu percebemos uma barreira que se destruiu naquele choque de poder criado pelos dois irmãos. Explique sobre o porque acreditar que estava defendendo-os. De que perigo está falando?

— Mestre Arles, peço desculpas por minha falta, eu deveria ter-lhe contado... — continuou Selene sem hesitar, baixando a cabeça em sinal de vergonha, mas levantando a cabeça e se voltando para seu mestre. — Pensei ser apenas um engano meu enquanto estudava as estrelas e vi Castor, uma das estrelas da constelação de Gêmeos se apagar. — Shion e Arles se entreolharam naquele momento, mas nada disseram. Selene havia baixado a cabeça naquele momento e não percebendo essa ação de ambos. — Ao longo de toda noite fiquei a observá-la, mas não houve nada que evidenciasse o que vi naquele rápido momento, então...

— Disse que uma das duas estrelas de Gêmeos se apagou? — enfatizou Arles quanto um algo dito pela jovem, confirmado por ela que foi cortada em seu relato. — Por que acha que isso influi na sua ação de ontem, Selene?

Aquele momento voltou à mente de Selene, da imagem da sombra se projetar sobre Kanon como pareceu ver acontecer com Castor naquele rápido instante em que a fez sumir. A sua ação naquele momento foi apenas de projetar um escudo junto ao mais novo dos irmãos, mas por fazer algo de maneira tão imprecisa, acabou por não ser forte o suficiente e se 'quebrando' em inúmeros cristais.

Tal ação seria perceptível a Arles e Shion não somente por estarem mais próximos como também por conhecerem a técnica. A nuvem de poeira apenas ajudou a camuflar tudo ao público mais distante.

A imagem que se repetia em sua mente foi a que relatou a ambos, de modo a não se deixar perceber o conhecimento que tinha deles e sua relação com ambos, calando-se em seguida.

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Sentia o corpo pesado por aquela culpa, temendo de ver Saga perdendo a armadura e ele — principalmente ele — nutrir tamanha raiva que jamais perdoá-la por aquilo. Via a expressão de raiva de Kanon em Saga naquele momento, e aquilo a fez cair no chão, sentando-se sobre as próprias pernas e apoiando as duas mãos no chão.

O silêncio imperou naquela sala. Foi então que Selene ouviu alguns passos em sua direção e levantar a cabeça, vendo Shion de pé — mostrando-se bem alto, de corpo esguio e imponente, o rosto ainda nublado pelo elmo dourado — diante dela. Arles se mantinha alguns passos atrás.

— Não existem razões que permitam que alguém interfira num duelo entre cavaleiros. Isso porque o envolvimento pode favorecer, ainda que indiretamente, uma das partes e a luta se tornar um embate covarde.

Vergonha. Era o que Selene era consumida naquele momento não por ela em si, mas por Arles. Sendo ele seu mestre, estava responsável por sua disciplina, e uma vez que ela cometesse falhas estas se refletiam em seu mestre. Estava ciente de seu erro, de que passara por cima das regras. Estava certa de que seria punida por aquilo, até ser expulsa do Santuário. Foi ordenada a se levantar e estava pronto para remover a máscara e quebra-la quando o ouviu continuar e parando sua mão próximo ao rosto.

— Porém, não foi o caso de ontem. Embora se tratasse de um duelo para conhecimento de um cavaleiro de Ouro, evitou uma morte desnecessária que lhe foi revelado pela própria constelação de Gêmeos. — dizia o Grande Mestre mantendo o tom de voz firme. — Porém, a sua omissão poderia ter provocado a morte de um jovem que, ao acaso, foi protegido por aquele a quem a constelação revelou do perigo. Sendo assim, não a expulsarei do Santuário por salvar uma vida da qual poderia ter sido perdida por seu erro, mas será exilada em Jamir até que esteja permitida voltar ao Santuário.

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"SELENE!", ouviu alguém gritar às suas costas e deparando-se com Aelia, correndo pela rua e acenando para ela, quase pulando sobre a amiga numa explosão de felicidade da qual já sabia do que se tratar.

