Chels

Capítulo 5


Quando as portas do supermercado se abriram, me senti no paraíso. Todas aquelas pessoas com carrinhos lotados de comidas, crianças implorando doces para os pais, adolescentes escolhendo as bebidas para o final de semana e, no meio de tudo isso, um cartaz indicando onde estava a seção de cupnoodles. Me controlei pra não sair saltitando até a seção, a última coisa que eu queria era um pirralho perguntando se eu sou um unicórnio. Não que eu me pareça com um. Praticamente joguei-me na prateleira onde ficavam os potes da minha comida favorita no mundo inteiro. O dinheiro que Ethan me deu pareceu que ia pular do meu bolso e implorar para que eu o usasse. Não pensei duas vezes em pegar pelo menos sete copos de cupnoodles, afinal, ainda tinham aquelas batatinhas e o refrigerante deles. As vezes, eu sou muito boazinha. Ah, é. Ainda tinha os Mentos também.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

Troquei de corredor e olhei com desprezo aquelas garrafas enormes de Coca-Cola. Por um momento, achei que as malditas retribuíam o olhar da mesma forma. Hesitei em pegar quatro delas, mas, como eram para um para um bem maior, – bombas de Mentos e Coca-Cola, convenhamos, tenho meus princípios – acabei cedendo.

Passei os olhos pela seção de salgadinhos que ficava mais à frente. Sussurrei para mim mesma que deveria agradar às minhas mais novas faixineiras. Caminhei até lá e literalmente joguei metade da prateleira no carrinho. Algumas pessoas me olharam estranho e eu as encarei de volta, como se fosse a coisa mais normal do mundo.

Passei pela parte dos legumes, verduras, etc, etc. Daí você pergunta: NOSSA, CHELSEA DO CÉU, QUERIDINHA, TÁ PASSANDO BEM? PORQUE TIPO, NOSSA, EU LEMBRO QUE VOCÊ DISSE QUE NÃO SABIA NEM FRITAR UM OVO!!!!!!! E daí eu respondo bem bonitinha assim: Pois é, eu posso não saber fazer ovo e afins, PORÉM um daqueles três viados devem saber. E, claro, se não sabem, vão aprender.

Revirei aquele mercado, o carrinho só faltava explodir de tanto peso ali. A única coisa que faltava eram os doces. Tipo Mentos, caso queiram saber.

Coloquei uma das mãos numa caixinha das tais balas e meus olhos foram atraídos por um pote cheio de creme de avelã, numa das prateleiras de cima – das quais eu não conseguia alcançar. Pode chorar, Chelsea, pode chorar.

Tudo o que eu queria era um pote de Nutella e tudo o que eu não podia ter era o tal do pote de Nutella.

– Cara, como eu odeio ser minúscula – resmunguei, cruzando os braços.

– Oi? – um menino bem bonitinho de cabelos loiros e olhos verdes virou-se para mim. Que merda, odeio falar com gente mais bonita do que eu. E agora vocês estão vendo o motivo pelo qual eu ainda me dou o trabalho de dirigir a palavra ao Ethan. – Desculpe, mas está falando comigo?

– N-não... – QUALQUER PESSOA PODIA TER NOTADO QUE EU ESTAVA FALANDO COMIGO MESMA, EU NÃO IA LIGAR SE FOSSE UMA VELHA IDOSA OU UM PAI DESESPERADO TENTANDO ACHAR A MARCA DO CHOCOLATE QUE O FILHO PIRRALHO MIMADO MAIS GOSTA. MAS N-Ã-O, TEM QUE SER O ADOLESCENTE DE SOTAQUE-SOCORRO-VEM-ME-ENGRAVIDAR-SOU-QUASE-FILHO-DO-BRAD-PITT. – Eu só tava... Sei lá.

– Sei... – ele riu. – Você quer ajuda?

– N-não, eu me viro, pode deixar – porque eu sou muito machona, desculpa aí.

– Tudo bem então, vai em frente, pega essa tão preciosa Nutella – ele debochou de mim. Se fosse Ethan que tivesse falado uma CALÚNIA dessas, já estaria no hospital com hemorragia. Só que acontece que ele é um completo estranho e sair batendo em estranhos alheios pode dar cadeia.

