Capítulo 9 – Dores

Pov’s Edward:

Eu pouco me lembro daquele dia. Lembro de Marie, a trabalhadeira lá em casa, e avisar que meus pais estavam no hospital, morrendo de gripe espanhola – e foi aí que o mundo começou a desmoronar.

Também lembro que, ao chegar no hospital, tossi um pouco de sangue. Aí fiquei confuso porque quando acordei estava num quarto particular, deitado numa cama, com minha mãe sentada na cadeira ao lado – ela acariciava meus cabelos, tossindo sangue para os lados, cada vez mais.

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- Mãe? – eu me recordo de ter questionado.

Elizabeth, minha linda mãe, somente sorriu, tirando um pouco sua aparência doentia. Lembro-me perfeitamente dela levantar e conversar com um médico loiro no corredor, que parecia absolutamente saudável.

Aí minha visão ficou turva e dormi. Quando acordei de novo, o médico loiro, Carlisle Cullen, dizia o crachá no jaleco, perguntou-me como eu estava.

- Bem – eu mentira, sempre fui muito bom em inventar mentiras sobre essas coisas.

Com pesar, me informou que meu pai e minha mãe partiram desta para a melhor, ao paraíso. Lembro-me de ter pensado “Logo, logo irei juntar-me a eles” e lembro, também, de ter ficado feliz com a possibilidade.

Quando o Dr. Cullen se aproximou, pensei que fosse acabar com meu sofrimento, entretanto, ele mordeu meu pescoço, dolorosamente. Foi como se algo dentro de mim explodisse, devagar e por partes.

Meu corpo inteiro ardia, como se não houvesse mais camadas de pele, ou se tivessem tacado no fogo – eu queria que parasse. Mal senti quando alguém me pegou no colo e correu tanto que parecia querer voar – imaginei se, para ir ao céu, eu teria de sentir dor enquanto voava com um anjo.

Mas o céu não chegou.

Eu estava deitado no sofá, agarrando suas laterais com força, os olhos bem abertos – sem conseguir ver nada, de qualquer forma – e boca fechada, se abrisse, berraria.

Ouvi uma vaga voz do meu lado, parecendo distante: - Quem é este?

Era São Pedro, olhando se meu nome estava na lista para abrir as portas? Não, era meio infantil e feminina – me recusaram no paraíso?

Os pontos pretos que cegavam minha visão foram sumindo aos poucos, até eu ver Carlisle e uma garotinha, bem bonitinha, do meu lado. Reparei melhor no médico Cullen.

Ele tinha cabelos loiros claros, olhos de um dourado quase liquido, inumanamente bonito e, no momento, parecia perturbado, murmurando consigo mesmo palavras incoerentes e que eu não conseguia compreender.

A menina tinha cabelos castanhos, bom, como se fosse um pouco mais escuro que mel e mais claro que castanho – era uma cor que eu nunca vira, mas parecia reluzir. Não a vi de pé, mas era miúda, de braços pequenos e rostinho delicado. Os olhos também eram dourados – ela poderia ser a filha de Carlisle, pensei com surpresa.

Ela segurou minha mão levemente. Alguns milésimos de segundo depois a soltou, com uma expressão meio assustada.

- Edward Anthony Masen? – sussurrou ela, a voz era como uma melodia.

Assenti, e parei, o corpo ainda queimava, mais ainda do que antes.

- Dezessete anos, nascido em Chicago, estava morrendo de Gripe Espanhola? – novamente concordei. A questão de como ela sabia isso só me ocorreria mais tarde.

Acho que minha dor era bem visível, porque ela disse, tocando quase hesitante minha testa quente: - Vai ficar tudo bem, eu te garanto – ela sorriu – A dor é temporária, logo acaba.

- Logo quando? – indaguei entre dentes, maldição, alguém faça parar!, berrei para mim mesmo, alucinado.

Uma dor desse calibre era impossível, inimaginável... Insuportável.

Ela suspirou: - Dois ou três dias.

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Eu não mudei minha expressão, nem falei. Só fiquei quieto. Supondo-se que conseguiria sobreviver a isso durante dois ou três dias, tudo bem.

Talvez eu não me arrependesse disso depois – quem quero enganar? Só quero que isso acabe logo de uma vez, minha vida é desnecessária.

Eu não soube por que – naquela hora – mas cheguei a conclusão de que eu não era mais vivo. Só uma carcaça sem alma no mundo.

Pov’s Bella:

Edward fechou os olhos, mas sei que não dormia, porque a dor fazia isso, não nos deixava descansar, sentir alguma coisa. Aproveitei esse tempo para usar o dom de Heidi e entrar na mente de Carlisle.

Lembra o que falei sobre “gavetas organizadas e mexê-las como se colocasse o arquivo no lugar errado”? Bom, para noção da coisa, parecia que eu tinha passado por ali e feito exatamente isso que exemplifiquei, mas, eu não tinha feito.

Era só a confusão de Carl.

Pacientemente, “catei” os papéis e os organizei, um por um – racionalidade, personalidade, força, agilidade, inteligência, sonhos, pesadelos, beleza, vaidade, tristeza, raiva, orgulho, infantilidade, habilidade, e tudo mais.

