OTAMV 2: A Prima

Recaídas.


Pela primeira vez em muitas semanas, não tive pesadelo algum. Abri os olhos lentamente, e um sorriso brotou em meu rosto antes mesmo que eu pudesse me dar conta. Fechei-os novamente, lembrando-me de cada detalhe do que havia vivenciado dentro daquele quarto. As lembranças vinham em flash’s, e provocavam-me a abrir um sorriso cada vez maior.

_ Bom dia... – senti braços envolvendo-me em um abraço enquanto espantava as lembranças de mim, os lábios de Kiseop beijaram-me o ombro, e sua cabeça pousou ali, sua respiração causando cócegas em minha bochecha.

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_ Bom dia. – disse baixo, minha voz mais rouca do que o comum.

Eu não conseguia pensar em algo interessante para fazer. Afinal de contas, era domingo e, pelo frio, estava nevando. Me senti muito idiota por continuar sorrindo, mas era inevitável. Eu piscava e imediatamente me lembrava, e se ele não estivesse ali do meu lado, eu não acreditaria.

Com algum esforço para me livrar de seus braços, me virei para ele, perdendo-me de imediato na imensidão de seus olhos. Eles brilhavam, assim como os meus provavelmente estariam brilhando. Kiseop também sorria. Um sorriso tão largo e contagiante, que obrigou-me a gargalhar.

Ficamos alguns minutos rindo um da cara do outro como idiotas, até meu estomago roncar primeiro, e o dele em seguida.

Muitas coisas na geladeira interessavam a minha gula, mas acabei escolhendo os cereais – que faziam parte de todos os meus cafés da manha. Mesmo porque, quanto mais rápido terminasse de comer, mais rápido voltaria a me esconder em meio aos edredons.

_ O que vamos fazer hoje? – perguntou. O cabelo mais bagunçado que o normal, seus olhos mal paravam abertos.

_ Dormir. – sorri.

_ Tsc. Você... acabou de acordar! Como pode pensar em dormir?

_ Vai me dizer que não esta com sono? – negou com a cabeça lentamente. – Ah, podemos ver um filme então. – outra colherada do cereal. Balançava as pernas de um lado para o outro enquanto debruçada sobre o balcão.

_ Podíamos fazer alguma coisa, sei la.. Sair... É domingo!

_ Já reparou que ta nevando? Assim... Só pra saber... – ironizei. Ele apenas bufou, deixando a cozinha com sua tigela em direção ao sofá.

Não o segui, embora tenha sido esse meu primeiro instinto. Continuei ali, devorando o cereal e ao terminar fui para meu quarto, sem encará-lo.

Se ele queria comportar-se como uma criança, então era o que faríamos; duas crianças em um domingo tedioso!

Entrei no cômodo e bati a porta com força, pra deixar bem evidente minha decepção com aquele comportamento ridículo. Qual é, depois da melhor noite da minha vida, nada parecia de fato ter mudado em minha relação com Kiseop. Ele sempre agiria assim quando contrariado, e eu nunca sabia como contornar a situação.

Deitei em minha cama, tomada pela preguiça; afundei a cabeça no travesseiro e não pude impedir que um grito escapasse. Estava irritada, muito irritada. Sem contar que uma dor em meu ventre começava a me incomodar, cólica. Após ficar ali por alguns segundos, ouvi batidas suaves contra a porta amadeirada, e Kiseop abriu-a em seguida.

_ Vai dormir? – não respondi. – Ana? – aproximou-se e se abaixou a minha frente. Encarei-o por uma fresta entre o travesseiro e meu braço, seus olhos curiosos e quase inocentes. – Vai dormir de novo? – perguntou baixo.

_ Hm. – respondi sem vontade.

_ Vamos pra sala, o que acha? Você pode dormir lá, comigo... – sua mão quente acariciando meu braço. – Ya, me desculpe! Não quero que se magoe... – sorriu – Venha...

_ D-daqui a pouco eu vou! – respondi, recebendo uma onda de dor mais forte, gemi involuntariamente.

_ O que foi?

_ Dor. Cólica. – respondi baixo, contraindo-me de dor.

_ De novo isso?! – levantou-se. Kiseop livrou-me das cobertas enquanto eu encarava-o confusa. – Vai passar! – e surpreendeu-me ao pegar-me em seus braços. Com algum esforço pegou também o edredom e arrastou-me para o corredor.

_ Ya, eu posso andar! – disse.

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_ Quieta. – selou seus lábios nos meus.