Caminhavam de volta ao Santuário, trazendo com ela uma urna envolta de uma capa de couro. Chegaram até o Anfiteatro, onde ainda havia alguns duelos, mas mantendo-se no ponto mais alto, permitindo total vista do pátio da arena, onde acontecia os embates.

— Jisty conquistou sua armadura? — indagou Selene se voltando para Aelia que assentiu. — Constelação de Serpentis... Não lembro qual sua classificação.

— Prata! — a voz de Aelia foi de lamento, também de descontentamento. — Foi há duas semanas, ela quase matou sua oponente. Ficou inconsciente por dias. Consegue imaginar o que tem sido desde então?

— Bom, não esperava menos de Jisty. Sempre foi uma pessoa forte e de grande potencial e... — dizia Selene que já tinha voltado sua atenção ao anfiteatro quando ouviu risos às suas costas, sendo elas bem reconhecíveis.

Tanto ela quanto Aelia se levantaram num impulso, encarando a própria Amazona de Serpentis diante delas com sua armadura reluzindo ao sol, destacando as nuances de lilás ao vermelho nos detalhes como era em sua máscara. Estava acompanhada de outras três aprendizes, as mesmas que surraram a jovem Marin — a garota de cabelos ruivos — e impedido por Selene.

— Ora, ora... Vejam só quem voltou. Interessante saber que me julgue alguém de potencial, Selene. Devo-lhe agradecer o lisonjeio? — riu pouco mais, acompanhado das outras garotas. — Quanto a você, dobre a língua em falar comigo, garota. Estamos em níveis bem diferentes e deveria mostrar respeito à sua superior.

Aelia fez menção de responder algo, mas foi contida por Selene que a segurou em seu braço antes que avançasse contra Jisty, mas aquilo parecia o mínimo esperado para Amazona que riu com grande satisfação. Não era nem preciso ver sua expressão de felicidade para perceber isso.

— Vejam só isso... Digna de uma punição por confrontar sua superior, garota. Uma noite de patrulha na zona de transição dos dois campos, o que me diz, Aelia?

A zona de transição era o 'ponto cego' que separa o campo de treinamento entre os homens com as mulheres, sem uma demarcação clara do limite para as duas partes. Nem mesmo a presença de soldados era vista nesse lugar, tornando o local um tanto deserto e deixando margem para Jisty e suas meninas fazerem o que bem quisessem sem chegar ao conhecimento de qualquer um — e acusá-la de qualquer coisa.

— O quê? Não pode fazer isso! Estive no patrulhamento da última noite. — disse Aelia recuando dois passos e encarando Jisty, entendendo bem seus intentos nas entrelinhas. Selene observava aquilo e intencionando a dizer algo, mas Jisty adiantou-se sobre Aelia.

— Pensa contrariar as minhas ordens, aprendiz? Posso mandá-la prender por desacato! — e riu, voltando-se para Selene que continuava a encará-la sem esconder sua insatisfação por aquilo. — Posso não ver seu rosto, Selene, mas posso ver nitidamente sua expressão para mim e puni-la por isso.

— Não pode fazer nada contra mim, Jisty... — disse Selene à Amazona de Prata que recuou, olhando-a sem entender aquelas palavras. As garotas que a acompanhavam se entreolharam aturdidas. — Enquanto não me apresentar ao Grande Mestre, é como se não tivesse regressado ao Santuário, mas ainda estou sujeita às leis que aqui existem. Porém, enquanto não houver um reconhecimento de minha chegada pelo Grande Mestre, estou dispensada de toda e qualquer obrigação oficialmente. Em outras palavras, não tenho que acatar qualquer ordem sua por hora.

O que se viu foram os punhos de Jisty se fechando pela raiva que sentia. Era como se Selene pudesse ver a expressão de raiva por trás daquela máscara de 'vampira' da qual a Amazona usava. Aelia alternou seu olhar da Prata para a amiga e com intensa vontade de rir daquele confronto, mas a sua situação não era das melhores.

— É verdade, Selene... — comentou Jisty entre dentes enquanto se voltava para Aelia — Mas ao contrário de você, a sua 'amiguinha' aqui não está imune e deverá acatar as minhas ordens.

