Premonição 5: Água Negra
Xarope
Emily já estava quase chegando ao hospital quando seu celular tocou. Era Johnny. Ele está bem.
— Ems?
— Jo, você está bem?
— Estou sim. E estou salvo. A Heather me salvou. Eu fiquei preso no elevador e quase morri, mas ela me salvou. A morte me pulou.
A garota respondeu qualquer coisa e desligou. Leon era o próximo, e Emily não sabia o que deveria fazer. Naquele momento ela estava com muita raiva dele, e não conseguia importar-se com seu bem estar. Ele deixara Abi morrer, e então fora incapaz de salvar Francis. Por que, Leon? Por quê?
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Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!Emily então voltou a recapitular todas as mortes. Quando Jade morreu, Leon não estava presente. Coincidentemente, ele não matara a garota no sonho que Emily tivera. Naquela ocasião havia Leon e as cobras, mas só isso. Quando Pete morreu, Leon estava presente, na vida real e no sonho. Emily não sonhara com as mortes de Rebecca e Mikey, e, outra coincidência acontecera: Leon não presenciara a morte da oriental, e o seu namorado sobrevivera. A próxima era Abi, e a mesma situação de Pete se repetira. Com Krista não houvera sonho, e Leon não vira a quase morte da garota. E por último Francis... E o efeito de Pete e Abi acontecia mais uma vez.
As pessoas que eu o vejo matando em sonho, são as que morrem quando ele está presente. Mas... Por quê?
Desistiu de pensar. O hospital já não admitia visitas àquela hora, e a garota teve de ir para casa. Essa vai ser uma longa noite, pensou. Pela primeira vez ela estava completamente sozinha. Mikey e Krista estavam no hospital, Johnny estava em outra cidade. Francis estava morto, e Leon... Era a última pessoa que ela gostaria de ter por perto. Ele é amaldiçoado, voltou a repetir para si mesma, esperando que quanto mais dissesse aquilo, mais fácil fosse de aceitar. A garota precisava ter alguém para culpar pelas tragédias, e o rapaz parecia ser a isca perfeita.
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— Calminha, Mikey, você ainda não está em condições de andar tão rápido.
O rapaz sorriu. Ele estava apoiado na namorada, ambos descendo a imensa escadaria do hospital. Mikey recebera alta naquela tarde, enquanto Krista ainda precisava ficar sob observação. Emily conversara apenas uma vez com a amiga, e não fora capaz de contar sobre Francis. Se eu contar ela desiste. De tudo. Krista é durona por fora, mas é frágil por dentro. Ela precisa de mim. Eu preciso protegê-la, eu não posso contar a ela sobre ele...
— O doutor disse que não foi nada muito grave. — Mikey explicou, tirando Emily de seus devaneios. — Mesmo assim minha perna quebrou em uns cinco lugares diferentes. É um milagre que as muletas sejam suficientes, eu deveria estar numa cadeira de rodas.
Emily forçou-se a sorrir, embora não houvesse qualquer motivo para aquilo.
— Sem drama. Essas muletas são só por algumas semanas. Não é como se você fosse ficar como... — E então parou, engolindo em seco. Eu não contei nada ao Mikey ainda. Ele não sabe de nada.
— Como o seu primo, eu sei. Aliás, onde está ele? E Krista? — Deus, ele não sabe nem sobre Krista ainda. — Achei que eu teria um comitê de boas-vindas.
— Escuta, Mikey... — Emily começou, e sentou na escadaria. O rapaz olhou-a incerto, e então fez a mesma coisa. — Aconteceu muita coisa enquanto você estava internado. Eu não pude te dizer nada antes...
Mikey olhava para Emily de maneira apreensiva.
— A Rebecca já estava morta antes do seu acidente. A lista continua correta. — O rapaz reagiu minimamente a essa fala. — A amiga do Leon, a Abi... Ela morreu. — Dessa vez Mikey pareceu horrorizado. — A Krista quase morreu, então, mas eu a salvei. O Johnny também foi pulado. Agora é a vez do Leon.
O rapaz não se deixou levar com facilidade:
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Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!— Espera... Mas e o Francis?
Emily meneou a cabeça negativamente, e então lágrimas escorreram de seu rosto. Ela não precisou dizer nada. Ele entenderia aquilo com facilidade. As lágrimas falavam uma língua universal.
Mikey abraçou-a e disse:
— Tudo vai ficar bem, meu amor. Tudo vai ficar bem...
— Não, não vai! Essa maldita lista, ela está matando todos nós... Ela não vai parar até que nós estejamos todos mortos!
O rapaz não podia discordar daquilo.
