Tricks of Fate
"Por que tão diferente?"
– Eu aviso se ela ligar, Tori. Pode deixar. – Yuri disse-me enquanto saíamos do ônibus.
– Ok. Eu sei que moramos lado a lado, mas anota meu telefone. – Respondi e tirei uma caneta preta da bolsa, puxando a mão esquerda de Yuri e anotando o número da casa de Jordan ali.
Ele riu.
– Ok, obrigado. – Mais um sorriso daqueles que pareciam irradiar. – Até mais tarde!
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Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!– Até. – Sorri de volta e me virei para o meu caminho. Abri a porta da casa e soltei um sorriso longo e fundo, pensando novamente em Madison.
– Boa tarde, Victoria! – A voz de Jordan se fez ouvir.
Joguei minha bolsa sobre uma poltrona e andei até a cozinha.
– Como foi a aula?
Enchi um copo d’água e dei um gole.
– Ótima! Ah, só por curiosidade... tem quantos alunos naquela escola?
– Uns oitocentos e pouco. Por que?
– Agora tem oitocentas e poucas pessoas que sabem que eu namoro uma garota. – Dei uma risada seca e entrei no corredor que levava aos quartos.
Entrei no meu e fechei a porta e as cortinas. Tirei a blusa branca, a saia vermelha e os tênis e coloquei shorts, um par de tênis boot e uma camiseta azul clara sem mangas. Levei o uniforme até a área de serviço e joguei-o na máquina de lavar junto com algumas outras roupas.
Coloquei o molho de chaves no bolso, peguei meu skate e atravessei a sala.
– Vai sair, Victoria?
Bati a porta.
...
Subi a rua em direção à praça e logo encontrei Yuri, sentado num banco conversando com uma garota de longos cabelos loiros e olhos muito azuis.
– Oi! – Sorri para os dois.
– Tori! – Yuri fez o mesmo e eu vi a menina mirar fixamente seu rosto. Parecia encantada com seu sorriso radiante. – Essa é Dora, uma amiga minha.
– Muito prazer, Victoria. – Me apresentei e trocamos um aperto de mãos.
– Você é namorada dele? – Ela perguntou.
Nós rimos.
– De jeito nenhum. Yuri é meu amigo e nada mais que isso! – Respondi.
– Exatamente, nada mais que isso. – Ele concordou ainda rindo.
– Eu vou indo. Foi bom falar com você, Yuri. – Dora se levantou e beijou o rosto dele. – Tchau, Victoria. Prazer em conhecê-la. – Ela sorriu.
– Igualmente. – Sorri de volta e a esperei se afastar antes de me voltar para Yuri. – Por Deus, Yuri! Que gata! O que tá rolando, hein?
Ele ficou levemente corado.
– Que isso, Tori! Não tá rolando nada! Eu nem gosto muito dela.
Eu ri e cruzei os braços.
– Ok, tá bom. Vou fingir que acredito. – Ele riu.
– Vem, vamos andar de skate, Tori. – Ele levantou-se e esticou a mão para mim.
...
Os dias que se passaram foram quase idênticos um ao outro.
Pela manhã eu ia à escola, mas não antes de presenciar Jordan tentando ser legal comigo. Nicholas fazia quase o mesmo na escola, fazendo minha paciência ir para os ares em minutos. E não importava quantos foras ou perdidos eu desse, ele sempre voltava a me incomodar.
Na volta da escola, eu almoçava em casa e logo depois me encontrava com Yuri na praça. Lá nós conversávamos, andávamos de skate e lanchávamos.
Depois da mensagem deixada por mim no número de Madison, nos havíamos conseguido nos falar, e desde então ela ligava todos os dias para o telefone público, e ali nós conversávamos por um tempo e ela me mandava novidades de Robert e meus amigos. Mas mesmo assim a falta deles forte e frequente, e eu ainda não me acostumara com ela. E assim meus sonhos me faziam acordar quase chorando no meio da noite.
Quando era hora de Jordan chegar em casa, eu fazia o mesmo, e aguentava novamente toda a chatice do “meu pai”. E então eu ia para o meu quarto e ali eu estudava, comia, tomava banho e dormia, para começar um novo dia bem parecido com o anterior.