"Não, ela não tem, Jisty", disse outro alguém que se aproximava, usando máscara que na verdade era uma vseira de sua tiara, com seus olhos lembrando as de um gato, em tom amarelo, e no alto simulando pequena orelhas felinas acima da cabeça.

A armadura era tons prata com destaques em amarelo e outros rajados alaranjados, com ombreiras que lembravam garras felinas, tão como nas mãos, e protegendo todo o tronco até abaixo da cintura, onde adornava uma faixa num amarelo-pálido. A bota era até altura dos joelhos. Era Illyria de Linx, Amazona de Prata de Lince.

— Aelia possui outros compromissos estabelecidos por mim, e não somente para hoje como para o longo da semana. Acredito que suas meninas não terão problemas em realizar o patrulhamento que estava incumbir à Aelia, não é mesmo? — disse a Amazona parando ao lado de Selene e cruzando os braços, falando muito tranquila para Jisty que se sentia contrariada por outra Amazona de Prata. — Acredito que não tenhamos nada mais a esclarecer aqui. Se não for o problema, Aelia, poderia me acompanhar? Precisamos tratar alguns detalhes.

Aelia respirou aliviada, dando às costas para Jisty que permaneceu parada onde estava, ao lado de suas garotas que não sabiam o que falar e como agir enquanto Selene apenas observava as duas se afastarem. Tomara a urna que trouxera consigo e as acompanhou, sem nada a dizer — embora sentisse o cosmo enfurecido de Jisty ser contido ao máximo.

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— Tem sorte que estava perto, mas recomendo terem cuidado com a Jisty. Ela não vai esquecer isso. — recomendou Illyria olhando para Aelia e depois se voltando para Selene. — E você, foi bem esperta em quebrá-la com aquilo. Porém, sabe que deveria já ter se apresentado invés de ficar rondando por aqui, Selene.

— Sim, eu sei, Não era minha intenção. —disse Selene se voltando para a Prata. —Soube que o Grande Mestre se encontra em Star Hill, e isso pode levar alguns dias, o que me dá alguns dias livres das investidas da Jisty.

As três riram daquilo. A mudança da lua influenciava na ausência do mestre, retirando-se para Star Hill, também chamado de 'Colina das Estrelas', um local sagrado onde apenas os Grandes Mestres tinham a permissão de ir e sendo possível a interpretação das estrelas — local da qual foi concedido à Selene.

— Que seja, mas recomendo cuidado das duas. — disse Illyria mais uma vez se voltando para as duas. — E já que tive que salvar sua pele, vou aceitar sua ajuda para com as novas aprendizes, Aelia, o que vai ajudá-la a se preparar para sua sagração que acontecerá em breve.

Selene apenas ficou a observá-las se afastar após se despedirem. Precisava levar a armadura até o Templo de Prata, onde as armaduras ficavam reservadas aguardando por seu cavaleiro. Levitou-a até um espaço vazio e removendo a capa da urna, revelando ser a armadura de Sextante.

Ficou a observar outras urnas ali guardadas e baixou a cabeça, removendo um pequeno envelope do bolso de seu casaco. Olhou em direção à porta e percebia que a tarde avançara mais rápido que o esperado. Bateu de leve o envelope na palma da mão, parecendo hesitante, mas avançou até ela e seguindo pelos corredores em passos rápidos e desaparecendo num dos becos existente entre os prédios e ruínas.

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Não que o pôr-do-sol em Jamir não tivesse sua beleza. Era uma zona montanhosa e o céu ali era tão limpo quanto aquele que assistia em Star Hill, com suas estrelas iluminando a noite e, na lua cheia ou nova, denotava uma beleza quando visto na ponta da ponte que dava ao precipício criando um quadro fantástico.

Por alguma razão, nada parecia se comparar ao sol se pondo atrás do Monte Zodiacal, assim chamado por todos por acomodar os Doze Templos Zodiacais que guardavam à Sala de Mestre e o Templo de Athena. A estátua tomada pela luminosidade do sol em fundo alaranjado tornava mítico, pois era como se a própria Athena estivesse emanando seu cosmo naquele momento.

