Além do Destino

Intenções.


Dumbledore gostava de admirar seu gabinete. Não que ostentasse demasiado luxo, sob toda a montanha de livros e objetos mágicos empoeirados, ainda sim era belo. Ser diretor de Hogwarts não foi um de seus primeiros objetivos, mas negar que sentia-se orgulhoso em ter merecido tamanha honra seria um insulto. Essa responsabilidade lhe traria grandes feitos, e tamanha satisfação em prover bem-estar e segurança aos jovens da comunidade bruxa, que buscassem na escola um lar. Não conseguia imaginá-los como almas isoladas.

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Suas novas descobertas acerca de Lorde Voldemort o intrigara novamente. Se fossem reveladas verdadeiras suas conjecturas, um plano de defesa imediato seria extremamente necessário, partindo, sobretudo, de dentro do castelo. A escola de magia estaria em iminente perigo, e surgia a incerteza sobre a capacidade de protegê-la a si e seus alunos, numa pesarosa batalha em que absolutamente ambos os lados sairiam perdedores. Harry, como sempre, era sua ferramenta principal: sentaram-se frente a frente, incansáveis, numa eterna discussão de métodos passíveis para aprimorar habilidades específicas dos estudantes, porém estas deveriam ser invisíveis ao olhar fulminante do Ministério, em especial após o incidente na Sala de Mistérios. Qualquer erro seria desastroso.

Orientou seu melhor corpo docente a seguir suas instruções. De início, todos ficaram exasperados a respeito das novas atividades, destinadas em primeira mão aos veteranos, num rigoroso protocolo de execução. Severo Snape, entretanto, não deixou de demonstrar seu desgosto a parte do diretor, considerando tão válida a sugestão de um aluno como Potter, que agia sem precedentes e instintivamente. Ao contrário do senso crítico do outro, Snape apenas reconheceu nos olhos azuis de Alvo a admiração que esse possuía pela astúcia de Harry.

E assim, fez-se. O ano letivo iniciara e traria com ele novas possibilidades. Segundo seus cálculos, nenhum dos alunos capacitados estariam por fora da lista de interesse, caso tivessem algum. Primeiramente, sabia por experiência própria que a escolha deveria ser dada, a decisão é o passo fundamental da mudança. A organização didática estava de acordo com as expectativas, o que favorecia seus sentimentos ansiosos por resultados concretos. Exausto com tal leva ínfima de pensamentos, colocou cuidadosamente seu óculos meia-lua sobre a mesa, esbranquiçada de papéis, fitando uma última vez todo o ambiente que o cercava, agora embaçado, reconhecido apenas pelas luzes que rondavam a penseira e o pio delicado de Fawkes em seu pedestal. Fechou os olhos azuis com força, e a sala desapareceu.

Não tão logo amanheceu e Hermione já saia apressada dos dormitórios femininos. A noite anterior tinha sido no mínimo estranha, para todos os efeitos, haviam muitas perguntas que precisavam ser respondidas. Em meio aos corredores lotados de alunos perdidos e curiosos, avistou professora McGonagall, um tanto agressiva com dois jovens que insistiam furtivamente em levantar a saia das colegas. Aplicada a detenção, aproximou-se finalmente.

– Bom dia, professora, bem, eu... - tentou iniciar um diálogo, enquanto a outra exasperava-se a procurar por mais travessos no corredor. - Gostaria de saber sobre as novas aulas, é que, como sou monitora, pensei que... - surpreendeu-se novamente, enquanto a professora gritava com um aluno que invadia o banheiro feminino.

– Ah, me desculpe Srta. Granger, mas parece que os hormônios estão incontroláveis este ano! - Minerva sorriu com zombaria. - Não sei muito acerca dos planos do diretor com relação a essas atividades, Hermione, se surgiu alguma dúvida eu sugiro que converse diretamente com ele. - parou, olhando por cima da menina e afastando-se com passos largos. - A senha é Sangue de Unicórnio! - disse antes de desaparecer entre os alunos.