Isso perdurou até o sábado seguinte. Naquele dia, eu não tinha aula, mas também estava sem nada pala fazer.
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Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!Yuri saíra para almoçar com a família e só voltaria à tarde. Obviamente eu não o culpava. As pessoas em geral não eram como eu, sozinha e com uma vida meio estragada.
Jordan também saíra para o seu trabalho, que eu não sabia muito bem o que era – mas também não tinha o menor interesse.
Então o que me restava era ficar deitada na cama, folheando alguns dos livros que eu trouxera enquanto as músicas So Far Away e Dear God se repetiam pela terceira vez nos fones de ouvido.
So Far Away me lembrava muitas coisas. A minha vida de Liverpool, principalmente, mesmo que quase nunca aparecesse nos meus pensamentos, já que nos anos anteriores todos os meus esforços para esquecer a dor me fizeram esquecer também de pensar nela.
Ela e Dear God também me lembravam Fort Lauderdale. Madison, principalmente. Eu pensava no quanto precisava dela perto de mim, e o quanto ela estava longe. Tão longe de mim.
Uma ideia surgiu na minha mente como um estalo. Desliguei a música, coloquei os livros de lado e me levantei da cama. Troquei o pijama por uma blusa larga com a bandeira da Inglaterra, que tinha um dos ombros caídos, shorts e um par de tênis. Dei um jeito no rosto e no cabelo e coloquei no bolso da bermuda o necessário para a saída: dinheiro, chaves, o celular e dois papeis dobrados.
Tomei um táxi até uma área mais central de Miami, onde as pessoas andavam com roupas de banho pelas ruas. O sol brilhava e as palmeiras derramavam uma sombra leve na rua. Era quase como aquele trecho da música Paradise City, dos Guns n’ Roses: “take me down to the Paradise City where the grass is Green and the girls are pretty.”
Bom, pelo menos o cenário. Eu não me enquadrava ali, se aquele fosse o caso.
Pedi para que o motorista parasse em frente a um salão de beleza com paredes lilases e portas de vidro escurecido e paguei a corrida.
Logo na entrada havia um grande balcão onde um homem baixo, mas forte atendia telefonemas e anotava coisas. Assim que apareci em seu campo de visão, ele sorriu para mim.
– Bom dia. O que deseja?
– Tem algum horário livre para agora? Eu quero cortar o cabelo.
O homem deslizou o dedo por uma página de uma agenda aberta em meio de tantos papeis.
– Oh! É seu dia de sorte. A cliente das dez desmarcou!
Sorri.
– Com certeza. – Concordei.
– Por favor, me acompanhe.
Obedeci-o enquanto andávamos entre as diversas cadeiras, onde mulheres – em sua maioria – arrumavam os cabelos e unhas e conversavam.
– Dee! – Ele chamou e outro homem surgiu. Este era alto e magro. Tinha a pele branca e os cabelos espetados, e trajava um avental com a logomarca do salão.
– Sim?
– Ela quer cortar o cabelo. – O primeiro me indicou.
– Ok. Venha, querida. – Ele sorriu para mim e me puxou pelo braço.
Sentei-me na cadeira que ele indicou, onde meu cabelo seria lavado.
– E então, qual é o seu nome?
– Victoria. – Respondi.
– Muito prazer, eu sou Dee. – Eu sorri. – E quantos anos tem?
– Quinze, quase dezesseis.
– É jovem, então! – Assenti.
– Tem namorado?
Eu ri.
– Não. Namorada. – Dei de ombros.
– E qual é o nome dela? Por que não veio com você?
Ri de novo.
– Madison. E eu me mudei faz pouco tempo. Ela ficou em Fort Lauderdale.
– Ah... que pena. – Não foi uma exclamação muito falsa.
Dee enrolou meu cabelo numa toalha pequena e me guiou até uma cadeira frente a frente com um espelho.
Peguei numa cesta uma revista de cabelo e comecei a folheá-la enquanto o homem penteava meus fios.
– E aí, o que vamos fazer? – Ele perguntou e eu bati o dedo na página aberta.
– Isso aqui.
– Uau! Mas por que tão diferente?
– Ah. – Dei de ombros. – Sei lá. Deu vontade de mudar.
Dee riu.
– Entendo.
