Living Dead - EM HIATUS

XVII - My Immortal


These wounds won't seem to heal, this pain is just too real
There's just too much that time cannot erase.

Aquela manhã estava mais fria do que todas as outras. O inverno já estava quase em seu fim, mas não era o que os ventos do norte diziam, congelante e sibilante entrando por uma das janelas do quarto, sacudindo a cortina violentamente. Frederick não se lembrava de aquela janela estar aberta, afinal, todo o castelo estava fechado para proteger-lhes o máximo possível do frio. Ele andou rápido até ela e a fechou, esfregando as mãos uma na outra rapidamente para esquentar.

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Assim que se virou, entretanto, teve que se conter com o susto que levou ao avistar a figura sombria e imóvel de Thalia, que havia silenciosamente entrado ali de alguma forma, muito provavelmente pela janela, a lhe fitar. Ela segurava algo em seus braços, mas ele não soube identificar.

– Thalia! – ele falou baixo. – Da próxima vez, por favor, venha como uma visita!

– Eu não poderia – ela respondeu simplesmente. – Não hoje. Não nesta situação.

– Que situação?

Ela apenas ergueu um pouco mais os braços, e então enfim ele soube o que era: um corpo.

– O que...? – O Rei ia perguntando, mas então seus olhos encontraram as madeixas ruivas caindo por debaixo do lençol branco que cobria o corpo.

Não havia nem mesmo uma pessoa naquele reino que não reconhecesse aqueles cabelos de fogo de sua amada filha Rachel. Mas algo parecia errado. Os fios estavam estranhamente desbotados... Quase sem vida. Era como se o fogo estivesse se apagando.

– Rachel? O que aconteceu? O que aconteceu com minha filha? – Ele perguntou, sua voz se elevando enquanto ele se aproximava de Thalia.

– Não! – Ela disse se afastando dele, impedindo que retirasse o lençol do corpo da garota. - Você não vai querer ver.

Ele a olhou incrédulo.

– Eu a encontrei nesta manhã, não muito longe de uma estrada que levava para fora de Bridgeport... Mas eu realmente não sei se ela estava de fato deixando o reino ou não, ou como foi parar lá. Eu só... Senti quando aconteceu. – Thalia explicou.

– O... Que... Aconteceu? – Frederick perguntou entre um fôlego e outro.

– Adivinhe só, Frederick? Não foi um animal! – Ela respondeu dura.

Ele a olhou furioso e se ergueu na direção dela, mas então algo o afastou abruptamente na direção contrária, contra a parede.

– Não ouse tocar em mim, majestade! – Falou ironicamente, sem mesmo ter se movido – Lembre-se: você causou tudo isso.

– O quê? – ele gritou. – Como pode eu ter feito isto? Minha própria filha!

Thalia riu.

– Sua própria filha, é? Annabeth também era sua própria filha – ela disse enquanto se aproximava e empurrava o corpo de Rachel contra Frederick.

Ele a segurou com cuidado em seus braços e, delicadamente, retirou o lençol.

Não – Ele lamentou soluçando ao ver o sangue que secava pelo corpo de sua filha, a pele branca e cadavérica, o rosto quase irreconhecível e a grotesca ferida em seu pescoço, muito semelhante a uma brutal mordida.

Pela primeira vez em sua longa vida, Thalia Grace viu o gelo do coração do rei descongelar e sair em forma de lágrimas pelos olhos dele. Ela não estava com dó dele, muito pelo contrário; achava que ele ainda merecia muito pior do que aquilo.

– Você disse... – Ele disse depois de algum tempo. – Que não foi um animal. Então o que foi? Quem foi?

– Frederick, você percebeu o tamanho de ataques que ocorreram na floresta desde a morte de Annabeth?

– Sim, é claro. Eu mesmo não aguento mais ouvir tantos relatos sobre as mortes ocorridas lá.

Thalia se irritou com a indiferença por parte dele para com o que vinha acontecendo com o seu povo, mas continuou. Ela sabia que não podia contar tudo o que sabia para ele, então decidiu fingir incerteza sobre os verdadeiros fatos.

– A minha suspeita é de que, de alguma forma, ela ainda está no nosso mundo. E atacando a todos que entram na floresta.

