A imagem da criança torturada presa por correntes assombrou meus sonhos por todas as noites, fazendo com que meu tempo de descanso (que já era pequeno) ficasse menor ainda. Imagine você tentando dormir em meio ao som de milhares de máquinas gritando suas musíquinhas e piscando suas luzes, adicione a isso a visão de vários cadáveres acorrentados acima de você a cada vez que você fecha os olhos, pois é, não é muito fácil dormir tranquilamente.

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Mikael estava preocupado com meu estado, eu percebia isso a cada vez que o flagrava me encarando com um olhar de pesar enquanto tentava fazer suas atividades, porém ele nunca falava nada, ele já devia ter notado que eu não era o tipo de pessoa que contava seus medos para alguém, esperando abraços acolhedores.

Os dias foram se passando, não que meu pânico se fosse junto com eles. Acredite, eu não sou uma pessoa que se assombra fácil, ainda mais vivendo na realidade em que vivo, porém saber que um anjo que me queria morta andava me perseguindo não era algo a que eu conseguia encarar facilmente.

Com o tempo, o grupo parou de ficar apreensivo quanto a mim, provavelmente por perceber que eu não havia começado a ter afeição pelas sombras ou ter mudado meu cardápio para algo exótico como a carne deles, então todos começaram a me ignorar como sempre haviam ignorado, tratando-me apenas como mais uma lanterna que afastava os nightwalkers de noite.

A única novidade quanto a isso tudo, foi o crescente afastamento do grupo a Mikael também, como se ele estivesse contagiado com meu azar aos bichinhos que nos assustavam, por isso nós dois acabamos nos aproximando, aceitando nossa condição de excluídos da pequena sociedade.

Passaram-se semanas, e eu já não temia tanto as sombras como nos primeiros dias depois de meu contato com meus amiguinhos mortos, agora eu conseguia distinguir as outras figuras que vinham diante de mim, nem sempre pensando ver os olhos negros e opacos do anjo em todos os nightwalkers que me atacavam.

A minha rotina voltou ao normal, assim como minhas noites de sono, e eu comecei a tentar me iludir com a ideia de que todo o pesadelo com meu anjo havia acabado.

Talvez ele tivesse se esquecido de mim, como devia se esquecer de várias pessoas que fazia promessas de morte.

Talvez ele tivesse finalmente morrido por alguma arma de alguém mais experiente que nós.

Talvez ele tivesse voltado a ser um nightwalker normal, apenas querendo seu almoço humano para sobreviver, não querendo mais perseguir sua caça.

Talvez, essa era a palavra que me dava medo.