— Mas existe uma maneira. — Emily disse subitamente, recuperando algum fôlego. — Eu... — Ela não precisava contar sobre Johnny e Heather. — Eu descobri uma maneira de deter a lista.
— E qual é essa maneira? Me conta!
Emily chacoalhou a cabeça.
— É algo que nós não podemos fazer.
— O quê? Matar alguém?
Bingo.
— Alguém precisa morrer fora da ordem da lista. Quando ela espera levar outra pessoa.
— Isso é absurdo. Além disso, jamais aconteceria. — Mikey afirmou. — A morte não leva ninguém fora de ordem através dos acidentes. Até mesmo quando eu quase morri, a Rebecca precisou ir antes. A lista é à prova de erros.
Você não sabe de nada, Mikey.
— Por isso mesmo isso é algo que nós não podemos fazer. Para alguém morrer fora da ordem, essa pessoa precisaria suicidar-se. Ou... Ser morta.
Mikey tremeu. Ficou abraçado com Emily por vários segundos, e então disse:
— Eu queria que tudo isso pudesse ser consertado com um xarope. Como quando nós estamos doentes. Nós tomamos um xarope e tudo fica bem. Mas nada disso vai ficar bem, dessa vez. Mesmo se nós detivermos essa lista... As pessoas que nós amamos, elas... Elas não voltarão. A Jade, o Francis, o Jay... Eles continuarão mortos, e não há nada que possamos fazer em relação a isso. Nós os perdemos para sempre, e nós estamos a ponto de perdermos uns aos outros também. Estamos a ponto de perder nossa própria lucidez.
A garota percebeu que tocar no assunto da morte do irmão fez a voz de Mikey embargar. Tentou imaginar como devia ser a dor de perder metade de si, e não conseguiu. Se Johnny morresse, Emily achava que gostaria de morrer também, tamanha a dor que provavelmente sentiria. E ele era apenas seu irmão mais velho. Com Mikey e Ajay era diferente, era mais forte: os dois eram as duas metades de um mesmo ser. O namorado não era mais completo desde o dia do incidente do Rainha Fohtaed: apenas metade dele sobrevivera ao naufrágio. A outra metade continuava perdida no mar...
Uma sensação estranha correu o corpo da garota, ao pensar naquilo. Ao pensar no mar e no acidente. O vento parecia sussurrar algo para ela, e então ela soube o que deveria fazer:
— Vamos ao cais.
— Como?!
— Vamos ao cais. Alguma coisa vai acontecer lá.
— Você teve uma visão? É sobre o Leon?
Eu não sei.
— Não, eu não tive uma visão. E talvez seja algo relacionado ao Leon, mas eu não sei. Nós precisamos ir ao cais, e é só isso que eu sei dizer. Eu sinto isso.
Mikey então relutantemente concordou.
x-x-x-x-x
— Chegamos.
O lugar estava vazio. Desde o naufrágio do Rainha Fohtaed aquele cais não recebia mais navios. O lugar era uma visão bonita: uma estrada de madeira que seguia até o mar, quase a perder de vista. De ambos os lados havia estacas com cordas amarradas, e o cheiro da água salgada fez Emily sentir-se um pouco mais viva. Alguns albatrozes fizeram barulho, e a garota sucumbiu à paz por breves e infinitos segundos.
Os dois ficaram em silêncio por vários minutos, até que Mikey disse:
— Emily, você me ama?
A pergunta pegou a garota de surpresa.
— É claro que eu te amo. Que pergunta mais boba.
Mikey então segurou o queixo da garota e a fez olhar diretamente dentro de seus olhos. Olhos escuros, palavras escuras.
— Você me ama?
— Sim. — Ela disse, desviando os olhos dos dele.
— Você me ama?! — Mikey voltou a perguntar, dessa vez mais impacientemente. Emily não pôde virar o rosto daquela vez. Teve de encarar o namorado. Ali, olhos nos olhos, ela jamais conseguiria dizer o contrário:
— Não.
O rapaz largou o queixo da garota e seguiu mancando em direção à beirada do cais.
— Desde quando?
Emily seguiu atrás dele, lentamente.
— Eu não sei dizer. Eu acho que foi logo depois do naufrágio do Rainha. Quando você se isolou de mim. Eu queria te ajudar a lidar com a perda do Ajay, mas...
Mikey virou-se, vermelho de raiva e exclamou:
— Não fala o nome dele! Não fala o nome do meu irmão! — A garota sequer respirou. Ela jamais vira Mikey tão irado. Ele respirou fundo e então disse, aparentemente mais calmo: — Agora tudo faz sentido...