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Ele levantou um pouco a cabeça e franziu o cenho.

– Isso é... Ridículo.

Ela deu uma leve risada.

– Oras, você sabe muito bem que o mundo não é do jeito que a maioria pensa. A minha própria existência e capacidades provam isso. E cá entre nós... A sua existência também prova, Frederick.

O semblante do rei ficou sombrio, mas ele não respondeu nada.

– Como eu ia dizendo... Infelizmente, eu não estava lá no momento do ataque contra ela, de modo que não posso lhe dizer exatamente o que aconteceu. Mas devido a minha conexão com a floresta, de uma coisa eu tenho certeza: foi algo sobrenatural.

Novamente furioso, ele se levanta.

Você é a feiticeira, Thalia! Você colocou a maldição nela! Como é possível? Como pode ela ter matado à minha filha se ela deveria estar morta? O que mudou, Thalia?

– Eu não sei! – Ela responde. – Eu fiz tudo correto! E tudo aconteceu como o planejado! Talvez tenha acontecido algo durante todos esses anos que não saibamos... Mas eu não sei! Tudo o que sei é que ela não está viva por completo, mas também não está morta. E que apenas ataca a quem cruza os limites na floresta. Mas lembre-se que isso não passa de uma suspeita minha.

– Então arranje uma solução! – Frederick diz. – A floresta é sua, o feitiço é seu! Eu mandarei os guardas avisarem que, a partir de agora, está proibido entrar na floresta, e farei um mandato de guarda na frente dos limites para que ninguém quebre a regra. Enquanto isso, você arranje uma forma de acabar com isso!

Thalia respirou fundo.

– Não sei se posso de fato acabar com isso, mas verei o que posso fazer para controlar.

Ele se agacha e pega novamente o corpo de sua filha em seus braços. A feiticeira os observa uma última vez, e então desaparece janela afora.

