Admirável Mundo Novo

2 - Cruzando o caminho sem volta


2 – Cruzando o caminho sem volta


Pâmela Guimarães: 2 meses depois. Terça-feira, 15 de abril de 1999.


“Após aquele episódio na porta da escola, parecia mesmo que eu havia encontrado amigos, ou pelo menos alguém para conversar. As humilhações não pararam, mas quando Manu e Filipe estavam por perto eu me sentia protegida.

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Hoje estávamos numa conversa descontraída. Enquanto eles falavam da formatura eu viajava em algumas anotações no meu caderno. Escrevia todas as minhas emoções e sentimentos para depois passar para o meu diário.

Confesso que estava feliz de tê-los por perto. Manu e Filipe realmente estavam mudando minha a vida.”


– Nem posso acreditar que nossa formatura está chegando! Pena que nós temos que usar aqueles vestidos idiotas – Manu começou a reclamar fazendo minha atenção cair sobre ela.

– Nós não. Você tem. Eu vou estar na moda com um traje elegante. Na balada vou pegar todo mundo – suspirei. Por que esses caras são sempre tão retardados?

– Cala a boca Filipe! Vou pegar um lanche na cantina, cuide da pequena até a mãe dela vir buscá-la – vi Manu sair deixando-me a sós com ele.

– Você não fala muito, não é? – ele perguntou.

– É – respondi secamente.

– Não gosta de mim? – ele chegou mais perto de mim até sentar bem ao meu lado.

– Só não temos assunto – continuei escrevendo sem olhar pra ele. Encarar aqueles olhos claros não tem sido fácil pra mim.

– O que você tanto anota nesse caderninho? Deixa eu ver – ele me empurrou e tentou tirar o caderno das minhas mãos. Relutei.

– Solta Filipe!

– Qual o seu problema? – Depois de tanto me sacudir deixei o caderno cair e dele saiu uma folha dobrada, a qual eu estava tentando compor minha primeira música.

– Olha um poema!

– Me devolve seu idiota! – Filipe era mais alto que eu então nem preciso dizer que perdi.

– Daria uma ótima canção, sabia? É uma letra linda.

– O que você sabe sobre música? – arranquei o papel de suas mãos. Levantei-me e o encarei com raiva.

– Eu... Bom, eu adoro a música. Estudo sempre que posso, sei tocar violão e...

– Não me interessa a sua vida ok? Não gosto que mexam nas minhas coisas e esse poema não é bom! – eu estava muito envergonhada e brava ao mesmo tempo. Sentia que estava sendo injusta com ele, mas meu gênio era mais forte. Ele também se levantou, olhou pra mim e sorriu friamente.

– Entendi, vou te deixar sozinha então – senti um pouco de pesar na voz dele, como uma tristeza, não sei – Vou atrás da Manu, já volto. Ele saiu correndo e logo eu estava sozinha mais uma vez. Continuei a escrever algumas quando elas se aproximaram novamente.

– Cansou do joguinho com a esquisita? – Jaqueline e as amigas de sempre nunca perdiam a oportunidade de acabar comigo. Sentiam-se superiores por já estarem no ano da formatura e eu sinceramente achava isso tudo uma grande bobagem.

– Por que não me deixa em paz? Vai viver sua vida! – tomei coragem.

– Cale a boca, favelada! Não ouse falar assim comigo, quem você pensa que é? – Jaqueline me prensou na parede e me encarou como se eu fosse a pior coisa do mundo.

– Me solta – rebati.

– Tá na hora de você aprender uma lição. Aprender que um pobre deve conhecer o seu lugar e o seu com certeza não é aqui! Vou te mandar pra favela, pra sarjeta de onde você nunca devia ter saído! – ela gritava muito e logo os olhares dos outros alunos se voltaram para nós. Eu tentava ser forte, mas qualquer coisa desse tipo me machucava muito. As lágrimas já rolavam soltas pelo meu rosto.

– Olha só a favelada tá chorando – outra amiga dela riu de mim.

– Sai de perto de mim! – uni todas as minhas forças e empurrei Jaqueline para longe de mim. Eu estava com muita raiva e vontade absurda de chorar. Os outros riam de mim sem piedade alguma. Olhei á minha volta e vi que o portão estava aberto. Corri desesperadamente sem pegar as minhas coisas que estavam no banco. Eu só queria sair dali. Era errado ir sem a minha mãe, mas ela entenderia quando eu explicasse.

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Corri na direção do portão e logo eu estava na rua. Não olhei nada, não esperei, não pensei. Atirei-me contra o fluxo dos carros.

– Pâmela o que você tá fazendo? Sai daí amiga! – ouvi os gritos de Manuela – Pâmela! – ela gritou mais alto.

Não consegui ouvir mais nada só um clarão terrível seguido de forte dor. Senti meu corpo tremer e então caí. Ainda conseguia ver vultos, pessoas gritando e entre elas minha mãe. Ela dizia coisas que eu não entendia, só chorava muito e abraçava o meu corpo. Manu e Filipe estavam com ela. Vi as silhuetas das garotas se aproximarem. Jaqueline e as outras também vieram ver o que tinha acontecido.

Minha visão estava cada vez mais turva quando a última imagem que eu tive foi a de Filipe acariciando o meu rosto. Olhei bem para os seus lábios que disseram: “isso não termina aqui, não vou deixar você desistir. Foi quando eu perdi a consciência e fechei meus olhos para não abri-los mais.