Decidida a procurar por Dumbledore após o almoço e consecutivamente a consolidação das vagas, seguiu para o Grande Salão, ainda vazio, porém as mesas já estavam repletas de apetitosas e intocáveis guloseimas. Acenou para Luna amigavelmente, na mesa ao lado, enquanto a outra retribuiu o gesto sonhadora, degustando um pedaço generoso de pudim.

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A aula de poções foi tão desastrosa que praticamente engoliu a manhã consigo. Hermione deu um muxoxo baixo de reprovação ao ver Harry e Ron adentrarem a nova sala do professor Horácio Slughorn com significativo atraso. Diferente de Snape, Slughorn não perdia tempo amordaçando os alunos antes de detalhar conciso a explicação sobre cada experiência e seus efeitos gerais, bem como a cordialidade em que tratava as dificuldades de seus colegas. Rapidamente foi conquistada pelo modo com que conduzia a tarefa, porém, surpreendeu-se ao perceber que a poção de Harry alcançara padrões superiores aos dela, sem o menor esforço. Chateada pelo fracasso, caminhou até a saída da sala acompanhada por Ron, mas sem olhá-lo diretamente. Harry juntou-se em seguida, satisfeito.

– As anotações desse livro são fantásticas! - bradou. - Elas não têm um padrão, mas aposto que pertenceu a algum aluno tão brilhante quanto você, Hermione.

– Anotações de simples alunos podem conter falhas irreversíveis. - respondeu ríspida. - Eu não daria tanto crédito, afinal, se fosse tão genial como diz, não estaria na beira do cesto de lixo. Você praticamente o salvou da extinção. - deu de ombros.

– Talvez. Mas eu confio em análises, se quer saber. Não acho que todo autor é dono da verdade. Para tudo há outros meios. - retrucou, achando graça na expressão furiosa da amiga.

– Absolutamente não! - disse por fim, saindo de perto, enquanto Lilá aproximava-se aos pulos e bagunçava os cabelos de Ron. - Perdi a fome, se não se importa, me dê licença.

O almoço adiado não seria conveniente. Partiu depressa ao dormitório de uso exclusivo dos monitores, adentrando o cômodo confortável. Suspirou, arrancando os sapatos sobre o tapete felpudo, sentindo os dedos relaxarem com o contato suave. Atirou-se de ímpeto na enorme cama de casal, reprimindo o choro. A imagem de Lavender bagunçando os cabelos de Ron doía em seu coração, misturando incredulidade e raiva. Até onde sabia, o ruivo nunca havia namorado ninguém, e nem mesmo tinha demonstrado afeto por nenhuma garota a não ser...ela mesma. Aparentemente, nada foi além de amizade, mesmo que a relação dos dois tivesse tomado mais proximidade nos últimos dias, antes que conseguisse a vaga como goleiro do time de Quadribol.

Sentia-se traída, substituída e humilhada. E a recíproca vinha em sorrisos e beijos melados.

– Hermione, o que está fazendo! - ergueu a cabeça, como se recuperasse o orgulho e a consciência. - Não pode ficar assim pra sempre, deve superar! O que pensou? Que ele gostava de você? - limpou as lágrimas nas mangas da veste. - Não. Ele gostava sim, da sua inteligência, preferencialmente quando você o auxiliava nos trabalhos. Ele gostava da maneira com que você facilitava a vida dele pra sobrar tempo para aquela...! - parou. Não havia mais palavra ou ofensa naquele instante. Calçou os sapatos, trancando o quarto assim que saiu, em marcha, até o gabinete de Dumbledore.

Não teve problemas com a senha, acostumada a rodear a entrada. Subiu, tropeçando em si mesma, os degraus que conduziam à sala superior, cuja porta pousava entreaberta. Batendo delicadamente, não esperou resposta, imaginando que o diretor deveria estar ocupado analisando as listas de interesses das novas atividades.

– Boa tarde! - disse o mais velho, folheando um livro. - Como vai Srta. Granger? A que devo a honra de sua visita?

Hermione reprimiu um arfar de susto.