Frederick deposita Rachel em sua cama e suspira. Ele não podia acreditar que logo ela, sua filha favorita, havia sido morta. Por causa dela... A maldita Annabeth! Parecia que tudo de ruim em sua vida acontecia por causa dela! Nem mesmo após ser morta, a maldição que ela carregava havia sido dissipada. E agora, como se já não bastasse ele não poder ter mais filhos homem, ela havia lhe tirado seu bem mais precioso.

~~~~

A notícia da morte de Rachel foi um enorme choque para o reino de Bridgeport, assim como para os reinos vizinhos. A segunda princesa que era tirada deles, e logo a mais preciosa do Rei, de modo que o funeral foi um evento longo e demorado, o pesado luto se abatendo sobre todos.

Frederick já se encontrava em seus aposentos no castelo, juntamente de sua esposa Elizabeth, após regressarem. Ele andava para um lado e para o outro afrouxando suas vestes, como se estivesse furioso. E de fato estava; ele simplesmente não aceitava a morte de sua primogênita, pois assim todos os seus planos estavam indo por água abaixo.

Elizabeth choramingava sentada em uma poltrona, olhando sem realmente um foco através da janela. A rainha vinha passando por uma difícil depressão desde a morte de Annabeth, e agora com a de Rachel, isso só tendia a piorar, e muitos acreditavam que ela não suportaria por muito mais tempo.

Frederick sabia que não era justo, mas acabou irritando-se com o barulho de sua esposa:

– Ahr, pare com esse choro, Elizabeth! Pare, pare, pare!

Ela o olhou com os olhos vermelhos e inchados arregalados, soluçando com ainda mais força.

– Como você pode... Acha que isso tudo é fácil pra mim? Minha filha... Nossas filhas! Elas se foram, Frederick! Primeiro minha doce Annabeth...

– Annabeth, Annabeth, Annabeth... É sempre Annabeth para você, mas tudo isso é por culpa dela! É por causa dela que tudo isto está acontecendo!

Elizabeth sacudiu a cabeça.

– Se você soubesse... – ela murmurou para si mesma, mas ele conseguiu ouvir.

– De uma coisa eu sei, Elizabeth! – disse ele. – Annabeth nunca pertenceu aqui, nunca pertenceu a lugar algum! Ela não deveria nunca ter nascido, amaldiçoou todo nosso reino quando o fez!

– Pare com isso... – a rainha pediu.

– Ela tampouco merecia essa boa vida que tinha! E mesmo assim ainda possuía a ousadia de esnobar tudo o que tinha, como se sua vida fosse horrível!

– Você nunca fez com que fosse boa! – gritou ela. – Assim como Silena e como Rachel, Annabeth era sua filha também, Frederick! Mas você nunca foi capaz de amá-la, nunca foi capaz de trata-la bem ou até mesmo dirigir uma palavra gentil sequer!

– Ela não merecia isso! Não via como era? Sempre desleixada, se comportando sempre do modo errado. Ela repugnava as pessoas! Rachel não, sempre foi uma moça que merecia se tornar a rainha que estava destinada a ser.

– Pare com isso, Frederick!

– Isso o quê?!

– De ficar sempre defendendo Rachel! Você não pode simplesmente escolher uma favorita.

– E por que eu não o faria? – ele gritou de volta.

– Porque ela não era sua filha! – berrou a rainha, calando seu marido.

Um minuto de silêncio se passou, o arrependimento logo caindo sobre Elizabeth.

– Como?! – questionou Frederick.

– Eu... Pouco antes de nos casarmos, Richard e eu... – ela não conseguia completar a frase, mas decidiu simplesmente ser direta. – Eu sinto muito, Frederick. Mas a sua favorita não passava de uma bastarda.

No momento em que ela lhe disse isso, ele sentiu tudo ferver dentro de si, e suas mãos começaram a tremer. Sua esposa... A mulher que ele tanto amou no passado lhe traíra com um maldito criado e engravidara de Rachel, a gravidez que todos pensaram ser uma vitória resultante logo da primeira noite de núpcias deles... E por todos esses anos ele a amou e a tratou como a melhor acreditando ser sua filha, sua pequena vitória.

Aquilo o enlouqueceu.

Olhou para Elizabeth, que lhe deu a notícia tão diretamente, tão indiferente. Ele não podia acreditar que ela mentiu para ele por todos esses anos, lhe fazendo de tolo. Frederick estava enxergando vermelho, completamente tomado pelo ódio de ter sido enganado.

Tarde demais, ela percebeu o perigo em que se colocou, se assustando com o ódio enlouquecedor na expressão de seu marido, e tentou se afastar, mas ele rapidamente já se aproximara dela e, sem nem mesmo parar para pensar no que faria, enrolou as mãos ao redor da cabeça dela e em um só movimento, quebrou-lhe o pescoço, deixando sua esposa cair em seus pés.

~~~~

You used to captivate me by your resonating light, now I'm bound by the life you've left behind
Your face it haunts my once pleasant dreams, your voice it chased away all the sanity in me.

3 ANOS DEPOIS...

Aquele fora com certeza o pior ano da história de Bridgeport, muitas mortes, sendo cinco delas de importantes nobres do reino: Luke Castellan, Annabeth Chase, Calipso Van Der Waals, Rachel Elizabeth Chase e a rainha Elizabeth Chase.

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Como se não fosse o suficiente, boa parte do povo de Bridgeport se revoltou contra Frederick, alegando que ele estava ignorando todos os problemas do reino, alguns até acusando-o de ter assassinado a própria esposa, embora houvesse sido “comprovado” que um assassino invadira o castelo enquanto eles estavam no funeral de Rachel, e matara Elizabeth quando esta se encontrava sozinha em seus aposentos, o que resultou em sua condenação de morte em praça pública.

Toda a revolta apenas causou ainda mais conflitos no reino, mas em algumas semanas tudo havia sido resolvido. Para manter Silena longe de todo o caos, Frederick a enviara para um internato na Suíça, alegando também ser melhor para afasta-la das memórias de sua mãe e suas irmãs ali no castelo que costumavam viver, com quem ela compartilhava seu dia a dia.

A nova lei de proibição à entrada na floresta realmente funcionou em parte, e assim as mortes por ataque diminuíram bastante; no entanto, por outro lado, isso impedia os caçadores de irem atrás de seu jantar, o que piorou ainda mais a situação de fome no reino, no entanto, ainda podia ser controlada com a agricultura e a criação de animais.