– Isso é um desafio? – gargalhei falsamente. – Você não ousaria...

– Podemos dizer que é...

– Pois bem. Fique observando e tente não chorar quando perder pra uma estranha gostosa – empurrei as caixas de Mentos que restaram na prateleira e algumas embalagens de Fini. E foi assim que eu comecei a escalar aquela porra e quase caí pra trás, fazendo com que o tal sou-quase-filho-do-Pitt me segurasse. Aí você pensa: “NOSSA QUE FOFO, SE CASEM, SHIPPEI VOCÊS DOIS, AWN QUE LINDOS.” Só tenho um detalhe pra você: Ele aproveitou pra segurar na minha bunda. Vadio.

– TIRA A MÃO DAÍ, SEU IDIOTA – gritei, ainda agarrada à prateleira e tentando me acalmar do susto causado pela quase-queda.

– Eu só estava tentando te segurar! Não precisa ser bruta! – ele se justificou.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

– Sei, sei – falei qualquer coisa e voltei a prestar atenção nos potinhos de Nutella. Estiquei uma das mãos e finalmente consegui pegar um deles, jogando no meu carrinho.

– Tu não acha que tá levando besteira demais? – sou-Brad-Pitt-gostoso perguntou.

– Levando em consideração que eu moro com três faxineiras e elas precisam ser sustentadas com alimento, acho que não...

– Ah, então a menina da Nutella é rica? Que legal, simpatizei com você – UM LONDRINO SIMPATIZOU COMIGO? LICENÇA, ONDE QUE EU TIRO UMA FOTO BONITA PRO MUSEU DE ESTÁTUA DE CERA? Afinal, eu sou uma lenda.

– Não exatamente. Na verdade, eu não tenho porra nenhuma. Meus pais me mandaram pra cá, tipo, sem nada.

– Percebi pelo seu sotaque que não era daqui. Principalmente por sua educação...

– O que tem minha educação? Ela é mais bonita do que muitos por aí – relaxa e goza que a vida é rosa e eu sou maravilhosa, beijos.

– Se você diz, quem sou eu pra discordar? – MORRI. MORTA, TIPO FALECIDA SABE? ELE NEM AO MENOS FALOU “AFF, SUA BURRA, É LÓGICO QUE É HORRÍVEL” OU “CLARO, E ESSE MUITOS POR AÍ INCLUÍ VOCÊ MESMA, PORQUE NÉ”, coisas que o Ethan não perderia tempo para dizer. Aliás, why the fuck eu estou pensando nesse retardado com deficiência mental? Meh.

– Sabe de uma coisa, não sei nem seu nome, mas você é a única pessoa legal que eu conheci nessa porra toda desde o dia que eu cheguei.

– Mark... – ele falou num suspiro.

– Oi? – perguntei baixinho. Mark o quê, porra?

– Meu nome é Mark e o seu? – ele sorriu. Awn, Mark-filhoso-do-Pitt, oi.

– É Chelsea... – pensei – Mas, pode me chamar de Chelsy ou Chels – ISSO MESMO, EU LIBEREI ESSA EXCLUSIVIDADE SÓ PRO M-A-R-K. Foda-se você Christian gayzão. Foda-se bem fodido, beijão.

Sorri sem jeito, encarando o tal do Mark gostosinho e quando percebi, duas crianças estavam levando meu carrinho embora. Ambas empurravam com todas as suas forças e por incrível que pareça, O CARRINHO ESTAVA ANDANDO. Achei que nós dois fossemos fiéis um ao outro, eu era dele e ele era meu. Eu até ia planejar nosso primeiro encontro, mas não, lógico que duas pessoas menores que um rato se atraíram por ele – ou devo dizer, pelo o que tinha dentro dele – e resolveram tomar o primeiro passo antes

– QUE MERDA QUE ESSES PESTINHAS TEM NA CABEÇA? – gritei e saí correndo. Mark veio atrás de mim. Já vi que vamos nos casar, simples assim.

