Tricks of Fate

\"E se... A gente se casasse?\"


– Mamãe! Mamãe! – Ainda de olhos fechados, ouvi aquela vozinha infantil junto ao som surdo dos passinhos no carpete.

Segundos depois senti o impacto na cama de casal.

– Bom dia, meu amor! – Madison exclamou, sentando-se na cama.

Eu fiz o mesmo, e assim consegui ver a garotinha de quase cinco anos ajoelhada na cama, com um sorriso infantil de dentinhos quadrados e covinhas e os enormes olhos cinzentos – apenas um pouco mais claros que os de Madison – brilhando.

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– Bom dia, princesinha! – Sorri. – O que aconteceu? São oito horas agora! – Chequei o relógio na mesinha de cabeceira.

– A neve, mamãe! A neve chegou! – Ela exclamou com o seu fofo sotaque britânico, pulando na cama sobre os joelhos e jogando uma mecha do cabelo castanho e ondulado para trás.

Olhei para a janela enquanto Madison abria as cortinas, mostrando os pequenos flocos brancos tocando o vidro com delicadeza.

– A gente vai ao parque, não vai? Vocês prometeram! – Ela falou, olhando ansiosamente do meu rosto para o de Maddy.

– Prometemos? – Franzi o cenho, fingindo desentendimento e vendo-a olhar para Maddy com tanto desespero como se eu houvesse dito que o Papai Noel não existe.

– É claro que prometemos, Rosie! – Maddy sorriu, sentando-se novamente na cama. – Sua mãe está só brincando com você. – Me lançou um olhar feio. – E sabe o que podemos fazer com ela?

– Não. O que? – Rosie olhou para ela, que se abaixou e encostou os lábios em sua orelha, sussurrando algo que eu não pude ouvir e piscando logo depois.

De repente, as duas tinham sorrisos enigmáticos no rosto.

– Atacar! – Maddy gritou e as duas pularam em cima de mim, fazendo cócegas sem parar.

Logo eu estava sem fôlego, implorando para parar entre risos desesperados.

– A gente vai parar. Quando você disser que vamos ao parque hoje! – Rosie exclamou.

– Ok... ok... a gente.... vai... ao parque... hoje. – Arquejei e as duas pararam, comemorando e batendo palmas.

– Nós vamos agora? – A pequena perguntou.

Não resisti e soltei uma risada.

– Claro que sim, Rosie. Nós vamos só arrumar a cama e trocar de roupa, ok? – Maddy respondeu, acariciando o rosto da pequena.

Rosie assentiu, desviando os enormes olhos cinzentos para mim.

– A mamãe Vick pode escolher a minha roupa hoje? – Ela pediu e eu sorri.

– Posso sim, pequena. Vamos lá. – Respondi e me levantei da cama.

Rosie ia fazer o mesmo, mas eu levantei-a do chão, colocando-a sobre meu ombro. Diante disso ela deu um gritinho agudo e começou a bater com os punhos pequenos nas minhas costas, dando gargalhadas em meio a gritos de "mamãe!". Não resisti e comecei a rir, andando em direção à porta do quarto. Mas Madison interrompeu a brincadeira.

– Victoria! – Ela exclamou. – Para com essas brincadeiras e coloca a Rosie no chão. Ela não é brinquedo.

Revirei os olhos e desci a pequena para o meu colo, dando-lhe um beijo na bochecha antes de descê-la de volta ao chão.

– Ah, mamãe. Eu quero ir lá em cima de novo!

Sorri e me ajoelhei diante dela.

– Depois a gente brinca, princesa. Agora a gente tem que ir trocar de roupa. Não é você que quer ir ao parque? – Arrumei rapidamente o seu cabelo.

Ela sorriu e assentiu.

– Então vai lá pro seu quarto e vai decidindo a roupa que você quer, ok? Eu vou só falar com a Maddy e te sigo.

Ela assentiu novamente e foi correndo para fora do quarto.

– Você não cresce, não é, Vick? – Maddy perguntou com um sorriso, logo que Rosie desapareceu na curva do corredor.

– E para quê crescer? – Perguntei, sorrindo e abraçando-a pela cintura.

Ela deu uma risada baixa e balançou a cabeça, pressionando os lábios nos meus. Beijei-a demoradamente, acariciando suas costas e os cabelos, que agora, aos trinta e um anos, possuíam um corte chanel, na altura do pescoço.

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Logo que nos separamos, me desvencilhei do abraço.

– Bom, é melhor eu ir lá arrumar as roupas da pequena, se não daqui a pouco ela volta aqui e me arrasta.