Isso não mudava a predominância da decadência em Bridgeport.

A decadência não só estava no reino, como também em Percy Jackson. Ao longo dos anos, o rapaz acabou tornando-se tudo aquilo que nunca quis ser: subjugado, fracassado, sem esperanças; além de gastar boa parte de sua riqueza com bebidas e mulheres – riqueza tal que ele só possuía ainda por causa de seus pais.

O filho do grão-duque já estava reconhecido pelo reino como um mulherengo, bêbado conquistador. Ele não se importava, pois, apesar de sua má reputação, era inevitável as moças continuarem caindo por ele.

Certa noite, Percy está em um bar a beber, como fazia quase todas as noites. Mas desta vez, ele possuía novos planos. Acontece que se tratava de uma quinta-feira, e como aconteciam todas as noites de quinta, um grupo de ciganas iria se apresentar.

Não só ele, como também a maioria do povo adorava assistir às danças das ciganas. Em alguns outros reinos, os ciganos não eram aceitos, mas aquele grupo conseguira fugir da perseguição e se refugiara em Bridgeport. Jackson se interessava em uma em particular, com quem conseguira conversar algumas vezes. Ela se chamava Piper McLean.

Desde a primeira vez que a assistiu dançar, ele já começara a planejar uma forma de se aproximar da bela moça para então conseguir atraí-la para a cama, pois, apesar do tipo de suas danças não serem sensuais, a beleza e delicadeza de Piper se destacavam no grupo, o que fazia com que ela atraísse mais homens do que as mulheres que realmente dançavam para sensualizar, com o objetivo de venderem seu corpo.

Porém, era difícil se aproximar de uma cigana. Ela não tinha permissão para estar em constante contato com quem não fosse de sua própria cultura; eles gostavam de estar sempre junto de seu grupo. Até que Percy descobriu que, onde Piper morava, ela atendia clientes para desvendar seus futuros. Ficava em um lugar particularmente mais isolado no cais perto do porto de Bridgeport; aquela era sua chance perfeita.

Não sabia se daria certo, pois, pelo que ele sabia, as ciganas eram muito mais conservadoras no quesito castidade, mas aquilo não o impedia de tentar. Percy era reconhecido por sempre conseguir a mulher que queria.

Ele e seus colegas de bebedeira estão cantando músicas animadas, a maioria claramente embriagada, apesar de ainda ser cedo. Quando um dos homens cutuca Percy com um cotovelo, ele se vira e o homem aponta com o queixo para lá fora, no meio da praça. O lugar está movimentado e enchendo, isso significa que estava para começar. Os homens riem animados e comemoram, alguns dando tapinhas no ombro de Percy, pois sabiam das intenções dele.

O rapaz deixa uma quantia de moedas de ouro no balcão e se levanta, saindo para a praça. Um círculo de pessoas já havia sido formado em volta das ciganas, prontos para assistirem. Percy prefere ficar afastado, então procura um lugar para se encostar, mas que desse para vê-las claramente. Logo ele avista Piper, vestida em blusa branca que deixa exposto seus ombros e um pouco de sua barriga, com as mangas e o busto sendo largos, e uma longa saia vermelha; ela estava descalça e segurava um pandeiro na mão.

Seus cabelos eram escuros e lisos, mas apesar de longos, ele percebera que era todo desfiado, como se alguém tivesse passado uma tesoura desgovernadamente por ele, coisa que ele nunca vira antes; outra coisa diferente também era as duas tranças finas que ela possuía pelo cabelo, com uma pena presa na ponta de cada uma, e ele tinha certeza de que nenhuma outra pessoa no grupo possuía tranças com penas presa nelas.

Mas o que ele realmente adorava eram os olhos dela. Uma hora eles eram azuis, outra verdes, e às vezes castanhos. Mas ele gostava mesmo era quando ficavam cinza, pois o lembrava... Bem, o lembrava muito dos olhos de Annabeth, uma coisa que era boa e dolorosa ao mesmo tempo. Uma dor viciante de se sentir. E ele tinha certeza que era só por causa disso que ele ficara obcecado pela moça, apesar de ela ser realmente bonita.

