I Love The Way It Hurts

04. Talvez a resposta esteja lá dentro. Talvez...


Algumas horas depois.


Abri a porta de casa com cuidado, tomando todas as precauções para que ela não rangesse de forma escandalosa. Acendi a luz da sala, que estava vazia. A decoração da festa ainda estava lá, um pouco desarrumada. Joguei a chave em cima do sofá e subi as escadas, totalmente desanimada. Eu tinha a sensação de que um ônibus havia me atropelado. Entrei no meu quarto e encostei a porta, deixando apenas dois dedos abertos. Joguei-me na cama e tirei o aparelho auditivo, colocando-o no criado mudo. Me levantei e fui até o banheiro. Peguei a caixa do remédio tarja preta, que havia sido prescrito para mim após o incidente com minha mãe, o que me afundou numa depressão. Despejei dois comprimidos na minha mão e os engoli de uma só vez. Prendi meu cabelo, dando um nó com os próprios fios. Arregacei as mangas do casaco e joguei água no meu rosto. Fazia algum tempinho que eu não me sentia daquele jeito, tão... imprestável e acabada. Voltei para meu quarto, em passos tão lentos, que nem pareciam me fazer andar e sim me arrastar. Fechei a porta do quarto e desabei na cama.

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A escuridão do quarto fora interrompida pela claridade que vinha do corredor, a qual a porta aberta deixava entrar. Me levantei, observando Justin parado, com metade do corpo dentro do quarto. Ele falou algo, que eu não consegui ouvir. Acenei com a cabeça, indicando que ele poderia entrar. Estiquei meus braços até o criado mudo, pegando meu aparelho auditivo e recolocando no meu ouvido direito. Justin se sentou na cama, bem na minha frente, cruzando as pernas.

–Umas amigas peruas da mãe passaram e pegaram ela. Acho que ela só volta amanhã de manhã.- Justin falou, dando a explicação para o motivo da casa estar completamente silenciosa. Balancei meus ombros.- Bom, guardei um pedaço de bolo e alguns salgadinhos pra você.- Justin disse, empurrando a bandeja, que eu só tinha percebido naquele momento, com três pedaços de bolo, alguns salgadinhos e duas latas de refrigerantes na minha direção. - Você deveria ter ficado. Foi divertido.- ele falou com a voz manhosa e fofa.

–Eu não deveria, Justin.- falei com a voz baixa, brincando com um pedaço de bolo com a ponta do dedo indicador.

–Por que não? Você é como se fosse parte da família. Você fez falta.- Justin disse, abrindo uma latinha

–Fiz?- ergui meu olhar até Justin, encontrando seus olhos castanhos que tinham um brilho diferente.

–Ér... Digo... Minha mãe sentiu bastante a sua falta.- ele disse, pigarreando e bebendo o refrigerante logo em seguida. Não consegui não sorrir. Passei o dedo sujo de bolo de chocolate em sua bochecha, deixando um risco marrom cortando sua maçã do rosto.- Ei! Isso é jogo sujo!- Justin falou, enfiando o dedo no mesmo pedaço de bolo e passando no meu nariz. Parecíamos duas crianças tolas, brincando com comida. Peguei o garfo e comi um pedaço do bolo, que estava incrivelmente gostoso.

–Foi muito bonito o que você fez hoje, Justin. Você se superou.- falei, engolindo o bolo e atacando a lata de refrigerante.

–Diga.- a voz de Justin soou séria, mas com um tom zombeteiro.

–Dizer o quê?- perguntei.

–Você sabe o que dizer.- ele manteve a conexão entre nossos olhos.

Entreabri meus lábios, procurando as palavras que eu tinha de dizer e que ele tinha de ouvir. Eu não fazia ideia do que ele queria ouvir. Então, as palavras passaram por minha mente, luminosas.

–Você me surpreendeu.- falei as três palavras que, como mágica, fizeram um sorriso brotar nos lábios de Justin. Nossos olhares se conectaram por alguns segundos- que pareceram congelar-se diante de tal situação. Logo abaixei a cabeça. E lembrei do corte do pescoço do Justin.- Como tá isso aí, Justin?

–Ainda dói. Eu acho que não fiz o que tinha que fazer do jeito certo...Deve estar infeccionando e...- ele continuou, fazendo uma expressão de dor. Senti meu coração se torcer ao lembrar que era culpa minha ele ter aquele corte enorme ali. Coloquei a bandeja com as comidas mais para o lado da cama e cruzei as pernas, como índio.

–Desculpa...- falei, abaixando a cabeça, com a voz sumindo aos poucos. Ele fez um barulhinho estranho com a boca. Eu me levantei e peguei o kit de primeiros socorros no criado mudo- eu tinha deixado lá, caso fosse necessário.- Me deixe limpar isso, ao menos, Justin.

–Claro, você fez, você conserta.- ele disse, semi cerrando os olhos. Torci meus lábios e embebi uma gaze com algum líquido anti séptico. Fiz um sinal com as mãos, para que Justin ficasse em uma posição que eu pudesse ver o corte como um todo, que começava na cabeça, um pouco atrás da sua orelha e descia pelo pescoço. Era um corte e tanto. Ele se deitou sobre um travesseiro que eu coloquei em meu colo e virou a cabeça alguns graus à direita, me dando uma visão exata do corte.

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–Wow.- falei ao ver o corte. Passei a gaze em seu corte e Justin estremeceu com o contato entre sua pele e o anti séptico. Não consegui deixar perceber os pelinhos lourinhos em sua nuca ouriçando. Justin soltou um “aut” quando eu forcei um pouco a gaze no corte. Eu me distraía, olhando o movimento suave e imperceptível de seus pelinhos, que subiam por sua nuca e se confundiam, a partir dali, com seu cabelo. Em alguns instantes, a gaze de cor branca se tornou avermelhada e o corte ia adquirindo um aspecto mais limpo. Procurei o esparadrapo e uma gaze pequena e logo fiz um curativo. A pele de Justin era macia. E seu cheiro era...bom demais.– Prontinho, Bieber.

–Eu não tenho que agradecer, né?- ele dizia enquanto se levantava.

–Claro que não.- respondi e sorri fraco.

–Ok, bem, acho que vou jogar um pouco de video game. Você já ia dormir, não é mesmo?- ele se levantava roubando alguns salgadinhos da bandeja.

–Ia...claro. - continuei sorrindo fraco.

Justin se levantou da cama e caminhou até a porta.

–Boa noite.