Real or not real?

Capítulo 24 - Consciência inconsciente


- Diga Peeta... O que você teme? – indagou o doutor Aurelius.

Peeta Mellark se acomodou melhor na poltrona, imaginando que talvez se ficasse mais confortado fisicamente, conseguisse garantir o conforto mental. O garoto soltou um pesado suspiro e levantou os olhos, que até então estavam pregados na mesa, para o doutor que estava sentado de fronte a ele, do outro lado da escrivaninha que havia no escritório de sua própria casa na Aldeia dos Vitoriosos. Ele o fitava com olhos amistosos, transmitindo uma sensação de confiança com aquele simples e suave olhar.

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- Muitas coisas – admitiu Peeta.

- Vamos Peeta, seja mais especifico.

Peeta suspirou novamente. Sempre fora bom para se expressar em palavras, mas agora não fazia ideia de como colocar para fora tudo o que passava por sua cabeça nesse momento sem parecer assustado de mais, ou desesperado de mais.

- Katniss... Bom, eu temo por ela... – Peeta balançou a cabeça, ele não estava fazendo isso direito – Desculpas doutor.

- Tudo bem, você está indo bem, continue.

- Temos de voltar a Capital... Não podemos dizer não, há toda uma burocracia envolvida. Estão prescrevendo a nova constituição, e a Presidenta Paylor pediu formalmente para os principais manifestantes que conseguiram fazer isso acontecer para ir a Capital, a fim de ver as clausulas e aprovar ou discordar antes que ela seja oficialmente aprovada e...

­- Peeta – o doutor o interrompeu – Vamos pular essa parte. O que você teme? – indagou-o novamente.

É só falar. Ele disse a si mesmo.

- Ir a Capital. Passar pelos Distritos. Encontrar os velhos amigos – ou o que sobrou deles, pensou Peeta com um gosto amargo na boca – Isso tudo vai trazer muitas lembranças, e para mim, não será boas lembranças. Tenho medo de isso me afetar, e conseqüentemente, afetar Katniss. Não quero jogar fora tudo o que conseguimos – confessou ele desviando os olhos do doutor.

Por um momento, ele nada disse, apenas apurou as palavras de Peeta e formulou as suas.

- É compreensível – respondeu o doutor, com toda a calma que encontrara – Mas veja bem, Peeta, é uma oportunidade. Será a chance de testar se o seu tratamento está funcionando realmente.

- Está funcionando. Mas... Ir lá irá apenas por tudo a perder...

- Não acredito nessa possibilidade – assegurou o doutor.

- Mas...? – perguntou Peeta vendo que havia algo a mais a ser dito.

O doutor Aurelius a olhou, cautelosamente, e por fim disse:

- Mas há a possibilidade de seus temores terem fundamentos.

Peeta soltou um pesado suspiro.

- E mesmo assim temos de ir – murmurou ele.

- E mesmo assim vocês têm de ir – confirmou o doutor.

Peeta se agarrou ao silêncio que tomara conta de ambos para poder absorver a possibilidade que poderia novamente se perder, deixar ser eu verdadeiro para trás, e perder todo o ano que com a ajuda e esforço tanto de si quanto de Katniss, voltara a ser o que era.

O regime antigo da Capital, controlado por Snow, havia o capturado e telesequestrado sua mente. Distorcendo todas as boas lembranças que Peeta tinha por Katniss, e o programando para que ele a destruísse. Por um ano Katniss e Haymitch, com o auxilio do doutor Aurelius estavam com êxito conseguindo reverter isso, e agora, uma simples viagem seria o bastante para por tudo a perder.

- É apenas um talvez Peeta, um mínimo talvez – disse o doutor, como se pudesse ler sua mente e decifrar seus pensamentos. Peeta assentiu, confirmando que entendera. Mesmo que a chance fosse mínima, ela estava lá, e isso era o suficiente para abalar o emocional de Peeta – Eu o conheço Peeta, sei que não existe mais ninguém com tamanha força de vontade em toda á Penem que possa ser igualada a sua. Você é mais forte que tudo isso. Vão ser só algumas semanas, qualquer indicio de que você deu uma recaída, eu estarei lá, e principalmente Katniss estará lá. Duvido que vá acontecer, realmente duvido, mas caso venha a ocorrer, não será algo tão drástico como costumava ser.