Isolado ali, assistia a ela e as outras dançarem animadamente os passos que apenas eles sabiam. Os homens tocavam a música animada, e ela acompanhava com o pandeiro enquanto dançava e encantava a todos. Os seus amigos do bar estavam lá perto, gritando junto à plateia. Até algumas crianças se juntavam a dança, embora fizessem passos diferentes. Todos estavam animados, e aquilo ficava cada vez mais doloroso para Percy.

Era como se a Festa da Lua Azul daquele verão houvesse ocorrido logo no dia anterior, pois a memória era fresca em sua mente. Ele fechou os olhos e, apenas ouvindo a música, pôde ver claramente Annabeth dançando junto aos outros, Silena, Rachel e os irmãos Stoll.

– Percy... – Annabeth murmurou, o nervosismo claro em sua voz.

– Vamos, se solte Annie! – ele disse.

A viu fechar os olhos e agarrar as bordas do vestido, e depois Travis a puxar para ser seu par. Percy fez o mesmo com alguma outra moça, e então lembrou-se deles trocando de par e de par no meio da roda, mas sempre procurando os olhos um do outro. A música que estava tocando ali na hora quase se encaixava perfeitamente à dança que eles faziam em sua memória.

Sentiu ela finalmente voltando aos seus braços, mas foi aí que a música acabara. Sentiu a respiração rápida e o peito ofegante dela, o rosto apenas alguns mínimos centímetros longe do seu. Sabia que na hora aquele momento durara apenas alguns segundos, mas ele quis segurá-lo por mais um tempo, sentir a respiração dela por mais tempo, e, como se estivesse acontecendo de verdade, ele lentamente aproximou uma mão do rosto dela, em nenhum momento desviando os olhos dos cinza hipnotizantes dela. E então, quando ele estava quase finalmente tocando a pele macia dela, a imagem mudou, Annabeth se transformando em algo completamente diferente, com a pele ressecada e cicatrizes descendo do rosto até o resto de seu corpo; os cabelos antes perfeitos cachos dourados, agora sem cor, sem vida, e o que antes eram lindos olhos brilhantes, de repente opacos e aterrorizantes.

Percy abriu os olhos, assustado, voltando para a realidade onde a música ainda tocava animada e Piper ainda dançava entre os outros. Mas ele não se sentia mais animado. Diabos, era exatamente como os pesadelos com que vinha tendo por longos três anos! Todas suas melhores memórias com Annabeth se transformando em algo horripilante; ela sempre se transformando naquilo que ele vira na floresta que não conseguia reconhecer, e que claramente não o reconhecera também.

Sentiu-se tentado a voltar para o bar e pedir outra rodada de bebida, mas sabia que se o fizesse, a noite se tornaria ainda mais deprimente do que estava sendo. Não. Ele precisava de outra coisa para distraí-lo.

Levantou-se e se aproximou do grupo. Sabia que Piper já o avistara, e assim como ela, ele continuava a lançar olhares em sua direção. Em outros casos, aquilo significaria que ela também estava interessada nele, mas se tratando de uma cigana, ele podia estar errado; talvez ela só gostasse de tê-lo conhecido e quisesse ser sua amiga. Mas ele não estava nada interessado em ser apenas amigo. Só queria dormir com ela e pronto. Dependendo de como fosse, poderia voltar a dormir com ela outras vezes.

Teve vontade de rir. Se há alguns anos atrás Percy soubesse que seria assim no futuro, sentiria nojo de si mesmo. Mas não se importava. Tudo com que ele se importara na vida fora arrancado dele, então realmente não via motivos para ainda tentar ser feliz. E não, apesar de tudo, ele não se sentia uma pessoa feliz. Riqueza, todas as mulheres a seus pés... Aquilo não era a fonte da felicidade para ele, embora todos os seus amigos o invejassem.

Quando a apresentação finalmente terminou, Percy esperou mais um pouco para Piper ficar sozinha. A festa ainda continuaria por ali, mas ele sabia que ela nunca ficava até o fim, sempre ia embora cedo. Não demorou muito para ela começar a se distanciar. As pessoas recomeçaram a tocar música, e logo todos estavam dançando novamente.