É claro que toda aquela irritação tinha um por que no fim das contas. E cólicas, eram sempre minhas inimigas; minhas maiores inimigas. Tomada por outra onda forte de dor, afundei a cabeça no ombro de Kiseop, até que ele deixou-me no estofado macio em frente à televisão.

_ Quer chá? Remédio... qual é o remédio? – perguntou afobado.

_ Não quero. – murmurei – Não tem mais remédio, acabou.

_ E-então eu vou comprar!

_ Kiseop, vai virar um picolé até achar uma farmácia aberta em um domingo de neve.

_ Aish... O q-que quer então poxa? – parecia agoniado ao ver-me com dor.

_ Nada. Vai passar. Só fique aqui. – pedi.

Ele sumiu no corredor, e alguns segundos depois estava de volta, com três cobertas pelo que pude contar, mais a minha que cobria meus pés. Ajeitou-se no sofá ao meu lado, e cobriu nossos corpos abraçados com a montanha de cobertas quentes. Suas mãos invadiram minha camiseta, e acariciaram minha barriga em movimentos circulares.

Não pude deixar de sorrir, mesmo com dor. Por mais estranho que aquilo fosse, realmente funcionava.

Ficamos ali, deitados assistindo a filmes de todos os tipos. Cochilei muitas vezes, mas acordava sempre que ele beijava-me o pescoço, ou a bochecha. A dor aumentava, diminuía, mas eu muitas vezes a esquecia.

O resto do dia foi apenas o resto do domingo.


__



Depois de uma semana inteira sem falar com meus pais, liguei para eles no domingo a noite. Eu estava com saudade de pronunciar meu idioma, saudade de dizer ‘mãe’ e ‘pai’. Criei muita coragem, e contei à minha mãe o que acontecera na noite de sábado. Ela surtou, gritou, começou a pular com o telefone na mão e nós duas acabamos chorando. Pediu para que eu mandasse uma foto nossa, e acabou confessando que procuraria tudo sobre ele. A sorte é que Kiseop não entendia uma palavra sequer do que eu dizia, apenas me encarava com um sorriso confuso no rosto toda vez que eu ria de alguma coisa.

Pude até dizer coisas como “mãe, ele está aqui do meu lado”, ou confessar que o amava, sem que ele notasse.

E por mais estranho que pareça, contar a minha mãe pareceu muito mais fácil do que contar a Brookie. Talvez parecesse tão difícil porque ela encarava-me com olhos devoradores enquanto os meus contemplavam o chão em busca de palavras certas. Mas no fim acabei desembuchando, e ela surtou, como sempre fazia.

Estávamos no fim da aula de Educação Física, e por culpa do frio, treinávamos na quadra coberta. Quer dizer, os meninos treinavam enquanto as meninas faziam as unhas nas arquibancadas, e Broo e eu conversávamos sobre sábado.

_ Doeu muito? – perguntou baixo.

_ Hm... No começo sim, mas depois melhorou... – respondi envergonhada.

_ Melhorou quanto? – insistiu.

_ Melhorou muito... Ya, porque tem que tornar isso tão constrangedor? Vamos mudar de assunto! – soquei seu ombro.

Foi a deixa para que ela começasse a tagarelar sobre DooJoon. Brookie estava perdidamente apaixonada, de uma maneira saudável, claro. Perguntei-me se meus olhos brilhavam tanto quanto os dela quando eu falava de Kiseop, era fofo ver que ela estava empenhando-se cada vez mais pra ser uma boa pessoa para Joon. E o fato de ter trocado a cadeira de rodas por um par de muletas já era um bom começo para que ela voltasse a ter esperança de que a vida lhe sorriria muitas vezes ainda.

A aula de exercícios logo acabou, mas eu continuei ali. Era recreio, Broo ficaria com DooJoon, Kiseop estava na biblioteca terminando uma tarefa que devia ter feito no fim de semana, e eu não estava afim de perambular pelo pátio sozinha.

Coloquei meus fones de ouvido e fechei os olhos, relaxando e ignorando as paranóias dentro de mim.


You


_ Encontrei você! – quando dei por mim, Jun estava lá, sentado ao meu lado.

_ Ah. – pulei na cadeira – Me assustou... – ri.

_ Me desculpe! – sua língua umedecendo seus lábios. – Eu procurei você no início da aula, mas não te encontrei em lugar algum... Espero que não tenha se dado mal sem sua mochila. – sorriu de lado.