Maddy riu.

– Tudo bem. Vai lá.

Roubei-lhe um selinho rápido e saí do quarto, seguindo o caminho do quarto de Rosie.

Havia se passado doze anos desde que eu, Madison, Tom e Yuri saíramos de Fort Lauderdale para estudar em Oxford, e uma grande quantidade de coisas acontecera desde então.

Eu e Maddy nos mudamos para Londres, e ela, aos vinte e cinco anos, havia se tornado uma das melhores astrônomas da Universidade de Londres – e provavelmente a mais famosa, por ser tão jovem e do sexo feminino.

Eu me especializara em Assistência Social, como eram meus planos iniciais, e comecei a trabalhar em uma casa de auxílio a crianças que haviam perdido os pais, assim como eu, mas que não tinham outros parentes próximos. Inicialmente eu apenas fazia as vezes de assistente da dona dali, até o dia em que uma criança se interessou pelo skate que eu trazia na mochila. E assim eu comecei a ensinar crianças a andar de skate, e quando a gerente do local teve de se mudar de cidade, eu assumi aquele cargo.

– Mamãe, você deixa eu vestir esse casaco? – A voz de Rosie me despertou, indicando um casaco xadrez de vermelho e azul escuro com capuz pendurado em seu armário. – Ele é igual ao seu, e eu acho seu casaco tão bonito!

Sorri e baguncei seus cabelos, o que a fez fazer uma careta engraçada.

– Claro, pequena. E o que você quer vestir com ele? – Perguntei, enquanto tirava o casaco do cabide.

Rosie cruzou os braços, com uma cara pensativa.

– Hm... Não sei. – Disse, por fim.

Dei uma risada e abri a outra porta do seu armário, tirando dali uma camiseta branca com um coração vermelho na frente e jeans.

– Que tal? – Perguntei à pequena, que me deu um sorriso de satisfação.

– Igual a você, mamãe.

Sorri.

– Sim, princesa. Igual a mim. – Concordei e ajudei-lhe a se vestir com as roupas escolhidas, acrescentando camisas de manga comprida por baixo e um pequeno cachecol, toucas e luvas.

Depois de vestida, comecei a pentear seus cabelos castanhos e brilhantes, lembrando-me de quando ela nascera.

Eu e Maddy havíamos levado muito tempo para tomar aquela decisão. Ela queria engravidar, e eu também gostaria de ter filhos, mas nós sabíamos que não era algo tão simples. Decidimo-nos então quando Maddy tinha acabado de completar vinte e sete anos. Na universidade, seu trabalho estava estável, e eu tinha acabado de contratar novos empregados para a casa de crianças. E então procuramos uma clínica de inseminação artificial. Rosie foi concebida com óvulos meus e cresceu no ventre de Madison, o que a tornava nossa filha também geneticamente.

– A princesa está pronta? – Maddy apareceu na porta do quarto, sorrindo. Ela estava vestida com jeans, um suéter branco de mangas compridas e listras pretas, uma jaqueta verde-acinzentada e botas. No pescoço se enrolava um cachecol cinza, e luvas pendiam do bolso do casaco.

Fiquei por alguns instantes distraída com a beleza da minha namorada, até que Rosie saltou do banco onde estava sentada e correu até ela, me despertando.

– Você está linda, meu amor. – Maddy sorriu, fazendo a pequena girar. – Quem escolheu a sua roupa?

– Fui eu! – Ela sorriu. – Na verdade, eu escolhi esse casaco, e a mamãe Vick escolheu o resto.

– E agora eu escolherei a minha roupa, se me permitem. – Me levantei e deixei a escova de cabelos que estava na minha mão sobre a penteadeira. – As duas estão lindas, eu também preciso ficar.

– Mas você já é linda, mamãe. – Rosie, que estava no colo de Maddy, disse.

– Verdade. A mais linda do mundo. – Maddy concordou, acariciando os cabelos da pequena.

Eu sorri e andei até elas, dando um beijo na testa de Rosie e outro nos lábios de Maddy.

– Mas não é legal sair de pijama na rua, então eu vou me trocar.

– E nós vamos arrumar o café da manhã! – Maddy exclamou e eu ri, enquanto caminhava em direção ao nosso quarto.

Depois de vestida, segui até a cozinha e me sentei com Maddy e Rosie, tomando o café da manhã que as duas arrumaram.

– Rosie, Yuri me ligou ontem. Ele disse que os gatinhos estão quase desmamando, e logo você poderá pegar o seu.

– Fumaça! – A pequena exclamou, batendo palmas e nos fazendo rir.