– Como sempre você sendo a primeira a ir embora – ele disse andando atrás dela.

Ela nem mesmo virou a cabeça, mas ele conseguiu ver um leve sorriso no rosto dela. Ela já sabia que ele viria atrás dela.

– Gosto das festas que fazemos, mas gosto de voltar cedo e aproveitar a noite enquanto estão todos aqui.

– Então você gosta de ficar sozinha?

– É. A noite fica... Interessante.

– E quanto aos seus clientes? – ele perguntou, se referindo ao fato de que, estando quase todos ali na praça, ela teria pouca clientela na noite.

– Não atenderei hoje a noite – ela sorri.

– Bem, é uma pena. Porque eu gostaria de receber sua consulta hoje. Tenho curiosidade em saber como você faz isso.

Piper se vira para ela, já ao lado de seu cavalo marrom. Ela morde os lábios, pensando.

– Tudo bem. Abrir-lhe-ei esta exceção.

Percy sorriu satisfeito, e subiu em Blackjack. Enquanto a seguia, perguntou se ela sabia o que ele pretendia ou se realmente achava que ele só estava interessado em saber seu futuro. Francamente, seu futuro não lhe parecia nada promissor.

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Eles cavalgam em direção ao porto de Bridgeport, e quando lá, fazem o caminho para o pequeno vilarejo que ficava em frente ao cais. Ela segue até uma caravana cigana entre algumas outras, pouco a frente da ponte que levava ao vilarejo no cais. Sem dizer nada, ela desmonta e prende seu cavalo. Percy faz o mesmo.

Como ela dissera, o estava tudo vazio e silencioso, o que deixou Percy mais a vontade. Assim que eles entraram, ele percebeu que o lugar era bastante pequeno e apertado, então provavelmente ela morava sozinha ali. Ele realmente não via como ter mais de uma pessoa ali.

O cômodo aonde entraram era escuro, com apenas algumas velas espalhadas para iluminar o necessário. Havia uma mesa baixa, com almofadas espalhadas ao redor.; havia plantas e bacias espalhadas por todo o lugar. Um forte cheiro de incenso predominava no ar. Ao todo, era bastante aconchegante.

Uma cortina de brilhante separava o cômodo para o outro, para onde Piper andou direto. Ele esperou pacientemente em pé, pensando em como iria fazê-la ceder ao seu desejo. Finalmente, Piper voltou do outro cômodo, com os pés descalços não fazendo som algum ao mover-se.

– Então você quer que eu leia sua sorte? – ela perguntou suavemente, sentando-se atrás da mesa no chão, ficando de costas para ele.

Percy pensou por um minuto, e então decidiu se direto. Devagar, ele se ajoelhou atrás dela, aproximando-se de sua nuca.

– Na verdade, acho que você não precisa ler a minha sorte para saber o que eu realmente quero... – falou galanteador, mas por dentro, torcia para que desse certo.

Ele a ouviu sorrir.

– Certamente não, senhor Jackson.

Ela se virou para ele e o fitou nos olhos por um segundo. Seus rostos estavam bem próximos, então ele se aproximou para que pudesse beija-la, mas esta se afastou.

– Há algo que precisa saber – Piper disse.

– O quê? – perguntou ele confuso.

Ela abriu a boca, hesitando. Depois de alguns segundo falou:

– Eu posso lhe dar o que você quer, com uma condição.

Percy sorriu torto. – Qualquer coisa.

Ela levantou uma sobrancelha, sorrindo um pouco.

– Desde a primeira vez que te vi, eu senti que existem... Coisas em sua vida – ela segurou uma de suas mãos. - Interessantes o suficientes para chamar a minha atenção fácil, mas complicadas, e que eu me sinto no dever de deixar claras pra você.

– Eu... Não entendo. – Percy percebeu que os olhos delas estavam estranhamente brilhantes, como se ela estivesse prestes a entrar em um transe.

– Com certeza não – ela sorriu, e o estranho brilho sumiu. – Mas prometa-me que vai me deixar lê-las para você depois.

– Depois? – ele disse em seu habitual sorriso torto.

– Depois – concordou.

