Cicatrizes

Desabafos


Tales dá um gole na cerveja e começa a falar.

– Eu sei que você não vai muito com a minha cara, mas por algum motivo acho você parecida comigo.

– Parecida com você? Em que sentido?

– Você já sofreu por amor ou estou errado?

Lorena fica imóvel e agora é sua vez de dar um gole na sua cerveja.

– Pela sua reação acho que já. Ou me enganei, pode falar.

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– Eu não sofri por amor. Fui destruída por ele. – diz dando outro gole.

– Como eu imaginei. Um ferrado reconhece outro.

– Ainda não te entendi Tales.

– Pode me chamar de louco, sem noção, mas eu preciso desabafar com alguém, mas não qualquer pessoa. Tem que ser alguém que realmente vai me entender. E eu consigo ver essa pessoa em você.

– Nossa, que honra. – diz mordendo uma batata.

– É sério. – diz pegando outra batata.

– Bom, se é assim, pode começar. Sou uma boa ouvinte.

Tales dá mais um gole na cerveja e começa a falar.

– Eu não era esse monstro que você acha que sou, esse ser insensível e grosso.

– Eu nunca disse isso.

– Não precisa dizer, eu vejo nos seus olhos quando você está perto de mim. – diz deixando Lorena sem graça. – Mas eu não te culpo. Como eu disse, eu não era assim, mas me transformaram nisso.

– Foi uma mulher acertei? – diz com outra batatinha nas mãos.

– Exatamente. A mulher que eu amei, que desejava ter filhos e passar o resto da minha vida com ela. Por causa dela hoje sou assim.

– Era sua namorada?

– Minha noiva. Estávamos de casamento marcado, coisas compradas, tudo pronto já. Eu a tratava como a mulher mais preciosa do mundo, pra mim ela era única e tudo o que eu fazia por ela ainda era pouco pra mostrar o quanto ela era especial.

– E o que aconteceu? Terminou com você de repente, desistiu de casar?

Tales dá uma risada amarga.

– Antes tivesse sido isso. Por ela tínhamos casado, talvez tivesse até filhos hoje.

– Não to entendendo, o que aconteceu então?

– Você nem imagina?

Lorena fica pensativa olhando para Tales. Ela abre a boca na menção de falar, mas engole as palavras. Tales percebe e a encoraja a dizer.

– Meu Deus, ela traiu você foi isso?

– Bingo! – diz dando um gole na cerveja secando o copo e o enchendo novamente.

– Mas se você tratava ela também como diz que tratava, qual foi o motivo?

– Ela disse que aconteceu. Bem convincente.

– Nossa Tales, me explica isso direito, agora eu não to entendendo nada.

Tales explica para Lorena tudo o que aconteceu, desde seu início de namoro até o rompimento do noivado e seus motivos.

– Nosso, você ainda teve esse sangue frio? Eu não teria conseguido.

– Na hora eu também não sei como consegui, apenas consegui. Talvez se tivesse feito de outro jeito hoje não seria como sou, sei lá. Mas e você? O que aconteceu pra você ser assim hoje?

– Assim como?

– Eu me abri com você Lorena, pode fazer o mesmo comigo. É como eu já disse, um ferrado reconhece o outro. Você é fechada também, especialmente com os homens. Você não confia em mais nenhum não é mesmo?

– Falando assim você me assusta, parece que você entra na minha cabeça e no que sobrou do meu coração.

– Estou certo então. Eu queria conhecer a sua história, mas se não quiser falar, não vou insistir.

Lorena olha para Tales e baixa os olhos. Respira fundo.

– Você tem razão. Me fechei mesmo, ou melhor, como no seu caso, me fecharam. Tem certeza que quer ouvir?

– Por favor.

Lorena então começa a contar sua história, do dia que saiu da casa dos pais no litoral e veio morar com Patrick, até o dia que acordou no hospital, ferida não só no corpo, mas muito mais na alma.

– Nossa, sua história é bem pior que a minha.

– Pode ser, mas você ainda superou melhor que eu. Você se envolve com outras mulheres, mesmo que só por diversão. Eu nunca mais me envolvi de forma nenhuma.

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– Já tentou?

– Não quero, sei onde vai terminar. Já tenho feridas demais pra fazer outras.

– Você nunca mais viu o cara?

– Nunca mais. Ele se quer foi me ver no hospital. Eu chorei muito, se não fosse o Patrick do meu lado, acho que não tinha agüentado.

– Esse Patrick é o que seu mesmo?

– Amigo, na verdade ele gostaria que eu o chamasse de amiga – diz Lorena rindo – mas eu não consigo. Digo que ele nasceu no corpo errado, só isso.

Tales ri e termina a cerveja. Não existem mais batatinhas a essa altura também.

– Quer mais alguma coisa? – pergunta ele.

– Não, não, o Patrick deve estar preocupado, melhor eu ir pra casa.

– Eu levo você.

– Não precisa Tales, nem é tão longe daqui e a rua está com bastante movimento.

– Depois de tudo o que conversamos e conhecemos um do outro ainda não é o suficiente pra você confiar em mim não é?

– Não é isso Tales, mas não quero te atrapalhar. Fora que você bebeu.

– Não vai me atrapalhar e não estou bêbado, posso dirigir. A quantia que está no meu sangue nem vai acusar do bafômetro. Deixa de ser orgulhosa ao menos uma vez.

Lorena pensa um pouco e acaba cedendo.

Ao chegar convida Tales para subir.

– Seu amigo não vai achar ruim?

– De jeito nenhum, o Patrick vive dizendo que tenho que fazer mais amigos.

Tales então aceita e eles sobem até o apartamento. Lorena procura a chave na bolsa mais não encontra.

– Não acredito que fiz isso de novo!

– Isso o que? – pergunta Tales sem entender nada.

– Esqueci a chave no escritório e essa hora não tem mais ninguém lá. Droga! Vou tocar a campainha de novo, coitado do Patrick.

Lorena toca a campainha mais Patrick não atende. Ela resolve ligar no celular dele e ver onde ele está.

– Oi Patrick, sei que você vai querer me matar, mas esqueci a chave no escritório de novo, pode abrir pra mim? Como? Putz, ferrou! Quando você volta? Ta de brincadeira né, por favor fala que ta!

– O que foi? – cochicha Tales e ela pede pra ele esperar um minuto.

Lorena desliga o celular e encosta a testa na porta.

– O que foi ele vai demorar pra chegar? – pergunta Tales confuso.

– Vai.

– Eu espero aqui com você, ou a gente dá uma volta, sei lá.

– Ele só volta no domingo a noite. Foi visitar a avó que está doente. Não acredito que esqueci a chave de novo, e ele tanto em pede pra prestar atenção. Quero ver achar vaga em hotel agora, se bem que isso não é o problema, o cartão ta no limite.

– Você não precisa ir pra hotel nenhum, fica no meu apartamento até ele voltar.

– No seu apartamento?

– É, melhor que ficar em hotel. Lá é pequeno, mas é confortável.

– Hoje é sexta Tales, ele só volta domingo a noite, nem roupa eu tenho.

– Quando minha irmã brigava com o marido ela dormia lá em casa, tem umas roupas dela lá que devem servir em você.

– Eu não vou atrapalhar?

– Se fosse eu nem dava a idéia. Ou você prefere dormir do lado de fora até ele voltar?