— O que faz sentido?
— Leon.
Só ouvir aquele nome foi suficiente para que Emily fosse desarmada. Ela não conseguiria mentir. Seu corpo a denunciou.
— Oh, meu Deus, então é verdade. É ele, não é? É por ele que você está apaixonada. Foi por causa dele que essa viagem aconteceu, em primeiro lugar. Você o conheceu na internet e veio encontrá-lo aqui pra vocês poderem foder na minha frente, é isso? É isso que animava ele?
— Não! — Emily gritou, sentindo-se ofendida. Não diga isso, Mikey, por favor, eu não mereço. Eu nunca fiz nada que pudesse te magoar... — Não! Eu não estou apaixonada pelo Leon. No começo, eu confesso... — A garota temia a reação de Mikey, mas ela precisava dizer. — Eu tive sonhos... Com ele. Você me deixou sozinha, e o Leon era tão prestativo e misterioso e...
— Eu te deixei sozinha porque eu estava tendo de lidar com a porra da perda do meu irmão, caralho! Você não consegue colocar isso nessa sua cabeça de maluca neurótica, hein? Porra! — Emily chorava, sentindo todo o rancor de Mikey contra ela. — Você é mimada, egoísta, mesquinha, cruel! O mundo não gira ao redor de você! Caralho, Emily... — Lágrimas corriam pela face do rapaz. — Eu sempre estive do seu lado. Sempre. Eu nunca pedi nada em troca. Nada. Apenas que você estivesse ali para mim quando eu precisasse. Só isso. E quando eu precisei, quando eu estava sentindo a dor da perda do meu irmão... Você desistiu de mim! Você deixou pra lá. Deixou que eu curasse minhas feridas sozinho. Eu precisei de você, Emily! E era você que não estava lá! E agora você quer me culpar por não ter podido te foder depois do desastre porque eu estava tendo que lidar com a porra de uma morte?!
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Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!Quando o rapaz terminou aquele discurso Emily estava destruída. Ele estava completamente vermelho, gritando. A garota não soube o que dizer. Será que eu fui mesmo tão horrível assim?
— Eu não poderia me importar menos sobre você e esse Leon. Que você tivesse fodido ele quantas vezes quisesse. Eu não ligo. O que me dói foi que você desistiu de mim tão facilmente...
— Mikey, eu...
Mikey não a interrompeu, e Emily temeu pelo pior. Ela não tinha desculpas para tudo aquilo que ele dizia. Era tudo verdade. Gaguejou, tentando se defender do que realmente sabia como:
— Mas nada jamais aconteceu entre a gente. Entre mim e ele. Nem um abraço, eu juro.
— Eu não ligo, porra! — Mikey gritou.
Emily ignorou-o e continuou:
— Eu não sabia dizer se eu não te amava mais, e não sabia dizer se eu estava apaixonada por Leon, ou se só estava carente... — Emily sentia que estava prestes a desmoronar. Não é isso que ele quer ouvir, mas é só isso que eu posso dizer. — E isso foi antes. Antes de tudo. Antes da morte da Abi e do Francis. Agora tudo o que Leon me lembra é a morte. Olhar nos olhos dele me arrepia, e eu me sinto mal perto dele... Eu me sinto mais próxima da morte. Ele concentra tudo de pior que existe nessa lista. E eu... — Ela precisava dizer algo. Precisava dizer que se arrependia de não ter ficado ao lado dele quando ele precisou. Precisava dizer algo que importasse, e que valesse a pena. Mas não teve tempo.
Mikey mantinha o olhar fixo atrás dela. Quando a garota virou-se, percebeu o motivo.
Leon estava ali, parado, ouvindo tudo.
— Leon...
O rapaz se aproximou do casal, sombrio, cabisbaixo. Estava vestido todo de preto. Emily temeu pelo pior, então gritou:
— Não se aproxima!
O egípcio não entendeu a reação da garota:
— Emily, você não está bem. Você está se virando contra mim. Eu não fiz nada para causar tudo isso. A lista... Não é minha culpa.
— Não dê mais um passo! — A garota berrou, com a voz esganiçada. Ele é mal. Não é? — Você é o próximo! Sai de perto de mim, me deixa em paz! Me deixa em paz...
— Emily...
— Você ouviu a garota. — Mikey falou, e investiu contra Leon, subitamente recuperando-se do surto que tivera minutos antes.
O rapaz desferiu dois socos contra o egípcio. Emily gritava para que Mikey parasse com aquilo, mas foi em vão. Leon aproveitou-se da perna quebrada do rapaz e livrou-se rapidamente da terceira investida dele. Então chutou o ferimento de Mikey com força, e desferiu três socos em seu rosto.