Assim, Percy avidamente atacou os lábios da garota, colocando suas mãos na cintura fina e exposta dela. Ele sentiu as mãos dela se prenderem em seus cabelos e ele a puxou para seu colo.

O fato de o rapaz nunca ter se envolvido com uma moça como ela antes parecia algo perigoso e inovador, o que tornava tudo mais excitante para ele. Rapidamente Percy começou a retirar seu paletó e retirou os sapatos com os pés mesmo, chutando-os. Quando se separaram um pouco para tomar ar, ele aproveitou para retirar algumas peças da roupa de Piper. Por fim, ele se levantou e, segurando-a em seu colo, com as pernas dela entrelaçadas em suas costas, ele e levou para o outro cômodo aonde encontrou uma cama.

~~~~

Percy não fazia ideia de quanto tempo havia passado, e por mais que devesse se preocupar, ele não se preocupava. Ele ainda estava um pouco sem fôlego, e seu peito nu descia e subia rápido. Assim como o seu, o belo corpo moreno de Piper estava suado, brilhando sobre as luzes das velas, e ele se mantinha acima dela, apoiado em um cotovelo para não pesar, enquanto a outra mão deslizava lentamente pelas pernas lisas dela. Ele apenas queria aproveitar bem enquanto tinha tempo.

Por fim ele perguntou:

– Vocês costumam fazer isso? Digo... Se envolver com seus clientes.

Ela riu.

– Nós, ciganas? Claro que não! Mas eu não quebrei nenhuma regra da nossa cultura. Ela apenas diz que devemos manter nossa castidade até nosso casamento.

Percy afasta um pouco a cabeça, assustado.

– Então quer dizer que você já se casou? Você é casada?

– Sim e não – ela responde.

Percy a olha por uns segundos e percebe uma nuvem de tristeza passar por sua expressão. Ela percebe seu olhar e suspira, levantando-se logo depois.

– O que houve? – ele pergunta.

Piper veste um robe de tecido leve.

– Meu marido faleceu há algum tempo... Uma história realmente longa, e que não gosto de contar.

– Tudo bem – ele responde. Então se levanta e começa a se vestir também, tendo que ir caçar sua camisa e sapatos na sala.

Piper o segue silenciosamente. Ele vê que ela enrolou seus cabelos no alto da cabeça, prendendo-os.

– Tinha algo que você queria me falar, não é? – ele pergunta.

Ela sorri satisfeita e se senta em frente à sua mesa, o convidando para sentar na sua frente. Em seguida, ela estende suas mãos, pedindo a mão direita dele. Ela passa levemente o dedo indicador em suas linhas, e fica um bom tempo se concentrando, até que por fim ela fala:

– Eu sabia! – Piper exclama baixo.

– O quê? – pergunta ele.

– O seu coração, Percy. Está comprometido.

Ele faz uma careta em confusão.

– Como assim? Eu não estou comprometido com ninguém!

– Você certamente não. Não me referi a uma cerimônia. Eu me refiro a você nunca mais ser capaz de se apaixonar por alguém, pois você está destinado a ficar com esta garota.

Ele subitamente pensa em Annabeth, pois ela é a única garota que ele já amou em toda sua vida, mas logo se desfaz desse pensamento, pois era impossível ele estar destinado a ficar com alguém que... Bem, não estava exatamente vivo.

Qual garota? – ele questiona.

Ela olha para sua mão novamente, franzindo a testa.

– Hãn, é uma jovem que desapareceu há muito tempo, mas... Bem, isso é estranho. Ela ainda está no nosso mundo, entretanto, ela ao mesmo tempo faz parte do mundo dos mortos.

Um calafrio percorre a espinha de Percy.

– Annabeth... – ele sem querer sussurra.

– A princesa desaparecida? – Ela pergunta levantando a cabeça à menção do nome dela.

– O quê? Você a conheceu?

– Não, apenas ouvi falar sobre o que aconteceu. Bom, isso faz sentido. – Ela o olha profundamente por um segundo, e a energia que passa pelos olhos dela o deixa tonto. – É, é ela mesma. Você já se apaixonou por alguém além dela?

O rapaz sacode a cabeça.

– Isso é impossível. Ela se foi...

Piper ergue as sobrancelhas perfeitas.