– Chels... – Mark tentou me impedir, segurando um dos meus braços. – Não acho que seja conveniente causar confusão com duas criancinhas num mercado lotado.

– Foda-se a conveniência – falei e voltei minha atenção para os dois moleques, correndo atrás deles de novo, com Mark atrás.

Os meninos, ao perceberem que estavam sendo perseguidos por um demônio em fúria, pararam subitamente, e eu, linda como always, como estava à um centímetro deles, tive que parar também, caindo em cima deles, que desviaram como se estivessem sendo dois mini-Christians-gays e estivessem fazendo patinação no gelo, com toda aquela graciosidade e tal. Nisso, eu me segurei no carrinho pra não cair pra frente. Mark segurou-se em mim e eu acabei indo pra frente e empurrando o carrinho junto. RESUMINDO: TUDO O QUE EU TENTEI EVITAR QUE ACONTECESSE, ACONTECEU.

O carrinho atropelou uma das prateleiras com vidros de temperos como vinagre, azeite de oliva e etc, que caíram no chão e se quebraram em pedaços. A prateleira – que, convenhamos, devia ser mais velha que minha avó – com a falta de “peso” para segurá-la no chão, cambaleou fazendo com que a outra de trás dela caísse e derrubasse alguns mantimentos básicos como azeitonas. Os potes de azeitonas lindos, formosos, de plástico e em uma quantidade absurda, rolaram pelo chão atingindo a bancada de maças que se espatifaram no chão imundo, poluído e passarela de desfile para bactérias.

Enfim, como já podem ter visto, o mercado foi detonado, os dois pestes assaltantes de besteiras e gostosuras sumiram, – devem ter ido correndo assustados pra mamãe deles, porque né – Mark só faltou abrir um buraco e se enterrar no chão e eu estava lá parada, com as mãos no carrinho, sendo encarada por todos. Nossa, me senti tipo o Justin Bieber que tocava pras multidões no aeroporto, deixando as pessoas sorridentes. Só que, no meu caso, as pessoas estavam com a cara mais fechada que pote de milho – acredite, é impossível de abrir essa merda. Ficava madrugadas procurando alguma coisa fácil de comer na América e tudo o que eu achava era um pote de milho verde lá. Demorava pelo menos meia hora pra juntar forças pra abrir aquilo sem gritar de raiva e acordar todo mundo, afinal, não queria ser crucificada no período de duas ou três horas da manhã, por estar com fome a esse horário e não ter comido o jantar direito.

Uma mão grossa e negra pousou-se num dos meus ombros. Virei-me.

– Prevejo que a mocinha já tenha terminado de arruinar o mercado, caso contrário terei que chamar minha equipe – percebi que era um segurança do tipo “Vou te expulsar amigavelmente antes que decida colocá-la na prisão eternamente até os ratos imundos roerem todos os seus ossos e as aranhas comerem sua carne”.

– A culpa não foi minha! – eu quase gritei, tentando enxergar os olhos dele por trás daqueles óculos escuros do estilo “sou o fodão, vou olhar pra tua bunda e você nem vai perceber”, típico usado por canalhas na praia. Meh.

Um pouco atrás do segurança vou-te-matar-antes-que-possa-protestar, Mark estava misturado com a multidão, porém, ainda visível. Ele me olhava como se mandasse eu ficar quieta antes que arrumasse mais confusão do que já arrumei.

– Seria uma pena se eu concluísse que fosse – o segurança fortão falou, retirando a mão do meu ombro. – Caso não queira que isso aconteça, acho melhor ficar quietinha.

– Mas que porra, você vai me jogar na cadeia com marmanjos cheios de tatuagens e piercings porque EU não controlei DUAS CRIANÇAS MAL-EDUCADAS que ROUBARAM o MEU carrinho? – um recado pro Mark: MEU SOBRENOME DO MEIO É CONFUSÃO. – Não é mais fácil mandá-los pra alguma espécie de prisão infantil, seja lá qual for o nome dessa merda aqui em Londres?

– Você está dizendo que eu não dou educação para os meus filhos?! – uma mulher de cabelos negros entrou no meio da multidão, segurando nas mãos das duas pestes que começaram com esse tchu aqui.

