Até que se Tornem Lembranças

Capítulo 6- Pensando na Vida


Laura entrou no quarto e trancou a porta, era um costume adquirido para se defender do pai, às vezes ele costumava acordar no meio da noite procurando por bebida e quando não encontrava enlouquecia, tornava-se violento e descontava nela.

Era loucura, mas ela já deixava uma garrafa na soleira de sua porta, bastava encontrá-la e ele a deixava em paz, o difícil era conseguir dinheiro para comprar a bebida, fazia uns seis meses que ele estava desempregado.

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Ela sentou no banco da penteadeira e mirou seu reflexo no espelho, o último hematoma perto do olho estava quase para sumir, enfim o roxo adquiria uma tonalidade amarelada. Do espelho pode ver que a caixa que trouxe de sua casa estava sobre a cama.

Atirou-se na cama para abrir a tampa e retirou cada pequeno tesouro que juntou, objetos que tinham valor sentimental para lembrar dos momentos felizes nas horas mais difíceis. O que mais adorava era a única foto que sobrou dos três: Pai, mãe e filha juntos pela última vez.

Ela nunca havia analisado aquela foto e foi com choque que percebeu que por trás daqueles sorrisos, ela era a única que sorria genuinamente. A câmera não mentia, o olhar tristonho da mãe e o olhar indiferente do pai confirmavam o que ela nunca quis ver, eles tiveram problemas que não conseguiram resolver.

Pegou o cordão da mãe, a recordação daquele dia voltou forte como se tivesse sido ontem, o tempo passou enquanto se perdia nas lembranças truncadas de uma criança.

A mãe abriu a porta do quarto em que ela dormia. Ela soluçava e era estranho vê-la de óculos escuros no meio da noite, mas seu sono estava pesado e não conseguia manter o olho aberto.

- Eu não agüento mais... – disse com dificuldade – eu te amo, Laura... – a respiração entrecortada – filhinha – e beijava espalhando as lágrimas pelo seu rosto. – Não esqueça de mim, eu venho te buscar.

O pai entrou de supetão e sentiu o corpo da mãe tremer, mais ouviu a últimas palavras ditas por seu pai antes da porta fechar:

- Se vai me deixar, vai sair com a roupa do corpo. – a voz tremia de ódio – Nem pensa em voltar! Daqui você não leva nada, nem mesmo a Laura.

Durante todos esses anos havia feito tantas conjecturas sobre o que teria acontecido, teria coragem de perguntar a mãe? Por qual motivo ela teria sido abandonada? Perguntar se valeu à pena o seu sofrimento em troca da felicidade dela?

Ela olhou ao redor e não tinha certeza se gostaria de ouvir a resposta, seu corpo tremeu, tudo que estava guardado há tanto tempo saiu em forma de um choro convulsivo e sofrido. Encolheu-se deitada sobre a cama abraçando suas pernas, esta era a única forma de consolo que tinha para si mesma.

Enquanto derramava seu pranto e as lágrimas a cegavam, ela sentiu o calor de um abraço e em seu desespero solitário agarrou-se ao conforto desse abraço sem nem mesmo saber quem era, pois naquele momento era só o que importava.