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Novamente, Peeta assentiu. Ele estava certo. Katniss estaria ao seu lado, e cuidaria dele, da mesma maneira que ele faria no lugar dela.



“Você não precisa sofrer.” A conhecida voz de Snow ecoava pelos ouvidos de Peeta. “Sua família não precisa sofrer.” A voz fazia eco, como se proviesse de uma extremidade cavernosa. “Katniss precisa sofrer.” Disse Snow, por fim.

“Não” responde Peeta com os dentes trincados. Ele vira para os lados, mas não há luz, nem a mínima refração para denunciar a onde estava. Tinha quatro paredes, disso ele sabia, pois se encostava em cada uma delas quando bem entendia. Mas agora, ao centro da sala, Peeta se virava no lugar, “Não!” exclama ele em forma de berro.

Luzes e mais luzes brancas se acendem repentimanete, sem aviso prévio, forçando Peeta a semicerrar os olhos e os proteger com as mãos. Ele distingui com dificuldades televisores, as paredes eram feitas de televisores, eram vários e pequenos. Cada extremidade das quatro paredes tinha mais de uma centena de televisores.

O teto se abre, e uma avalanche de água se derrama sobre o centro da sala, molhando Peeta, o encharcando da cabeça aos pés.

Os televisores se ligam, no mesmo instante, todos mostrando a mesma cena.

“Não”diz Peeta, mas sua voz não passa de um sussurro agudo agora “Por favor, de novo não”. Por onde Peeta olha, ele vê Katniss, correndo, com um arco e flecha nas mãos, em meio a uma floresta. Era a arena, gravações feitas na arena.

“O que planejam?” pergunta a voz de Snow.

“Eu. Não. Sei” responde Peeta pausadamente como se explicasse uma equação a uma criança.

“Você não precisa sofrer.” repete Snow. “Não por ela, tudo o que você passar, é por ela”

Os televisores se desligam. Peeta respira aliviado, mas é cedo de mais para alivio.

Uma carga elétrica começa a passar por seu corpo encharcado, fazendo-o sacudir da cabeça aos pés, e o forçando a cair sobre os próprios joelhos. Seus próprios gritos ferem seus ouvidos.

Ardia, queimava, dilacerava.

“Eu não sei!” grita ele, em meio aos berros de dor.

Os televisores se ligam, Katniss volta aparecer, mas não é ela. Ou é? Peeta não saberia dizer.

“Tudo o que você passar, é por ela. Isso é por ela” soa novamente a voz de Snow.

A dor é tanta que Peeta sente seu estômago embrulhar. Ele prefere morrer onde está, nesse momento. A voz de Katniss soa pelos televisores, e ele somente deseja que ela se cale. A imagem do liquido verde sendo inserido em suas veias volta a sua cabeça, e Peeta finalmente entende o que está acontecendo. Ele estava sendo telesequestrado.

“Não!” berra ele, sentindo sua visão embaçar devido ás lágrimas de dor que se acumulam em seus olhos. Peeta já não tem forças nas pernas, seu coração está a mil, com sorte, o seu coração para, seria melhor do que sentir tudo isso. Peeta desaba no chão.

A corrente elétrica some, mas a dor não. Os pensamento não.

Está tudo confuso. Peeta coloca a última refeição que fizera há dois dias para a fora, no lugar onde estava. Sua respiração esta ofegante. Ele não sente seu corpo. A voz de Katniss ainda soa pelos televisores, penetrando seus ouvidos como faca. Cale. Ele quer dizer, mas não tem força. É insuportável, ele não agüenta ouvi-la. Peeta fecha as pálpebras com força, como se para fugir dali.



- Está tudo bem agora – assegura Doutor Aurelius colocando uma das mãos no ombro de Peeta – Creio que você poderá continuar o tratamento sem minha supervisão. Você poderá voltar para casa.