Yuri e Tom não voltaram para a Flórida depois de se formarem, e fixaram residência em uma casa em Londres, do outro lado da cidade. Tom abrira sua clínica veterinária e Yuri trabalhava como botânico, e a casa onde o casal morava era uma confusão de plantas e cachorros, gatos, pássaros e outros animais de estimação. Um desses gatos havia acabado de ter filhotes, e o "Tio Tom" de Rosie havia prometido que lhe daria um dos gatinhos cinzentos, que ela já chamara Fumaça.

– Tem certeza que está quente, Rosie? Eu não quero que você fique doente. – Maddy ajoelhara-se na frente da nossa filha, depois que termináramos de comer.

A pequena revirou os olhos, em um ato tão meu que até me fez rir.

– Sim, mamãe. Eu não estou com frio e não vou ficar doente.

Maddy sorriu.

– Tudo bem. Então vamos?

Rosie sorriu e assentiu quase freneticamente, enquanto saíamos do apartamento.

Outras coisas que haviam mudado muito ao longo dos anos eram a vida de Robert e o meu pai, Jordan. Robert se casara com Miranda pouco depois que entramos em Oxford, e desde então os dois viviam viajando pelo mundo – graças ao trabalho dele – e conhecendo outras culturas e pessoas, sem nunca fixar residência.

Jordan agora possuía os cabelos acinzentados – quase brancos – e, desde que uma pneumonia mal-curada o havia deixado internado por um longo tempo, seu vigor não era mais o mesmo. Ele também deixara de ser o CEO da sua empresa, vendendo sessenta por cento das ações dela para outra pessoa e, virando assim, um sócio minoritário, que apenas participava das reuniões e ajudava a tomar decisões importantes.

A vantagem disso era que a mulher que comprara as ações fora Cecília Björn, uma sueca de cinquenta e seis anos que mais parecia ter vinte e três, tamanho seu vigor e a ousadia, e ela havia também tomado o coração de Jordan. E, desde então, os dois namoravam. E todo o ânimo, a agitação e a positividade de Cecília haviam tornado o meu pai uma pessoa muito melhor, e tornado também mais intrínsecas minhas relações com ele, e também, as relações de Rosie com o avô.

– Chegamos! – Maddy exclamou, no momento em que chegamos ao enorme parque quase no centro de Londres, que tinha uma incrível paisagem invernal.

As enormes árvores pareciam adormecidas, tendo como cobertor a neve macia que se aninhava nos galhos mais grossos e em sua raiz. Alguns dos troncos castanhos – assim como os prédios ao redor – eram enfeitados por luzinhas coloridas, que se acenderiam durante a noite para celebrar o natal que viria. Todo o chão, que em outras épocas do ano era coberto de grama verde e fresca, recortada por alguns caminhos de concreto para se caminhar, agora estava também coberto pelo frio e alvo manto da neve, onde a sola das nossas botas se enterrava e os milhares de bonecos de neve feitos pelas crianças repousavam.

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– Eu quero fazer um boneco de neve! – Rosie exclamou, correndo em direção à neve fofa e recém-caída.

– Rosie, cuidado, não corre. – Maddy tentou avisar, mas a pequena já estava muito à frente, e o que nos restou foi correr atrás dela.

Logo, nos colocamos a construir o boneco de neve, mas pouco tempo depois outras três crianças chegaram e acompanharam Rosie, nos substituindo.

Eu e Maddy nos levantamos do chão e limpamos a neve das roupas, indo sentar em um banco próximo, de onde era possível assistir Rosie, que brincava e conversava com as outras crianças, sempre com seu sorriso típico nos lábios.

Abracei Madison de lado e ela sorriu enquanto me abraçava mais forte, tentando conter assim o frio que vinha. Rosie corria com as crianças, em busca de pequenos gravetos para fazer os braços do boneco. Os cabelos que caíam da touca eram soprados pelo vento, e o frio fazia seu rosto ficar rosado. O vento e o frio faziam o mesmo com Maddy, ao meu lado, e eu podia afirmar que elas eram muito parecidas. A mulher que, mesmo depois de dezesseis anos, eu ainda amava como aos quatorze e a filha que ela havia gerado.

– Eu amo tanto, tanto vocês. – As palavras saíram da minha boca antes que eu permitisse, fazendo Maddy sorrir.

– Eu também te amo, Vick. Você e a nossa pequena.

Sorri e acariciei-lhe o rosto.

– Maddy...

– Sim? – Ela me olhou.

– E se... A gente se casasse?

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.