– Ela não está perdida para sempre, Percy. Você se esqueceu de quem você realmente é e do que alimenta a sua essência: é ela. Annabeth. Você não deve esquecer ou desistir dela, pois apenas ela pode reacender a chama de seu espírito.

Ele suspira e apoia o rosto nas mãos, passando os dedos pelos cabelos.

– E como eu poderia fazer isso? Digo... Recuperá-la?

Ela pensa por um segundo, então pega uma espécie de jarro feito de couro marrom no canto da mesa e o esvazia na mesa. Percy vê que se trata de pequenos ossos, o que é no mínimo bizarro.

Piper passa uma mão pouco acima dos ossos, se concentrando com os olhos fechados.

– Isso é difícil – ela diz. Após alguns segundos mexendo nos ossos, ela ergue a cabeça. – Parece que você possui uma relíquia... Algo que pertenceu a ela antes.

Ele pensa por um segundo, e se lembra do dia em que roubou o caderno de desenhos de Annabeth da carruagem dos guardas de busca.

– Sim, eu tenho.

– Pois bem, você deve usar isso para encontra-la e ajuda-la a expulsar o terror de sua vida.

– Terror de sua vida? – ele pergunta.

Percy vê que as chamas das velas espalhadas pelo cômodo subitamente diminuem, e o ambiente fica um pouco mais escuro. Piper estremece.

– Ela teve uma vida realmente conturbada. Eu devo me manter longe dessa zona. Mas você vai descobrir do que se trata.

Aquilo só o deixou ainda mais curioso, então esperava que realmente viesse saber o que era, pois ele percebeu que, seja lá o que Piper tenha visto ali, parecia tê-la deixado realmente assustada.

– Tudo sobre vocês é bastante complicado, mas nem se compara à complexidade que é quando chego perto da história dela. E eu estou apenas nas bordas!

Ele franze o cenho tentando entender do que ela está falando. Piper suspira.

– O que eu quero dizer é que algo a está prendendo neste mundo, e parte disso é você, porque vocês estão comprometidos. Isso é bom. Mas há um lado que é perigoso e está cada vez a sugando mais. Entende?

Ele faz que sim, embora tudo aquilo só o deixara ainda mais confuso. Só sabia que, de alguma forma, ele matinha o espírito dela neste lado da vida. Se é que podia chamar de vida.

– Isso é tudo o que eu posso te dizer. Se eu avançar mais além disso, não vai ser nada bom. Eu preciso parar por aqui - falou ela.

Percy respira fundo e se levanta, andando de um lado para outro. Piper o observa apreensiva, até que se levanta e se aproxima dele.

– Você não precisa ter medo, Percy. Não precisa continuar escondendo a dor das memórias de vocês dois nas... Bebidas ou mulheres. Ou isso irá acabar lhe matando por dentro.

Aquilo o assustou. Era como se a cigana estivesse dentro de sua mente doentia e soubesse de todas as vezes que ele se deixava afogar nas memórias suas com Annabeth, para depois apenas tentar esquecer-se de tudo através dos prazeres da carne.

– Você sabe que este não é você – ela disse. – Você não pode perder as esperanças sobre Annabeth. Se você desistir dela, aí sim ela partirá para sempre. O compromisso estará desfeito, mas então você terá perdido o verdadeiro amor da sua vida. Para sempre.

Percy olhou para baixo apreensivo.

– Bem – ele disse. – Você é mais poderosa do que eu imaginava.

Ela sorri encolhendo os ombros.

– É, geralmente as pessoas dizem que sou realmente boa no que eu faço. Agora você precisa ir. As pessoas já estão voltando da festa, e você tem algo muito mais importante para fazer, senhor Jackson.

Ele sorri e assente.

– Promete que irá lutar por ela? – Piper pergunta.

Seu sorriso se abre.

– Eu estaria sendo um tolo se não o fizesse – diz ele. – Prometo.

A garota sorri satisfeita, então ela se ergue sob a ponta dos pés e deposita um beijo na testa do rapaz. E assim, ele se vira e vai embora, determinado a voltar a lutar por Annabeth.

I've tried so hard to tell myself that you're gone, but though you're still with me, I've been alone all along.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.