Ele abriu sobre um balcão de vidro uma bolsinha com tesouras e navalhas. Ao lado haviam pentes de todos os tamanhos, e também prendedores de cabelo. Estes foram usados para separar e prender as partes do meu cabelo, para que o corte novo tomasse forma.
Dali a quarenta minutos, finalmente as tesouras e pentes descansaram novamente sobre o vidro. Dee pegou um espelho ao seu lado para me mostrar a parte de trás do cabelo.
– E aí, o que achou?
Abri um sorriso largo.
– Ficou perfeito. Muito obrigada, Dee.
– Por nada, querida. Volte sempre, certo?
Assenti.
Me olhei novamente no espelho e mexi com os dedos no meu cabelo, para deixá-lo do meu jeito antes de voltar ao balcão para pagar e sair dali.
Andei por alguns minutos, até parar em frente a um estúdio. Empurrei a porta de vidro ainda mais escuro do que o do salão e este tocou uma campainha, chamando a atenção da mulher que ali estava.
Ela tinha os cabelos vermelhos até quase a cintura, com a lateral do lado direito raspada. Alargadores nas orelhas, piercings no nariz e lábios e tatuagens nos braços.
– Posso ajudar? – Ela sorriu para mim.
– Bem... sim. Eu queria fazer... uma tatuagem. – Respondi.
– Certo. Qual é a sua idade?
– Dezesseis. – Menti um ano. – Mas eu trouxe uma autorização.
Tirei do bolso o papel dobrado por duas vezes no meio e entreguei-a. Ela o desdobrou e analisou com os olhos.
– Ok, está certo. – Ela colocou a folha sobre uma mesinha. – Bom, vamos à tatuagem. Qual, como e onde será?
Tirei outro papel do bolso, mas dessa vez era meia folha de caderno meio amassada. Havia uma frase escrita com letras caprichadas ali. Entreguei à ruiva.
– Bem bonita a frase, garota. Onde vai ser?
– Não escolhi um lugar certo. Onde você acha que fica melhor?
– Bem... – Ela parou para pensar. – Se você quiser algo discreto, pode fazer na costela. Se não, acho que no braço fica interessante. – Ela tocou o meu braço no ponto certo. Um palmo abaixo do ombro.
– Deve ficar legal aí. Pode ser.
– Ok. – Ela sorriu e me indicou uma maca alta. – Senta aí.
Obedeci ao pedido e ela puxou para perto de si uma mesa com as coisas necessárias para uma tatuagem. (N/A: eu nunca fiz nenhuma tatuagem, e não farei tão cedo, então eu não sei como acontece. Quebrem essa, vai.)
Primeiro houve o desenho a lápis. Olhei no espelho e vi que ficaria legal.
– Aí mesmo? – Ela perguntou.
– Com certeza.
E então começou.
– A frase é para alguém em especial? – Ela perguntou e eu ri.
– Não exatamente. Bem, mais ou menos, na verdade. Eu gosto dela, e é uma brincadeira que faço com a minha namorada. – Dei de ombros e ela arqueou as sobrancelhas.
– Uau! É raro ver garotas da sua idade com namoradas.
Eu ri.
– Pois é. Já ouvi isso antes. – Dei de ombros. – Mas nós estamos juntas desde os meus quatorze.
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– Madison. – Respondi.
– Ah, agora faz sentido. – Ela sorriu. – E eu sei que ninguém perguntou, mas a minha se chama Rachel.
Sorri.
– Sério? Que legal! – Respondi com verdadeiro entusiasmo.
Enquanto a tatuagem era sendo feita, ela puxava assuntos para me distrair da dor – que não era tão forte -, e assim começamos a falar de namoradas e outras coisas do gênero.
– Pronto. – Ela colocou a máquina sobre a mesinha e passou novamente o algodão sobre a tatuagem já pronta. Levantei-me dali e andei até um espelho pendurado na parede, vendo o novo componente da minha pele.
– Ficou muito boa. – Sorri abertamente e ela também o fez. – Obrigada.
Ela colocou o curativo ali e sorriu de novo.
– Espero que você volte logo para Lauderdale, para ela ver sua nova tatuagem.
Assenti.
– Eu também.
Acertei o pagamento e, não antes de agradecer novamente a mulher, saí dali.
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