_ Hm, obrigada! – tomei a mochila em minhas mãos. – Eu tenho várias em casa, mas essa é minha preferida... Obrigada por lembrar de trazer. – sorri de volta. – Você trouxe a correntinha? – tentei controlar minha ansiedade, mas pareci obvia demais.

_ Sim, eu trouxe! – suas mãos no bolso do uniforme. – Aqui cabeçuda... – estendeu-a para mim – Por acaso, essa é a que ganhou de Kiseop, não é? – eu apenas afirmei com a cabeça, mordendo os lábios um tanto constrangida. – É, eu me lembro dela. Aquela prima estranha estava usando-a no dia do jantar, se lembra?

_ Aham. – forcei um sorriso – Obrigada por trazê-la.

Eu estava inquieta. Ter JunHyung tão perto de mim causava-me uma sensação desconhecida. Eu estava feliz, porque estar ao seu lado sempre me deixava assim, mas estava agoniada, como se estivesse fazendo-o algum mal muito grande.

_ Não fique com essa cara, eu não quero que as coisas entre nós fiquem estranhas... – disse encarando meus olhos.

_ Me desculpe, é que eu não consigo acreditar que você esteja tão bem quanto aparenta. Nada me tira da cabeça que você pode estar sofrendo, e que a culpa seja minha. – disse baixo.

_ Só me dê um tempo. Eu sinto muito que esteja se sentindo culpada, digo que você não deve se sentir assim... – suspirou – A culpa não é sua, mesmo! Eu só preciso saber o que fazer... No momento estou um pouco perdido. – encostou sua cabeça em meu ombro.

Eu não sabia o que dizer. Nunca conseguia pensar em algo bom o suficiente para dizer à JunHyung. Não podiam ser simplesmente palavras, tinha que ser algo que o ajudasse, mas eu era esse tipo péssimo de pessoa que não sabia consolar. Então acariciei seus cabelos, em uma tentativa de mostrar com ações o quanto queria que ele ficasse bem.

_ Só precisa me prometer que não vai deixar de ser minha amiga, não importa o que aconteça... Quer dizer, você me deve isso... – sorriu.

_ Ok. – ri – Nunca vamos deixar de ser amigos...

_ Que música está ouvindo? – pegou um dos fones e esperou alguns segundos. – Nossa, está assim tão depressiva?

_ Não! – rimos – Eu só estou com sono, e estranhamente românica... – completei.



*mensagem*


“Cabeçudinha, onde você está? Acabei meus deveres, estou procurando você... Melhorou das dores? Amo você!

Kiseoppie ♥”



Foi um tanto constrangedor, pois encostado em meu ombro, Jun também leu a mensagem. Não soube o que dizer, mas meu primeiro impulso foi levantar-me da cadeira e ir de encontro à Kiseop. Mas continuei ali. Meus olhos cruzaram com os dele por alguns segundos, e eu me senti ainda mais culpada.

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_ E-eu preciso ir. – disse baixo. Ele desencostou sua cabeça de meu ombro, encarando-me silencioso enquanto eu me levantei.

_ Por favor, fique. – segurou-me pelo braço, e levantou-se em seguida. – Não vá, fique. – seus olhos marejando.

Não, não, não, não, JunHyung chorando não!

_ J-jun... – disse baixo, mas antes que pudesse terminar, ele abraçou-me.

_ Eu estou tentando, estou tentando ser forte! Não importa quanto tempo eu passe longe de você, meus sentimentos não vão mudar... Eu te amo, eu te amo muito e vê-la indo assim dói demais... – beijou-me o pescoço, e eu arrepiei.

Eu não soube o que fazer, e chorei. Não sei dizer ao certo porque, mas meu coração estava agoniado. Não queria estar causando tanta dor à quem amava. Pois sim, eu amava JunHyung e esse era um fato indiscutível, nada mudaria esse sentimento. Ele seria sempre o ponto de paz para mim, sempre alguém precioso demais para que eu perdesse. Era difícil saber – e admitir – que eu estava o causando tanta dor, e nada pudesse fazer para evitar.

Não desfiz o abraço. Apertei-o ainda mais forte quando senti suas lágrimas molhando-me o pescoço. Eu era culpada, e jamais me perdoaria por isso.

“Tu és responsável por aquilo que cativas” – minha mãe sempre dizia. E não deixava de ser verdade. Eu era responsável por ele, mesmo sendo imatura demais para ser responsável pelos sentimentos de alguém.

_ Me desculpe. – disse, tomada por um pranto silencioso. As lágrimas somente escapavam de meus olhos, enquanto minhas mãos acariciavam suas costas.