Foi difícil colocar no lugar, mas, saí satisfeitíssima da mente de Carlisle, vendo-o recuperar a compreensão das coisas. Primeiro ele olhou para Edward, pensei que fosse ficar como antes, mas suspirou e olhou para mim.

- Está brava comigo? – ele perguntou, jogando-se, com mais delicadeza que um humano faria, na poltrona ao lado do sofá.

Sentada sobre as pernas, no tapete, olhei para cima, para ele.

- Não, papai, porque estaria? – era confuso.

- Talvez... Sei lá, talvez não fosse gostar de ter mais alguém aqui, ou me achasse um monstro por transformar ele, qualquer coisa – ele disse exasperado pela minha falta de raiva.

Mas o que ele queria, que eu gritasse com ele e o xingasse com todos os nomes que conheço? Depois de tudo que Carl tinha feito por mim, ele queria isso?

Impossível.

- Não, acho que fez bem – falei sorrindo tristemente – ele estava morrendo de Gripe, logo, viria a falecer, você o salvou, acredite. E, antes que pergunte, vi tudo, com o dom de Aro.

Ele suspirou, não sei se preocupado ou feliz por eu ter adquirido mais um dom. Carl não falou nada. E eu também permaneci calada.

Percebi, nessa hora, como o silêncio poderia ser bom. Eu nunca dera muito valor a ele, mas o silêncio parecia estranhamente confortador nessa hora, abraçando a mim.

Baixei os olhos para o tapete de linho. Teríamos de nos mudar, de novo, eu tinha certeza. E para uma floresta, Edward iria treinar seu autocontrole, sem dúvida. Perto das pessoas seria uma missão impossível.

Não sei que horas exatamente, mas de manhã, Carl saiu, dando-me um beijo na testa como sempre, e foi tentar salvar pessoas de uma doença incurável – ele se sentia péssimo por isso.

E eu? Bom, eu sentei na poltrona, encarando o nada durante muito tempo, não foi difícil, eu fazia muito isso em Chicago. Só era esquisito fazer isso com uma pessoa se transformando em vampiro do seu lado, mas tudo bem.

Uma vez ou outra, Edward deixava gemidos de dor escapar. Cogitei usar o dom de Heidi, mas, talvez entrar na sua cabeça lhe causasse mais dor, pobre Edward.

Peguei-me pensando, nessas horas, como papai se sentira me vendo ser transformada – Edward não era contra as leis, era um vampiro comum – mas eu, proibida, Carlisle sabia das leis e mesmo assim, salvou-me. Como ele se sentira?

Porque eu me sentia absolutamente impotente, como se fosse, de um minuto a outro, um trapo inútil, sem nada ter para remendar. Era uma sensação esquisita essa, inutilidade, quero dizer.

Mais tarde, papai voltou, me aconselhou a caçar, de fato, meus olhos estavam ficando âmbar, mas recusei. Não tinha sede, nem vontade. Eu já devia estar há quase um dia sentada, na mesma posição, na mesma poltrona.

- Princesa – chamou Carl, certa hora de madrugada, da segunda noite de transformação – vá fazer algo, é doloroso vê-la sentada aí como se estivesse sofrendo.

Eu analisei durante alguns segundos a fala dele, pois estava “voando” e não a entendera direito. Ignorando completamente o dito, tirei minhas duvidas:

- Papai – hesitei, mas prossegui – como você se sentiu ao me ver na floresta da Itália? Bem, mal, com pena, com raiva... O quê?

Ele olhou para mim tristemente, como quem diz “Então, pois é né...”.

- Talvez... Bom, acho justo contar, afinal, você é minha filha e lhe devo isso por todas as vezes que salvou minha vida – estava pronta para dizer que não salvara para dizer favores, mas me calei, ele sabia disso.

- Eu estava caçando quando ouvi seus gritos – ele pareceu estremecer – eram altos, agudos e, principalmente, dolorosos. Quando encontrei você a primeira impressão foi que eu estava sentindo pena, porque eu tinha entendido perfeitamente o que estava acontecendo com ti. Você estava virando vampira.

“Por um momento mínimo, pensei. Era contra as leis, todavia, você parecia sentir tanta dor, que te peguei no colo e a levei para casa. Não sabia quem tinha feito isso, nem por que, mas sei que senti raiva, como ousavam transformar uma criança!”

Ele sorriu: - A realidade, Princesa, é que você não é uma criança. Sim, às vezes tem espírito de uma, mas todos nós temos. Você é inocente como uma, sorri como uma sim, tudo isso. Mas, você não é uma criança, Bella. Por vezes, fico questionando-me se deixar você viver foi certo, se não fui eu o responsável por sua dor, não Alec e Jane.

O abracei, dando soluços no meu já conhecido – e quase freqüente – choro seco.

- Pára, pára, pára! – quase gritei – Não diz mais nada, tá? Não fala nada! Eu ‘tô aqui, e vou ficar, não se arrependa de nada, pai. Eu não me arrependo.

Ele devolveu o abraço, com força, quase me tirando do chão.

Foi nesse instante que o coração de Edward decidiu bater tão rápido que parou.