Emily então puxou Leon com força, fazendo-o cair de costas. Mikey estava atordoado, com o nariz sangrando.
— Para, Leon...
— Mas foi ele quem começou!
A garota então saiu correndo, sem saber direito para onde. Não deu dez passos e Leon a segurou pelo braço.
— Emily, por favor, me escuta. — A loira não queria olhar no rosto dele. Fazer isso significava rever cada uma das mortes. Leon parecia refletir a própria morte. — Eu não sei o que te aconteceu. Mas eu preciso te dizer que eu não tenho culpa de nada. Qualquer que seja o motivo que esteja fazendo você me odiar tanto, eu... — E então a voz dele ficou embargada. — Eu não sou a morte, porra! Eu sou uma vítima tanto quanto você. Eu não mereço que você me trate dessa forma. Eu te ajudei, você não se lembra? — Emily mantinha o rosto virado, as lágrimas escorrendo. — Nós... Somos amigos. Nós somos bons amigos. Você não tem o direito de me tratar dessa forma! — Leon gritou. — Eu...
E então a garota interrompeu-o com um abraço. Colocou os braços ao redor do egípcio e abraçou-o com força. Mikey também precisa de um abraço, mas o de Leon é mais urgente. Ele não tem muito tempo.
— Me desculpa...
Então a garota viu um clarão.
A cena seguinte da qual ela se lembrava era de estar caída no chão com Mikey em cima dela. Tudo aconteceu com uma rapidez incrível, e seu mundo virou de ponta cabeça. Em um minuto ela estava abraçada com Leon.
No outro o raio estava entre eles.
Aconteceu de repente. O clarão apareceu no céu azul puríssimo, e então Mikey puxou-a no último segundo. Leon não foi tão rápido: o raio acertou sua cabeça, e a eletricidade passou por todo o seu corpo. O rapaz sentiu-se queimando por dentro, e todas as partes do seu corpo formigaram.
Quando Emily ergueu o olhar viu o rapaz caindo ajoelhado.
Leon tinha queimaduras por todo o seu corpo. Bolhas estouravam em seus braços e em seu rosto, e sua roupa e sua pele escureceram com as queimaduras.
Ele estava morto.
— Aconteceu. O Leon era o próximo. — Mikey murmurou, ainda completamente atônito. As lágrimas em seu rosto secaram, mas o olhar de desespero continuava em sua face. O corpo queimado do egípcio também continuava estirado no chão. Emily não conseguia dizer qualquer coisa.
— E... Agora? — Foi só o que a loira conseguiu murmurar.
Mikey passou a mão pelos cabelos, extremamente nervoso.
— A lista começa de volta não é? Você, eu, Krista, Johnny...
E então Emily teve um estalo:
— Mas você me salvou. Eu deveria ter morrido junto com o Leon, atingida pelo raio. Você fez a morte me pular mais uma vez.
A verdade daquelas palavras atingiu Mikey em cheio, como um soco no estômago. O rapaz olhou para a namorada de maneira atônita, assustado. Ele ainda estava bravo com ela? Um misto de sentimentos o invadia. Queria beijá-la, mas também sentia uma vontade incontrolável de fazê-la desaparecer para sempre. Talvez a dor fosse embora junto com Emily. Só o que conseguiu dizer foi:
— Você está certa... É a minha vez.
E então ele se virou e saiu correndo o mais rápido que podia com a sua perna engessada. A garota alcançou-o com facilidade, e segurou seu braço, obrigando-o a parar:
— Pra onde você vai?
— Eu não sei, Emily. Porra! Eu não sei, eu...! — E ele olhou para todos os lados, procurando algo que pudesse ajudá-lo com as palavras. — Você precisa ficar longe de mim. Eu sou o próximo, e eu não quero que você esteja comigo quando acontecer. Eu não quero que você... Veja.
Emily continuou segurando o braço do namorado e deu um berro de desespero, as lágrimas ainda caindo de seu rosto. Por que tem que ser assim? O que nós fizemos para merecer tudo isso? Por que Mikey tinha de continuar sendo tão carinhoso e preocupado com ela mesmo depois de tudo o que a garota fizera? Mesmo depois de ela ter desistido dele?
Mikey voltou a se afastar. Emily gritou:
— Mikey!
Ele se virou e disse:
— Não... Se aproxima. Nunca mais. Não chega perto de mim.
A garota ficou parada, em choque, observando Mikey. As palavras a cortaram mais profundamente do que espadas. Fora aquilo que Leon sentira quando ela o repelira? O desprezo... Era insuportável sentir-se desprezado por alguém que ela se importava. Por alguém que, durante muito tempo, significou a vida para ela.