Então ele beijou-me novamente o pescoço, e eu paralisei. Ele ergueu seu rosto, encarando em meus olhos concentrado. As lágrimas paralisadas em suas bochechas, seus olhos e ponta do nariz vermelhos. Ele aproximou-se aos poucos, e uniu nossas testas sem interromper o contato visual. Eu passei a tremer, e engolir a seco enquanto seus lábios aproximavam-se dos meus.

_ Eu juro, juro que é a ultima vez. – murmurou unindo nossos lábios em seguida.

E fraca como sempre, eu não tive forças para afastá-lo. Posso dizer que uma parte de mim queria aquele beijo, ansiava por ele desesperadamente, e sentiu-se satisfeita quando os lábios alheios tomaram os meus com avidez.

Foi um beijo diferente de todos os outros, pois não era calmo como costumava ser. JunHyung estava triste, agoniado, e agia como se fosse a ultima coisa que faria na vida. Tinha pressa, força demais. Seus lábios chupavam os meus como nunca antes; uma de suas mãos segurava-me forte pela cintura, e a outra agarrava a raiz de meus cabelos. Sua língua quente arrancando-me suspiros involuntários, principalmente quando intercalava mordidas ao beijo. Os lábios beijando os meus com força, enquanto apertava-me cada vez mais contra si.

Estava paralisada. E por mais que estivesse de olhos fechados, segurando um choro, não pude deixar de notar a forma estranha como meu coração reagia àquilo. Ele batia forte e rápido, mas não era como se eu estivesse feliz por aquilo estar acontecendo. Por fim, senti-me culpada. Duplamente culpada, quando pensei em Kiseop. Admiti então que o amava demais para fazer aquilo com ele. Não podia decepcioná-lo mais uma vez, não queria fazê-lo...

Tomada por um desespero, pressionei minhas mãos contra o peito de Jun e tentei empurra-lo. No começo ele prendeu-me em seu abraço, mas não relutou, apenas afastou-se e manteve seus olhos fechados.

_ M-me desculpe... – murmurei segurando o choro, afastando-me lentamente.

Ele não disse nada, nem sequer encarou-me. Seus olhos continuaram fechados e sua cabeça baixa enquanto eu continuei afastando-me em passos lentos. Então finalmente me virei em direção a porta e passei a correr, as lágrimas já escapando de meus olhos de uma maneira patética.

Então eu a abri e – como se já não fosse o bastante – Kiseop estava lá, seus olhos arregalados ao me ver, e um sorriso que ameaçou abrir se não tivesse me visto chorando. Encarei em seus olhos por milésimos que pareceram horas, e seu semblante foi fechando-se aos poucos. Naquele momento eu soube que ele sabia o que havia acontecido.

Com uma tentativa inútil de encobertar o que havia feito, cobri meus lábios – provavelmente vermelhos – com a mão, mas seus olhos não estavam mais em mim. Ele agora procurava por alguém em específico na quadra, alguém que ele sabia que estava lá, e o encontrou. Afinal, JunHyung não estava tão longe para que não pudesse vê-lo.

Cerrou os punhos, seus olhos vidrados em mim agora. Ele ameaçava dizer, mas não dizia; Ameaçava fazer, mas não fazia; E eu, como sempre, não sabia o que dizer também. Certo, Kiseop e eu não tínhamos nenhum tipo de compromisso oficial que precisava ser respeitado, mas eu estava errada. Se eu o amava, se eu o queria para sempre, porque havia traído-o? Claro que a culpa não fora somente ou totalmente minha, mas como fazer com que ele entendesse, uma vez que eu sequer sabia quais palavras usar?

Odiava-me acima de tudo, e frustrada pela falta de sorte, chorei ainda mais.

_ Faz isso como se fosse adiantar agora... – ele murmurou, dando as costas.

_ Kiseop! – chamei por ele, mas ele continuou andando, então o segui – Kiseop!

_ Hm? Estou ouvindo... – cessou seus passos encarou-me novamente – Vamos, o que vai dizer agora? Quer saber, estava bom demais pra ser verdade! Acho que no fundo eu sabia que algo assim aconteceria, você nunca vai se decidir, nunca vai respeitar o que eu sinto por você! O que tem a dizer?

