Charlie

25 - Abstinência de uma Hagen


E lá se foram os três meses na casa dos Moritz. Eles passavam como um flashback na minha cabeça enquanto eu atravessava o aeroporto sozinha à procura de Joseph e Jeane, já havia deixado os meninos para trás.

Eu não tenho boa memória, mas eu nunca conseguiria esquecer-me das primeira palavras que eu troquei com o babaca do Danny. “Seu idiota”.

Os amendoins acabaram, o garotinho irritante já havia sido levado pela mãe depois de começar a chorar por nenhum motivo e eu já não tinha mais nada a fazer. Cutucaram meu ombro. Sabe que eu odeio quando falam comigo me cutucando? Virei-me com meu típico olhar mortal, e vi um garoto mil vezes mais alto do que eu, de cabelos castanhos e olhos azuis.

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— Não toque em mim, seu idiota.

Eu gostava, e ainda adoro xingá-los.

Meu pai estava parado com Jeane e suas malas com quilos de maquiagens, perto do Starbucks. Eu joguei minha mala para perto deles e acenei sem sorrir. Mentira, eu sorri sim, estava morrendo de saudades do meu pai e não havia agora motivos para voltar a ser anti-social.

Me ensinaram a não ser.

Eu o abracei, e depois abracei Jeane.

— Cuidado Jeane! Ela pode estar tentando passar uma doença via abraços. – Papai disse.

— Joseph, são só abraços, amor. – Jeane riu.

— Como foram os meses? – Perguntou meu pai.

— Eu aposto que foram incríveis! Vamos, Charlie, Daniel e Gerard são ótimos. – Jeane depositou confiança, coitada. – Eles são as coisinhas mais santas e lindas, angelicais e gêmeas...

— Ah, papai... – Suspirei, interrompendo-a. – Como havia previsto. Estupidez, que tipo de pai manda a filhinha de dezesseis anos para a casa de dois meninos mais velhos? Você não tem malícia, não?

Eles riram.

— Mas agora você tem dezessete!

— Porra, que bom que você sabe, não é? Imagina se tivesse esquecido que foi... quando mesmo? – Me fingi de desentendida – Ah, é. ONTEM.

— Mas nós te trouxemos presentes.

Sorri de forma interesseira.

— Por isso que eu sempre digo que vocês são a melhor família. – Claro, eu sempre digo isso, de fato.

Jeane tirou de sua mala um PSP envolto num laço.

Eu havia feito aniversário de dezessete anos ontem, num restaurante com os meninos, Andrews e Lucas. Cutucaram meu ombro. Eu me virei com incômodo e vi Danny, segurando Nikabrik.

— O que é, idiota? Saudades? – Ri.

— Você esqueceu Nikabrik. – Ele me entregou o buldogue, balançando a cabeça como se também afirmasse que estava com saudades. – Tchau mãe, Joseph... Tchau Charlie!

Danny estava se afastando. Eu corri alguns passos e o abracei antes de ir embora. Pelas costas. Ele se virou e inclinou para me abraçar direito.

Ele era bem magro, então me trazia uma sensação estranha como abraçar um esqueleto, mas era gostoso, o perfume dele me confortava, e até mesmo os fios de cabelo castanhos roçando no meu rosto, eu só queria fechar os olhos e abraçá-lo por bastante tempo, com o meu estômago revirando, eu estava muito apaixonada por ele, definitivamente. Virou o rosto e encostou seus lábios na minha bochecha, com um estalo, se afastou.

Eu não fui abraçá-lo por que ele me entregou Nikabrik. Foi porque eu quis e senti falta.

E voltei para meu pai e a madrasta. Eles questionaram sobre o cachorro e eu contei a eles toda a história de Nikabrik, até a briga de ontem com Gerard, por quem iria ficar com ele. Eu havia decidido que traria Nikabrik, e ele ficou triste sem um cachorrinho, quando um santo garoto apareceu na nossa porta, anunciando que sua cadela havia tido filhotes e ele estava doando alguns com sua irmãzinha bandeirante que vendia biscoitos. É, era o Christian e sua irmã. Gerard pegou uma filhote fêmea, dessa vez foi mais fácil escolher seu nome, todos concordaram, se chamaria Hagen, meu sobrenome. Hagen não é nome de menina, mas nem é Charlie, então a cadela se chamaria Hagen em minha homenagem.

Eu achei que foi a coisa mais fofa que eles fizeram todos juntos por mim.