Ao seu redor algumas pessoas se aproximavam e viam o corpo de Leon. Não demorou muito até que o local estivesse infestado de curiosos e de ambulâncias. Emily não quis ficar por ali para observar o circo: ela sabia que Leon estava morto. Ele morrera carregando uma culpa que não tinha, por algo pelo qual ele não causou. Se ao menos a garota soubesse como parar com tudo aquilo... Ela poderia salvar três vidas. Quatro, se contasse a sua própria. E então teve um insight e soube o que deveria fazer.
Correu o mais rápido que podia. Passos desajeitados, lágrimas pulando de seus olhos involuntariamente. A vista estava tão embaçada...
Mikey.
Ele não podia morrer. Emily sabia o que deveria fazer, mas para isso o rapaz precisava estar em segurança. Eu posso te salvar, agora eu sei.
Emily encontrou-o facilmente, numa das maiores avenidas da cidade. Era o caminho natural para quem precisava voltar do cais até onde ele morava. Carros passavam a todo o momento, apesar de as ruas estarem relativamente vazias de pedestres. A garota gritou:
— Mikey, espera!
Ele olhou para trás instintivamente. Jamais conseguiria dar as costas para aquela voz.
A garota olhou para cima.
— Corre! — Ela gritou, percebendo o que aconteceria.
Do oitavo andar do prédio onde Mikey estava em frente, um piano era suspendido por uma corda. Emily viu quando o objeto se soltou, e já sabia o que iria acontecer. O rapaz não chegou a ver o que iria cair em cima dele, apenas fez o que Emily lhe disse. E correu em direção a ela, atravessando a rua como se do outro lado estivesse o seu ágape.
O piano não caiu.
Mikey atravessou a rua no exato momento em que a ambulância apareceu e acertou-o em cheio, fazendo o coração de Emily despedaçar-se.
Ela viu apenas o sangue voando e respingando na ambulância. Quando o veículo passou, Mikey estava estirado no chão, uma mancha vermelha. A van havia acertado-o de modo que as rodas passaram em cima de seu torso. Ele fora dividido em dois. A metade da metade.
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Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!A parte de cima do corpo do rapaz ainda tinha espasmos involuntários. Emily percebeu que Mikey ainda estava de olhos abertos, observando o infinito. Um último olhar. As tripas dele estavam por todos os lados no asfalto, tornando a experiência a mais traumatizante possível. E quando a garota pensou em correr até ele, por qualquer motivo que fosse, outro carro passou, esmagando a cabeça do rapaz e silenciando-o para sempre.
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Eu preciso chegar ao cais, eu preciso chegar ao cais...
Era tudo o que Emily tinha na cabeça.
Se eu olhar para trás estou perdida.
Queria gritar, espernear, chorar, dizer que não era justo. Imagens vinham e voltavam em sua cabeça. Leon sendo queimado vivo pelo raio, Mikey sendo cruelmente atropelado. Eu pedi para ele correr. Eu indiretamente pedi para ele correr para mim. Para correr para a morte. O corpo dele... Ele se mexia. Oh, Mikey...
No fim das contas Leon não era o anjo da morte.
Ela própria era.
Mas Emily estava pronta para consertar as coisas. Para aparar as arestas de uma vez por todas. E ela precisava ser rápida: Krista era a próxima, e a morte estava vindo com rapidez. Se a garota não fosse rápida, seu sacrifico poderia chegar tarde demais. Eu vou salvar você, Krista. Você e Johnny. Pelo menos vocês dois. E depois vou poder descansar em paz. Em um lugar onde nenhuma memória ruim vai conseguir me alcançar. Paz...
A garota descobrira o que deveria fazer quando Mikey deixou-a para seguir para o deu destino final. Alguém precisa morrer fora da ordem em que deveria. Morrer quando a lista esperava levar outra pessoa. Não fora isso que Johnny dissera para ela? A maneira de deter a lista. A única maneira...
Emily parou na ponta do cais. Não havia praticamente mais ninguém ali. Leon já havia sido levado.
Seu celular tocou. Era Johnny.
— Ems, onde você está? Eu fui pra casa e não te encontrei. Eu estou aqui no cais. Cadê você?
— Eu te amo. — Foi só o que Emily conseguiu falar. Desligou.
E então saltou para dentro da água com força.
Sentiu um impacto forte em sua cabeça, como se tivesse batido em algo. Sentiu-se molhada, e sentiu braços ao redor de si, e então apagou. Seu mundo se tornou azul, e girou, girou, girou.
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