Eu já havia me decidido. Levou algum tempo para entender que meu coração gritava desesperado o quanto amava Kiseop, mas eu entendi no fim. Mas sou burra demais, permissiva demais, e não consegui ignorar o beijo de JunHyung uma vez que ele parecia agoniado e triste. Senti-me culpada o suficiente para acreditar – inutilmente – que o beijo o consolaria, mas eu estava errada. Aquilo só o machucaria mais, e acabou ferindo Kiseop também. Como sempre, o meu maravilhoso dom de machucar a todos a minha volta não havia me abandonado.

Não sabia o que dizer. Desculpar-me àquela altura seria ridículo e desnecessário. Mesmo assim, procurei por palavras certas a todo custo, mas elas insistiam em fugir. Talvez não houvesse o que dizer.

_ Eu sinto muito. – baixei a visão, envergonhada demais para encará-lo nos olhos.

_ E isso é o que mais irrita, porque você tem seu livre arbítrio pra fazer o que quiser, e mesmo assim, faz as escolhas que magoam as pessoas. Cansei de esperar que você me ame o quanto eu te amo... – deu as costas.

Queria virá-lo de volta para mim, e abraça-lo. Queria dizer que o amava, e pedir para que ele perdoasse todas as minhas idiotices; Queria dizer que me esforçaria para ser o suficiente para ele, porque ele era pra mim. Mas deixei que ele fosse embora.

Pensei por um momento nas milhares de encrencas que me meti no ano letivo, e nunca nenhuma delas fez com que eu fosse embora no meio das aulas – pelo menos não acordada. Mas aquilo tudo era demais para que eu pudesse agüentar mais quatro aulas chatas, de modo que sai discretamente.

Comecei a andar pelas ruas, perdida.

Porque eu sempre fazia tudo errado? Quando as coisas finalmente pareciam se acertar, eu estragava de alguma forma, e magoava alguém além de mim mesma. Mas eu amava tanto Kiseop, que sentia que jamais poderia ser a mesma caso ele não me perdoasse. Viveria para sempre culpando-me por não ser capaz de dizer tudo o que ele era pra mim. Eu era sempre como um bicho irracional e insensível que feria todos a minha volta.

Então veio a recaída. Precisava livrar-me de toda aquela dor, e todo aquele sentimento de culpa. Dei-me o direito então, de ter duas recaídas em um mesmo dia. Levei as mãos aos olhos, enxugando as lágrimas que jorravam e adentrei em uma pequena vendinha que encontrei pelo caminho. Apanhei duas garrafas de soju e fui até o caixa, onde uma senhora de mais ou menos oitenta anos atendeu-me com um sorriso – e os poucos dentes que tinha.

Procurei pelo dinheiro em minha mochila, e ela sequer questionou o fato de eu estar chorando muito e ser uma estudante comprando bebida alcoólica. De certo entendeu que eu precisava daquilo, pois seus olhos transmitiam-me um certo conforto cálido. Senti-me de certa forma acolhida pela ajumma, principalmente quando ouvi um “Cuide-se querida” antes de deixar o estabelecimento.

Fui para casa com um pouco mais de pressa. Deixei os fones de ouvido no máximo em Arcade Fire e não conseguia conter as lágrimas, que insistiam em jorrar cada vez mais sempre que me lembrava da face desapontada de Kiseop. Eu não conseguia não desapontar as pessoas que me rodeavam.

Abri a porta afobada, deixando meus tênis sobre o tapete e as garrafas no balcão da cozinha. Lavei as mãos, molhei o rosto e encarei meu reflexo no vidro do armário. Estava afoita e ansiosa, então não demorei a pegar o maior copo e enche-lo com o líquido que suavizaria minha dor.

Levei as duas garrafas para a sala, onde entornei dose atrás de dose, e perdia-me em pensamentos incompletos enquanto a mesma música repetia-se pela milésima vez.

Eu estava sentada no tapete, minhas costas apoiadas no sofá e uma das garrafas já havia secado. Eu não tinha forças para ir até o quarto, nem à qualquer canto da casa. O celular vibrava freneticamente em meu bolso, o que deixava-me irritada, mas curiosa.


*mensagem*


“Estou envergonhado. Me desculpe, sinceramente! Eu detesto pessoas covardes, e acabei me comportando como um no fim das contas... Espero que me perdoe :/

JunHyun”



*mensagem*


“Amiga, kd você? Kiseop passou bufando por aqui, pensei que estariam juntos! Vocês brigaram? Não me diga que foi pra casa? Vai perder prova de biologia! Cria juízo!

Se cuida, Broo ♥”


_ Aish... Que sentido? Qual sentido? – conversava sozinha.