- Casa... – murmurou Peeta para ver como a palavra soava a seus lábios, tinha um gosto doce, mas havia um amargo mesclado discretamente. Há muito não sabia o que era casa, toda sua convicção disso fora arrancada de si, por culpa de Katniss... – Não é real – disse ele rapidamente para si mesmo antes de deixar o pensamento inundar mais e fluir em sua mente – Não é real.

- Peeta – começou o Doutor Aurelius ao ver sua repentina reação – Ás vezes os pensamentos irão invadir sua mente, mesmo que você se cure por completo, isso nunca saíra de você. Você poderá acordar um dia confuso, e já estar velho, e não saber se é verdadeiro ou falso o que vê. Sua mente é sua inimiga, ela projetará dia após dia história e acontecimentos, que poderão ser lembranças tiradas de você, ou simplesmente... Ilusões. Caberá a você decidir se elas são ou não reais.



A fadiga já tomara conta do corpo de Peeta muitas vezes, e essa não seria a primeira que ele iria desistir. Ele iria continuar, não levaria muito mais tempo e logo tudo teria acabado, ele estaria bem, e o mais importante, Katniss estaria bem. Mas porque então algo dentro de si dizia que não era apenas isso que bastava?

- Espera! – exclamou Peeta – Nem todos saíram.

- Do que está falando? Vamos logo! – contrapôs Gale, trajado com um uniforme que lhe protegia da cabeça aos pés, e que carrega Katniss, apertando-a forte contra o peito, como se não quisesse perdê-la.

- Não... Noel e Snow...

- Peeta, você não pode ajudar mais ninguém! – rebateu Gale.

- Eu posso tentar, não se preocupe comigo – com dificuldades Peeta largou os soldados que o ajudavam, e refez o caminho de volta, descendo cada vez mais, lutando contra a fumaça e fadiga, apenas visando ajudar seus seqüestradores.

O caminho era tortuoso, o ambiente encontrava-se escuro devido à energia que ali já não mais existia, e a fumaça inundava não só as narinas de Peeta como dificultavam ainda mais sua visão e seu rendimento.

Um acesso de tosse atingiu Peeta, a fumaça das explosões não foram amigáveis com seus pulmões. Mas Peeta não desistiria. Importava se Snow e Noel ou seus soldados torturam-no? Talvez sim, mas eram pessoas, e para Peeta nenhum ser humano tem o direito de tirar a vida do outro, e sendo a pior ou a melhor pessoa que está correndo risco, ela tem de ser ajudada, afinal é esse o papel das pessoas, segundo Peeta, uns ajudar os outros e juntos conseguirem algo melhor. Ele ajudaria Snow e Noel, se esses ainda estivessem vivos, e se não estivessem... Bom, ao menos a consciência do Peeta estaria limpa.

Outro acesso de tosse atingiu Peeta, mais forte e violento, e esse fez dueto com outro. Alguém ali perto tossia.

Depois disso Peeta não teve dificuldades em chegar à sala de monitoramento de Snow, ou ao menos o que restou nela, e ali estavam um Snow esborrachado ao chão, e um Noel contorcido sobre si, cuspindo sangue enquanto tossia.

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- Vamos – Peeta disse, estendendo a mão para Noel.

- O que está fazendo garoto do pão? – perguntou Noel, ainda irônico – Não vê que já estamos mortos? – Noel riu – Eu diria para aproveitar as ultimas lufadas de ar que você terá, mas isso apenas adiantaria sua morte. Essa fumaça é tão tóxica quanto veneno.

Peeta estava preparando sua resposta quando uma explosão ao longe fora ouvido. E logo outra, e mais perto outra, e novamente outra. A última explosão fora tão perto que os ouvidos de Peeta já não as ouvia, e se estavam vindo de lá para cá, não era difícil deduzir o próximo lugar que ia pros ares.

Noel soltou uma risada, ou seria uma tosse? Peeta não sabia.

Por um momento tudo ficou em absoluto silêncio, e Peeta já não sentia a gravidade abaixo de seus pés, nem via mais nada a não ser a escuridão.

Não é real” tentou dizer, mas sua voz não saia, e no pleno silêncio e breu de sua consciência inconsciente, Peeta continuou sussurrando, não é real.



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