– Bom, interprete como quiser – joguei as mãos pro alto. Convenhamos, o barraco foi formado e a única coisa que podem fazer comigo é me prenderem. Daí meus pais me buscam e eu coloco a culpa nos três idiotas que me obrigaram a ir ao supermercado para não morrerem de fome.

A mulher veio pra cima de mim, visivelmente irritada. Mark entrou na frente dela e o segurança me puxou de lado.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

– Francamente, se a senhorita não quer ser expulsa do mercado e perder todas as suas compras, faça-me o favor de ir pagá-las e sair daqui o mais rápido possível.

– Mas... Mas...

– Sem mas, vai logo.

Eu aceitei o humilde “conselho” dele e fui para a fila, dando uma última olhada para Mark, que tentava incansavelmente acalmar a mãe louca que não dá educação para os filhos E AINDA POR CIMA os deixa sair andando por aí no meio de um mercado LOTADO. Entenderam onde eu quero chegar.

Passei no caixa e sorri para a atendente. Ela passava os produtos pela esteira e quase falei que as tartarugas estavam invejando tanto ela que queriam que ela entrasse pra população deles e virasse rainha. Enfim, infelizmente, se eu falasse, nunca mais poderia das as caras por aqui e morreria sem cupnoodles de sabores exóticos. O que me lembra o táxi que peguei para chegar no mercado mais cedo. E então você, na maior inocência: “NOSSA, TÁXI? COMO ASSIM? CUPNOODLES E TÁXI? TUDO A VER, CARAMBA. Já pegou sua dose de crack, Chelsea?!”, primeiro, cale a boca, não use o nome do crack em vão, porra. Segundo, vou explicar porque te amo e sei que é recíproco.

Eu saí saltitante daquele apartamento lixão e só conseguia pensar no quão limpo ele estaria quando eu voltasse. Chamei um táxi qualquer na rua, que parou imediatamente e eu entrei. O motorista tava escutando uma música muito brega. Com “brega” eu quero dizer... Apenas imagine as músicas maravilhosas que existiam no tempo da sua bisavó e entenderá perfeitamente. Eu pedi pra ele trocar de música, na maior educação. Ele disse que é feio pedir uma coisa dessas. Daí eu falei que ele não podia passar moral, porque, porra né. E então, ele se virou pra trás com um olhar assassino, ainda dirigindo. E eu fiquei lá “VOCÊ QUER MATAR A GENTE? OLHA PRA FRENTE, QUE VIADAGEM POR CAUSA DE UMA MÚSICA”, cena típica de alguns filmes, eu sei, mas enfim. E daí, ele voltou a sua posição inicial, como um motorista normal. Eu perguntei um pouco sobre Londres e o vadio nem quis mais me responder. Eu só decidi parar de perguntar, porque fiquei sem graça de ficar falando sozinha e também porque não queria que ele me deixasse na rua, afinal, eu nem sabia onde estava.

Enquanto relembrava minha experiência traumática, Mark apareceu do meu lado.

– Já vai, Chels? – ele perguntou. – Ia te chamar pra sentar naquelas mesinhas ali e ver se rolava um papo mais civilizado.

– Infelizmente, comida é um negócio muito importante pra mim e caso eu não queira perdê-la e ser expulsa do paraíso, terei que ir embora – falei, olhando nos olhos dele.

– Essa hora tu não vai achar táxi, a maioria das pessoas estão saindo pra almoço.

– Nem que eu carregue tudo à mão, eu quero sair daqui antes que aquele brutamonte venha encher meu saco de novo – nossa, por incrível que pareça, eu estava mesmo sendo simpática com esse Mark.

– Bom, eu posso te dar uma carona e quem sabe conhecer às suas três faxineiras? Caso não role com você, pode rolar com elas, certo?

– Cale a boca, seu idiota – falei. – Se bem que elas vão gostar muito de você... É, vai rolar com as três ao mesmo tempo, aposto – três gays and um hétero (ou quase, não vamos julgar quem não conhecemos) em ação.