*mensagem*


“Jun aorfser~ttrds~gzpçoa f,sdfjfsiof oi, oix, hahehi dslfijçzgojç~s´gfçgbvjidfçog

Ana :B”



Encostei minha cabeça no sofá, pensando respectivamente no Brasil, minha família e em como não devia ter deixado Petrópolis para devastar a vida das pessoas que passei a conviver neste ano. Mudei-me para a Coréia com planos que haviam sido esquecidos assim que me apaixonei a primeira vista por um garoto, que me levou a gostar de mais outros dois e tornou tudo um inferno. O quão complicada era minha situação afinal?

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Nem havia me dado conta de quantas horas se passaram, mas despertei de uma hipnose assim que a maçaneta grunhiu, e a porta abriu-se, fazendo o vento frio invadir o cômodo. Kiseop paralisou assim que me viu ali, sentada no chão com uma ultima dose em mãos.

_ Você... – eu murmurei, voltando a chorar.

_ Aish... – resmungou, fechando a porta atrás de si e seguindo direto para seu quarto.

_ Ya! Kiseop... – levantei-me rapidamente, chutando uma das garrafas sem querer, e causando um estrondo. – Kisseoppieeeee – o segui.

Ele apenas bateu a porta de seu quarto, e pude ouvi-lo trancando-a assim que cheguei.

_ Hm... Abre a porta – pedi batendo com o maximo de delicadeza que me fora permitido. – Por favor, abre... – sentei-me ao canto da porta, encostando-me na parece e abraçando minhas pernas. – Kiseop? Está me ouvindo, não está? Eu sei que eu faço tudo errado, mas eu não queria que aquilo tivesse acontecido... Ya, abra a porta, preciso falar com você! – bati mais algumas vezes – E-eu não vou dizer que nunca mais vou falar com JunHyung, porque eu amo ele... Mas não chega aos pés do quanto eu amo você! O beijo, eu não senti nada, comparado com quando você me beija... Eu me decidi a muito tempo, Lee Ki Seop, estou falando com você! – tagarelei por muito tempo até que ele abrisse a porta, e seguisse pelo corredor. Havia trocado o uniforme com um moletom quentinho, o que me lembrou que eu devia ter tirado o meu antes que pudesse sujá-lo com bebida.

Estava sem forças para levantar, então continuei ali esperando que ele voltasse. Não demorou muito e ele apontou no corredor novamente, um copo de água em suas mãos. Ele o deixou ali, ao meu lado, e antes que pudesse agradecer bateu a porta novamente.

_ Aish realmente... Você é um grosso! Você é muito estúpido, nossa! Com tanta gente melhor pra eu me apaixonar, fui gostar logo de você, sou uma burra! Não sei porque você ta tão putinho... Se me quer pra você, porque não me convida pra ser sua namorada? – ouvi uma gargalhada de dentro do quarto. – Ya, não ria! Isso é engraçado pra você? E se eu quisesse rir da sua cara toda vez que fizesse algo idiota? Seriam muitas risadas, eu garanto... Kiseop abre essa porta! – soquei-a desta vez.

Perdi a noção de quantos minutos ou horas fiquei ali, falando mais que a boca coisas sem sentido, mas acabei cochilando sentada. Depois de um tempo ele abriu a porta. Estava quase desacordada, mas pude ouvi-lo murmurando qualquer coisa parado a minha frente. Continuou parado ali, como se estivesse esperando uma resposta mas eu o encarei somente, sonolenta.

_ Você é ridícula! – abaixou-se a minha frente.

Tomou-me em seus braços e me levou até meu quarto. Usou várias cobertas para me cobrir e sentou-se em uma beirada da cama.

_ Muito ridícula! Não vou nem te falar nada, porque você vai se esquecer de tudo quando acordar... Você tem que ter essa maldita amnésia quando bebe, nem pra ser bêbada você serve, francamente! E mesmo que eu acredite no que você diz, estou decepcionado... Você não é idiota, me prometeu que não beberia de novo... Sabe o que aconteceu da ultima vez, quer que aconteça de novo? – meus olhos iam fechando-se lentamente. – Até quando vai ser uma inconseqüente? Será que você não entende, que se alguma coisa acontece a você, nada mais fará sentido em minha vida? – riu – Isso é patético! Eu devia odiar você... Devia odiar você por não deixar espaço para mais ninguém em meu coração... Até assim você é egoísta! – e depois de tagarelar por um bom tempo, era a vez dele falar sem parar enquanto sua voz melodiosa embalava meu sono.

Adormeci enquanto ele continuou falando.