– Perdoe-me, professor! - desculpou-se depressa. - Eu achei que não ouviria a mim, e ainda mais, com a porta praticamente aberta, não achei que fiz mal em entrar tão...

– Ah! Não se preocupe, na verdade, Harry esteve a pouco aqui, trazendo-me isto. - mostrou-lhe os pergaminhos. - Receio que esteja a par de nossa situação.

– Na verdade não, quero dizer, vim aqui exatamente para saber, professor, porquê não fui avisada previamente. Como monitora, é meu dever informar aos alunos sobre a disposição das aulas e novas atividades, inclusive, alguns já vieram me questionar e não tive qualquer tipo de reação a respeito. - respondeu sincera. - Harry não disse nada além do que estava escrito na ata de inscrição. - completou. - Mas senti que talvez pudesse haver algo a mais.

– Naturalmente. - Dumbledore levantou-se, aproximando da garota uma bandeja com torradas. - Sirva-se, deve estar faminta.

Até então, Hermione não tinha notado o desejo repentino de devorar qualquer alimento que estivesse em sua frente, devido a seus interesses prioritários. Pegou uma torrada com vontade, estalando os lábios.

– Acredito que seja necessário intervir em Hogwarts. - começou, rodeando a mesa. - Estive buscando novos meios de auxiliar o desenvolvimento de bruxos em estudo já avançado, mas seria absolutamente impossível simplesmente expor ao Ministério toda a minha pesquisa. Evitei tais questionamentos mascarando minhas reais intenções, porém, sinto que fui pego. - piscou. - Interessante a Srta. vir até mim, pois devo dizer-lhe, Hermione, precisava conversar com você.

– Comigo? - ergueu as sobrancelhas.

– Sim. A Srta. foi a única que inscreveu em Construção de ponte temporal através de feitiçaria, abrindo-me um leque de novas ideias. É claro que o Sr. Potter ainda não sabe o que está por vir, mas creio que devo ser sincero ao máximo com o que tenho comigo.

"Descobri recentemente uma nova artimanha de Voldemort, um poder tão perverso e sádico que até mesmo me questionei se poderia ser capaz de realizá-lo. Chama-se Horcruxe. Sendo quem é, a resposta ficou nítida em instantes. Na tentativa desesperada de desconstruí-lo, retirando o bálsamo do objeto, terminei sendo afetado por ele, e não sei até quando e onde poderei continuar minha busca. O preço foi alto demais."

Dumbledore descobriu a mão direita enegrecida, enquanto Hermione abria a boca em desespero.

– Pedir a Harry que faça isso é improvável, ainda que seja um rapaz extraordinariamente empenhado e correto, suas lembranças o revoltariam. Seria incapaz de realizar o que pretendo, por isso, acredito que seja a minha única opção.

A menina ajeitou-se na poltrona, preocupada com o que viria. Com as mãos suadas e entrelaçadas, assentiu seriamente, sob o olhar cauteloso do diretor.

– Percebi que a Srta. tem certa piedade das pessoas más, contrapondo a total admiração das pessoas boas. Pense da seguinte maneira: e se eu a mandasse para o passado, para o Tom Riddle de 16 anos? O que a Srta. faria? Como o trataria? Mesmo jovem, o passado de Lorde Voldemort não é menos perigoso que a figura que nós conhecemos, Tom é totalmente desprovido de afeto. - Hermione não conseguia arregalar mais os olhos, em total descrença da proposta do professor. - Acredito que um contato amistoso, até mesmo carinhoso, poderia cravar nele alguma sensibilidade, impedindo o rompimento de sua alma. Atitudes plausíveis dificultam a consolidação da magia.

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– Eu... estou surpresa, de fato, não esperava que fosse possível...

– Por meios comuns, não é. Se me permite a ousadia de lhe mostrar pouco de meus planos, e muito de meu material, deixe-me levá-la até a Sala dos Segredos. - aproximou-se, tomando a mão da menina.

– Como desejar. - e tudo sumiu.

