Meu Panda Vermelho

Meu Panda Vermelho


Toc... Toc... Toc, toc...

Acordei assustada ouvindo batidas em uma árvore próxima a nossa barraca. Talita ainda dormia pesado, então imaginei que fosse apenas um pica-pau, mesmo sabendo que eles não se alimentavam durante a noite.

Passos rápidos seguidos de uma enorme sombra aproximaram-se da barraca, fazendo-me levantar de subido, em silêncio para não assustar Talita, acendi meu isqueiro e sai cautelosamente da barraca. Sei que um pequeno isqueiro não iria me proteger de lobos ou ursos, mas eu ganharia tempo se os assustasse acendendo a fogueira que deixei preparada ao lado de fora. Já vivera uma situação parecida ao lado de meu pai quando acampamos em Tongass, uma floresta que se encontra no sudeste do Alasca, EUA, onde tivemos que assustar uma alcateia de lobos cinzentos que chegaram sem avisar.

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As plantas começaram a balançar e produzir barulhos que eu não conseguia distinguir de onde surgiam devido ao eco que a floresta produzia e eu virava-me de um lado para o outro, assustada, tentando encontrar uma razão para aquela bagunça em meio às plantas.

De repente, um silêncio mórbido alastrou-se a minha volta e eu parei. Ouvi um choro, mas não um choro qualquer, era de uma espécie conhecida. “Não é possível, não pode ser. Essa espécie só existe nas regiões montanhosas do Himalaia e do sul da China” – pensei, mas estava claro que aquele choro pertencia a uma espécie solitária, quase extinta e única sobrevivente da família de mamíferos Ailuridae. Sim, era um panda vermelho, mas não qualquer panda vermelho, era um filhote!

Ele estava assustado quando finalmente o encontrei e notei que uma de suas patas estava completamente ensanguentada. Eu precisava conter a hemorragia ou ele perderia aquela pata para sempre. Imediatamente levei-o para dentro da barraca, com cuidado para não machucá-lo e para que ele não me machucasse.

Peguei minha nécessaire e preparei uma mistura que meu pai me ensinou, Casca de Acoita Cavalo e Casca de Barmitão deveriam ajudar. Minha sorte foi estar em uma floresta que já continha tais especiarias tão prestativas.

Talita acordou assustada com os gritos do pequeno panda e demorou a entender o que se passava por ali.

- O que é isso? O que esse guaxinim faz aqui dentro?!

- Não é um guaxinim, é um filhote de panda vermelho. Ele está com hemorragia na pata dianteira, precisamos levá-lo a um veterinário e depois devolvê-lo ao seu habitat natural.

- Natural? De onde ele veio?

- Do Himalaia, provavelmente.

- Como?! Você pirou? Ele não chegaria até aqui.

- É isso que quero descobrir... Não faz sentido algum.

- E ai amiguinho, só você mesmo para trazer o espírito escoteiro da Tatá de volta a vida. Não é, coisa linda? Quem é um filhote fofo? Quem é? É você sim!

O filhote rolava no chão e balançava a cauda como se compreendesse o que ela dizia, e ela acariciava-lhe a barriga e a cabeça como se ele fosse um cachorro caseiro.

- O que está fazendo? – Perguntei com um pouco de inveja do carisma dela.

- Estou brincando com ele, ué. Quero que nosso hospede sinta-se à vontade.

- Tudo bem, mas que tal voltarmos a dormir? Amanha precisaremos encontrar o caminho que nos levará de volta.

- Não consigo, agora que acordei não vou dormir tão cedo.

- Beba um pouco do chá de Catuaba que preparei, quem sabe além da insônia ele não cure essa sua memória de minhoca e você não acabe lembrando que caminho pegamos para chegar até aqui.

- Muito engraçado, mas vale lembrar que a culpa disso tudo é sua. Não venha pesar minha consciência.