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Entretanto, naquela tarde, não estava tão ansiosa como tantas outras vezes. Estava sentada de frente àquela maravilha, seus olhos voltados para o monte, mas divagando, perdida em seus pensamentos até seus olhos caírem para o envelope em suas mãos. Abriu este com cuidado. Nada havia escrito, senão guardar uma flor, já pouco ressecada de uma íris, com qual pegou com cuidado e ficou a observá-lo, deixando sua mente mergulhar em lembranças não muito feliz como foi no dia que a ganhou.

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— VOCÊ FEZ O QUÊ? — exclamou Saga se voltando para ela, os olhos verdes arregalados com expressão incrédula — Não, não, espere! Diga pra mim que você não fez isso, Selene...

A ordem de Shion seria de partir na manhã seguinte, o que levou Selene ficar dispensada de todos os deveres como aprendiz naquele dia para fazer os preparativos de viagem que incluía levar duas urnas para Jamir. Isso seria o menor dos seus problemas. O Patriarca havia se mostrado compreensivo à sua atitude, mas tinha dúvidas se Saga também o seria quando precisasse contar a razão de sua partida e ausência pelos 30 dias referente ao seu castigo.

A expressão de raiva e rancor de Kanon não saia de sua mente, e acabava por se projetar sempre no irmão, ainda que se mostrasse mais controlado que o irmão. A verdade era que Saga era a última pessoa a quem ela quisesse magoar de fato e passara a tarde ensaiando maneiras de conversar com ele naquele fim de tarde.

Contudo, ao encontrá-lo preocupado com a ideia do irmão ser acusado de deserção — algo punido com morte — fez Selene simplesmente perder-se e sem saber mais o que dizer e fazer senão se condenar ao se culpar, levando o recém sagrado cavaleiro a perguntar-lhe do porquê daquilo, levando-a a confessar o que havia feito.

— Foi uma atitude impensada Saga, eu sei! E-eu apenas agi e... — tentou ela se explicar, olhando para ele que apenas a fitava, meneando negativamente, levando a mão à fronte com os olhos fechados. — E-eu apenas quis protegê-lo...

— Protegê-lo? — interrompeu ele abrindo os olhos e fitando-a incisivamente — Você quis proteger o Kanon criando uma barreira que, numa ‘atitude impensada’ poderia fazer o meu golpe se voltar contra mim! Você também pensou nisso ou apenas na proteção dele?

Selene engoliu a seco aquelas palavras dele. De fato, ela poderia ter criado uma barreira-reversa, da qual acabaria por fazer o golpe se voltar contra Saga, salvando Kanon e podendo vir matá-lo. Talvez seria isso que Shion teria dito quanto à ‘boa intenção’ de seu ato em ‘gerar consequências mais graves’. Isso a fez levar a mão diante do rosto mascarado pelo horror daquilo. Poderia realmente tê-lo matado.

— Sem contar que ele desapareceu depois daquilo. Agora faz sentido... Você o teleportou dali, e ainda me diz que queria somente protegê-lo? Ele agora é um desertor quando desapareceu do anfiteatro... e você sabia que deserção é passível de morte?

Nesse momento as lágrimas ganhavam o rosto de Selene, camuflados por sua máscara. Ela não tinha como contra-argumentar aquilo. Tentara salvar Kanon da morte e o condenara como um desertor. Poderia ela ter sido assim tão monstruosa que nem ao menos percebeu?

— Sa-Saga, por favor... — tentava chamá-lo, mas ela notava seu transtorno por aquilo, a maneira como se continha trincando os dentes e caminhando de um lado a outro. — Entenda, eu...

Ele esticou o braço que mantinha na cintura em direção dela como se pedisse um basta, calando-a por momento. Ele mantinha os olhos fechados enquanto, com a outra mão, massageava a têmpora. Quando abriu seus olhos e se voltou para ela, Selene teve a impressão deles estarem levemente vermelhos como de Kanon quando se voltou contra ela. Era como vê-lo diante dela.

— Não fale mais nada, Selene. Diga mais nada porque... — ele respira fundo — Eu não quero ter uma ideia mais errada de você. — e deu as costas, com sua capa esvoaçando enquanto deixava aquela clareira e deixando Selene, mergulhada silenciosamente em lágrimas.