O gabinete fora substituído por uma nova sequência de salas e saletas intercaladas em vários andares. Cintilantes, incontáveis vidros de memórias flutuavam em círculos, identificados com nome e data. A sensação era desconfortável, como se houvesse maresia ou magnetismo que turbilhoava o chão. Ficar de pé parecia dificultoso.

– É claro que dessa maneira fica tudo mais simples. - sorriu. - Seja bem-vinda. É aqui que guardo toda a minha memória, a partir da primeira que fui capaz de me recordar. Há também outras que considero importantes, algumas até já mostrei a Harry, tenho certeza que ele comentou com seus amigos. - alargou o sorriso, empolgado. - Ali estão as de Tom Riddle, - apontou. - nosso aluno mais ilustre.

– O senhor não nega isso. - repreendeu Hermione.

– Não nego a verdade, Srta., como aluno, Tom foi admirável, apesar de eu mesmo ter desconfiado por vezes de suas atitudes, principalmente pela maneira como tratava os colegas e afastava-os de maiores proximidades. Quando fez 11 anos, eu fui à um pobre orfanato em Londres buscar um garotinho abandonado e de excepcional habilidade mágica. Ele já a utilizava de forma inadequada, se me permite a ousadia, mas minha inocência e insistência foi maior. Percebi que um lar seria ideal para corrigir algumas falhas que a vida lhe tinha incumbido, e seria Hogwarts a responsável por esse feito. Infelizmente não é tempo para que eu me arrependa.

– O que devo fazer? - questionou decidida. Se havia alguma chance de ajudar, de proteger a escola, seus colegas e amigos, Hermione aceitaria, ainda que lhe custasse a distância e o sofrimento.

– Vou mandá-la aos poucos para o passado, utilizando uma magia rara e única, capaz de atrasar o tempo presente para que não se perca demais enquanto urge o passado. - explicou. - Marcaremos horários e datas, desvencilhados de seus amigos para não atrair suspeitas, e também dos professores, devemos nos certificar de que tudo o que for mudado seja apenas do meu conhecimento e o seu. Como foi a única inscrita na aula, este não será nosso maior desafio.

– Tenho razões para ter medo? - seria a última pergunta da tarde.

– A magia tem seus acasos, mas não se atente a isso, a preocupação afeta o raciocínio. - Dumbledore retirou um livro puído, sobrando a grossa camada de poeira, dando a menina em seguida. - Tome, e se puder, leia. Assim que estiver pronta, estarei no aguardo.

E toda a sala se foi.

– Hei! Tinha certeza de que iria falar com Dumbledore. - Harry surgiu ao seu lado, sorridente.

– Estava com Ginny?

– Como adivinhou? Já sei, veio pedir para o diretor se poderia cursar Refinamento de aptidão para adivinhação, além de Construção de ponte temporal através de feitiçaria. - tentou imitar a voz do diretor, arrancando uma risada de Hermione.

– Justamente. Sou bem desfavorecida. - comentou. - Ele se justificou sobre as aulas. - deu uma piscadela, compreendida pelo outro. - Acredito que serão bem proveitosas.

– Vai cursar mesmo Construção de ponte temporal?– em tom de pesar. - Deve ser muito útil, afinal, só você se interessou.

– Acho válido de qualquer forma, as outras não me despertaram qualquer vontade, aliás, eu tenho que ir. - adiantou-se.

– Ãhm, na verdade, acho que você não tem. - Harry franziu o cenho. - Horário livre. Eu tenho Trato das Criaturas Mágicas, mas você não quis coincidir seu calendário comigo por causa do Ron...

– Deixa disso. Eu precisava de um espaço pessoal.

– Tudo bem. Tenho que correr. Até mais, Mione! - saiu por dentre os campos até a alameda, acenando até sumir.

Tivera sorte, para alimentar sua curiosidade, aproveitaria do tempo disposto a desvendar o livro entregue por Dumbledore, e de sua natureza, todos os mistérios por trás dessa instigante façanha que seria viver no passado, em pleno convívio de Tom Riddle, numa época turbulenta, sem qualquer certeza de sucesso.