Porta 54

Chaves - Parte I


Peço que, para maior entendimento do lugar, meu leitor se lembre de sonhos.

Imagine aqueles sonhos terríveis em que você se encontra em um corredor, e tem que chegar ao final dele; mas quando anda, não só não parece sair do lugar como também o corredor começa a se estender, e estender, e fica tão grande que você mal consegue ver a porta no fim dele.

A sala redonda tinha algo parecido com isso. Era redonda, obviamente, mas parecia infinita. À medida que se avançava para um lado, a parede aparentava se esticar e as portas subitamente se duplicavam, mostrando que havia mais ali do que era possível perceber à primeira vista.

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Catarina observou esse fenômeno quando seguiu o coelho branco para um dos lados. Ali, os números das portas não eram muito altos; não deviam passar dos 50. Não deviam, mas passaram. Quando estavam perto o suficiente para tocar uma das portas, ela pôde perceber que passavam – e muito – dos 50, caso olhasse para sua direita. Era meio aterrorizante.

- Certo, certo – disse o coelho enquanto ajeitava seus bigodes com uma das patas. – Agora, onde estão as chaves?

- Eu não sei – Catarina disse de volta. – Alice não me entregou depois que fiz minha primeira visita aqui. Digo, entregou, mas eu acho que coloquei na mesa de novo...

- Ora! Então por que não disse antes?

- Achei que estivessem com você!

Ele parecia descontente. Puxou um relógio de bolso e deu uma olhada.

- Tudo bem. Mas saiba que isso é culpa sua, ouviu, devia estar aqui no solstício quando Alice se aposentou!

Catarina parecia indignada e prestes a dar uma resposta malcriada, mas felizmente para nossos ouvidos, o coelho foi mais rápido.

- Então ela deve ter deixado com o Chapeleiro. Alice sempre gostou muito do Chapeleiro. Vai entender – ele sussurrou a última parte, e começou a pular para a esquerda. – Acho que eu ainda tenho um pouco de Drink me. Como estamos sem a chave, você vai ter que ficar pequena o suficiente para passar pela fechadura...

Catarina parou abruptamente.

- Não. Não, não, não e não. Não vou beber nada que muda o tamanho. Isso não acabou bem para a Alice da história.

- Você tem alguma ideia melhor? – perguntou o coelho, virando-se para ela.

A garota ficou em silêncio por alguns segundos.

- Não podemos pedir ao Chess que me... – ela hesitou, em dúvida de qual palavra usar. – Evapore? Junto com ele?

Ele mudou o apoio entre os pés, desconfortável.

- Tudo bem. Peça a ele, então. Mas não se iluda; talvez não funcione!

- Vai funcionar – ela disse vagamente. – Chess! Vem cá!

Eles esperaram por alguns segundos. Nada aconteceu.

- Chess?

Mais alguns segundos. Ela começou a pensar que não havia funcionado, mas então finalmente ele surgiu pairando no ar. Apoiava a cabeça nas patas dianteiras e mantinha o resto do corpo como fumaça.

- Pois não, Dona Alice.

- Catarina – ela corrigiu. – Preciso entrar no País das Maravilhas. Alice se esqueceu de me dar as chaves e as deixou com o Chapeleiro.

- Sim, eu sei. – Ele parecia ligeiramente curioso, como se Catarina fosse algum macaco com uma bola e simplesmente o fato de ver o show valesse a pena.

- Então você pode me levar para lá? Evaporando?

- Claro!

Ela sorriu triunfante para o coelho.

- É sério?

- Não – Chess disse de volta, gargalhando. O sorriso de Catarina murchou mais rápido do que surgira.

- Mas eu preciso que me ajude! Como espera que eu entre, então?

- Eu não sei. Drink me, talvez.

Ela fechou a cara.

- Não vou beber aquilo. Gosto muito do meu tamanho. E você supostamente deveria me ajudar; foi o que Alice disse!

Chess brincou com pequenos vapores coloridos que emanavam dele.

- Eu posso lhe trazer a chave do País das Maravilhas. Não a que está no molho, porque nele não posso mexer; a reserva. Mas você tem que me autorizar a fazer isso.

- Tudo bem, pode ir – ela disse aliviada.

- Formalmente, Alice.

- Catarina.

Chess esperou mais alguns segundos, como se algo tivesse que acontecer.

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-... Você não sabe autorizar, sabe?

- Nem faço ideia – a garota disse de volta. A essa altura já tinha percebido que não sabia tanta coisa por ali e que talvez não devesse ficar sem graça por cada uma delas.

Infelizmente não posso descrever como Catarina autorizou Chess a mexer na chave por motivos de segurança principalmente de mim mesma. Então, resumidamente falando, vamos dizer que Catarina obteve a chave, mas mesmo assim teve que se encolher (muito descontente) para passar pela porta.

- Boa sorte, Alice – o coelho desejou enquanto ela girava a chave.

- Sorte é desculpa de perdedores – Catarina resmungou de volta. Então passou pela porta e entrou, pela primeira vez, no País das Maravilhas.