Eu voltei para casa. E senti muita falta das tardes n-a-d-a monótonas que eu passava na casa dos meninos. Senti falta do Gerard de cabelos vermelhos e também pretos, senti falta de Andrews recitando seus contos de terror para me assustar e Lucas calado em um canto lendo revistinhas de super heróis. Calado, mas simplesmente sentia falta da presença incômoda. Eu... consegui sentir falta de tudo. E eu senti ainda mais falta de brigar e abraçar Danny. De implicar com ele, e de vez em quando passar por momentos, para mim, constrangedores, como quando eu encostava minha mão no seu corpo, porque depois de um tempo ele começou a não ligar sobre ficar sem camisa em casa comigo, e é, falta de ficar vendo-o ficar sem camisa comigo.

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Caralho, eu senti MUITA falta de Danny. Dos olhos azuis que de vez em quando estavam me mirando e de quando o cabelo castanho caía no rosto, da sua altura gigantesca comparada à minha, e das suas roupas com seu perfume. E eu ficava me lembrando de cada momento em que ele se aproximava demais, e depois me beijava. Como ele me beijava. Doce, molhado, e desconfortável, porque ele sempre estava alguns centímetros mais alto do que eu.

E se passou um ano. Um ano!

Um ano indo ao inferno chamado escola, vendo as meninas filhas da puta, crescerem e ganharem peitos e bundas, até mesmo aquelas magricelas e tábuas como eu, como eu era. Vendo os meninos implicarem comigo e depois acabarem com a cara dentro da privada. Idiotas. Todos eles.

Eu passei um ano sem vê-lo. Até mesmo quando eu tinha chance. Não me pergunte o por que de não querer vê-lo. Era como abstinência. Eu podia vê-lo, mas não queria, e eu sentia falta.

— CHARLIE! – Joseph gritou do andar de baixo.

— O que? – Retruquei.

— Danny no telefone! Ele quer falar com você, está te convidando para sair com os amigos.

— Não, obrigada. – Bati a porta do quarto e me joguei na cama como uma baleia orca. E depois fui me olhar no espelho com a fita métrica, medindo o tamanho da minha barriga, dos meus braços, dos meus seios, do meu cabelo e até o meu tamanho. Estava quase lá!

Não, eu não estou querendo emagrecer. Sabe que se eu tentar isso, vou sumir. Eu estou querendo engordar.

Jeane e Joseph foram ao supermercado. Eu estava na bancada da cozinha comendo pedacinhos de morango com leite condensado. Foi uma loucura conseguir leite condensado aqui, mas eu achei com uns mexicanos que contrabandeiam comidas típicas da América do sul. Que? Eu sou uma pessoa suja, tenho interações com traficantes desde que expulsei alguns da cada dos meus irm... dos Moritz. Irmãos o caralho.

Eles voltaram com uma caixa gigantesca de Pringles, embrulhada com um laço vermelho, daqueles que você coloca em qualquer coisa para fingir que é presente.

— OBRIGADA! – Sorri com os olhinhos brilhantes – É POR ISSO QUE EU SEMPRE DIGO QUE VOCÊS SÃO A MELHOR FAMÍLIA DO MUNDO!

Nossa, que mentira. Tirei a caixa de Pringles da mão deles. Eles tomaram de volta.

— Existe um porém. – Disse Joseph – Bem... Já chegou as férias de verão, Charlie, e esse ano, nós vamos para Viena!

— Um lugar romântico e lindo! – Jeane suspirou, se apoiando em Joseph.

— Aquela cidade da Espanha que tem a Torre Eiffel? – Perguntei.

— Não, aquela cidade da Itália... É na França que tem a Torre, Charlie.

— Tanto faz, eu moro nos Estados Unidos, não na Espanha. Então, continuem, vocês vão para Viena e vão me deixar com quem dessa vez?

Eles abriram grandes sorrisos. Não, sério! GRANDES sorrisos, tipo a maquiagem daquele inimigo do Batman, o Coringa. Isso, conheci o Coringa com o Lucas.

— Você vai junto! – Dissera em coro.

— Oh, que legal. – Sorri.

— E não vamos sozinho! É aí que você vai adorar ainda mais, Danny e Gerard vão junto! Na verdade, vai o povo todo, eles vão levar mais dois amigos, se eu não me engano os nomes...

— Andrews e Lucas. – Jeane completou.

— Sim, esses dois.

— HAHAHA! Nossa, vocês são uma comédia. – Eu gargalhei falsamente e depois me voltei para eles com o rosto sério – Okay, têm algum primo desconhecido meu, aqui em Los Angeles, para eu ficar por alguns meses?

O sorriso do Coringa continuava estampado no rosto, eles negaram com suas cabecinhas no mesmo ritmo e meu queixo caiu. Como eles disseram, iria o POVO todo. Ou seja, FO-DEU. Iria acontecer tudo de novo.